Cruzeiro 5 x 1 U. de Chile – Variar é preciso

Mais do que uma goleada acachapante, a vitória do Cruzeiro sobre a Universidad do Chile, no reencontro do Cruzeiro com o Mineirão em uma Libertadores, fez com que o respeito que a equipe já possuía no Brasil, conquistado com um título inapelável e com futebol ofensivo e agradável — extrapolasse os limites nacionais e ecoasse por toda a América.

O jogo foi um bom resumo do que este Cruzeiro pode fazer nesta temporada, ainda que tenha quesitos a evoluir. Bola aérea forte e bem treinada, intensidade ofensiva e defensiva e — tão importante quanto as outras — variações táticas.

Alinhamentos

Universidad num 3-4-1-2 com compensações nos alas para garantir a sobra frente a quarteto ofensivo do 4-2-3-1 celeste; Goulart escapou de Martinez

Universidad num 3-4-1-2 com compensações nos alas para garantir a sobra frente a quarteto ofensivo do 4-2-3-1 celeste; Goulart escapou de Martinez

O Cruzeiro veio a campo no seu 4-2-3-1 tradicional. O gol do capitão Fábio era protegido pode Dedé e Bruno Rodrigo, com Ceará e Egídio fechando os lados. Mais à frente, Rodrigo Souza ganhou a posição e protegeu a área, liberando Lucas Silva para circular e se juntar ao trio de meias formado por Éverton Ribeiro partindo da direita, Ricardo Goulart como central e Dagoberto na esquerda. Na frente, Marcelo Moreno foi o escolhido.

O time chileno foi para o jogo com um sistema muito fluido, mas que tinha como base um 3-4-1-2. Protegendo a meta de Johnny Herrera, os zagueiros González, Caruzzo e José Rojas, faziam a linha de três, que por vezes tinha a companhia dos alas Cereceda à direita ou Castro pela esquerda. Mais plantado, o volante Martínez ficava mais centralizado e liberava Rodrigo Rojas para marcar um pouco mais à frente, alinhado a Lorenzetti, o meia de ligação. Na frente, Rubio e Gutiérrez.

Encaixe

A movimentação do volante Rodrigo Rojas pelo meio por vezes configurava a Universidade num 3-1-4-2, que seria um sistema espelhado do 4-2-3-1, pois o posicionamento de referência faz com que cada jogador tenho um oponente claro para marcar. Atacantes marcam zagueiros, alas pegam laterais, meias perseguem volantes, o volante único fica com o meia central e os zagueiros pegam o centroavante e os dois jogadores abertos.

Em teoria, isso deixaria a zaga sem sobra, uma coisa impensável diante de jogadores dribladores como Dagoberto e Éverton Ribeiro. Mas como futebol não é totó e o sistema é só uma referência inicial, os defensores da Universidad deixavam o quarteto de frente do Cruzeiro se movimentar, mas ajustavam a marcação de acordo, por vezes com os três zagueiros tendo a companhia de um dos alas para fazer a linha de quatro e garantir a cobertura dos ponteiros e de Moreno.

Mas se sobrou intensidade defensiva, com a bola o Cruzeiro não aplicou a mesma movimentação de sempre, facilitando o sistema defensivo da Universidad. Moreno ficou encaixotado entre os zagueiros e não participava muito da construção, sobrecarregando Goulart e Ribeiro. Pela esquerda, Dagoberto teve mais chances, principalmente porque ganhava o duelo com o zagueiro Gonzáles, mas não foi o suficiente para abrir o marcador.

Moreno e Goulart

Muitos atribuíram a lesão do zagueiro José Rojas, que acompanhava o lado direito, ao buraco deixado na defesa que Goulart penetrou e concluiu com passe de Dagoberto para abrir o marcador. Mas o fator preponderante é a inteligência tática de Ricardo Goulart. Se o camisa 28 não é um primor técnico, tem uma ótima visão dos espaços no campo e do posicionamento de seus companheiros e adversários. Bastou Moreno se movimentar mais para participar da criação, mais próximo dos meias, que Goulart achou os espaços rumo à grande área.

O mapa de calor de Goulart mostra o jogador caindo pelas pontas e entrando na área: movimentação ofensiva de um meia central moderno (Footstats)

O mapa de calor de Goulart mostra o jogador caindo pelas pontas e entrando na área: movimentação ofensiva de um meia central moderno (Footstats)

Há uma boa explicação da falha defensiva da Universidad no primeiro gol celeste no blog do André Rocha – aqui. O time chileno contraria a escola sul-americana e marca por zona, mas um lugar-comum em tática no futebol é que não existe um sistema de marcação perfeito. E o primeiro gol celeste é um bom exemplo de um potencial problema do sistema zonal — coberturas que falham em efeito dominó, deixando um jogador livre na cara do goleiro.

No segundo gol, a retribuição: Goulart invade a área novamente, livre de Martinez, que só marcava o meia até a entrada da área. Recebendo passe de Ribeiro, que puxava um ala, Goulart entrou às costas do zagueiro Caruzzo, Lichnovsky — que havia entrado na vaga de Rojas — foi na cobertura e puxou Gonzáles para a cobertura em Moreno. Resultado: Dagoberto totalmente livre, recebeu o cruzamento de Goulart e ampliou.

Ainda haveria tempo para mais um gol, desta vez de bola parada. Mas há que se destacar também a inteligência da movimentação de Goulart na cobrança: ele se livra do zagueiro e vai até a segunda trave para concluir, ANTES do desvio de Bruno Rodrigo. O zagueiro, por sinal, subiu mais alto que todos na grande área para resvalar na bola. Bola parada bem treinada também é mérito do técnico.

Segundo tempo

Com três a zero à frente, o Cruzeiro diminuiu um pouco o ritmo na volta do intervalo. O jogo ficou mais morno e equilibrado, sem domínio de posse de nenhum lado. Provavelmente tentando aproveitar isto, o treinador Cristian Romero fez sua segunda troca, mas a primeira por opção: tirou o avante Rubio e mandou o meia Fernandez a campo, que foi jogar centralizado por onde perambulava Lorenzetti, que por sua vez abriu à esquerda para jogar em cima de Ceará. O time chileno ganhou em volume e começou a rondar a grande área de Fábio.

Marcelo Oliveira respondeu mandando Willian a campo na vaga de Moreno. O bigode foi ser ponteiro direito, empurrando Ribeiro para o centro e avançando Goulart para o comando. Eram duas tentativas em uma: dar energia ofensiva com mais movimentação e mais proteção defensiva pelo lado direito, justamente no setor onde Lorenzetti jogava, já que Willian faz isso melhor do que Ribeiro. No primeiro lance, porém, Willian e Ceará erraram a troca de cobertura e Lorenzetti entrou às costas da defesa pela direita para ficar frente a frente com Fábio e diminuir.

Com Lorenzetti na esquerda, a Universidad começou a ganhar o meio-campo; MO respondeu com um triângulo de volantes que retomou o controle do setor

Com Lorenzetti na esquerda, a Universidad começou a ganhar o meio-campo; MO respondeu com um triângulo de volantes que retomou o controle do setor

O gol animou os visitantes, que continuaram tentando ter o domínio da posse no meio campo. Romero tentou dar mais velocidade com Mora na vaga do atacante Gutiérrez, mas a alteração não surtiu o efeito esperado e o jogo continuou com uma leve tensão para o lado celeste. Marcelo Oliveira mais uma vez tentou corrigir isto mandando mais intensidade a campo, com Marlone na vaga de Dagoberto. Pouco depois, uma substituição pouco comum: a saída de Éverton Ribeiro para a entrada de Souza. O Cruzeiro passou a ter um triângulo de volantes no meio, formado por Rodrigo Souza mais atrás e Lucas Silva e Souza quase como meias do novo 4-3-3/4-1-4-1. A mexida pode ter despovoado o ataque mas deu consistência ao meio campo e o jogo voltou a ficar controlado, ainda que sem a mesma intensidade ofensiva de antes.

Gol da tranquilidade

Em nova cobrança de escanteio e novo desvio de um zagueiro — desta vez Dedé — mais um gol de Ricardo Goulart na segunda trave. É praticamente um replay do terceiro gol, mais uma prova do senso de posicionamento que Goulart possui e que é pouco visto pela crítica e torcedores.

Com a vitória praticamente garantida, o Cruzeiro voltou ao modo cadenciado e esperava o jogo terminar. A Universidad tentava achar mais um gol, mas sem querer buscar a virada. Mas num descuido deixou a zaga no mano a mano e isso foi aproveitado pelo trio ofensivo celeste: balão da defesa, a bola cai em Goulart que mata e dá o passe para Egídio com o mesmo movimento. O lateral avança e passa a Willian na entrada da área, que limpa e bate sem chances para Herrera. Goleada e liderança garantidas.

Aquele Cruzeiro voltou — e melhor

A partida de terça foi a primeira mostra de que aquele futebol praticado no ano passado, e que valeu o título nacional, pode não só ser recuperado como melhorado. Pois mais importante foi ver que Marcelo Oliveira tem alternativas para retomar o controle do jogo não somente trocando peças e/ou características, mas também trocando o sistema. Se no Brasileirão ’13 o Cruzeiro foi uma equipe de um sistema só — e isso bastou, pois o campeonato de pontos corridos permite isso — esse ano mostra que as variações estão sendo treinadas, pois são muito importante numa competição com esse caráter como é a Libertadores, principalmente em sua fase eliminatória.

Sim, pois se é público e notório que o clube e a torcida tem uma identificação com o futebol ofensivo e de toque de bola, não se pode jogar assim em todos os momentos. Fatalmente chegará o momento em que o Cruzeiro precisará proteger um resultado para avançar, e para isso é preciso aprender a fazer isso. E ter variações de sistema é um importante passo para alcançar tal meta.

E também serve pra dar um pouco de graça para este blog, que só fala de 4-2-3-1 há mais de um ano…

Inter, EUA e Portuguesa: pacotão de férias

Como você, leitor, provavelmente sabe, este blog é escrito por um pseudo-analista torcedor — mais para o segundo do que para o primeiro. E por isso, durante a Copa das Confederações, este blogueiro voltou à sua terra natal, para acompanhar in loco os jogos da competição de Seleções, na casa do Cruzeiro Esporte Clube, assim muito bem definida por um dos voluntários que organizavam o embarque dos ônibus especiais.

Assim, por estar longe do computador onde são escritas estas análises e são feitos os diagramas de posicionamento, não pude analisar a partida contra o Internacional e nem soltar notinhas sobre os jogos amistosos na terra do Tio Sam. Mas pude assistir aos jogos, é claro, e pude notar uma pequena mudança na característica do Cruzeiro ao longo deste período, motivada pela contratação de Souza, volante de chegada que este blog tanto pediu.

Na Arena do Jacaré

No jogo contra o Inter, um erro de cobertura — Bruno Rodrigo saiu à caça do atacante que saiu da área e deixou seu setor livre — deixou o Cruzeiro em desvantagem e meio perdido. O time demorou a se recuperar, sendo atacado pelos lados, uma vulnerabilidade quando se tem dois laterais muito ofensivos no 4-2-3-1, como Mayke e Egídio. Mas em boa tabela de Everton Ribeiro e Anselmo Ramon, o Cruzeiro empatou com Élber, se infiltrando no meio dos zagueiros e se contundindo no lance, tendo que ser substituído. O garoto já havia entrado na vaga de Dagoberto, e assim duas substituições foram queimadas.

A entrada de Luan em seu lugar, porém, melhorou muito o time no segundo tempo, chegando com muito mais perigo e finalizando mais, até virar em pênalti infantil cometido por Rafael Moura, jogando vôlei na área. Mas nova falha de posicionamento — desta vez na entrada da área em sobra de escanteio — Gabriel acertou um bom chute e empatou. Foi um bom jogo taticamente, mas com estes pequenos erros que, contra um time grande como o Internacional, são fatais.

Na Disney

Já nos EUA, com a contratação de Souza oficializada, Marcelo Oliveira experimentou o jogador na vaga de Leandro Guerreiro. O 4-2-3-1 foi mantido, mas com Nilton mais plantado, e com isso o Cruzeiro ganhou uma presença ofensiva a mais no meio-campo. O volante participou bastante da construção das jogadas em ambos os jogos. Sua característica de avançar, tentar um passe mais ousado, dar a opção mais à frente para a inversão de lado da jogada era uma das coisas que o Cruzeiro precisava.

Em outro aspecto, a lesão de Ceará logo no início do jogo contra o Strikers fez com que o garoto Mayke fosse promovido à titularidade. Ele tem qualidade, mas Ceará é mais experiente e compõe melhor a defesa — que é, relembrando, a atribuição principal de um lateral: defender. Com Souza e Mayke (e Egídio do outro lado), o Cruzeiro passou a contar com muitos jogadores que se lançam à frente, causando um certo desequilíbrio entre defesa e ataque. Mayke e Egídio terão que aprender a recompor com muita rapidez para não deixarem os zagueiros expostos em um contra-ataque rápido, como aconteceu no jogo seguinte:

No Canindé

Portuguesa e Cruzeiro fizeram um jogo ruim. O técnico Edson Pimenta mandou um 4-2-3-1 maleável a campo, com liberdade para Souza, o meia central (aquele mesmo que jogou ano passado por aqui). A linha defensiva de Lauro tinha Luís Ricardo pela direita, Ivan pela esquerda e Lima e Valdomiro na zaga central. Corrêa e Ferdinando protegiam a área e davam suporte a Souza, flanqueado por Matheus pela esquerda e Cañete pela direita, procurando o atacante Diogo à frente.

No primeiro tempo, Egídio apoiou bem, mas teve dificuldade na marcação e deixa espaços às suas costas

No primeiro tempo, Egídio apoiou bem, mas teve dificuldade na marcação e deixa espaços às suas costas

Marcelo Oliveira mandou a campo o esperado 4-2-3-1 que o leitor deste espaço está acostumado, porém com Mayke na vaga de Ceará, Luan na de Dagoberto e Vinicius Araújo na de Borges, assim: Fábio; Mayke, Dedé, Bruno Rodrigo e Egídio; Nilton e Souza; Everton Ribeiro, Diego Souza e Luan; Vinicius Araújo.

Mas, diferente do que era esperado, o Cruzeiro não pressionou a Portuguesa no campo adversário. Deixou o time da casa com a bola, “confiando” na falta de criatividade dos paulistas. E talvez tivesse dado certo se o gol da Portuguesa não saísse logo aos 6 minutos, em bola parada ocasionada por um erro de saída de bola de Egídio, numa tentativa de engatar um contra-ataque rápido, adiantando demais a bola e cometendo a falta. Como é de praxe, o gol muda o jogo, e com a vantagem a Portuguesa se retraiu para tentar fazer mais gols em contra-ataque.

E o melhor setor para a Portuguesa era o de Egídio. tem muito vigor pra atacar, mas por vezes peca pelo excesso, errando um passe ou avançando em demasia, deixando espaços às suas costas. Nilton, que teoricamente poderia fazer esta cobertura, não o fez com frequência e várias vezes víamos Bruno Rodrigo encarando no um contra um um atacante do time da casa. Souza percebeu bem este espaço, e saía do centro para se posicionar ali, esperando as bolas longas para poder armar.

O gol de empate também veio em bola parada, em cobrança de escanteio de Souza na cabeça de Bruno Rodrigo. No replay, é possível ver Nilton puxando dois marcadores consigo, em direção à bola, apenas para abrir espaço para Bruno Rodrigo chegar de trás e golpear forte. Depois disso, o Cruzeiro voltou a comandar as ações e chegava com mais propriedade, mas pecava principalmente nas finalizações, com Luan, Egídio e Vinicius Araújo.

Após as mudanças, Everton Ribeiro comandou o ataque e encaixou bons passes, mas as conclusões foram ruins; cobertura de Egídio ainda estava falha

Após as mudanças, Everton Ribeiro comandou o ataque e encaixou bons passes, mas as conclusões foram ruins; cobertura de Egídio ainda estava falha

A primeira mudança veio após uma hora de futebol, promovida por Marcelo Oliveira. Diego Souza deu lugar a Lucca, que ao invés de ir jogar pelo lado, foi ser o meia central na recomposição, alternando com Everton Ribeiro na posse de bola. Com a alteração, Everton Ribeiro teve uma liberdade maior para circular na armação e seu futebol cresceu, conseguindo encaixar alguns bons passes para Anselmo Ramon, que havia substituído Vinicius Araújo aos 22. Anselmo teve duas oportunidades para virar, mas na primeira cabeceou em cima de Lauro, e na segunda, já com Tinga no lugar de Souza, fazendo um 4-1-4-1, Anselmo completou no travessão com o gol vazio, após bela jogada de Mayke pela direita e conclusão de Tinga.

O jogo terminou com o Cruzeiro finalizando 20 vezes, contra 6 da Portuguesa. Ficou a sensação de que, tivesse o Cruzeiro apertado um pouquinho mais a marcação no início do jogo, ou dado um pouco mais de gás, poderia ter virado a partida até com tranquilidade. A Portuguesa fez o seu jogo, marcou no erro celeste e se defendeu tentando partir nos contra-ataques, ciente de suas limitações e de sua inferioridade técnica, mesmo em casa.

Mas o maior problema é como Marcelo Oliveira vai fazer para segurar o ímpeto ofensivo de seus laterais. Ou sacrifica um dos volantes, segurando-o na defesa bem fundo — a la Luis Gustavo na Copa das Confederações para dar liberdade a Dani Alves e Marcelo, laterais muito ofensivos — ou então segura um dos laterais mais na defesa. Mayke me parece sair melhor na marcação, mas o estilo de Ceará era uma boa contra-balança ao estilo de Egídio. Uma das soluções seria tirar Nilton e lançar Leandro Guerreiro, mas aí a torcida esgana o treinador.

Por fim, é preciso ter em mente que o Cruzeiro jogou com uma formação muito modificada — 4 jogadores diferentes daquele time base do primeiro semestre. Isso faz o trabalho de entrosamento recuar alguns passos. Se o time ainda não estava 100%, com os novos jogadores ainda deve demorar mais um pouco.

O bom é que o jogo contra o Atlético Goianiense pela Copa do Brasil já é na terça, e no Mineirão. De acordo com as últimas notícias, o time deve ser mantido.

Ótimo, pois quanto mais jogos e mais tempo juntos, tanto melhor.

Cruzeiro 2013: Ofensividade e protagonismo como objetivos

Alô cruzeirense! Que em 2013 a sua cruzeiridade continue te dando alegrias!

Depois das férias de verão e da grandiosa movimentação do mercado, o blog de análise tática preferido da imensa torcida cruzeirense está de volta. Sim, esperei um momento em que as negociações já estivessem mais calmas e, portanto, com o elenco do Cruzeiro mais definido para a temporada que se inicia. E já que o assunto deste blog é tática, vamos a ela.

Comecemos pelo treinador. Marcelo Oliveira teve dois bons anos no Coritiba e uma passagem terrível no Vasco. No time paranaense, Marcelo jogou quase sempre no 4-2-3-1, que parece ser seu esquema preferido. No primeiro jogo do Brasileirão do ano passado contra o Cruzeiro, foi essa a formação escolhida. Depois, quando já estava no Vasco, o treinador mineiro preferiu o 4-3-1-2 losango — era seu primeiro trabalho no time carioca e ainda não havia tido tempo para alguma coisa diferente.

O elenco do Cruzeiro de 2013 parece numeroso demais, mas não é. Também proporciona boas variações táticas

O elenco do Cruzeiro de 2013 parece numeroso demais, mas não é. Também proporciona boas variações táticas

Com as contratações, que com toda a certeza têm o dedo de Marcelo, o Cruzeiro agora possui um elenco que proporciona variações táticas. Além disso, a saída de Montillo para o Santos, por incrível que pareça, dá alternativas interessantes taticamente, ainda que pelo lado técnico seja uma perda considerável. O leitor deste blog certamente se lembra da insistência do blogueiro em pedir o argentino como ponteiro durante a temporada passada. Mas, ao que parece, Montillo não gostava de marcar, e por isso era escalado com três volantes dando suporte. Infelizmente, o futebol moderno exige que todos marquem e que todos joguem. Estou curioso pra ver como o Muricy vai resolver este problema no Santos.

Mas o assunto aqui é Cruzeiro. E nos primeiros jogos-treino e do amistoso contra o Mamoré, Marcelo parece ter escolhido o esquema vencedor de sua passagem pelo time paranaense para iniciar o trabalho. O 4-2-3-1 do amistoso contra o Mamoré teve Fábio no gol, linha defensiva com Ceará e Egídio nas laterais e Paulão e Bruno Rodrigo no miolo de zaga. Leandro Guerreiro, que terminou o ano passado jogando na zaga, voltou à volância ao lado de Nilton. Everton Ribeiro pela direita, Diego Souza centralizado e Everton pela esquerda articulavam atrás do garoto Vinicius Araújo no comando do ataque.

Um resgate da identidade?

Ainda que o Mamoré seja um adversário mais fraco, e que se postou defensivamente num 3-5-1-1 quase que na totalidade da partida, o Cruzeiro de 2013 mostrou, pelo menos neste jogo, que quer recuperar a sua característica: futebol ofensivo com posse de bola, ser o protagonista do espetáculo. Com exceção de Fábio e dos zagueiros, todos os outros jogadores participavam da transição ofensiva. Típico de um time que quer construir a jogada, quer ser propositivo, em contraste com o jogo reativo e de contra-ataques do ano passado.

A primeira cara do Cruzeiro de 2013: um 4-2-3-1 propositivo e com bastante movimentação, principalmente de Diego Souza e Everton Ribeiro

A primeira cara do Cruzeiro de 2013: um 4-2-3-1 propositivo e com bastante movimentação, principalmente de Diego Souza e Everton Ribeiro

Ceará apoiou mais do que este blogueiro esperava, visto que nas últimas partidas do ano passado ele atuava quase como um terceiro zagueiro. Do outro lado, Egídio mostrou ser um lateral com bastante ímpeto ofensivo. Leandro Guerreiro e Nilton foram claramente instruídos a fazer o primeiro passe e carregar a bola (o segundo mais que o primeiro, por característica). O trio de meias se movimentava bastante, principalmente Everton Ribeiro e Diego Souza, que pareciam se conhecer há algum tempo e trocavam de posição com frequência. Everton ficou mais pelo lado esquerdo fazendo boas tramas com Egídio. E na frente, Vinicius Araújo demonstrou ter fome de gol. Finalizava em qualquer oportunidade boa, e ainda aparecia pra fazer jogadas e tabelas. Certamente será a revelação da base do Cruzeiro para este ano.

Sem a bola

Quando perdia a bola, o Cruzeiro tentou fazer o famoso pressing (marcação adiantada com o time compactado, fechando as linhas de passe). Claramente instruídos neste sentido, os jogadores de frente do Cruzeiro fechavam em cima dos defensores do Mamoré para roubar a bola, forçar um passe errado ou, no mínimo, um passe longo para a frente ou para o outro lado. Se fosse na direção do ataque, a zaga do Cruzeiro logo pegava a sobra, a famosa segunda bola depois da disputa de cabeça pelo alto (a primeira bola). Se fosse virada de jogo, então o time rodava e fechava do outro lado, repetindo o movimento.

Este movimento, porém, requer muita coordenação. Novamente, o famoso entrosamento. Muitas vezes o Cruzeiro adiantava as linhas mas não ficava compactado o suficiente para impedir que o adversário achasse um passe curto, porque o companheiro do jogador que estava pressionando a bola não fechou corretamente a linha de passe. Somente com muitos treinos o Cruzeiro poderá executar isto com qualidade, e isso só virá com o tempo. Mas o fato de se tentar já é um excelente indício do que o treinador quer.

Dagoberto

Reforço mais badalado do Cruzeiro, Dagoberto foi a primeira alteração do segundo tempo. Entrou no lugar de Egídio. Com isso, Everton passou à lateral esquerda, Diego Souza foi ser ponteiro e Dagoberto entrou mais por dentro. Poucos minutos depois, Diego Souza saiu do jogo, e portanto foram poucos minutos para ver em campo o que será o provável trio de meias titular da temporada. Entretanto, acredito que o posicionamento será diferente. Dagoberto deverá ser o ponteiro esquerdo e Diego deverá ficar mais por dentro.

Depois disso foi uma sucessão de alterações que dificultam qualquer análise. O máximo que consegui enxergar foi que, em um determinado momento, o 4-2-3-1 se transformou num 4-4-2 inglês, com Dagoberto um pouco mais atrás de Ricardo Goulart e à frente de uma linha de quatro homens no meio. Outra variação tática interessante: duas linhas de quatro sem centro-avante fixo. Novamente, um indício de time com muita movimentação.

Para o clássico

Uma possível escalação e sistema de jogo para a reinauguração do Mineirão: Ricardo Goulart centralizado, Ceará cuidando de Bernard e Guerreiro de Ronaldinho

Uma possível escalação e sistema de jogo para a reinauguração do Mineirão: Ricardo Goulart centralizado, Ceará cuidando de Bernard e Guerreiro de Ronaldinho

Diego Souza provavelmente será o titular durante o ano, mas com os problemas de documentação, está fora do clássico. Ricardo Goulart entra e deve jogar na mesma posição, a articulação central. Os outros dez jogadores deverão ser os mesmos que começaram a partida em Patos de Minas — a única dúvida é Anselmo Ramon ou Vinicius Araújo. Aposto no segundo.

A entrada de Goulart faz o time ficar mais leve no ataque. Então podemos esperar um Cruzeiro retendo a bola e tentando achar espaços na defesa adversária, enquanto o time rival deverá explorar a velocidade de seus ponteiros Bernard e Araújo, municiados por Ronaldinho. Este, aliás, deverá ser bem marcado por Leandro Guerreiro, liberando Nilton mais para o apoio. Ceará também deve ficar mais na cola de Bernard.

O aspecto tático mais interessante, porém, será do lado esquerdo do ataque azul. Egídio e Everton contra Marcos Rocha e Araújo. Quatro jogadores muito ofensivos, e portanto, a aplicação tática será fator determinante no setor.

É isso, estamos de volta. O ano de 2013 começa no domingo, na tão esperada e aguardada reinauguração do Mineirão. Normalmente não compareço aos clássicos devido aos problemas de violência das torcidas. Mas este é diferente. Vamos conhecer o Novo Mineirão, a única e verdadeira casa do Cruzeiro Esporte Clube.