Tupi 0 x 3 Cruzeiro – Comendo pelas beiradas

Comendo pelas beiradas

Já era sabido qual era o onze que Marcelo Oliveira iria mandar a campo em Juiz de Fora. Restava saber em que formação tática, já que não havia nenhum meia “de ofício” no time. Se a formação não foi surpresa, a escalação de Bruno Edgar pelo lado direito foi. E como bom ponteiro, ajudou a abrir espaço pelos lados, de onde o Cruzeiro construiu rapidamente o placar, administrando na segunda etapa.

Sistemas iniciais

Times no 4-2-3-1, mas o Cruzeiro com uma linha de meias "torta" devido ao posicionamento estreitado de Bruno Edgar, o que acabou por confundir a marcação do lado esquerdo da defesa do Tupi

Times no 4-2-3-1, mas o Cruzeiro com uma linha de meias “torta” devido ao posicionamento estreitado de Bruno Edgar, o que acabou por confundir a marcação do lado esquerdo da defesa do Tupi

Mesmo com os reservas, Marcelo Oliveira não abriu mão da sua formação predileta, o 4-2-3-1, mas devido às características dos jogadores, principalmente de Bruno Edgar, o time variava bastante para um 4-3-1-2, e às vezes ficava num 4-2-3-1 “torto”. O goleiro Rafael teve o retorno de Mayke à lateral direita, a estreia de Pará do outro lado e Manoel e Bruno Rodrigo na zaga central. Mais à frente, Willian Farias protegia a área, com Eurico a seu lado esquerdo ligeiramente mais solto. Bruno Edgar variava entre a ponta direita e o centro, deixando Joel mais aberto pela esquerda e Judivan centralizado para se juntar a Dourado na frente.

Já o treinador Felipe Surian armou o Tupi num 4-2-3-1, mas com problemas pelos lados. A meta de Glaysson foi protegida pelos zagueiros Sílvio e Mailson, com Osmar no flanco direito e Fabrício Soares no esquerdo. Genalvo e Noé faziam a proteção e davam suporte a Marcos Goiano, o meia central. E os ponteiros Ygor, pela direita, e Danilo, do outro lado, tentavam achar o centroavante móvel Daniel Morais.

Espaço pela direita

A partida começou com o Tupi tentando atacar o flanco direito do Cruzeiro, talvez tentando explorar uma eventual inexperiência ou insegurança do jovem estreante jovem Pará. Tanto o lateral Osmar como o ponteiro Ygor insistiram muito por aquele lado, também porque Fabrício Soares era um zagueiro improvisado na lateral esquerda e ficava naturalmente mais contido.

Com isso, sobrava para Danilo dar amplitude pela esquerda no ataque juiz-forano. Ele tinha também a incumbência de dobrar a marcação pela direita, mas a movimentação de Bruno Edgar confundiu a defesa do Tupi. Danilo frequentemente ficava muito estreito, deixando o corredor livre para Mayke se juntar a Bruno Edgar e fazer dois contra um em Fabrício Soares. Assim o Cruzeiro chegava naturalmente por aquele lado e conseguiu bons cruzamentos; em um deles, Bruno Edgar achou Henrique Dourado na área, que tomou à frente de seu marcador para cabecear e abrir o placar.

O lado esquerdo

Do outro lado, Pará tinha que ficar naturalmente mais contido, tanto em função do ímpeto do Tupi quanto em função da pouca ajuda que recebia de Joel. Mas isso não intimidou o garoto, que fez um ótimo movimento ao escapar despercebido pela recomposição de Ygor e receber a maravilhosa inversão de Mayke em cobrança de falta. Com isso, o lateral teve que sair na cobertura e deixou Joel com o outro zagueiro, matando a sobra. Com a zaga no mano a mano, Mailson tentou tomar a frente de Henrique para interceptar o excelente cruzamento de Pará, mas jogou contra a própria meta.

Aqui o momento em que Mayke faz a inversão de bola que originou o segundo gol: note a ótima ultrapassagem de Pará e os ponteiros do Tupi fora de posição

Aqui o momento em que Mayke faz a inversão de bola que originou o segundo gol: note a ótima ultrapassagem de Pará e os ponteiros do Tupi fora de posição

Com o segundo gol, o Cruzeiro tirou o pé. Natural para um time que tem grande vantagem no placar, e ainda mais um que joga poucas vezes juntos. Depois da parada técnica e da conversa com os treinadores, os times se “arrumaram” em campo: Danilo e Bruno Edgar permaneciam mais abertos. Mas Fabrício Soares continuava não subindo, fazendo o time da casa naturalmente continuar preferindo jogar em cima de Pará. Mas o Tupi só conseguiu chegar mesmo por ali em jogada de calcanhar de Ygor para Osmar, que não foi acompanhado por Joel. O lateral achou Daniel Morais, mas o camisa 9 chutou pra fora.

Intervalo

O Tupi voltou do vestiário com duas alterações. Felipe Surian trocou Ygor por Rafael, tentando atacar ainda mais o lado esquerdo celeste. Já o volante Noé deu seu lugar ao meia Bruno Arrabal, para qualificar o passe tanto na saída quanto na criação. O Cruzeiro voltou com a mesma formação, mantendo o 4-2-3-1 mais claro, com Bruno Edgar efetivamente como ponteiro direito, alinhado a Judivan e Joel.

Já após a parada técnica no 1º tempo e também no segundo, o Cruzeiro voltou ao 4-2-3-1 "tradicional": B.Edgar mais aberto e alinhado a Joel e Judivan, aqui mais projetado para um eventual duelo aéreo no tiro de meta de Rafael

Já após a parada técnica no 1º tempo e também no segundo, o Cruzeiro voltou ao 4-2-3-1 “tradicional”: B.Edgar mais aberto e alinhado a Joel e Judivan, aqui mais projetado para um eventual duelo aéreo no tiro de meta de Rafael

As alterações do Tupi funcionaram e o time da casa começou a ter muito volume, embora sem ameaçar de verdade a meta de Rafael, com exceção de um chute de longe de Daniel Morais. Marcelo Oliveira, como é de costume, quis então dar fôlego novo ao ataque para não deixar o Cruzeiro sem intensidade. Primeiro colocou Fabiano na vaga de Mayke, que ainda não tinha fôlego para 90 minutos, e logo depois, lançou Neílton na vaga de Joel, na mesma função de ponteiro esquerdo.

E logo na sua primeira jogada, Neílton recebeu de Judivan e avançou pela esquerda; Pará fez a ultrapassagem puxando a marcação de Sílvio e deixou Osmar sozinho contra Neílton e Judivan. Quando Genalvo chegou, Neílton já tinha passado a Judivan na frente, que ficou cara a cara com Glaysson. Dessa vez, ele não foi fominha e deu de volta pra Neílton, que não foi acompanhado por Genalvo e ficou livre dentro da área para fazer o terceiro. Um belo exemplo de gol coletivo, que demonstra como a movimentação dos jogadores pode desmontar um sistema defensivo bem postado.



As últimas trocas

Times no 4-2-3-1 até antes da expulsão de Maílson. Após o vermelho, o volante Genalvo recuou para a zaga

Times no 4-2-3-1 até antes da expulsão de Maílson. Após o vermelho, o volante Genalvo recuou para a zaga

O terceiro gol definiu a partida, que seguiu praticamente num piloto automático. Marcelo Oliveira aproveitou essa situação e promoveu a estreia de Gabriel Xavier, na vaga de Judivan, também na mesma função de meia central. O treinador celeste revelou depois do jogo que a ideia era segurar a bola, e GX fez isso muito bem, e ainda teve uma chance de marcar o seu, mas desperdiçou.

Felipe Surian, de sua parte, lançou Marcinho na vaga de Danilo, enfiando mais um atacante para tentar diminuir o prejuízo. Mas com tantos atacantes que não recompunham, o Cruzeiro tinha espaço para tocar a bola, a ponto de fazer a torcida gritar “olé”. Num dado momento, o time celeste chegou a ficar com a bola nos pés durante mais de um minuto, numa jogada que rodou a defesa inteira, passando pelo meio-campo e culminando numa finalização de Pará.

A expulsão do zagueiro Mailson, que saiu numa cobertura tão atabalhoada a ponto de atingir Pará já no campo de ataque, assentou a partida de vez. Genalvo recuou para a zaga, o Cruzeiro se limitou a puxar mais “olés” da arquibancada, e o Tupi não ameaçou mais até o fim do jogo.

A capacidade do elenco

A partida foi excelente para avaliar o nível verdadeiro do elenco celeste. Muitos jogadores se destacaram nessa partida, principalmente os jovens: Pará teve muita personalidade na lateral esquerda, mesmo sob pressão de dois jogadores; Eurico foi bem na marcação mas ainda tem a evoluir, particularmente no passe; Bruno Edgar mostrando ter muita versatilidade, caraterística de jogadores modernos; Judivan com boa penetração na área, mas tem que ser um pouco mais coletivo; e Neílton entrando com muita intensidade pelo lado esquerdo. A destacar também a partida de Henrique Dourado, que faz muito bem o primeiro combate, será excelente sombra para Damião.

Entretanto, também não se pode empolgar tanto. Por mais que os adversários do Campeonato Mineiro sejam bons times e estejam bem armados, não estão no mesmo nível das equipes que o Cruzeiro enfrentará nas grandes competições. O estadual está, neste ponto, servindo ao seu propósito: observação de jogadores e preparação do time.

Para a semana dura que chega, com a estreia em casa pela Libertadores o clássico no fim de semana, Marcelo terá um bom time. Mas é como diz aquele ditado: times ganham jogos, elencos ganham campeonatos. A vitória sem sustos foi uma prova inequívoca disso.

Cruzeiro 3 x 0 Tupi – A caminho da maturidade

Substituições certeiras – e dois gols de Anselmo Ramon como único homem de referência – deram a tranquilidade que o Cruzeiro precisava para espantar a crise.

Vágner Mancini escalou os 11 esperados, sacando Amaral para a entrada de Roger no meio, e Marcos no lugar de Gilson, com Diego Renan voltando à lateral esquerda. Já o Tupi veio para o jogo num misto de 4-2-2-2 e 4-2-3-1, com a chave sendo o posicionamento de Alan Taxista pelo lado direito, muito mais posicionado como meia do que como atacante. Michel e Leo Salino completavam o trio criativo com Adenilson sozinho à frente.

O losango “torto” celeste com Roger de box-to-box pela direita

A agradável surpresa foi o posicionamento de Roger, que recuava tanto que frequentemente se encontrava atrás da dupla de volantes, dando mais qualidade à saída de bola azul. Era um 4-3-1-2 em losango “torto”: o meia jogou mais pela direita, fazendo um papel de “box-to-box” (uma expressão inglesa que denota um jogador que transita no espaço entre as duas grande-áreas), Marcelo Oliveira na sua posição habitual pela esquerda e com um pouco mais de liberdade do que Leandro Guerreiro, primeiro vértice. Este ficou mais responsável por cobrir o apoio do lateral Marcos, muito bem na partida.

O resultado é que o time celeste teve muito mais ação ofensiva pela direita do que pelo outro lado. O primeiro gol saiu numa excelente jogada de Montillo, que, como de costume, circulava por todos os lados. O argentino recebeu a bola naquele flanco e girou em cima de seu marcador George, que o perseguiu por todo o campo. O volante teve que recorrer à falta, e a excelente cobrança de Roger achou Wellington Paulista livre para abrir o placar.

Sem a bola, o Cruzeiro se defendeu com o mesmo esquema das partidas anteriores, mas com uma fundamental diferença: Roger, como volante, se posicionava um pouco mais à frente, ocupando o espaço entre o meio e o ataque, que era um problema crônico da defesa azul. Defendendo muito bem sua grande área, o Cruzeiro impediu o trio criativo do Tupi de fazer jogadas mais agudas, que eram quase sempre obrigados a recuar a bola para os volantes para manter a posse. Esses, por sua vez, não eram jogadores de criatividade, e por causa disso Fábio mal viu a bola no primeiro tempo.

Nos minutos antes do intervalo, Roger passou a ser melhor marcado e com isso o time passou a administrar o placar. E, com a dupla de ataque se desfez no segundo tempo, cabe aqui uma observação. Reparem como WP e Anselmo Ramon raramente se conectam no ataque. Isto acontece porque ambos são jogadores muito semelhantes – são o homem de referência, ora segurando a bola para a chegada do time, ora se posicionando dentro da área para uma conclusão de um passe pelo alto ou cruzamento (veja o posicionamento dos dois no primeiro gol). Quando atuam juntos, não são tão eficientes, já que um tem que sair do caminho do outro, abrindo, e não rendem tanto quando estão fora de suas posições “naturais”. Não é de se estranhar que a dupla tenha feito 100% dos gols do time este ano e 0% das assistências.

Cruzeiro com as alterações, com Rudnei e Walter se aproximando de Montillo

O segundo tempo começou como terminou o primeiro, com a exceção de que o Tupi se lançou um pouco mais à frente. Com Roger mais apagado, o Cruzeiro recuou suas linhas naturalmente, e um leve domínio dos juizforanos apareceu, mas nada muito contundente. As melhores chances criadas pelos visitantes foram chutes de fora de área, sendo que em um deles Michel obrigou Fábio a fazer uma dupla defesa espetacular.

Mas com as substituições, o jogo mudou novamente. Mancini promoveu a estréia do atacante Walter no lugar de WP, e pôs Rudnei no lugar de Marcelo Oliveira. Walter se posicionou como segundo atacante e Rudnei foi um volante com muita liberdade para atacar pela direita. Com isso, Roger passou para o lado esquerdo. No Tupi, o volante Jaílson deu lugar ao meia-atacante Ulisses, transformando o Tupi num 4-1-3-2 com o avanço de Alan Taxista, numa tentativa de empatar a partida aproveitando o melhor momento no jogo.

Foi em vão. O trio Rudnei-Montillo-Walter combinou bem as jogadas, ajudado pelo espaço criado à frente da zaga juizforana com a saída de um dos volantes. George, sozinho, não foi capaz de comandar a marcação e o lado direito azul ganhou mais velocidade. O segundo e o terceiro gols surgiram, novamente, por aquele lado: no segundo, uma jogada de Montillo com Walter, que achou Rudnei na entrada da área, jogando como um meia. Este serviu com açúcar para Anselmo Ramon – agora único homem de referência no ataque – que tocou no canto direito de Rodrigo. O terceiro foi um cruzamento certeiro de Marcos numa outra jogada do 10 argentino, que Anselmo Ramon cabeceou sem chances para Rodrigo.

Percebendo o erro, o técnico do Tupi voltou ao 4-2-3-1 original com a entrada do zagueiro Paulinho como volante, no lugar do meia Leo Salino, com Alan Taxista voltando ao meio-campo, para evitar uma goleada maior. O Cruzeiro também desacelerou e o jogo ficou morno até os minutos finais, com o Cruzeiro por vezes tentando impor velocidade, mas sem sucesso no último passe.

Algumas conclusões a serem tiradas desse jogo:

  • WP e Anselmo Ramon estão certamente com os dias contados como dupla de ataque titular, Walter foi muito bem e deve entrar no time em um futuro muito próximo;
  • Roger deu criatividade ao time enquanto conseguiu jogar, mas no segundo tempo desapareceu, então é preciso pensar em uma alternativa para a criação além de Montillo;
  • Marcos também foi bem na lateral direita, e deve manter o lugar no time;
  • Rudnei é uma ótima opção para destravar uma retranca, pois é um volante mais incisivo;
  • o lado esquerdo vai precisa de mais criatividade;
  • os problemas mais graves dos primeiros jogos foram resolvidos, mas a qualidade de passe não: o time ainda erra muito e perde a posse da bola.

A evolução foi pequena, mas é clara. Ainda há muito espaço para crescer, no entanto. Já era para estarmos andando, mas ainda estamos engatinhando. A minha aposta é que, à época da reinauguração do Independência, no reencontro com Belo Horizonte, a maturidade chegue.