Mesmo correndo riscos desnecessários e errando demais, o Cruzeiro encerrou a incômoda série de sete partidas sem triunfar, com gols de Montillo, de pênalti, e Souza no fim. Taticamente, um jogo melhor para o Cruzeiro no primeiro tempo, que foi respeitado demais pela Portuguesa. No segundo, os visitantes adiantaram a marcação e expuseram um problema crônico do time.
Apesar de estar no mesmo 4-3-1-2 com losango de meio, Celso Roth mudou uma das peças. Tirou Diego Árias e lançou William Magrão. Ceará não reuniu condições, e com isso o Cruzeiro foi a campo com Diego Renan na direita, Everton na esquerda e Thiago Carvalho e Mateus, substituindo o suspenso Léo, defendendo o gol de Fábio. Leandro Guerreiro protegia a área, Marcelo Oliveira foi o “tornante” pela esquerda e Magrão o direito. Montillo fechava o losango com Borges e Anselmo novamente centralizados à frente.
A Portuguesa de Geninho veio com quatro volantes no meio, mas Moisés ficava mais à frente e Léo Silva tinha liberdade, também num 4-3-1-2 losango. Zé Antônio pela direita e Marcelo Cordeiro pela esquerda fechavam a defesa de Dida, com Gustavo e Valdomiro no miolo de zaga. Ferdinando ficou mais preso, Boquita tinha mais funções defensivas que ofensivas e Léo Silva tinha mais liberdade, liberando Moisés. No ataque, o perigoso Bruno Mineiro e Ananias.
Espaço para os volantes
A Portuguesa claramente veio tentar segurar o ataque cruzeirense. Os volantes recuavam em bloco, deixando apenas Moisés e a dupla de atacantes à frente, e estes três não faziam pressão sobre a bola quando o Cruzeiro tinha a posse. O resultado é que Guerreiro, Marcelo Oliveira e William Magrão tinham muito tempo para pensar o que fazer com a bola quando a recebiam, sem ser incomodados. Assim, o Cruzeiro controlou o primeiro tempo e a Portuguesa quase não teve chances. Digo quase porque o time visitante teve chances, principalmente em erros técnicos do Cruzeiro: uma num erro de tempo de bola aérea de Mateus e outra num erro de linha de impedimento de Diego Renan.
Além disso, a bola chegava mais facilmente à frente, principalmente com Anselmo Ramon fazendo muito bem o papel de segurar a bola, dando muito trabalho para os zagueiros Valdomiro e Gustavo, que depois foi substituído por Lima por contusão. Montillo também apareceu muito bem, arriscando chutes de fora da área — coisa que não me lembro ter visto ele fazer com frequência — e dando trabalho para o ex-cruzeirense Dida. O gol de pênalti do argentino foi um prêmio pela proposta mais positiva de futebol que o Cruzeiro teve no primeiro tempo.
Marcação adiantada
No segundo tempo, Geninho viu que havia um buraco entre seu meio-campo e seu ataque e mandou seus volantes avançarem, exatamente para tirar os espaços dos volantes do Cruzeiro. Já Celso Roth, naturalmente, achou que seu time estava bem postado e seguiu com a mesma tática e mesmos jogadores. Mas Roth não contava com a audácia da Portuguesa, e um dos problemas mais graves do Cruzeiro atual ficou novamente exposto: a transição ofensiva com qualidade. Como já dito neste espaço, Montillo não é um meia clássico, estilo Alex, que recua até sua intermediária para pegar a bola e penasr o jogo. Montillo é intenso, veloz, driblador, não é criativo. Portanto, escalá-lo como ligação entre o meio e o ataque — principalmente sendo um ataque com dois camisas 9, por assim dizer — faz com que os volantes sejam a principal saída de bola pelo chão. Quando pressionados, a transição é falha, e por isso chutões são frequentes.
O resultado é que a Portuguesa quase sempre ganhava a segunda bola, que á jogada logo após uma disputa aérea originada de um chutão. Foram 15 minutos de blitz na área cruzeirense que por pouco não cedeu o empate — por sorte, Marcelo Cordeiro estava impedido antes de achar Bruno Mineiro livre dentro da área.
Celso Roth, por fim, agiu. Em sua segunda mexida — já havia trocado Thiago Carvalho por Rafael Donato, por lesão — colocou Souza na vaga de William Magrão, para diminuir o ritmo do jogo e dar mais opções de saída, mantendo o 4-3-1-2 losango. Deu certo, a pressão da Portuguesa arrefeceu, mas o Cruzeiro não retomou as rédeas da partida, que agora estava equilibrada e, portanto, perigosa. O gol de empate seria fatal.
Martinuccio
Somente na última mexida é que o Cruzeiro passou a controlar o jogo. Ao contrário da partida contra o Grêmio, Roth criou coragem e fez uma mexida ofensiva, buscando ampliar o placar e matar o jogo. A entrada de Martinuccio no lugar de Borges reconfigurou o Cruzeiro num 4-2-3-1 muito amplo e móvel, que surpreendia a todo momento a zaga da Portuguesa. Oficialmente, Souza abria pela direita, Montillo ficava por dentro e Martinuccio dava opção pela esquerda, mas os meias trocavam de posição constantemente, e com Anselmo Ramon na referência, fazendo bem o pivô e buscando um dos três para o segundo passe, o Cruzeiro passou a criar bastante.
Mas a mexida também abriu o meio-campo cruzeirense, que agora só tinha dois volantes. Geninho tentou aproveitar a situação e lançou Diguinho no lugar de Zé Antônio, volante que estava jogando na lateral direita. Ferdinando foi para lá para perseguir Martinuccio, e Diguinho foi para o meio tentar aproveitar este espaço. Entretanto, Martinuccio continuava levando perigo pela esquerda, e Geninho gastou seu último cartucho para se defender disto: Rogério, zagueiro, foi jogar na direita, com Ferdinando voltando ao meio-campo.
Não deu muito certo. A Portuguesa acabou perdendo poder de fogo e só teve mais chances porque o Cruzeiro recuou demais para defender seu resultado e sair nos contra-ataques. E foi num desses que saiu o segundo gol: lançamento longo para Anselmo Ramon, disputa pela bola e sobra de Montillo. Martinuccio abre pela esquerda e recebe o passe de seu compatriota, avança sem marcação e cruza para Souza pegar de primeira e fazer as pazes com a vitória.
É hora de repensar
Não enxergar que a entrada de Martinuccio no time melhorou muito o poderio ofensivo cruzeirense é brigar com a realidade. Claro, é preciso testar mais este esquema, principalmente contra times melhores tecnicamente, e até mesmo contra ferrolhos suíços que eventualmente venham a ser armados contra o Cruzeiro. Mas é inegável que, com Martinuccio, o Cruzeiro ganhou velocidade, amplitude e profundidade. Anselmo Ramon também surpreendeu, fazendo uma boa partida como centro-avante pivô. Apesar de não prover um poder de finalização tão grande quanto Borges, Anselmo compensa isso servindo o trio de meias, que finalizam melhor. Assim, o trio Souza/Montillo/Martinuccio é, atualmente, a melhor opção para reduzir a incômoda estatística de sermos o time que menos finaliza na competição.
Mas nem tudo são flores. Apesar de conseguir mais um placar em branco, a defesa ainda apresentou alguns defeitos, principalmente Mateus, que tem sido muito inconstante ultimamente. Porém, é ele quem vai jogar a próxima partida ao lado de Léo, já que Thiago Carvalho e Rafael Donato estão suspensos, e Victorino está na seleção uruguaia.
De acordo com as últimas notícias, Martinuccio deve ser titular, mas Souza não. William Magrão é o provável titular e será o responsável por fechar o lado direito à frente de Ceará, que deve voltar à lateral direita. A presença de seu compatriota vai ajudar Montillo, já que a defesa do Flamengo terá mais gente com quem se preocupar.
Ainda não é a escalação que considero ideal, mas pelo menos ela está a apenas uma substituição de distância.