URT 0 x 2 Cruzeiro – Mais do mesmo

O Cruzeiro venceu em Patos de Minas, mas apresentou os mesmos problemas de sempre na fase ofensiva, mesmo com um “meia de ofício” no centro do meio-campo — um sinal de que o problema não era esse. Com o quarteto de frente muito estático e pouco intenso, a equipe teve dificuldades em sair da marcação individual imposta pela URT.

No segundo tempo, abriu o placar numa troca de posição simples, mas depois recuou, se contentando em absorver a pressão patense e tentando contra-atacar. Só conseguiu este objetivo no finzinho, após levar dois sustos.

O onze inicial

No 1º tempo, Cruzeiro no 4-2-3-1, com Charles avançando pela esquerda mas um quarteto ofensivo estático diante da marcação individual do time da URT

No 1º tempo, Cruzeiro no 4-2-3-1, com Charles avançando pela esquerda mas um quarteto ofensivo estático diante da marcação individual do time da URT

Marcelo Oliveira mandou seu fiel 4-2-3-1 a campo, com o retorno de alguns jogadores poupados e descanso para outros. Assim, a linha defensiva do goleiro Fábio começava com Ceará, com Manoel e Léo na zaga e Gilson na lateral esquerda. A proteção tinha Willian Farias e Charles atrás do central Marcos Vinícius, com Marquinhos à direita e Judivan jogando pelo outro lado. Damião foi o centroavante.

Já a URT do treinador Eugênio Souza entrou marcando individualmente, o que fazia o desenho uma espécie de 4-1-4-1. O gol de Luiz Fernando foi protegido pelos zagueiros Martinez e Carciano, com Rafinha na lateral direita e Marcel na esquerda. O meio-campo começava com Formigoni, ligeiramente mais atrás de Marzagão e Robinho, com Ramon pela direita e Edu Pina pela esquerda. Júnior Paraíba ficava solto na frente.

Muito volume, poucas chances

Com a proposta de marcação individual, a URT abdicava da briga pela posse e deixava a bola com os zagueiros celestes. Jr. Paraíba era o único que não tinha funções defensivas, apenas ocupando espaço na frente sem fazer pressão em Léo ou Manoel. Todos os outros jogadores tinham seu respectivo homem a marcar, com um dos zagueiros na sobra, o que naturalmente desfigurava as linhas de marcação.

Com isso, o Cruzeiro até conseguia fazer uma transição mais suave, sem muitas bolas longas. Mas bastava ela chegar aos pés de um cruzeirense que um adversário fazia pressão. Isso é esperado na marcação individual, mas o Cruzeiro estava sem intensidade e se mexia pouco, o que facilitava o trabalho da URT. Qualquer movimentação ou troca de posições, por menor que seja, já poderia tirar um adversário e deixar um jogador celeste sozinho, mas isso não aconteceu.

Flagrante da marcação individual da URT: note como os jogadores correm por todo campo atrás de seu adversário designado (ex.: Ramon x Gilson ou Rafinha x Judivan), com Carciano na sobra

Flagrante da marcação individual da URT: note como os jogadores correm por todo campo atrás de seu adversário designado (ex.: Ramon x Gilson ou Rafinha x Judivan), com Carciano na sobra

Charles e Marcos Vinícius

Mesmo assim, o Cruzeiro conseguiu ter algum controle da bola no campo de ataque. Isso porque Charles não se limitou à sua faixa de campo — como os volantes fizeram contra o Mamoré — e avançava pela esquerda sempre que possível, para dar suporte a Judivan e Gilson. Além disso, o jovem Marcos Vinícius recebeu mais passes e fez o jogo fluir um pouco mais, ainda que os jogadores tivessem muito longe uns dos outros.

As duas melhores chances do Cruzeiro no 1º tempo partiram dos pés dele. Na primeira, ele faz o passe para Damião no pivô, que de costas para o gol abre para Marquinhos chutar pra fora. E depois, numa ação de raciocínio rápido, quando a bola sobra e ele imediatamente aciona Damião na frente. O passe saiu meio torto e longo, mas mesmo assim Damião conseguiu chutar para a defesa de Luiz Fernando.

Organização defensiva

Sem a bola, o comportamento do Cruzeiro foi igualmente sem intensidade. Sem fazer pressão alta, o time se postava nas suas três linhas, fazendo marcação individual por setor — isto é, combater o adversário que entrar na área de ação do jogador. Foi suficiente para conter o pouco ímpeto ofensivo do time patense: a URT finalizou apenas três vezes contra o gol de Fábio. Nenhuma delas foi na direção certa, e duas foram de muito longe com Jr. Paraíba.

A única finalização mais de perto foi exatamente por causa da movimentação do camisa 10 da URT. Ele era o homem mais avançado quando o Cruzeiro atacava, mas quando a URT tinha a bola, os outros atacantes ultrapassavam e ele flutuava entre as linhas, funcionando como um armador de fato. Foi nessa posição que ele recebeu um passe, livre de marcação, fazendo Gilson sair de sua posição na lateral esquerda para cobrir, abandonando Ramon — que recebeu a bola e cruzou. A bola desviou no próprio Gilson e sobrou para Marzagão que bateu muito mal.

Segundo tempo

Após o jogo, Marcelo Oliveira revelou que pediu duas coisas aos jogadores no intervalo: mais mobilidade e saída de bola mais rápida. Os jogadores atenderam pelo menos a primeira requisição e logo no início do segundo tempo, uma troca de posições simples entre Marcos Vinícius e Marquinhos, com o apoio de Ceará pela direita, finalmente confundiu a marcação da URT.

A jogada do gol, inclusive, começa com uma espécie de pick-and-roll — uma jogada do basquete na qual um companheiro se aproxima e para para bloquear o avanço do marcador do homem da bola. Ceará passa para Marquinhos e bloqueia Formigoni, que foi arrastado por Marcos Vinícius para a direita. Com isso, o jovem meia tem campo para avançar e dar o passe para Marquinhos, também livre no centro, executar uma linda finalização e abrir o placar.

O início da jogada do 1º gol: Ceará e Marcos Vinícius fizera um "pick-and-roll" e tiraram Formigoni do caminho

O início da jogada do 1º gol: Ceará e Marcos Vinícius fizera um “pick-and-roll” e tiraram Formigoni do caminho

Recuo das linhas

Imediatamente após o gol, Eugênio Souza trocou Ramon pelo atacante Wellington, soltando mais o time da casa, mas sem mexer no sistema. O Cruzeiro teve mais espaços, mas parecia satisfeito com o empate e não os aproveitava. A URT então fez a segunda troca, sacando o lateral Marcel e lançando o meia Bruno Donizete a campo pelo lado esquerdo, abrindo de vez o time.

A URT começou a ter mais a bola e empurrar o Cruzeiro contra sua própria área. Marcelo então quis aproveitar o contra-ataque que se oferecia e mandou Joel a campo na vaga de Marcos Vinícius, para desespero da maioria da torcida. O camaronês ocupou a faixa central, mas não fez como no jogo contra o Mamoré, onde insistia em entrar na área e por lá ficar. Desta vez ele transitou melhor e sem a bola recuava até junto dos volantes.

Depois, Eurico entrou na vaga de Charles, aumentando o poder de marcação no meio. Isso só reforçou a tese de que a busca era por um contra-ataque que matasse a partida. A URT estava aberta, mas também não sufocava o Cruzeiro quando se defendia, o que pode ter dado a Marcelo alguma segurança para a sua terceira a última alteração.

Gabriel Xavier

No fim, o Cruzeiro recuou suas linhas e adotou uma postura reativa, procurando um contra-ataque que matasse o jogo -- só conseguiu no finzinho

No fim, o Cruzeiro recuou suas linhas e adotou uma postura reativa, procurando um contra-ataque que matasse o jogo — só conseguiu no finzinho

O treinador celeste lançou Gabriel Xavier no lugar de Judivan. Com isso, Joel foi ocupar a faixa esquerda. A ideia provavelmente era valorizar a posse no meio-campo, e ao mesmo tempo qualificar o último passe na transição ofensiva veloz, o popular contra-ataque.

O jovem meia só conseguiu cumprir a segunda função. Com Robson Duarte na vaga de Robinho, a URT se lançou totalmente ao ataque. O Cruzeiro se defendeu razoavelmente, mas não conseguia reter a bola. Com isso, em dois erros defensivos celestes, o time patense assustou: na primeira, uma sobra de bola parada em que Jr. Paraíba driblou Marquinhos dentro da área, e na segunda, um erro de Eurico no meio-campo que desmontou a cobertura da zaga celeste, deixando Léo sem ação contra Jr. Paraíba. Nas duas, Fábio salvou.

E o contra tão esperado finalmente saiu no finzinho da partida, com Gabriel Xavier. O “pensador” recebeu de Joel, girou driblando e passou imediatamente a Marquinhos na direita, ligeiramente impedido. O camisa 30 deu de primeira para Joel do outro lado, que invadiu a área e levou sorte na conclusão: o goleiro desviou, a bola iria pra fora, mas desviou também no zagueiro e entrou. Foi o último lance do jogo.

Mudar ou não mudar?

É fato que o Cruzeiro não vem jogando o futebol que a torcida espera. Talvez o time ofensivo e intenso de 2013/14 tenha feito os cruzeirenses ficarem mal-acostumados, o que pode aumentar o nível de exigência em relação a este time de 2015. Mas o Cruzeiro pode mais, principalmente na fase ofensiva, no ataque posicional.

Por isso, vejo muita gente pedindo que Marcelo reveja o esquema de jogo, e abandone o 4-2-3-1. O sistema mais pedido parece ser o 4-3-1-2 losango, bastando para isso recuar Marquinhos da ponta direita para o meio-campo. Eu particularmente não sou fã deste sistema, que tem como vantagem ter mais gente no centro do meio-campo, mas por outro lado expõe os laterais ao 2 contra 1 com o lateral e o ponta adversário.

Na minha visão, o problema é mais o modelo de jogo, a execução do esquema, do que o sistema em si. Ou seja, é muito mais uma questão de como o Cruzeiro joga o 4-2-3-1 do que o próprio 4-2-3-1 adotado. É como um bolo: se ele não fica gostoso, o problema está muito mais na receita e nos ingredientes do que na fôrma em que o bolo foi assado.

Além disso, trocar agora pode significar dois meses de trabalho fora. Eu ainda insistiria no 4-2-3-1 e cobraria uma execução melhor: mais mobilidade no quarteto de frente e participação dos volantes na construção, e ao perder a bola, ensaiar uma compactação ofensiva em bloco alto para recuperar a bola o mais rápido possível: o famoso pressing.

Mas, se o time continuar com o mesmo comportamento, a mudança no sistema pode ser o fato novo que faça este elenco responder.

Cruzeiro 1 x 1 Mamoré – A grande roda

Parece contraditório dizer isso quando cobramos aqui nesta coluna que De Arrascaeta saísse do centro para os lados, saindo da zona de maior pressão à frente da área adversária. Mas o Cruzeiro levou isso ao outro extremo na noite de quarta contra o Mamoré, a ponto de abandonar quase totalmente o centro da intermediária ofensiva.

Com os avanços de Mayke e Gilson pelos lados, a entrada de Joel na área e os volantes recuados, o Cruzeiro formou na prática uma grande roda em que ninguém podia entrar nela — ironicamente, num jogo em que o adversário dava espaços exatamente no centro. Um problema que só foi resolvido no segundo tempo com a entrada do jovem Marcos Vinícius.

Escalações

Volantes do 5-3-2 do Mamoré auxiliavam a marcação pelos lados abrindo um buraco no centro, que não era explorado pelo 4-2-3-1 do Cruzeiro: Joel entrava na área, volantes não subiam e ponteiros permaneciam abertos junto aos laterais, formando uma grande roda

Volantes do 5-3-2 do Mamoré auxiliavam a marcação pelos lados abrindo um buraco no centro, que não era explorado pelo 4-2-3-1 do Cruzeiro: Joel entrava na área, volantes não subiam e ponteiros permaneciam abertos junto aos laterais, formando uma grande roda

Sem os selecionáveis e o poupado Marquinhos, Marcelo Oliveira fez quatro mudanças no time considerado titular. Na lateral esquerda, Gilson foi o escolhido, compondo a linha com os titulares Mayke pela direita e Léo e Paulo André no miolo. Henrique e Willian Farias fizeram a parceria na volância, atrás de um trio de meias totalmente novo: Judivan pela direita, Joel no centro e Riascos mais pela esquerda. Na frente, Damião.

Já Pael, treinador do Mamoré, poupou alguns jogadores visando as últimas duas rodadas, um indício forte de que, para o time patense, o que viesse era lucro. Devido às compensações de marcação, a equipe se desenhou num 5-3-2, com o goleiro Gilberto tinha Bruno Limão à direita, Thales, Pablo e Juliano à sua frente e Ernani à esquerda. Na frente da área, Erick e Maxsuel davam suporte a Luizinho, o meia de ligação. Na frente, Charles caía pela esquerda e Jonatan Reis ficava mais à frente.

O centro, um lugar proibido

Em teoria, o Mamoré era um 4-3-1-2 com meio em losango, mas o volante Pablo afundava entre os zagueiros, empurrado pelo central celeste Joel, que preferia entrar na área a se movimentar. Maxsuel auxiliava Ernani na marcação a Judivan e Mayke, enquanto Erick preferia subir o combate a Gilson já a partir do meio-campo.

Flagrante da organização defensiva do Mamoré. Aqui com Jonatan Reis e Luizinho invertidos por causa de um duelo aéreo do camisa 9 patense com Léo. Note o zagueiro celeste orientando W.Farias a passar a Gilson do outro lado

Flagrante da organização defensiva do Mamoré. Aqui com Jonatan Reis e Luizinho invertidos por causa de um duelo aéreo do camisa 9 patense com Léo. Note o zagueiro celeste orientando W.Farias a passar a Gilson do outro lado

Com isso, abria-se um espaço enorme na intermediária central, que não era explorado por ninguém. Judivan e Riascos ficavam abertos e só faziam a diagonal para entrar na área quando a jogada era pelo lado oposto; Henrique e Willian Farias raramente chegavam perto da grande área para participar da construção ofensiva. Só me lembro de um momento em que Henrique subiu, e a bola passou pelos pés dele para o cruzamento de Judivan que encontrou a cabeça de Joel. Gilberto pegou.

Aqui, uma das raras jogadas em que um jogador ocupou o enorme espaço na frente da área patense: Henrique recebeu de Damião e deu seguimento ao ataque, passando a Judivan na direita que cruzou para Joel cabecear em cima do goleiro Gilberto

Aqui, uma das raras jogadas em que um jogador ocupou o enorme espaço na frente da área patense: Henrique recebeu de Damião e deu seguimento ao ataque, passando a Judivan na direita que cruzou para Joel cabecear em cima do goleiro Gilberto

Muitos cruzamentos, de novo

Assim, as jogadas celestes se resumiam aos lados, com inúmeros centros, principalmente pela direita, com Judivan levando vantagem sobre Ernani em vários lances. Alguns até foram certos, mas a finalização não foi boa: Riascos mandou na trave e Joel cabeceou errado duas vezes.

No meio do 1º tempo, Pael pediu ao atacante Charles para acompanhar Mayke e fechar o lado esquerdo, direito do ataque celeste. E a partir daí, o Cruzeiro só chegou uma vez mais, numa bola roubada por Damião no campo de ataque e passada para Riascos, que chutou estranho em cima do goleiro.

Aquele ditado

O Cruzeiro voltou com Manoel na vaga de Paulo André por questão física, e com Neílton no lugar de Riascos. Marcelo Oliveira tinha a esperança de abrir a defesa do Mamoré com os dribles do garoto, mas infelizmente o problema não era isso — o Mamoré nem estava fazendo uma marcação tão boa, só tinham os lados bem bloqueados e um latifúndio à frente da área.

Como esperado, a alteração não surtiu efeito, e o jogo continuou na mesma balada. Aí entrou em campo o famoso ditado: “quem não faz leva” (que não seria um ditado do futebol se não acontecesse muitas vezes). Num escanteio bobo, Damião errou a marcação individual que é feita pelo Cruzeiro em bolas paradas e o zagueiro Juliano testou para as redes azuis.

Finalmente, alguém no centro

Este gol foi aos 9 minutos. Aos 18, Marcelo finalmente teve coragem e tirou Willian Farias e colocou Marcos Vinícius. Ainda era um 4-2-3-1 sem bola, com o jovem meia se alinhando a Henrique, mas isso não aconteceu mais (o gol foi a última finalização do Mamoré no jogo).

Marcos Vinícius entrou como volante, mas como só o Cruzeiro atacava, quase não fez a função, e derivava para o espaço central sem nenhuma marcação

Marcos Vinícius entrou como volante, mas como só o Cruzeiro atacava, quase não fez a função, e derivava para o espaço central sem nenhuma marcação

Marcos Vinícius fez o que era esperado de um jogador naquele ponto do campo: perambulou nas quatro direções, aparecendo para receber o primeiro passe atrás, dos lados para ser o apoio e se aproximando da área para tabelar ou finalizar. Mas parecia que seus companheiros não tinham confiança nele, e preferiam o passe longo. Houve um momento em que Marcos Vinícius chegou a ficar a um metro de Léo para receber o passe e iniciar o ataque, mas o zagueiro preferiu inverter pro lado direito para Mayke.

Não por coincidência, as melhores jogadas do Cruzeiro saíram quando o passe finalmente ia para os pés do jovem meia. Na primeira, ele avança até o setor onde não há ninguém para ajudar Judivan e Mayke pelo lado direito contra três marcadores (veja abaixo). Quando recebe a bola, desorganiza a defesa que sobe para pressionar, consegue entrar na área e cruzar rasteiro. Neílton marcou mas estava impedido.

E no lance do empate, foi também ele quem iniciou a jogada. Judivan, que àquela altura estava pela esquerda invertido com Neílton, passou para Marcos Vinícius que novamente estava sozinho no buraco que era a intermediária ofensiva do Mamoré. Passou por dois marcadores, e na hora de finalizar, os defensores que marcavam Damião saíram para tentar impedi-lo. Com isso, Damião ficou livre para pegar a sobra e empatar.

No fim o Cruzeiro ainda ensaiou uma pressão, mas não conseguiu virar.

Flagrantes do oceano de espaço que Marcos Vinícius tinha à disposição: em cima, o início da jogada do gol anulado de Neílton, e embaixo, a do gol de empate de Damião

Flagrantes do oceano de espaço que Marcos Vinícius tinha à disposição: em cima, o início da jogada do gol anulado de Neílton, e embaixo, a do gol de empate de Damião

É hora de rever conceitos

É inegável que a entrada de Marcos Vinícius no time (ainda que não tenha sido muito procurado pelos companheiros) melhorou a organização ofensiva, que foi praticamente a única coisa que aconteceu o jogo inteiro — houve poucos momentos de transição e organização defensiva do Cruzeiro. Isso porque a equipe fez uma execução ruim do 4-2-3-1 costumeiro.

Sim, o problema foi a execução e não o esquema em si. Ano passado, o modelo funcionava com Goulart e Ribeiro fazendo movimentos complementares: o primeiro entrava na área ou caía pelo lado, e o segundo ocupava o espaço no centro. Havia intensidade, troca de passes curtos, com os jogadores bem próximos uns dos outros. Neste ano, os atletas ficam presos ao seu setor, sem mobilidade ou troca de posições para criar os espaços. E mesmo quando o adversário já cede estes espaços naturalmente, eles não são aproveitados (ou não são notados).

A solução não é, necessariamente, “mais um meia”. Obviamente, um meia passador típico preencheria melhor este espaço, mas ele precisa ter mobilidade e intensidade. No futebol atual, não existe essa coisa de pensar o jogo, parando a bola e encaixando passes. É um falso dilema entre “pensar ou correr”: é preciso pensar correndo. Então até mesmo um jogador que não fosse um meia, mas se movimentasse bem e preenchesse os espaços, melhoraria.

O time é líder nas duas competições que disputa, mas muito mais pelo baixo nível técnico dos oponentes do que por méritos próprios. Para as fases eliminatórias, precisará melhorar bem sua organização ofensiva, pois quando tiver que fazer um bom placar para jogar o segundo jogo fora, ou tiver que buscar o resultado adverso num segundo jogo em casa, fatalmente terá problemas se continuar insistindo neste modelo.

América/MG 0 x 2 Cruzeiro – Eficiente e suficiente

A partida contra o América foi bem melhor do que a de quinta na Venezuela, mas era bem difícil ser pior ou até mesmo igual. O Cruzeiro ainda teve alguns problemas, inclusive cansaço físico da longa viagem — como revelado por Marcelo Oliveira na coletiva — mas foi mais compacto, protegeu bem sua área e conseguiu explorar um pouco melhor os espaços no contra-ataque.

Não foi nada brilhante, mas o Cruzeiro errou muito pouco, tanto na marcação quanto nas poucas chances que teve, e por isso saiu com a vitória.

Formações iniciais

Cruzeiro e América entraram no 4-2-3-1. Cruzeiro numa postura reativa, com De Arrascaeta se mexendo um pouco mais para acionar os ponteiros em contra-ataque; América tinha mais a bola, com Renatinho caindo pelos lados para criar superioridade numérica

Cruzeiro e América entraram no 4-2-3-1. Cruzeiro numa postura reativa, com De Arrascaeta se mexendo um pouco mais para acionar os ponteiros em contra-ataque; América tinha mais a bola, com Renatinho caindo pelos lados para criar superioridade numérica

As duas equipes vieram no 4-2-3-1. Marcelo Oliveira mandou a campo o mesmo onze do jogo com o Mineros, com Fábio no gol, Mayke na lateral direita e Mena na esquerda, com Léo e Paulo André no miolo de zaga. Willian Farias e Henrique ficaram na proteção, e mais à frente Alisson e Marquinhos flanqueavam De Arrascaeta, atrás de Damião.

O América de Givanildo tinha João Ricardo no gol, Wesley Matos e Anderson Conceição na zaga, com Robertinho à direita e Bryan fechando o lado esquerdo. Na volância, Thiago Santos e Diego Lorenzi davam suporte ao central Renatinho, que tinha ainda Felipe Amorim pela direita e Sávio pela esquerda, com Rubens na referência.

Duelos por todo o campo

A marcação encaixou e gerou duelos interessantes nos quatro cantos do campo: Mayke x Sávio, Mena x Felipe Amorim, Alisson x Robertinho e Marquinhos x Bryan. No meio-campo, Henrique e Willian Farias se encarregavam de marcar Renatinho e o volante que subisse, que normalmente era Diego Lorenzi, enquanto Thiago Santos ficava a cargo de cuidar de De Arrascaeta. E os centroavantes duelavam com as duplas de zagueiros nas áreas.

Mas quem marcava mais eram os celestes. Isso porque o América tomou a iniciativa e ficou com a bola, tentando chegar pelos lados, devido à movimentação de Renatinho, que saía do centro para criar superioridade numérica nesses setores. Por duas vezes, a marcação celeste ficou indefinida e os jogadores americanos conseguiram chegar ao fundo. Talvez De Arrascaeta pudesse se espelhar nisso, apesar de ter sido muito mais móvel neste jogo do que na Venezuela.

Felipe Amorim deu muito trabalho para Mena pela esquerda. Até conseguiu passar em alguns lances, mas no cômputo geral, Mena fez um bom trabalho: o camisa 7 americano só conseguiu criar duas chances, uma em cada tempo. Do outro lado, Sávio se dava melhor contra Mayke, porque destro que é, partia para o centro e batia com a perna direita. Acertou a trave num desses chutes.

Zagueiros e contra-ataque

Com o time do Cruzeiro mais compacto, porém, o América não conseguia entrar na área adversária. No 1º tempo, o time da casa finalizou 6 vezes, mas todas de fora da área. Muito por causa de um bom trabalho da linha defensiva, mais uma vez. Léo e Paulo André venciam todas pelo alto e pelo chão, em contraste com o desempenho irregular da dupla de volantes.

Em azul, as finalizações do América, e em vermelho, as do Cruzeiro; os dois únicos chutes do América de dentro da área foram no 2º tempo (Footstats)

Em azul, as finalizações do América, e em vermelho, as do Cruzeiro; os dois únicos chutes do América de dentro da área foram no 2º tempo (Footstats)

Com as linhas avançadas, o América deixava espaços atrás, cedendo o contra-ataque ao Cruzeiro, que ensaiou uma, duas até acertar na terceira. Após cobrança de falta do América, a bola sobrou na esquerda, e a defesa rechaçou novo cruzamento. A bola sobrou para Marquinhos, que viu a movimentação de De Arrascaeta e deu na frente. O uruguaio girou e acionou Alisson imediatamente pela esquerda, onde estava apenas Diego Lorenzi, com o outro volante Thiago Santos, na cobertura — os zagueiros estavam na área adversária por causa da bola parada. Alisson avançou, cortou pra dentro e bateu maravilhosamente no canto, fora do alcance de João Ricardo.

Com o gol, Givanildo percebeu o perigo e recuou as linhas. O América passou a marcar a partir do meio-campo, dando um pouco mais a bola para o Cruzeiro e partindo em velocidade. Mas o primeiro tempo acabou mesmo com o Cruzeiro em vantagem.

Segundo tempo

As equipes voltaram do intervalo sem alterações, assim como o panorama do jogo após o gol. A posse de bola era equilibrada, e nenhuma das duas equipes via necessidade avançar as linhas: o Cruzeiro porque tinha o placar a seu favor, e o América porque não queria sofrer mais estocadas no perigoso contra-ataque celeste. A partida ficava sendo disputada entre as duas intermediárias, e a bola só se aproximava dos goleiros em bolas paradas.

Givanildo com quem fez o primeiro movimento, trocando de centroavante: Rodrigo Silva na vaga de Rubens. A partida não mudou, mas o Cruzeiro conseguiu achar alguns bons passes pela esquerda. Marquinhos achou Mena, que cruzou para Damião sozinho perder; e depois Alisson foi acionado, driblou duas vezes mas no último toque a bola escapou ligeiramente e ele bateu prensado.

Troca nas pontas

Marcelo então mexeu nos flancos. Trocou de ponteiros: Alisson deu lugar a Gilson — que sim, foi jogar na meia esquerda — e Marquinhos cedeu vaga a Judivan. O 4-2-3-1 estava mantido, mas com mais fôlego pelos lados e mais proteção a Mena pela esquerda, já que Gilson também é lateral e sabe recompor. Após o jogo, Marcelo justificou as trocas dizendo que era por cansaço, já que os titulares não estavam mais recompondo.

Fim de jogo: ambos os times mantiveram o 4-2-3-1 durante todos os 90 minutos; Cruzeiro teve Gilson como ponteiro esquerdo para recompor melhor e ajudar Mena

Fim de jogo: ambos os times mantiveram o 4-2-3-1 durante todos os 90 minutos; Cruzeiro teve Gilson como ponteiro esquerdo para recompor melhor e ajudar Mena

No América, Pedrinho entrou na vaga de Sávio, com câimbras. Ele se posicionou pela esquerda do ataque, mantendo o sistema original. Mas quem continuava dando trabalho era Felipe Amorim, que derivou para o centro a partir da direita, levando Mena consigo e causando o chileno a cometer falta. Ele mesmo cobrou, mas mal.

O que ele não imaginava é que o tiro de meta originaria o segundo gol celeste. Na bola longa de Fábio, Damião inverte com De Arrascaeta para brigar pelo alto, e foi exatamente o que aconteceu: uma casquinha para o uruguaio na frente, que driblou seu marcador e avançou pela esquerda. Damião também fez um movimento interessante: primeiro ele corre na direção do zagueiro, “empurrando-o” pra longe. Quando De Arrascaeta se aproxima da área, ele muda de direção, indo para a primeira trave. Isso fez ficar sozinho pra receber o passe e aumentar o placar.

No lance, o zagueiro Anderson Conceição se lesionou e teve de ser substituído por Allison, acabando com as trocas do América. E no fim, Marcelo tirou Damião apenas para receber os aplausos da torcida. Henrique Dourado jogou pouco mas conseguiu roubar uma bola excelente no meio-campo, fazendo o que se espera de centroavantes modernos.

Novo estilo

O Cruzeiro de 2013/14 nos acostumou a ver uma equipe com a bola nos pés, intensa na movimentação e inversão de posições. Mobilidade necessária para criar os espaços diante de times que enfrentavam o Cruzeiro com muito respeito, com muitos jogadores postados atrás da linha da bola. Em 2015, a equipe parece ter uma característica diferente: marca forte no meio (apesar das deficiências dos últimos dois jogos) e prefere jogar na transição, com velocidade. Quando acertou o passe nessa fase, venceu.

Já são dois meses na temporada e o Cruzeiro ainda não fez um jogo em que dominou a posse de bola criou chances em profusão. O entrosamento, que ainda não chegou totalmente, tem parte nisso, mas talvez já seja hora de reconhecer que o Cruzeiro de 2015 seja um time diferente, mais reativo, mais competitivo e letal.

Sofrer poucos gols e ser muito eficiente nas poucas chances que cria. Não me agrada, mas aí já é questão de gosto. E não que eu acredite nisso, mas torço para que esta característica seja mais eficaz para campeonar na Copa Libertadores — que, ao fim e ao cabo, é o objetivo principal.

Mineros 0 x 2 Cruzeiro – A pior de todas

Enfim o Cruzeiro venceu na Copa Libertadores. Mas fez sua pior partida desde 2013, nas palavras do próprio Marcelo Oliveira. Foram 67 minutos em que a equipe foi mal em todas as fases do jogo: ataque, recomposição, defesa, transição, bola parada. Até no contra-ataque, onde até então vinha tendo seu melhor desempenho, o Cruzeiro não foi bom. Com as substituições, o time se distribuiu melhor em campo e passou a controlar as ações, mesmo sem brilho.

Formações iniciais

No 1º tempo, o 4-2-3-1 do Cruzeiro levou um banho tático: os laterais do Mineros avançavam ao mesmo tempo e criavam dificuldades para Marquinhos e Alisson; De Arrascaeta distante dos volantes, dando muito espaço para López se juntar ao intenso ataque dos venezuelanos

No 1º tempo, o 4-2-3-1 do Cruzeiro levou um banho tático: os laterais do Mineros avançavam ao mesmo tempo e criavam dificuldades para Marquinhos e Alisson; De Arrascaeta distante dos volantes, dando muito espaço para López se juntar ao intenso ataque dos venezuelanos

Marcelo escalou o Cruzeiro no 4-2-3-1 tradicional. A linha defensiva de Fábio tinha Mayke e Mena nas laterais, com Léo e Paulo André na zaga. Na volância, Willian Farias substituiu o lesionado Willians, na parceria com Henrique. À frente, Marquinhos fez a ponta direita e Alisson a esquerda, com De Arrascaeta por dentro se aproximando de Damião na referência.

A equipe do Mineros também se posicionou num 4-2-3-1, que variava para um 4-3-3 com a bola com o avanço do volante López. O gol de Romo foi protegido por Machado e Matos, com Vallenilla pela direita e Cíchero na esquerda. À frente da área, Jiménez ficava mais preso, liberando López para se juntar ao meia Blanco e aos atacantes Peña pela direita, Pérez pela esquerda e Cabezas, o avante.

Descompactação

Antes do jogo, escrevi no Twitter que não sabia qual seria a estratégia usada pelo time venezuelano: iriam atacar com tudo, mas dando espaços atrás, ou iriam preferir esperar para jogar no erro do Cruzeiro? A resposta veio logo no começo: o Mineros jogou a vida. Atacaram com muita intensidade, com os dois laterais subindo ao mesmo tempo, inversão de Pérez e Peña, Blanco entrando na área para dar profundidade e deixando a criação para López e o ponteiro do lado da bola. Sempre 5 atacando, com a ajuda dos laterais.

Nem o gol de Damião, na primeira jogada de ataque do Cruzeiro, mudou o cenário. O Cruzeiro parecia estar numa rotação abaixo, sem pressionar o homem da bola, num contraste claro com a intensidade aplicada pelo Mineros. López conseguia transitar com muita facilidade na intermediária ofensiva, ditando o ritmo, pois havia um grande buraco entre os volantes e os homens de frente. Henrique e Willian Farias simplesmente não conseguiam entender o sistema ofensivo venezuelano e tiveram muitas dificuldades em preencher os espaços.

Saída de bola

Quando o ataque do Mineros não funcionava, o Cruzeiro era imediatamente pressionado pelos vários jogadores venezuelanos que estavam no campo de ataque. Quase sempre apelava para a bola longa, também porque De Arrascaeta e Damião, sem contribuir com o trabalho defensivo estavam bem longe do resto do time. Apenas em um lance no primeiro tempo, De Arrascaeta conseguiu encaixar um contra-ataque que achou Damião na área, mas o centroavante chutou pra fora.

Com maior posse, o Mineros criou algumas chances, mas Fábio só teve de trabalhar em um chute do lateral Vallenilla (veja na imagem abaixo). Isso porque a linha defensiva celeste, mesmo exposta demais, teve um bom desempenho. Léo desviou um chute à queima-roupa deitado no chão, e em um passe por cima que deixou Cabezas cara a cara com Fábio, Mena se recuperou a tempo impedindo a finalização. Assim, a primeira etapa terminaria, por incrível que pareça, com o Cruzeiro na frente.

Os problemas defensivos  celestes em um lance: (A) Marquinhos chega atrasado na marcação de Cíchero, forçando Henrique a abandonar o meio e ir para a cobertura; (B) a bola chega no centro, onde W.Farias está sozinho contra López e Peña, com De Arrascaeta longe; (C) Alisson e Mena saem em socorro, mas deixam Cabezas e Vallenilla livres. A bola chegou ao lateral do Mineros que chutou para a defesa de Fábio.

Os problemas defensivos celestes em um lance: (A) Marquinhos chega atrasado na marcação de Cíchero, forçando Henrique a abandonar o meio e ir para a cobertura; (B) a bola chega no centro, onde W.Farias está sozinho contra o avanço de López e Peña, com De Arrascaeta longe; (C) Alisson e Mena saem em socorro, mas deixam Cabezas e Vallenilla livres. A bola chegou ao lateral do Mineros que chutou para a defesa de Fábio.

A troca que mudou a partida

Sempre se espera algo de Marcelo Oliveira no intervalo, mesmo que seja apenas na conversa. Um mero ajuste de posicionamento já poderia melhorar as coisas para o Cruzeiro, mas não foi isso o que aconteceu. O segundo tempo começou da mesma forma que o primeiro, com o Cruzeiro sofrendo em sua retaguarda e tentando sair em contras — Marquinhos poderia ter matado o jogo em um, mas chutou em cima do goleiro.

Com as entradas de Charles e Ceará, Cruzeiro passou a fazer duas linhas sem a bola, preenchendo melhor os espaços e afastando o Mineros de sua área; com a bola, Charles e Henrique avançavam como meias e Alisson abria, formando um 4-3-3, com os laterais se soltando um pouco mais

Com as entradas de Charles e Ceará, Cruzeiro passou a fazer duas linhas sem a bola, preenchendo melhor os espaços e afastando o Mineros de sua área; com a bola, Charles e Henrique avançavam como meias e Alisson abria, formando um 4-3-3, com os laterais se soltando um pouco mais

Foi então que Marcelo fez as trocas que mudaram o panorama. Trocou Mayke, que sofria na marcação pela direita, por Ceará, que sabe compor melhor a linha defensiva. O veterano lateral cumpriu sua função muito bem. Além disso, uma substituição fez a corneta soar forte: De Arrascaeta por Charles. A torcida logo se apressou em criticar, pois era uma troca de um meia por um volante. A velha confusão entre posição, posicionamento e função.

Charles se posicionou do lado esquerdo da linha de meio-campo, deixando apenas Alisson e Damião na frente, com Marquinhos recompondo pelo lado direito. As novas duas linhas de quatro sem a bola agruparam mais o time, o que matou os espaços que o Mineros tinha na intermediária ofensiva. O time venezuelano passou a ter a bola bem mais longe da área celeste, em seu campo de defesa, e já não conseguia entrar com facilidade.

Mais defensivo e mais ofensivo

Além de marcar melhor, o Cruzeiro passou também a fazer uma transição defesa-ataque bem mais suave, sem quebrar a bola. Com os jogadores mais próximos, era mais fácil encontrar um passe na saída após roubar a bola. Assim, podemos dizer que o Cruzeiro ficou mais defensivo e ao mesmo tempo mais ofensivo. Saindo pelo chão, o Cruzeiro começou a chegar com facilidade na intermediária ofensiva e trabalhar a bola.

Com a segurança de Charles pelo lado esquerdo, o lateral Mena, que até então não havia se aventurado no campo de ataque, passou a sair mais. Não por coincidência, a jogada do segundo gol passou pelos pés dele. Alisson puxou a marcação e deixou um corredor livre pelo meio para o chileno avançar, tabelar com Damião e servir Marquinhos do outro lado. O gol que deu tranquilidade e números finais ao jogo.

Sem resultadismo

Taticamente, a partida foi um desastre. Setores muito espaçados, falta de intensidade nas ações e muitos erros de passe com a bola. Talvez Marcelo tenha se surpreendido com a estratégia do Mineros de ir pra cima mesmo deixando espaços generosos atrás. Mas o Cruzeiro tinha que adaptar sua marcação e explorar estes espaços. Não fez nem uma coisa nem outra, a não ser em dois ou três contra-ataques desperdiçados.

Na parte do jogo em que foi dominado, o Cruzeiro só não sofreu gol por causa da falta de qualidade do Mineros. Fosse um time um pouco melhor tecnicamente, arrisco dizer que o Cruzeiro teria saído com o revés. Tanto é que quando o jogo se equilibrou na parte tática, com as trocas de Marcelo, a superioridade técnica do Cruzeiro ficou evidente — a jogada do segundo gol comprova isso.

Valeu a vitória, é claro. Mas cuidado com o resultadismo. É bom saber que o próprio Marcelo reconhece que atuação foi ruim, mesmo com um resultado importante.

Que este jogo seja pelo menos um exemplo de como NÃO se comportar em campo, principalmente na parte defensiva.

Cruzeiro 1 x 1 Atlético/MG – Zero a zero com gols

No primeiro clássico do ano, o Cruzeiro voltou a apresentar os mesmos problemas em encontrar espaços diante de defesas fechadas no Mineirão. A partida contra o Huracán já havia mostrado essa deficiência criativa, mas naquela partida o Cruzeiro pelo menos chegou fácil pelos lados. Neste jogo o excesso de cruzamentos não aconteceu, também por causa do pouco ímpeto dos laterais, que são os responsáveis pela amplitude no ataque.

Foi um jogo concentrado no terço central, já que ambas as equipes pouco criaram: o Cruzeiro por não ter mobilidade suficiente para criar os espaços e o Atlético por proposta de jogo.

Os escretes

Times no 4-2-3-1: Cruzeiro sem muito apoio dos laterais e sem mobilidade, Atlético bem compactas negando espaços entre as linhas e Luan responsável pela ligação

Times no 4-2-3-1: Cruzeiro sem muito apoio dos laterais e sem mobilidade, Atlético bem compactas negando espaços entre as linhas e Luan responsável pela ligação

Marcelo Oliveira não fez nenhum mistério e escalou o time no 4-2-3-1 esperado, com o gol do capitão Fábio sendo protegido por Léo e Paulo André, com Mayke fechando pela direita e Mena pela esquerda. A dupla volância teve Willians e Henrique mais uma vez, no suporte ao trio formado por Marquinhos na direita, Willian à esquerda e De Arrascaeta centralizado atrás de Leandro Damião, o centroavante.

Levir Culpi tinha muitos desfalques e armou seu time no mesmo 4-2-3-1, mas que virava um 4-4-2 em fase defensiva, que foi na maior parte do tempo. Victor tinha Patric à direita e Douglas Santos à esquerda flanqueando a dupla de zaga formada por Edcarlos e Jemerson. Na frente da área, Rafael Carioca e Leandro Donizete faziam a proteção, deixando os corredor esquerdo para Carlos e o direito para Cesinha, o que dava liberdade para Luan se juntar a Dodô na frente.

Posse e recomposição

Com os desfalques e na condição de visitante, era esperado que o Atlético se preocupasse mais em marcar o Cruzeiro e partir em contras. Nas duas últimas visitas ao Cruzeiro no Mineirão, foi exatamente o que o Atlético fez, e nas duas saiu com a vitória. Querendo evitar novo revés, Marcelo armou seu time para atacar, mas também preocupado com os contragolpes, principalmente pelos lados, e por isso prendeu um pouco mais os laterais. A primeira função de Mayke e Mena era acompanhar os ponteiros adversários, e depois subir.

Mas os ponteiros do Cruzeiro tem a característica de centralizar o jogo, se aproximar do centro. Foi assim em 2013 e 2014, e assim é em 2015, ainda que com jogadores diferentes. E dessa forma, o Cruzeiro pouco chegou pelos lados, diferente da partida contra o Huracán. O Atlético marcava bem compacto, negando espaços entre as duas linhas, dificultando as ações do trio ofensivo atrás de Damião.

Flagrante do posicionamento ofensivo do Cruzeiro: laterais dão amplitude, mas não profundidade; trio de meias bem próximos, mas sem espaço entre as duas linhas do Atlético (foto: @rodrigodeaf)

Flagrante do posicionamento ofensivo do Cruzeiro: laterais dão amplitude, mas não profundidade; trio de meias bem próximos, mas sem espaço entre as duas linhas do Atlético (foto: @rodrigodeaf)

Sem opções, o Cruzeiro chegava perto da área do Atlético até com facilidade, mas a partir dali não sabia bem o que fazer com a bola. Diante de um time bem postado taticamente, cabe ao time com a bola se movimentar e aproximar, tentando desmontar a defesa para criar os espaços e usá-los. Mas para isso é preciso que os jogadores se conheçam bem, saibam a característica de cada um: onde preferem a bola, em que pé, de que forma, como se movimentam. É o tal entrosamento, que, como sabemos, ainda está sendo construído.

Defesa e transição

Quando o Atlético recuperava a bola, o Cruzeiro não fazia pressão alta. Recompunha-se e marcava a partir do meio-campo, usando a mesma estratégia do adversário. Quem fazia a transição era sempre Luan. Ele buscava a bola atrás e carregava para o campo de ataque, aparecia pelos lados e tentava encontrar os companheiros no meio da defesa celeste. Os avançados atleticanos até tinham mais mobilidade, mas não achavam o passe e entregavam a posse de bola.

Mas ao invés de partir na transição rápida, o Cruzeiro não aplicava velocidade suficiente e deixava a defesa adversária se recompor também. O único lance em que isso aconteceu foi uma jogada de Marquinhos pela direita, mas Damião não chegou a tempo e a zaga afastou.

Com as defesas levando vantagem sobre os ataques, não por acaso o primeiro tempo só teve uma grande chance, e de bola parada: escanteio do Atlético que Fábio fez dois milagres. E foi só: basicamente, um jogo de uma intermediária à outra.

Segundo tempo

Após o intervalo, o panorama pouco mudou. De Arrascaeta passou a se movimentar e aparecer mais para o jogo, e com isso o Cruzeiro teve mais volume, mas ainda sem ter o passe final qualificado. Aos 15, Marcelo fez troca dupla: tirou o uruguaio e Willian, lançando Alisson e Judivan — as mesmas duas trocas do jogo contra o Huracán. Alisson foi à esquerda e Judivan ficou pelo centro. Quatro minutos depois, Levir respondeu com Danilo Pires e Maicosuel nas vagas de Cesinha e Dodô. Danilo entrou para segurar mais a bola, e Maicosuel para dar velocidade aos contras.

Se no jogo contra o time argentino as alterações de Marcelo deram um certo resultado, nesta partida nem tanto. As mexidas de Levir acabaram por neutralizar as de Marcelo: o Atlético de fato passou a ficar mais com a bola, e foi saindo aos poucos para o ataque, principalmente com Patric pelo lado direito — de onde começou a jogada do gol bizarro que Fábio sofreu.

Marquinhos volante

No fim, Cruzeiro se lançou em busca do empate com Marquinhos armando de trás e Judivan e Alisson nas pontas, e quase virou o jogo, mas cedeu espaços importantes que o Atlético não aproveitou

No fim, Cruzeiro se lançou em busca do empate com Marquinhos armando de trás e Judivan e Alisson nas pontas, e quase virou o jogo, mas cedeu espaços importantes que o Atlético não aproveitou

Atrás no placar, Marcelo não viu alternativa senão a de abrir o time de vez, e fez a substituição esperada: recuou Marquinhos para armar de trás na vaga de um dos volantes, que desta vez foi Willians, por precaução, entrando Joel pelo centro e abrindo Judivan à direita. Novamente, uma substituição arriscada, pois sem a bola Marquinhos era o segundo volante e tinha que marcar as saídas de bola atleticana no contra ataque.

O Cruzeiro não teve o volume esperado com a alteração, mas o gol de empate acabou saindo por causa dela. Joel, se movimentando, ganhou uma jogada de Luan pela direita e achou Marquinhos na posição de armador central. Ele tocou pra Damião, que a partir daí fez todo o trabalho sozinho: protegeu no pivô, girou em cima de Jemerson, ganhou no pé de ferro de Douglas Santos e finalizou cruzado por baixo das pernas de Jemerson, longe do alcance de Victor. A bola morreu mansinha nas redes azuis do Mineirão.

O gol deu força para o Cruzeiro que foi com tudo, até com uma certa ansiedade, se desorganizando atrás e dando o contra-ataque. Chegou mais uma vez com Alisson pela esquerda, num cruzamento rasteiro que nem Damião nem Judivan alcançaram, mas também correu riscos. Mena e Léo tiveram que parar contragolpes com faltas e por isso foram advertidos, mas nenhum dos dois times levou mais perigo à meta adversária.

Devagar, devagar

Quem conhece este blogueiro sabe que sempre acredito na justiça do placar. Pelo que foi o jogo, considerando as propostas e estratégias, o empate foi um resultado que espelha bem o equilíbrio que houve na partida. O Atlético se limitou a repelir as ações ofensivas celestes e atacar poucas vezes, e o Cruzeiro teve a bola mas pouca criatividade para furar o bloqueio defensivo adversário. Talvez só o zero a zero fosse um placar melhor.

As marcas azuis indicam as finalizações do Cruzeiro e as vermelhas as do rival; o baixo número de acertos (em cores mais escuras) ilustra bem o que foi a partida

As marcas azuis indicam as finalizações do Cruzeiro e as vermelhas as do rival; o baixo número de acertos (em cores mais escuras) ilustra bem o que foi a partida

Está claro que o Cruzeiro tem um problema de criatividade na fase ofensiva, mas que tem que ser relativizado pelo fato de ter enfrentado duas defesas muito fechadas. Nem sempre os adversários se comportarão desta forma; o Cruzeiro será atacado em alguns momentos. Porém, é um problema de fato, e pode ser resolvido de várias formas.

Vi gente nas redes sociais clamando por mudanças no sistema tático, ao que sou frontalmente contrário. Para enfrentar adversários organizados, só existe um jeito: intensidade de movimentação, seja em qual esquema for. Também vi mais pedidos por mais um meia criativo, o que pode resolver, mas talvez também não seja a solução. Como sempre digo: não adianta ter um bom passador se todos os alvos de passe ficam estáticos e marcados. Os bons passes são responsabilidade tanto de quem os executa quanto de quem os recebe.

Assim, o meia ideal para o Cruzeiro é o Entrosamento da Silva. Esse aí, não tem como contratar. Ele só vem com o tempo. Hoje, Ricardo Drubscky foi demitido do Vitória, porque segundo a diretoria do clube baiano, o time não vinha convencendo em campo. Ricardo só tinha um mês de trabalho. Depois da demissão, Ricardo disse: “Eu não consigo ver um trabalho com alguma substância com menos de três meses.”

Parece muito? Pois já vi treinadores consagrados dizendo que às vezes precisa de um ano inteiro. A hora agora é de paciência.