Usando o mesmo estilo de jogo do Cruzeiro no primeiro turno, para nosso azar, o Botafogo esperou um turno inteiro para devolver na mesma moeda a derrota sofrida naquela partida.
As formações iniciais
Celso Roth tentou repetir o time da vitória sobre o Náutico, mas Charles foi suspenso e Sandro Silva foi para o jogo. Em uma primeira análise, foi uma opção estranha, já que Sandro é naturalmente reserva de Leandro Guerreiro na base do losango de meio-campo. Entretanto, com cinco minutos de jogo, a razão teria ficado mais clara, como veremos adiante. No início, o Cruzeiro se postou num 4-2-2-2 estreito demais: Fábio no gol, Léo na lateral direita, Everton na esquerda, Rafael Donato e Mateus fechando a defesa. Leandro Guerreiro e Sandro Silva protegiam a área e liberavam Tinga e Souza para armar. Na frente, Wallyson e Borges.
O Botafogo entrou no 4-2-3-1 tradicional: Renan debaixo das traves era defendido pela dupla de zaga Dória e Fábio Ferreira, flanqueados pelos laterais Lucas na direita e Márcio Azevedo na esquerda. Gabriel e Jádson na dupla volância, e mais à frente o quarteto ofensivo, com o trio Fellype Gabriel na direita, Andrezinho centralizado e Seedorf na esquerda atrás de Elkeson. No encaixe de marcação, ficou claro que Everton ficou sobrecarregado com a marcação de Fellype Gabriel e o avanço de Lucas. O mesmo ocorria do outro lado, com Léo tendo que se virar contra Seedorf e o ofensivo lateral esquerdo Márcio Azevedo. Assim, o Botafogo controlou o meio-campo, tinha mais posse e mais amplitude. O Cruzeiro nem pegou na bola nos cinco minutos iniciais.
Leandro Guerreiro e Everton
Então veio a mudança tática: Leandro Guerreiro deixou Sandro Silva marcando Andrezinho, e recuou à lateral esquerda para dar suporte a Everton e marcar Fellype Gabriel; Everton virou ponteiro esquerdo e foi marcar Lucas à frente. Do outro lado, Wallyson recuava acompanhando Márcio Azevedo e Léo ficou responsável por Seedorf. O novo 4-1-4-1 equilibrou a marcação e fazia o Cruzeiro ter mais volume, empurrando o Botafogo para trás. O setor mais perigoso do Cruzeiro era o esquerdo, e foi por este lado que saiu o gol: Souza recebeu por ali e lançou Borges em profundidade. Fábio Ferreira falhou e Borges saiu na cara de Renan, mas não conseguiu vencer o arqueiro botafoguense. Tinga, que vinha correndo para acompanhar o ataque, pegou o rebote num chute muito mais difícil que o de Borges e marcou seu primeiro gol com a camisa celeste.
O gol atordoou o Botafogo. O Cruzeiro teve volume, muito volume, e teve uma chance de ouro para ampliar com Everton, que estava vencendo o duelo contra o lateral direito Lucas. O volante-lateral disparou em velocidade, sua característica, e ao receber passe de Souza, em um só toque driblou seu marcador e invadiu a área. A opção era tocar para Wallyson, que vinha correndo do outro lado, marcar, mas ele chutou para fora. Um gol perdido que faria falta e poderia ter mudado a história do jogo.
A movimentação do quarteto ofensivo do Botafogo
O Botafogo foi controlando os nervos à medida que o Cruzeiro desperdiçava o bom momento. O quarteto ofensivo do Botafogo se movimentava, invertendo posições e tentando confundir a marcação cruzeirense, que estava muito bem. E conseguiram fazer isso por uma única vez. Souza ainda estapeava o gramado, reclamando de uma suposta falta que teria recebido, quando Fellype Gabriel, desta vez na direita, já cruzava a bola que atravessaria toda a área para encontrar Seedorf, que se movimentou às costas de Guerreiro e emendou um lindo chute de primeira no canto direito de Fábio. Com os ponteiros adversários invertidos, a marcação se confundiu.
Nem deu muito tempo de avaliar o impacto do gol, porque logo no minuto seguinte, o Botafogo viraria o jogo, novamente em passe de Fellype Gabriel para Seedorf. Desta vez eles estavam em suas posições iniciais, mas quem marcava Fellype Gabriel era Everton, já que Guerreiro estava vigiando Lucas neste lance. Quando o meia dominou dentro da área, Léo bobeou na marcação e Seedorf tomou-lhe à frente, recebeu o passe e finalizou no cantinho para decretar a virada.
Agora era a vez do Cruzeiro se sentir atordoado. O time começou a errar passes que não estava errando, fruto do nervosismo de um time ainda em formação e que está atrás no placar. Wallyson, que fazia boa partida defensivamente, não fez o mesmo atacando, e naturalmente começou a ser cobrado pela torcida, ávida pelo gol de empate. O nome de Élber era ouvido em alguns lugares da arquibancada. Mesmo assim, o Botafogo contentou-se em aguentar as tentativas cruzeirenses e tentar sair só na boa, o que não aconteceu nenhuma vez até o fim do primeiro tempo.
No segundo tempo, o contra-ataque fatal
No intervalo, Celso “atendeu” o pedido da torcida e mandou Élber a campo no lugar de Wallyson. Também, tirou Sandro Silva do jogo e mandou Wellington Paulista. Com isso, Everton voltou à lateral, Leandro Guerreiro voltou ao meio campo mas Tinga não recuou e continou sendo meia: era um 4-3-3 clássico, com triângulo alto no meio – um 4-1-2-3 para ser mais exato, mas com WP mais centralizado do que aberto pela esquerda. No Botafogo, Fellype Gabriel deu lugar ao centro-avante Willian, com Elkeson voltando para o meio-campo aberto pela direita, mantendo o 4-2-3-1.
Foram dez minutos de tentativas pelo alto e cruzamentos infrutíferos na área. O Botafogo se defendia e tentava sair em contra-ataques, quase sempre com Seedorf pela esquerda. Em uma bola parada, a zaga botafoguense conseguiu fazer exatamente isso. Seedorf e Guerreiro apostaram corrida, vencida pelo primeiro, que num toque só pôs na frente e tirou do alcance do volante. Imediatamente mandou para o centro, onde chegavam nada menos do que quatro jogadores adversários sem marcação. Fábio ameaçou sair, recuou e só saiu de vez quando Jádson dominou, mas foi driblado. Everton não conseguiu salvar a conclusão.
Outras tentativas
Com o jogo decidido aos 10 do segundo tempo, Celso Roth resolveu que não queria mais tomar contra-ataques deste tipo e recompôs o meio com William Magrão no lugar de Souza. Agora era Tinga quem ficava centralizado, com William Magrão tendo certa liberdade para avançar. O Cruzeiro não jogava pelo chão, e insistia muito nas bolas aéreas, tanto com Everton pela esquerda quanto com Élber pela direita. Dominou a posse, muito mais por estratégia do Botafogo de absorver as investidas do que por mérito próprio. Oswaldo de Oliveira, então, fez sua segunda mexida, para fechar o time e segurar o resultado: tirou Willian, aquele mesmo que entrou no início do segundo tempo, para colocar o zagueiro Brinner, e fazer um 5-3-1-1 para matar o quase 3-2-3-2 cruzeirense com o posicionamento alto de Everton.
Mesmo assim, o Cruzeiro ainda teve forças para criar algumas chances, como na jogada de WP recebendo passe de Borges, que fez o pivô. O atacante não foi fominha e passou a Everton que chegava livre pelo lado esquerdo, mas o chute foi dividido com o goleiro Renan e a bola saiu raspando a trave. Mas foi só.
Derrota com pontos positivos?
Não devemos atribuir o revés sempre a erros nossos. Há mérito do outro lado e é preciso reconhecer isso. Taticamente foi um jogo igual, a diferença foi na técnica: quando o Botafogo teve as chances, converteu, e o Cruzeiro não. Se Everton fizesse aquele gol no primeiro tempo, o jogo teria sido outro, mas o “se” não existe no futebol. O que vale é o resultado final — que na não tão modesta opinião deste blogueiro, sempre é justo. O Botafogo fez uma excelente partida e executou melhor a sua estratégia.
Assim, posso até estar exagerando um pouco nesta análise — pois quem me conhece sabe que sou otimista por natureza — mas acredito que este time que jogou ontem é muito mais consistente e equilibrado do que o do início do ano com Vágner Mancini, e até mesmo do que aquele do início do campeonato. É claro que ainda há muitas coisas a melhorar, mas a evolução em relação ao início do ano é clara. Por exemplo, ao contrário do que se imagina, Roth tem feito cada vez menos experiências, e portanto podemos dizer que o time tem sim uma estrutura tática. Everton me parece uma realidade pelo lado esquerdo, principalmente na parte ofensiva, tendo suporte; Wallyson ainda precisa ganhar mais confiança ofensiva, mas tem se destacado taticamente, o que é fundamental.
É sempre bom lembrar que o Cruzeiro jogou sem Ceará e Montillo, peças fundamentais nesse esquema e que dariam outra característica ao time. Também temos Lucas Silva e Charles como opções para o meio, e Martinuccio, meia canhoto, pode se integrar ao grupo em breve.
Portanto, apesar da derrota, vejo pontos positivos. Mas infelizmente, creio que só vamos ter frutos no ano que vem — isso se não mudarem o treinador, é claro.