Cruzeiro 1 x 0 Santos – Retomadas

Voltar a vencer após uma sequência ruim de resultados foi importante. Não sofrer gols em casa na Copa do Brasil, ainda mais. Mas o primordial foi retomar o velho estilo, ainda que por pouco tempo, para mandar um recado a todos os outros times do país, para a própria torcida a para si mesmo: o Cruzeiro ainda sabe ser Cruzeiro, e deve ser temido.

O desgaste físico é inegável, mas enquanto teve pernas, o Cruzeiro foi infinitamente superior ao Santos, tanto com a bola quanto sem ela, e construiu o resultado nesse período. Depois, quando foi obrigado a “descansar”, controlou o jogo, perdeu o controle e o retomou novamente, e ainda foi prejudicado pela arbitragem — elementos que certamente veremos nas últimas partidas do ano.

Escretes

As duas equipes entraram no 4-2-3-1; Cruzeiro muito mais intenso, com movimentação do quarteto ofensivo e Mayke sem ser perseguido por Robinho

As duas equipes entraram no 4-2-3-1; Cruzeiro muito mais intenso, com movimentação do quarteto ofensivo e Mayke sem ser perseguido por Robinho

Marcelo Oliveira mandou o costumeiro 4-2-3-1 a campo, mesmo sem ter Marcelo Moreno 100% fisicamente. Júlio Baptista foi o escolhido para ficar à frente do trio de meias, formado por Éverton Ribeiro à direita, Ricardo Goulart centralizado e Willian à esquerda. No suporte, a dupla dinâmica Henrique e Lucas Silva, e protegendo o goleiro Fábio, a última linha tinha Mayke à direita, Egídio à esquerda, e Dedé e Léo no miolo.

O Santos de Enderson Moreira também entrou num 4-2-3-1. O goleiro Aranha teve Cicinho na lateral direita, Edu Dracena e David Braz pelo meio e Mena aberto à esquerda. Mais à frente, Alisson ficava mais plantado liberando Arouca, que se juntava ao trio formado por Rildo à direita, Lucas Lima como central e Robinho pelo lado esquerdo, com Gabriel sendo o homem mais avançado.

Cruzeiro sendo Cruzeiro

O temor era que Júlio Baptista, sem ritmo, quebrasse um pouco a intensidade que o Cruzeiro sempre aplica no início das partidas, mas isso não aconteceu (muito). A movimentação e troca de posições que Willian, Ribeiro e Goulart impunham desorganizava a marcação santista, com o maior exemplo sendo o lance do gol. Naquele momento, Willian estava à direita, Ribeiro estava do outro lado e Júlio era o meia central, com Goulart sendo o centroavante. Tudo invertido.

A bola saiu da esquerda para Júlio, e de Júlio foi a Willian, totalmente livre do lado direito. O bigode chutou, a bola voltou e em um lance técnico maravilhoso, bateu com o lado do pé esquerdo, que não é o bom, aplicando uma curva de fora pra dentro que saiu totalmente do alcance de Aranha e fazendo a bola bater na bochecha da rede. Golaço.

Ponteiros x laterais

Além da movimentação ofensiva, havia outro fato que causava o grande domínio de posse de bola e territorial do Cruzeiro: a passagem dos laterais. Se pelo lado esquerdo Rildo tentava voltar com Egídio até a própria linha de fundo — e mesmo assim perdendo o duelo, do outro lado Robinho não fazia o mesmo com Mayke. Mena teve problemas em lidar com o jovem lateral e o ponteiro que caía por ali.

No meio do primeiro tempo, Enderson inverteu os lados para fazer Robinho ficar em Egídio e Rildo acompanhar Mayke, uma medida que teve um certo sucesso — mas num período do jogo em que o Cruzeiro já não estava mais tão intenso, como explicado nos parágrafos abaixo.

Pressão alta

Além disso, o Cruzeiro não era intenso só na movimentação ofensiva. Quando o ataque não se completava, o Cruzeiro sufocava a saída do Santos, sem deixar os jogadores respirarem. Lucas Silva e Henrique marcavam na intermediária de ataque; o ponteiro do lado da bola e o meia central faziam pressão no homem da bola e o ponteiro oposto fechava para o centro para recuperar um possível rebote, e o centroavante fechava as linhas de passe para os zagueiros e goleiros. Uma coordenação de time bem treinado, e que gerou muitas roubadas de bola já no campo de ataque.

Esse é o estilo deste Cruzeiro. Porém, toda essa intensidade vem sendo usada há dois anos. Nenhum time consegue aplicar essa velocidade defensiva e ofensiva durante os 90 minutos, que dirá durante duas temporadas inteiras. E agora, no fim da temporada, os jogadores estão cansando e naturalmente tendo que dosar. Após o gol, o time começou a preferir esperar o Santos já a partir da linha de meio-campo.

Mas não tive certeza quanto ao motivo: seria cansaço ou estratégia, uma vez que o placar era favorável? Ou ainda, seria o Santos que conseguiu concatenar mais passes? As duas primeiras opções me parecem mais prováveis, e foi assim que acabou o primeiro tempo: com o Cruzeiro “descansando” com a bola e às vezes sem ela, mas controlando o jogo. Fábio sequer sujou o uniforme.

Após o intervalo

Diferente do que alguns analistas da mídia disseram, o segundo tempo começou igual ao primeiro. Nada havia mudado: a vantagem no placar permitia ao Cruzeiro se posicionar mais pragmaticamente, fechando os espaços em seu próprio campo. Isso obrigava os zagueiros do Santos a trocarem passes entre si, sem encaixar uma bola mais aguda. E mesmo quando isso acontecia, o recebedor do passe imediatamente recebia pressão e era obrigado a voltar a bola para a última linha.

Numa dessas ocasiões, Willian subiu o bote em David Braz e roubou a bola, partindo num contra-ataque de três contra dois. Edu Dracena correu de costas até a grande área, e quando parou para dar o bote, Willian passou a Júlio na esquerda. O meia bateu para rebote de Aranha que Goulart completou para as redes. Mas o gol, bem construído, foi mal anulado pelo bandeira, que deu impedimento de Júlio no primeiro lance.

Perigo de gol

O segundo gol sem dúvida teria um impacto psicológico e na estratégia de ambos os times. O Cruzeiro passaria a proteger o resultado com mais calma, e o Santos tentaria se expor um pouco mais para tentar marcar ao menos um gol fora de casa, devido à abominável regra do gol qualificado. O gol anulado manteve as coisas como estavam, o que acabou sendo pior para o Cruzeiro no decorrer do segundo tempo.

Já sem muito vigor físico, o Cruzeiro começou a ceder espaços importantes no meio-campo ofensivo. Arouca começou a se sentir à vontade para se juntar à construção, e não era marcado por nenhum dos meias celeste. Além disso, Lucas Lima começou a voltar para pegar a bola nos pés dos zagueiros — um movimento que Éverton Ribeiro e Ricardo Goulart repetem constantemente no Cruzeiro — e também não era perseguido. Com liberdade, o meia começou a encaixar passes nas costas dos laterais para os ponteiros, que geraram lances muito perigosos. Só não aconteceu o gol porque os jogadores santistas finalizaram muito mal.

Trocas

Com o Cruzeiro já cansado e mais espaçado em campo, Lucas Lima e Arouca tentaram aproveitar os buracos da marcação, mas a entrada de Damião travou o time, e a partir daí o Cruzeiro controlou melhor a posse com Goulart mais fixo na faixa central tendo Moreno à sua frente

Com o Cruzeiro já cansado e mais espaçado em campo, Lucas Lima e Arouca tentaram aproveitar os buracos da marcação, mas a entrada de Damião travou o time, e a partir daí o Cruzeiro controlou melhor a posse com Goulart mais fixo na faixa central tendo Moreno à sua frente

Marcelo foi obrigado a lançar Dagoberto na vaga de Willian, que havia sofrido uma fratura na costela ainda no primeiro tempo e continuou jogando por mais um tempo. Dagoberto entrou inicialmente pelo lado direito, invertido com Éverton Ribeiro, mas logo isso se desfez. Já Enderson Moreira trocou o opaco Gabriel por Serginho. Com isso, Robinho passou ao centro do ataque e Serginho passou ao lado esquerdo.

O jogo não mudou muito, com o Santos ainda com mais posse de bola. Visando uma melhor recomposição e também numa tentativa de colocar sangue novo na sua equipe, Marcelo Oliveira colocou Marlone na vaga de Éverton Ribeiro. Dessa vez, Marlone jogou na sua posição “original”, que é o lado do campo. Se ofensivamente não contribuiu para equilibrar a posse de bola, taticamente foi importante para fechar os espaços a Mena pelo lado esquerdo.

Centroavantes

Por fim, Júlio Baptista, ainda sem ritmo, não aguentou os 90 minutos e Marcelo Moreno entrou em seu lugar. Mais fixo à frente, Moreno fazia com que Ricardo Goulart ficasse mais fixo como meia central, passando a organizar melhor o ataque celeste. Enderson respondeu com Jorge Eduardo na vaga do Rildo e também com Leandro Damião na vaga de Robinho, mas as trocas não deram certo, pois Damião travou o time e facilitou a marcação da defesa celeste.

As duas coisas somadas — Goulart fixo como meia central e Damião fixo como centroavante — acabaram por reequilibrar a posse de bola e a disputa no meio-campo. Com ambas as equipes cansadas e taticamente iguais, a melhor técnica dos jogadores celestes começou a aparecer e o Cruzeiro ainda criaria boas chances de aumentar, principalmente em cruzamentos de Mayke pela direita, mas o placar permaneceu inalterado.

Chover no molhado

O jogo foi importante para reafirmar, não só para todo o Brasil como também para si mesmo, que o Cruzeiro ainda é o melhor time do país. E foi isso o que Marcelo Oliveira e seus comandados buscaram na primeira meia hora de jogo: amassando o Santos, o Cruzeiro foi muito superior e teve azar nas finalizações. Mas o fim de temporada cobrou seu preço, e já no primeiro tempo o Cruzeiro teve que dosar o ritmo.

E é isso que devemos esperar para todos os jogos até o fim do ano. Dificilmente o Cruzeiro jogará com a intensidade que lhe é característica durante mais de 30 minutos por jogo, e em alguns casos não vai fazer isso em nenhum momento das partidas. Em 2014, o Cruzeiro já fez 3 partidas a mais que em 2013, e não há como negar que isso tem um impacto.

Sim, todos os outros times também estão desgastados, mas o estilo de jogo que o Cruzeiro prefere usar faz com que os jogadores se desgastem mais. Então é seguro concluir que isso afeta mais ao Cruzeiro que a outros times. No entanto, agora é a hora de se superar. Apesar do desgaste, falta pouco agora. Longas viagens sempre cansam, mas quando se está perto do destino, sabendo que falta tão pouco, um ânimo surge do nada para que demos um último gás e completemos a jornada.

Dez jogos, talvez menos, para dois títulos. Seguiremos confiantes como nunca.

Cruzeiro 2 x 1 Internacional – Correr, construir, controlar

Cruzeiro e Internacional protagonizaram grandes duelos no passado, principalmente na década de 70, quando o Cruzeiro se vingou da derrota na final do Brasileiro com uma vitória na Libertadores do ano seguinte, que culminaria no título. E o jogo deste sábado não ficou pra trás, disputado e tecnicamente agradável.

Mas além destes fatores, houve também um duelo tático interessantíssimo entre os dois treinadores. Abel Braga fez o primeiro movimento e complicou muito o jogo, mas Marcelo Oliveira respondeu à altura e garantiu o resultado.

Escalações iniciais

Domínio total do Cruzeiro no 1º tempo de muita intensidade, contra um 4-1-4-1 frágil pelos lados e com volantes celestes livres e com tempo na bola

Domínio total do Cruzeiro no 1º tempo de muita intensidade, contra um 4-1-4-1 frágil pelos lados e com volantes celestes livres e com tempo na bola

Com Ricardo Goulart e Júlio Baptista lesionados, era natural que Marcelo optasse por Éverton Ribeiro como meia central do 4-2-3-1 costumeiro. Com isso, o gol de Fábio foi protegido por Dedé e Manoel, com Mayke e Egídio fechando os lados da defesa. Protegendo a área, Henrique e Lucas Silva formavam o meio-campo com Marquinhos à direita, Ribeiro central e Willian pelo lado esquerdo, atrás do centroavante Moreno.

Já Abel Braga não tinha Eduardo Sasha, e criou-se uma expectativa pelo substituto do ponteiro esquerdo. O treinador do Internacional optou por Valdívia mais surpreendeu, tirando Alex do time e armando um 4-1-4-1, com Dida no gol, Gilberto na lateral direita, Paulão e Juan na zaga central e Fabrício fechando o lado esquerdo da defesa. Willians ficou entre a defesa e segunda linha formada, da direita para a esquerda, por D’Alessandro aberto, Aranguiz e Wellington mais centralizados e Valdívia na outra ponta. Na frente, Rafael Moura duelava com os zagueiros celestes.

Volantes livres

Diferentemente do que anunciara durante a semana, Abel postou seu time marcando a partir da linha do meio-campo, tentando tirar a velocidade que o Cruzeiro queria impor. A ideia era parar o ataque do Cruzeiro e acionar Valdívia e D’Alessandro pelos lados para os contra-ataques. Ou seja, a mesma coisa que quase todos os times que vieram ao Mineirão tentaram. Eis o respeito que quase dois anos de bom futebol impõem.

Mas, ao contrário de vários outros times, o Internacional não se preocupou com a marcação de Lucas Silva e Henrique. Os próprios volantes do Internacional ficavam muito próximos à própria área, distantes dos volantes celestes. Assim, ambos tiveram bastante tempo na bola e liberdade para levantar a cabeça e iniciar a construção, alavancando as estatísticas de posse de bola celeste.

Dois contra um

Com isso, D’Alessandro e Valdívia acabavam por tentar ajudar, indefinindo a marcação: ou fechavam nos volantes ou perseguiam os laterais subirem livres. Não dúvida, não fizeram nenhuma das duas coisas bem, e o resultado foi que tanto Egídio quanto Mayke subiam e faziam dois contra um junto com Willian e Marquinhos em cima de Gilberto e Fabrício.

Em um determinado lance, foi possível ver D’Alessandro perto de Egídio, preparado para acompanhar o lateral celeste caso ele subisse, mas a bola chegou nos pés de Lucas Silva, livre. O argentino então decidiu centralizar para marcá-lo, e bastaram dois passes para que a bola chegasse nos pés de Egídio, sem marcação e já numa posição avançada do campo, fora do alcance de D’Alessandro.

Marquinhos do lado “errado”

E outro fator que contribuiu para o desmoronamento da estratégia gaúcha foi o posicionamento de Marquinhos. Normalmente, o ponteiro joga pela esquerda, mas nesse jogo Marcelo optou por invertê-lo de lado com Willian para que ele pudesse marcar Fabrício, o mais ofensivo dos dois laterais adversários. Marquinhos cumpriu bem a função e ainda jogou bem com a bola, como visto no segundo gol.

Tudo isso contribuía para que o jogo fosse totalmente dominado pelo Cruzeiro no primeiro tempo: intensidade ofensiva e defensiva, volantes com liberdade, laterais sem marcação quando apoiavam.

A marcação no alto do campo, pressionando o homem da bola, gerou o primeiro gol, em que Moreno bloqueia o passe de Aranguiz, a bola sobra para Willian, que limpa o marcador com um drible, mas o próprio Moreno “rouba” a conclusão de Willian para vencer Dida. E em jogada pelo lado esquerdo, onde o Cruzeiro tinha superioridade numérica, cruzamento de Éverton Ribeiro para Marquinhos, livre do lado contrário, marcar o segundo.

Com Alex, Internacional mudou para um 4-2-3-1 e  tinha superioridade numérica com o movimento do meia da direita para o centro, causando problemas para Lucas Silva e Henrique

Com Alex, Internacional mudou para um 4-2-3-1 e tinha superioridade numérica com o movimento do meia da direita para o centro, causando problemas para Lucas Silva e Henrique

Inferioridade numérica no centro

O Cruzeiro voltou para o segundo tempo mais cadenciador, tentando descansar com a bola. Já o Internacional fez o contrário: começou a correr e querer roubar a bola de qualquer forma. Mas foi a alteração de Abel no intervalo que mudou o panorama da partida. Wellington deu seu lugar a Alex, que entrou pela esquerda do ataque; Valdívia foi pro outro lado, D’Alessandro centralizou e Aranguiz recuou para perto de Willians, formando o novo 4-2-3-1.

Com a bola, Alex centralizava e se aproximava de D’Alessandro, causando problemas na marcação para Lucas Silva e Henrique. Tanto na jogada que gerou a falta que bateu na trave quanto no gol, Alex e D’Alessandro se encontravam em posições centrais, e no lance do gol especificamente, os dois meias tabelaram e deram a volta na marcação dos volantes celestes.

A resposta de Marcelo

Marcelo Oliveira não estava gostando do que estava vendo e demorou a achar uma solução, mas achou. De uma só vez, tirou Éverton Ribeiro e Willian, lançando Nilton e Dagoberto, formando um 4-1-4-1 que remediava a inferioridade numérica no meio, mas perdia em capacidade de criação.

Marcelo Oliveira respondeu com Nilton e Dagoberto, configurando um 4-1-4-1 que encaixou a marcação e corrigiu o problema de inferioridade numérica no centro

Marcelo Oliveira respondeu com Nilton e Dagoberto, configurando um 4-1-4-1 que encaixou a marcação e corrigiu o problema de inferioridade numérica no centro

O jogo reequilibrou e o Internacional não conseguia mais chegar com facilidade. Até ficava mais com a bola, mas com a marcação encaixada, os volantes e zagueiros adversários, agora com tempo pra pensar, não tinham opções de passe. O Internacional parou de ameaçar a meta de Fábio, e o Cruzeiro controlava o jogo sem ter a bola em seus pés.

Outras trocas

Sem alternativas, Abel tentou mais velocidade com Leandro na vaga de Valdívia, sem sucesso, e depois abrindo o time de vez com Alan Patrick na vaga de Willians. Aranguiz passou a ser o volante único, mas o tiro saiu pela culatra e quem passou a dominar o meio-campo foi o Cruzeiro, já que o Internacional também arrefeceu o ritmo. A partir de então teve mais chances reais de ampliar do que sofrer o empate.

Borges ainda entrou na vaga de Moreno, mas apenas para fazer o tempo passar e garantir a vitória e aumentar a diferença para o vice-líder para impressionantes nove pontos.

A linha do tempo mostra as quatro fases distintas do jogo: 1- Cruzeiro arrasador até o 1ª gol; 2- Cruzeiro menos intenso mas ainda dominando até o fim do primeiro tempo; 3- Internacional tentando contra Fábio até a entrada de Nilton; 4- controle do jogo sem a bola até o final.

A linha do tempo mostra as quatro fases distintas do jogo: 1- Cruzeiro arrasador até o 1º gol; 2- Cruzeiro menos intenso mas ainda dominando até o fim do primeiro tempo; 3- Internacional tentando contra Fábio até a entrada de Nilton; 4- controle do jogo sem a bola até o final.

Maturidade para dosar o esforço

No último texto, questionei se a falta de intensidade do Cruzeiro nas últimas partidas havia sido uma coisa pensada ou se era um resultado natural do cansaço pelas partidas em sequência. A resposta veio nesse jogo, e foi um pouco das duas coisas: a temporada desgastante fez com que Marcelo usasse conscientemente uma estratégia mais cautelosa para diminuir o cansaço dos jogadores. Tudo visando os jogos mais importantes, como este contra o Internacional, o perseguidor mais próximo.

Ao que parece, a estratégia funcionou bem e os jogadores deram o máximo durante os primeiros 45 minutos, construíram o placar e apenas controlaram no segundo tempo, ainda que o Internacional tenha tido um domínio devido à entrada de Alex no time. Isso é sinal de um time maduro, que sabe em que momentos deve acelerar ou cadenciar o jogo. E mais: sabe também em que momentos da temporada deve se poupar para poder usar mais gás nas partidas decisivas.

E, com a reta final da temporada começando, o fator desgaste pesa ainda mais, para todas as equipes. Saber dosar o esforço será fundamental. E até nisso o Cruzeiro parece sair na frente.

Cruzeiro 2 x 3 Atlético/MG – “Olha eu aí!”

"Coluna dois! Ih! Olha eu aí!"

“Coluna dois! Ih! Olha eu aí!”

Antes de mais nada, sei que o jogo já passou e é hora de olhar pra frente. Por isso, este texto chega com algum atraso. Mas ele é também uma resposta aos que dizem que não há textos nas derrotas. Ora, também deixei de escrever em algumas vitórias, pois como já expliquei antes, a questão não é o resultado do jogo e sim o tempo que disponho para digitar minhas observações. Isto posto, sigamos.

O futebol é um jogo de imposição de estilos. Uma frase famosa no futebol, que o Google me diz ter sido dita por Sepp Herberger, técnico da Alemanha campeã em 1954. Mas o que Sepp não disse é que nem sempre o estilo que se impõe sai de campo vencedor. E o que se viu no Mineirão do último domingo foi exatamente isso: o domínio de uma equipe sobre a outra, se impondo e obrigando o rival a se defender como um time pequeno do interior, mas cometendo erros que foram bem aproveitados pelo adversário.

Pela postura, pela estratégia e pela imposição de um time sobre o outro — e até mesmo pelo padrão monocromático preferido pela roupagem do rival — nada mais justo e descritivo do que classificar o resultado como a mais clássica zebra. O título do texto é uma homenagem a isso.

Escalações

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, sendo forçado a sair pelos lados por conta do bloqueio dos atacantes rivais aos volantes; Atlético acuado em duas linhas de quatro

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, sendo forçado a sair pelos lados por conta do bloqueio dos atacantes rivais aos volantes; Atlético acuado em duas linhas de quatro

Marcelo Oliveira não fez nenhuma mudança em relação ao time esperado: um 4-2-3-1 com dois laterais ofensivos e dois volantes construtores. Do gol, Fábio teve sua linha formada por Mayke e Egídio nos flancos, com Dedé e Léo na área. Henrique e Lucas Silva comandaram a ligação para o trio de meias formado por Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Alisson, com Moreno na referência comandando a pressão alta.

Levir Culpi tentou surpreender, e no papel o Atlético só tinha um volante, mas na prática, fez um 4-4-2 britânico, ou seja, em duas linhas. O gol de Victor foi protegido pelos zagueiros Léo Silva e Jemerson, com Marcos Rocha na direita e Émerson Conceição na esquerda. A segunda linha tinha o já citado volante, Leandro Donizete, mas com Dátolo a seu lado, jogando por dentro, e com os flancos cobertos por Luan à direita e Carlos à esquerda. Na frente, Guilherme e Diego Tardelli.

Imposição de estilos

Continuando a velha mania da mídia em geral de dar a informação sem observar, os repórteres de campo bradavam que Levir “foi ousado” e que “iria pra cima” do Cruzeiro. Ledo engano. Como lhe é característico, o Cruzeiro tomou as rédeas da partida e já mandou uma bola no travessão logo aos dois minutos, com Alisson completando bela linha de passe. Um lance que resume bem como seriam os 90 minutos de jogo.

O Atlético até tentava ficar com a bola, mas a marcação do Cruzeiro no campo de ataque era excelente, forçando o erro rival, e logo a bola voltava aos pés celestes. Assim, praticamente durante todo o tempo, Guilherme e Diego Tardelli ficavam vendo os zagueiros celestes trocarem passes, sem subir a pressão, se limitando a fechar as linhas de passe para Lucas Silva e Henrique. Isso forçava o jogo do Cruzeiro pelos lados, o que acabou não sendo um problema, pois Mayke e Egídio conseguiam levar a melhor contra Luan e Carlos. E assim o Cruzeiro chegava com facilidade até as proximidades da área rival, mas faltava maior capricho no último passe e na hora de finalizar.

Sequência de erros

E justamente quando o gol celeste parecia madurinho, o Atlético conseguiu seu primeiro gol na sua primeira chance real. Com a jogada transcorrendo do lado esquerdo, Mayke corretamente se aproximou do centro para compactar o time lateralmente, deixando o espaço do lado direito descoberto. Émerson Conceição foi até lá e normalmente teria a companhia de Éverton Ribeiro, o ponteiro direito que acompanha o lateral. Só que Éverton também estava pelo centro e teve que correr uma grande distância para tentar bloquear o cruzamento: primeiro erro. Não foi suficiente, e o cruzamento saiu. Na disputa na área, Léo perde para Luan, muito mais baixo e franzino: segundo erro. E no rebote, Éverton Ribeiro se esqueceu de voltar e habilitou a posição de Carlos, que completou à queima-roupa: terceiro erro.

Talvez por saber que parte da culpa pelo gol foi dele, Éverton Ribeiro se enrolou na saída de bola, tentou um drible em uma posição perigosa do campo e perdeu a bola, gerando um contra-ataque bem executado, em passe de Dátolo para Tardelli já dentro da área. A transição ofensiva é o pior momento para uma equipe perder a posse, pois o pega o time saindo para o ataque, com os jogadores naturalmente saindo de suas posições defensivas. Quando acontece isso, gera um “contra-contra-ataque”, e os jogadores tem que interromper a corrida para a frente e mudar a direção, para voltar e recompor.

Voltando pro jogo

Em clássicos, normalmente um dois a zero contra é quase decisivo. Da forma como foi, mais ainda, pois foram dois gols em sequência quando o Cruzeiro era absolutamente melhor. Geralmente o time fica abalado, mas o Cruzeiro pareceu ignorar isso e continuou jogando como se o placar estivesse em branco. Seguiu com mais posse, rondando a área e chutando mal, exceto na jogada de Éverton Ribeiro, se redimindo em parte pelos erros. Ele achou Goulart sozinho em cima da linha do gol, para diminuir ainda no primeiro tempo, e fazer o Cruzeiro voltar ao jogo com muita naturalidade.

Não houve nenhuma mudança no intervalo, nem de peças, nem de estratégia e nem de estilo. O Cruzeiro continuou se impondo, mas foi muito mais perigoso e incisivo, empatando a partida logo no início com Alisson se descolando de Marcos Rocha, e depois criando uma profusão de chances. Alisson mandou na trave, Moreno mandou por cima um cruzamento da Mayke, que também teve sua chance em cabeceio livre, mas que mandou nas mãos de Victor. Um pouquinho só a mais de capricho nas conclusões teria decidido o jogo já no meio do segundo tempo a favor do Cruzeiro.

Mudanças

Depois do empate, o Atlético mudou para um 4-2-3-1 que acabou não mudando o panorama; Cruzeiro manteve o 4-2-3-1 e pressionou até perto do fim, quando pareceu ter se cansado de chutar tanto a gol

Depois do empate, o Atlético mudou para um 4-2-3-1 que acabou não mudando o panorama; Cruzeiro manteve o 4-2-3-1 e pressionou até perto do fim, quando pareceu ter se cansado de chutar tanto a gol

Após o empate, Levir viu seu time acuado e tentou fazer algo. Aproveitando uma lesão de Luan, mudou para um 4-2-3-1 com Josué ao lado de Donizete e atrás de Carlos à direita, Dátolo centralizado e Guilherme na esquerda, com Tardelli sendo o único centroavante. Depois, sabendo da deficiência defensiva de Guilherme, reforçou a marcação do lado esquerdo com Douglas Santos na lateral esquerda na vaga de Émerson Conceição. Já no Cruzeiro, Marcelo Oliveira mandou Dagoberto a campo na vaga de Alisson, lesionado, sem alterar o sistema mas colocando ainda mais verticalidade. Levir então respondeu com Eduardo na esquerda, mandando Carlos de volta para o lado direito e tirando Guilherme de campo.

Mesmo com tudo isso, o panorama não se alterava. O terceiro gol celeste parecia certo, uma questão de tempo. Marcelo lançou Borges, o melhor pivô do mundo, na vaga de Moreno, e a troca teria sido celebradíssima se Dagoberto convertesse em gol a jogada que construiu com seu antigo parceiro, numa jogada típica de Borges: costas para o adversário, toque de lado para achar o jogador na corrida e deixá-lo em ótima posição para chutar ou cruzar. Dagoberto perdeu um gol que não costuma perder.

Pareceu ser a última cartada do jogo. Talvez por cansaço, o Cruzeiro continuava com a bola mas já não ameaçava tanto a meta de Victor. O time rival conseguiu respirar um pouco e voltou a ameaçar em contra-ataques. Primeiro com Tardelli pela direita — em mais um drible errado de Éverton Ribeiro e que foi o estopim da substituição por Willian. A bola foi rebatida pela zaga e rebote atleticano foi desviado para escanteio. Mas no segundo, Leandro Donizete, com liberdade, achou um cruzamento para Carlos que, também sem marcação, cabeceou no canto oposto de Fábio e decretou o resultado final. Coisas do futebol.

Merecimento e justiça

Quem acompanha o blog sabe que sempre digo que não acredito em resultados injustos. Se o Cruzeiro se impôs, chutou mil bolas ao gol e não venceu, é porque foi incompetente na hora de concluir. E pior: cometeu erros que o rival aproveitou muito bem, com conclusões mais precisas do que as celestes. Por isso, a justiça do futebol é a da bola na rede.

Merecimento, entretanto, é algo diferente. Não que o Atlético não tenha merecido ganhar, pois fez um de seus melhores jogos num período recente, e também teve sorte com as duas bolas na trave. Mas o Cruzeiro, pelo que jogou na partida, pela forma como se impôs num clássico (que sabemos ser um jogo diferente), acuando o time rival em sua própria área, algo incomum para uma partida como essa — por causa disso tudo, o Cruzeiro não merecia perder. Infelizmente, aquele terceiro gol, que parecia certo, não saiu. Se Cruzeiro e Atlético jogassem assim cem vezes, o Cruzeiro sairia vencedor em oitenta.

A linha do tempo mostra: Cruzeiro se impondo durante os 90 minutos com muitas finalizações e Atlético com poucas chances, acuado mas mais eficiente

A linha do tempo mostra: Cruzeiro se impondo durante os 90 minutos com muitas finalizações e Atlético com poucas chances, acuado mas mais eficiente

E é nessa última parte que fica a boa impressão. Perder um clássico é sempre ruim, mas nesse caso, pareceu um pouco menos pior. Porque o futebol que o Cruzeiro mostrou, ainda que com os erros nas finalizações e na marcação do adversário, é suficiente para vencer a maioria das partidas e caminhar rumo ao título.

Ou seja: como defendo sempre, no longo prazo, a qualidade do futebol é mais importante que o resultado. E por essa ótica, o Cruzeiro ganhou de goleada.

Cruzeiro 2 x 0 Atlético/PR – Nada mudou

Começo este texto pedindo desculpas ao leitores por ter deixado passar a análise da partida contra o São Paulo no Morumbi. Como acontece de vez em quando, a vida nos atropela e temos que priorizar umas coisas sobre outras, e o Constelações acaba por ser preterido. Mas se você quiser ler boas análises a respeito daquela partida, acesse o blog Olho Tático, de André Rocha, ou então o blog Painel Tático, de Leonardo Miranda. Não são blogs exclusivos sobre o Cruzeiro e nem tem o estilo prolixo que é a marca do Constelações, mas não é por isso que deixam de ser ótimos textos.

Para recuperar-se da derrota para o perseguidor mais próximo, era imperativo ao Cruzeiro não só vencer o Atlético/PR em casa, como também fazer um bom jogo e mostrar que o revés foi só um pequeno obstáculo e não o início de uma oscilação. E depois de uma primeira etapa um pouco travada, principalmente pela rigidez ofensiva ao invés da fluidez costumeira, o Cruzeiro melhorou no segundo tempo e venceu com certa facilidade. Mesmo porque, quase não teve trabalho defensivamente.

Escalações

Os alas do 3-4-1-2 paranaense eram forçados a recuar, dando espaços para os laterais do 4-2-3-1 celeste, que por sua vez teve pouca intensidade na frente

Os alas do 3-4-1-2 paranaense eram forçados a recuar, dando espaços para os laterais do 4-2-3-1 celeste, que por sua vez teve pouca intensidade na frente

Marcelo Oliveira teve Henrique e Egídio de volta, mas não pôde contar com Goulart, suspenso. Assim, o goleiro Fábio teve sua linha defensiva formada por Mayke à direita, Dedé e Léo no meio e Egídio à esquerda. Henrique e Lucas Silva faziam a proteção e apoiavam o trio formado por Éverton Ribeiro pela direita, Júlio Baptista centralizado e Alisson pela esquerda. Na frente, o flecheiro Marcelo Moreno.

Já o Atlético/PR de Claudinei Oliveira inovou: tentou parar o líder em sua casa usando uma linha de três zagueiros. A meta de Weverton era protegida pelo trio de defensores Gustavo à direita, Cléberson no centro e Willian Rocha à esquerda. Os alas Sueliton e Natanael se alinhavam aos volantes Deivid e João Paulo, com Marcos Guilherme na ligação procurando os avantes Marcelo e Douglas Coutinho. No papel era um 3-4-1-2, mas não foi isso o que aconteceu, como veremos à frente.

O velho problema

Quem acompanha o blog sabe que vira e mexe bato nessa tecla. Um sistema com linha defensiva de três homens não funciona contra uma equipe que jogue com dois ponteiros abertos e um único centroavante, pois a marcação fica indefinida pelos lados. Os alas ficam em um dilema: se voltam para marcar os ponteiros, a linha de três se transforma em linha de cinco, o centroavante fica com dois na sobra: excesso em um setor significa falta em outro setor do campo, significando perda de posse de bola. Caso os alas permaneçam altos para marcar o avanço dos laterais adversários, aí a defesa fica no mano a mano contra o centroavante e os ponteiros, além de abrir vários buracos nos setor devido às distâncias que os zagueiros tem que percorrer.

O time paranaense escolheu voltar com os alas, o que significou muita liberdade para Mayke e Egídio avançarem. Os volantes até tentavam fazer a cobertura com movimentação lateral, mas como o Cruzeiro tinha mais meio-campistas centrais (três contra dois) conseguia tocar a bola com facilidade. Com isso, a estatística de posse de bola do Cruzeiro bateu na casa dos 80% em um dado momento do jogo.

Pouca mobilidade

Mas, se o Cruzeiro chegava fácil até a intermediária, passar dali era bem mais complicado. Éverton Ribeiro até que tentou se mexer e dar intensidade, tentando aparecer em outros setores que não o direito. Mas seus companheiros não o acompanhavam: Júlio Baptista jogava quase como um segundo atacante, ficando muito avançado quase todo o tempo e sempre na faixa central; Alisson, por sua vez, combinou bem com Egídio, foi intenso e veloz, mas não saiu do lado esquerdo. Com os meias estáticos, a marcação do Atlético/PR era facilitada.

Mesmo assim, o time celeste conseguiu abrir o marcador num lance de Alisson. E o gol fez o jogo mudar. O Atlético/PR desfez o sistema e mudou para duas linhas de quatro: os três zagueiros se “moveram” para a esquerda para acomodar o recuo oficial de Sueliton, deixando Natanael pela esquerda na segunda linha, também composta pelos dois volantes e Marcos Guilherme. Um clássico 4-4-2 em linha, que foi suficiente para diminuir o domínio sobre a bola do Cruzeiro, mas não para atacar com qualidade.

Júlio por Willian

Já depois do primeiro gol,  o Atlético/PR voltaria a ter defesa com 4 homens, e assim foi até o final; Cruzeiro só saiu do 4-2-3-1 bem no finzinho com Nilton entre as linhas

Já depois do primeiro gol, o Atlético/PR voltaria a ter defesa com 4 homens, e assim foi até o final; Cruzeiro só saiu do 4-2-3-1 bem no finzinho com Nilton entre as linhas

No intervalo, Júlio Baptista seria substituído por Willian, por lesão sofrida ainda no primeiro tempo. Mas calhou de a substituição ter dado outra cara ao Cruzeiro: Willian foi pra direita, centralizando Éverton. Alisson permaneceu do lado esquerdo. Apesar de ser da opinião de que Éverton rende mais partindo da direita, nesse caso específico foi bom, pois deu ao Cruzeiro o que faltava no setor central: intensidade, tanto ofensiva quanto defensiva. Os três meias se aproximavam e trocavam passes rápidos, lembrando muito os bons momentos do Cruzeiro de 2013.

O aspecto que acabou gerando o segundo gol, no entanto, foi a intensidade aplicada na marcação alta. Em um trabalho conjunto dos quatro homens de frente, o Cruzeiro forçou o erro da defesa do Atlético/PR, a bola sobrou pra Moreno que conduziu, viu Willian passar por um lado e Éverton passar por outro, mas no instinto de centroavante, resolveu mandar o sapato dali mesmo. Décimo primeiro gol do flecheiro, agora artilheiro isolado artilheiro do certame.

Com dois gols de vantagem o Cruzeiro tirou o pé e só controlou. Claudinei trocou Natanael por Sidcley, depois Douglas Coutinho por Mosquito, mas nada foi mudado no sistema tático. Marcelo Oliveira aproveitou e tirou Alisson, amarelado na comemoração do primeiro gol, lançando Marlone na faixa central — e aqui cabe um comentário: o reserva imediato de Goulart na função de central é Júlio Baptista, mas Marcelo tem preparado Marlone para jogar nessa posição também, já pensando à frente quando Goulart, novamente convocado, estará com a Seleção.

No fim, Claudinei ainda mudaria João Paulo por Hernani, numa tentativa de dar criatividade ao meio-campo, ao passo de que Marcelo Oliveira lançou Nilton na vaga de Éverton Ribeiro, posicionando à frente da defesa e atrás e Lucas e Henrique, com Marlone abrindo para configurar um 4-3-3. Mas Fábio nem viu a bola passar perto de seu gol e o dois a zero ficou até o final.

Alisson fez um excelente jogo e só errou um único passe nos 90 minutos: intensidade sem perder qualidade. Só falta se aventurar para longe do lado esquerdo.

Alisson fez um excelente jogo e só errou um único passe nos 90 minutos: intensidade sem perder qualidade. Só falta se aventurar para longe do lado esquerdo.

Mais um muro derrubado

Os adversários vem ao Mineirão e, cada um à sua maneira, tentam parar o Cruzeiro. Duas linhas de quatro, árvore de natal, três zagueiros — todos os sistemas falharam. Se não há um ponto em comum entre eles, então o xis da questão está do outro lado: é a inegável capacidade ofensiva que o time celeste tem em seus domínios. O respeito dos adversários só aumenta, e foi construído com um cartel impressionante de onze vitórias seguidas no Mineirão. E é esse mesmo respeito que faz com que, mesmo em uma noite não tão inspirada ofensivamente, o Cruzeiro saia com uma vitória inconteste.

Com a derrota do São Paulo em Curitiba, a vantagem voltou a ser de sete pontos, com a diferença de que agora são duas rodadas a menos pra o fim do campeonato. Mas o mais importante, contudo, é que o Cruzeiro mostrou não ter entrado na descendente como muita gente apostava. Afinal, a equipe vinha de um empate contra o Fluminense e uma vitória suada contra o Bahia no Mineirão. O futebol apresentado, se não foi brilhante, foi muito mais sólido e consistente que o dos outros times.

No fim das contas, é isso que decide quem será o campeão.

Fluminense 3 x 3 Cruzeiro – Futebol moderno

A preguiça do Cruzeiro diante do Santa Rita, no duelo de volta pelas oitavas da Copa do Brasil, foi tal que o time não chutou uma única bola sequer no primeiro tempo contra o gol alagoano, e ainda sofreu um gol por puro desleixo na rebatida para fora da área de um escanteio. Diante de um Santa Rita aplicado, em duas linhas de quatro, e que só queria ganhar o jogo pois sabia que a classificação era difícil, o Cruzeiro só fez o suficiente no segundo tempo pra vencer.

Mas isso foi um ponto fora da curva. Até compreensível, pela vantagem que tinha no confronto e pelo fato de ser um time alternativo. Mas no jogo seguinte, a postura tinha que ser outra — e foi. Fluminense e Cruzeiro protagonizaram um duelo moderno, com muita intensidade na marcação no meio-campo e na frente, e com velocidade na troca de passes para tentar sair dessa marcação.

Formações

Os dois times no 4-2-3-1: equilíbrio nos duelos invidivuais e marcação intensa no meio-campo

Os dois times no 4-2-3-1: equilíbrio nos duelos invidivuais e marcação intensa no meio-campo

Os dois treinadores lançaram suas equipes no 4-2-3-1. Marcelo Oliveira definiu o time com Fábio no gol, Mayke e Samudio nas laterais direita e esquerda, e Dedé e Léo no miolo de zaga. Sem Lucas Silva, na Seleção sub-20, Nilton foi o companheiro de Henrique na proteção. Marlone, como ponteiro direito, e Júlio Baptista, como meia central, foram os escolhidos para as vagas dos selecionáveis Éverton Ribeiro e Ricardo Goulart. Willian ocupou sua faixa pela esquerda normalmente e Moreno foi o jogador mais avançado.

Já o bom Cristóvão Borges armou o Fluminense com Kléver no gol, Henrique e Elivélton na zaga, com Bruno fechando pela direita e Chiquinho pela esquerda. Diguinho e Jean fizeram a dupla volância atrás do trio formado por Cícero na direita, Conca centralizado e Wagner pela esquerda. Na frente, Fred.

Equilíbrio

O jogo começou bem intenso no meio-campo. Os times marcavam muito bem e chegavam poucas vezes perto da área adversária. Tanto que, após o primeira tentativa de Conca logo a um minuto de jogo, não houve mais finalizações até o pênalti cometido por Cícero em Samudio e convertido por Júlio Baptista. O lance evidencia o posicionamento, onde Cícero tinha a função de espetar pela direita quando o Fluminense tinha a bola e acompanhar Samudio quando este ia para o apoio.

O mesmo Júlio Baptista, porém, seria o responsável pela desatenção no gol de empate. Era ele quem marcava Wagner, mas no desvio de cabeça Júlio largou o meia do Fluminense, que ficou sozinho pra completar para as redes. E no segundo gol dos cariocas, o discutível lance entre Dedé e Fred seria o fator determinante. Com o zagueiro caído, a zaga ficou com um buraco, e foi exatamente esse o espaço por onde Cícero — aquele mesmo que deveria ter sido expulso pela voadora em Samudio no lance do pênalti — se infiltrou e finalizou.

Troca forçada

Antes deste gol, Samudio sentiu um problema muscular e teve que ser trocado. Sem Egídio, Marcelo só podia colocar Ceará, lateral direito com o pé trocado. O incidente com o paraguaio viria a ser um ponto chave da partida posteriormente.

Uma partida que seguia equilibrada, com muita marcação e poucas chances de parte a parte. O Cruzeiro tinha um pouco mais a bola, mas errava mais passes no terço final do campo. Mas isso era puramente uma questão de estilo. O Cruzeiro é um time que tem por característica arriscar os passes agudos ao invés de ficar rodando com a bola até encontrar um espaço maior. Por serem tentativas de passe mais difíceis, a taxa de erros de passes ofensivos era levemente maior.

Já do outro lado, Conca foi bem vigiado na função de pensar o jogo e só foi perigoso quando se infiltrou na área, talvez inspirado por Ricardo Goulart. Assim, o Fluminense preferia trocava passes no meio-campo mas só espetava quando o Cruzeiro abria uma rara brecha. Coisa que aconteceu aos 42, quando Fred recebeu dentro da área e finalizou. Fábio tocou levemente para que ela explodisse no poste esquerdo e sobrasse para Conca do outro lado. O argentino finalizou a menos de 3 metros da linha fatal, mas não contava que Fábio já estivesse ali para salvar o terceiro.

Como os deuses do futebol não brincam, praticamente no lance seguinte Júlio Baptista acertou um rebote fraco fora do alcance de Kléver e empatou a peleja. Um 2 x 2 digno do que foi o jogo.

Segundo tempo

Normalmente no segundo tempo é um jogo diferente. Se não há alterações, há pelo menos ajustes táticos feitos pelos treinadores com os 11 titulares. Mas nesse caso foi uma exceção. Cruzeiro e Fluminense mantiveram suas formações, posturas e estratégias. Aos poucos, o Fluminense foi sentindo a pressão de ter que vencer em casa e cada vez mais subia a pressão na marcação no campo de ataque. Mas era uma pressão quebrada, da qual o Cruzeiro saía facilmente e criava contra-ataques velocíssimos.

Assim foi o terceiro gol: um contra ultrarrápido que teria entrado para a história do jogo como uma chance desperdiçada por Mayke, na marca do pênalti, frente a frente com Kléver. Teria, se Moreno não fizesse um voleio espetacular no rescaldo do lance para virar o jogo para o Cruzeiro.

O lado “menos forte”

No fim, Cristóvão espetou Kenedy e deslocou Jean para a direita pra jogar em cima de Ceará; Marcelo respondeu com W. Farias para reforçar a marcação no setor

No fim, Cristóvão espetou Kenedy e deslocou Jean para a direita pra jogar em cima de Ceará; Marcelo respondeu com W. Farias para reforçar a marcação no setor

A partir daí o jogo se tornou mais tático. Com a vantagem no placar e sabendo que seria pressionado, Marcelo colocou Marquinhos na vaga de Júlio Baptista, lançando-o na direita e trazendo Marlone para a faixa central. Willian foi mantido na esquerda. A intenção era explorar a velocidade nas oportunidades de contra — ou seja, foi apenas uma oficialização do que já estava em curso na partida.

Por sua vez, Cristóvão parecia gostar do que via, pois não dava sinais de mudança. Já a torcida do Fluminense pedia Walter nas arquibancadas. Até que teve uma epifania, provavelmente se lembrando do lance em que Ceará, lateral direito na esquerda, errou um cruzamento com o pé ruim numa das raras vezes em que subiu pro apoio. Ali era o mapa da mina. Colocou o jovem Kenedy para atacar o setor, mas para não perder Cícero, deslocou-o para a faixa central junto a Conca e recuou Jean para a lateral direita, sacando Bruno. Era um 4-2-3-1 mas com cara de 4-3-3, com Cícero e Conca de meias centrais.

O jogo se desenhou conforme queriam seus treinadores. O Cruzeiro com ótimas oportunidades de fazer o quarto gol e matar a partida em contra-ataques, e o Fluminense atacava insistentemente pela direita. Kenedy deu muito trabalho para o Ceará, que ainda teve que lidar com as subidas corajosas de Jean deixando Willian para trás. Percebendo isso, Marcelo trocou de Willian: saiu o bigode e entrou o Farias. Ao contrário do que se pode pensar, o sistema não se alterou. Continuou sendo um 4-2-3-1, mas com um volante aberto na direita. A intenção era clara em reforçar a marcação daquele lado. E ia dando muito certo.

A seleção de passes do Fluminense após a entrada de Kenedy no minuto 75 mostra bem como o time abandonou o lado esquerdo e forçou em cima de Ceará

A seleção de passes do Fluminense após a entrada de Kenedy no minuto 75 mostra bem como o time abandonou o lado esquerdo e forçou em cima de Ceará

Ia, porque faltando pouco para uma vitória que seria maiúscula, Fred disputou um lançamento na grande área, Ceará fechou e o desarmou, mas a bola sobrou exatamente para Kenedy. O garoto conseguiu acertar um belo chute de fora da área, longe do alcance de Fábio, para dar números finais ao jogo.

Capricho nos detalhes

Em partidas onde os dois times se propõem a jogar, o capricho nos detalhes é o que costuma fazer a diferença. Particularmente no duelo do Maracanã, estes detalhes foram: 1- a improvisação forçada de Ceará na esquerda, o que certamente diminuiu levemente a capacidade do Cruzeiro de se defender e de atacar por aquele lado; 2- o capricho no último passe nos vários contra-ataques que o Cruzeiro teve quando o jogo ainda estava 3 a 2; 3- as pequenas falhas de marcação que acabaram por definir dois dos três gols do Fluminense: a de Júlio largando Wagner e a de Ceará que largou Kenedy, embora este último tenha feito isso para ganhar a bola de Fred.

Entretanto, em que pese o gosto amargo de ter sofrido o empate bem no finzinho do jogo, o Cruzeiro foi um time maduro em campo. Ciente de sua capacidade e responsabilidade, mesmo com os muitos desfalques, que certamente mudam a característica do time. Jogou com autoridade de líder que é, e não se intimidou em nenhum momento. Ponto positivo, diante de um Fluminense que jogou a vida pela última chance de tentar um improvável título.

Essa é, em última análise, a diferença do Cruzeiro para seus perseguidores mais próximos: joga o mesmo tipo de futebol, em qualquer lugar, contra que adversário for, e mesmo que as peças mudem de uma partida pra outra. É o motivo pelo qual o Cruzeiro mantém a folga na liderança, enquanto os outros times se revezam como candidatos a concorrentes.

Fruto de longevidade e de manutenção de elenco. E que continue assim por muitas temporadas, amém.