Cruzeiro 2 x 1 Palmeiras – O ponteiro esquerdo

Apresentando uma novidade na formação, o Cruzeiro venceu com propriedade o Palmeiras ontem na Arena Independência, apesar dos erros da arbitragem.

Montillo de ponteiro esquerdo, voltando com o lateral, Tinga centralizado se movendo por todo o campo e Wallyson se juntando a Borges pela direita no novo 4-2-3-1 cruzeirense

Ao contrário do que disse um certo comentarista de uma certa rádio de Belo Horizonte — inclusive contrariando o que disseram Tinga e o próprio treinador nas coletivas ao fim do jogo — Celso Roth surpreendeu e escalou o Cruzeiro em um 4-2-3-1 claríssimo (e não um 4-4-2 como disse o comentarista). Fábio teve Ceará na direita, Thiago Carvalho e Victorino à sua frente e Diego Renan à esquerda. Protegendo a área, Leandro Guerreiro dava mais liberdade a seu parceiro de volância Charles. A novidade tática, entretanto, estava na linha de meias: Tinga, aparecendo centralizado, tinha Wallyson pela direita e Montillo estreando como ponteiro esquerdo. Borges era a referência.

Felipão não saiu do esquema que vinha usando nos últimos jogos e mandou sua equipe no mesmo esquema do adversário — o que, estranhamente, foi notado pelo comentarista citado. O 4-2-3-1 palmeirense tinha o goleiro Bruno sendo defendido por Leandro Amaro e Henrique (que vinha jogando de volante e foi recuado neste jogo) flanqueados por Artur na direita e Fernandinho do lado oposto; Márcio Araújo, mais plantando, e João Vítor suportavam Patrik pela direita, Daniel Carvalho por dentro e Mazinho pela esquerda, com Hernán Barcos enfiado.

Como é de costume quando estes dois esquemas se enfrentam, os embates típicos são a dupla de zaga contra o centro-avante, o volante plantado contra o meia central, os dois volantes da sobra batalhando entre si e laterais contra ponteiros. Façamos um exercício didático, portanto: Borges enfrentava Leandro Amaro e Henrique, e na outra ponta do campo Barcos encostava em Thiago Carvalho com Victorino na sobra; no meio, Guerreiro ficava a cargo de Daniel Carvalho, Charles vigiava (e tentava se livrar de) João Vitor e Tinga era perseguido por Márcio Araújo. Pelos lados, os duelos eram Ceará x Mazinho, Diego Renan x Patrik, Wallyson x Artur e o duelo desigual entre Montillo e Fernandinho.

Qual é a diferença, a grande novidade tática? É simples: Tinga já tinha tendências centralizadoras quando era escalado como ponteiro, enquanto que Montillo tendia a cair pelos lados, fazendo uma função que Michael Cox, do excelente Zonal Marking, batizou como “ponteiro central“, quando seu posicionamento era o centro do meio-campo. Celso Roth apenas oficializou as coisas. O resultado direto, como o próprio Tinga disse ao fim da partida quando explicava a diferença de posicionamento em relação aos jogos anteriores, foi que Montillo teve mais espaço para poder utilizar a sua melhor arma: a vitória pessoal, como diria o treinador celeste. Ou como disse o Predador Azul, o “um contra um”.

Sim, os treinadores adversários perceberam que, ao escalar um volante sempre encostando no argentino, às vezes em marcação individual destacada — e até mesmo chegando ao exagero de encurtar até quando o própria equipe tinha a posse de bola — Montillo produzia pouco, e mesmo quando conseguia vencer o seu marcador, havia muitas sobras para tirar a bola do camisa 10. Ao deslocá-lo para a esquerda, resolvem-se três problemas em um: primeiro, troca-se o marcador principal do argentino, facilitando a “vitória pessoal”, já que os volantes plantados têm muito mais poder de marcação que um lateral; segundo, a marcação é única e não dupla; e terceiro, ao ser deslocado para a esquerda, Montillo foi o que se chama de “ponteiro de pé invertido”, ou seja, um destro na esquerda (análogo a um canhoto na direita — Martinuccio pode ser uma bela novidade quando se recuperar). A vantagem de inverter os pés dos ponteiros é que, com isso, eles podem cortar para dentro e arriscar um chute, ou então servir uma jogada de profundidade para o centro-avante, ou ainda cruzar para a área de uma posição mais recuada. Assim jogam Robben e Ribery no Bayern de Munique vice-campeão europeu.

Todos os lances do argentino no primeiro tempo, de alguma forma, derivaram deste seu novo posicionamento. Ele vencia facilmente o duelo com o pobre Fernandinho, que certamente não esperava ter que marcá-lo na partida de ontem, e criava muito pelo setor. Fez um cruzamento, arriscou um chute quando cortou pra dentro e recebeu a assistência de Tinga para a falta fora da área que recebeu, mas que o juiz deu pênalti. Borges converteu o maior volume de jogo cruzeirense em vantagem no placar.

Mas não foi só o argentino que apareceu. Praticamente todo o time foi bem ontem. A nova dupla de zaga, Victorino e Thiago Carvalho, segurou bem as investidas do ataque palmeirense, principalmente nas bolas aéreas para Barcos, que, à exceção do pênalti cobrado, nada produziu durante todo o tempo em que esteve em campo. Ceará tomou conta da lateral direita, marcando com firmeza e apoiando o ataque aproveitando o corredor aberto por Wallyson; do outro lado, Diego Renan também foi aplicado na marcação e não deixava Patrik com liberdade. Guerreiro perseguia Daniel Carvalho com precisão, mesmo quando o meia palmeirense abria pela esquerda invertendo com Patrik, e ao mesmo tempo fazia o primeiro passe sem sustos, procurando os laterais, Charles ou Tinga. Estes dois, por sua vez, foram excelentes no meio-campo: Charles, com mais liberdade devido ao posicionamento mais afundado de João Vítor, tinha tempo na bola e podia pensar o jogo com calma, e Tinga, o Predador Azul, corria por todo o campo, dando sempre a opção para um passe de segurança. Montillo, indomável como ponteiro esquerdo, surpreendeu defensivamente ao voltar junto com o lateral Fernandinho, quando este tinha a audácia de apoiar; Borges, o autor dos gols, com boa presença de área — principalmente no segundo gol, e a volta do bom futebol do garoto Wallyson, que dava opção de passe profundo pela direita e por vezes centralizava buscando a diagonal para auxiliar Borges. A única nota negativa, se é que se pode dizer assim, foi a não tão grande aplicação defensiva do garoto, que por vezes “esquecia” a recomposição pelo lado e dava campo para o lateral Artur subir sem ser incomodado. Foi por ali que o Palmeiras conseguiu seus lances mais perigosos, mesmo que longe de assustar Fábio.

No intervalo, Felipão desfez o 4-2-3-1 e lançou Obina na vaga de Patrik. A intenção era acabar com a marcação encaixada, aumentando o número de atacantes e fazendo número no meio-campo ao mesmo tempo, num 4-2-2-2 que virava duas linhas de quatro bem inglesas sem a bola: Mazinho trocou de lado, Daniel Carvalho fechava pela esquerda e os dois volantes compunham a primeira parede. Com a bola, os meias abertos entravam pelo meio-campo para pensar o jogo. Roth respondeu afundando Guerreiro entre os zagueiros para fazer a sobra, mas a consequência direta era ficar com ainda menos jogadores no meio-campo: Charles era ajudado por Tinga, mas o Palmeiras tinha quatro no meio. Assim, o time paulista dominou a posse de bola, inclusive tendo longos períodos com ela, mas sem ser incisivo.

A desvantagem do 4-2-2-2 era fazer o time ficar estreito, que, com o apoio dos laterais, abria os flancos para os contra-ataques celestes. E eles vieram, ainda mais perigosos com Montillo jogando oficialmente pela esquerda. Foi com ele que nasceu o lance do segundo gol, conduzindo e invertendo para Wallyson, que de primeira mandou a Tinga na marca do pênalti. Marcado, o Predador girou e finalizou, a bola resvalou no zagueiro e sobrou novamente para Wallyson, que centrou para Borges completar com excelente senso de posicionamento.

Depois do gol, o Palmeiras se lançou ainda mais à frente tentando diminuir o placar, e o Cruzeiro teve várias chances de matar o jogo no terceiro gol. Wallyson teve a chance de se consagrar fazendo o terceiro num passe longo de Montillo para ele em velocidade, mas Bruno conseguiu defender. Felipão aproveitou a superioridade numérica no meio-campo e oficializou o “abafa”, tirando mais um meia, desta vez Daniel Carvalho, e mandando Maikon Leite para o jogo. Ele foi atuar pela direita, forçando em Diego Renan, e Mazinho voltou a atuar aberto pela esquerda em cima de Ceará, fazendo um ultra-ofensivo 4-2-4. No primeiro lance, Maikon Leite receberia lançamento em velocidade e Victorino cometeu o pênalti, num dos poucos lances de desatenção da zaga azul. Barcos deslocou Fábio para diminuir, e o placar havia ficado perigoso.

O Palmeiras se animou com o gol, como é natural. Mas a zaga cruzeirense, incluindo Leandro Guerreiro na sobra, estava em noite inspirada, e não deixou o Palmeiras concluir a gol com perigo. Além disso, Wallyson e Montillo ainda estavam presentes em campo, e o perigo de um contra-ataque fatal era constante. A combinação destes dois fatores fez Felipão fazer a última mudança e tirar Barcos do campo, mandando Betinho. O Palmeiras voltava a ter três no meio em seu 4-2-1-3, mas desta vez Celso Roth respondeu lançando William Magrão no lugar de um cansado Wallyson. Tinga foi jogar de meia-direita, ajudando Ceará, e Magrão foi fazer companhia a Charles à frente da área. Guerreiro continuava na sobra, mas com liberdade para se adiantar, já que só havia apenas um atacante adversário na área. Assim, o meio-campo voltou a ser um setor equilibrado em número de jogadores.

No fim, Cruzeiro numa espécie de 5-4-1 variando para 4-1-4-1, com Guerreiro circulando entre as linhas (ou afundando entre os zagueiros), Magrão e Charles protegendo a área e Anselmo Ramon na frente para reter a bola como pivô

A partir daí, portanto, o Palmeiras não teve mais tanto volume e o jogo voltou a se equilibrar. O Cruzeiro novamente teve chances de matar o jogo, inclusive com Tinga em arremate que Bruno defendeu. Borges e Montillo sairiam ainda para as entradas de Anselmo Ramon — para reter a bola e esperar a chegada dos companheiros — e Souza — que entrou mais para marcar pelo lado esquerdo do que para passar. O jogo seguiu até o fim com o Palmeiras tentando mais na base da raça, mas o Cruzeiro estava bem postado e só era ameaçado nas bolas paradas, devido ao excessivo número de faltas — foram 30 durante o jogo. Foi numa bola parada que o Palmeiras concluiria impedido para o gol. Tivemos sorte de Marcos Assunção não estar em campo.

Os erros da arbitragem não escondem a boa atuação cruzeirense. Destaque, novamente, para o novo posicionamento de Montillo, ponteiro esquerdo do 4-2-3-1, inclusive fazendo funções defensivas nunca antes vistas. Wallyson também se destacou do outro lado, fazendo algumas inversões e ajudando Borges na área, mas precisa ser mais aplicado na recomposição para não dar espaço ao lateral adversário. Charles fez uma boa partida, porém pode se apresentar ainda mais ao ataque como elemento surpresa, sendo o homem que sobra no meio-campo.

Não há razão para mudar o time para o jogo contra a Ponte Preta. Se Celso Roth conseguir fazer com que Montillo e Wallyson mantenham a aplicação tática na recomposição pelos flancos, este 4-2-3-1 tem tudo para ser o esquema base e titular do Cruzeiro. Claro que sempre há espaço para melhorar, como por exemplo, fazer menos faltas: o Cruzeiro é, disparado, o time mais faltoso do campeonato. Mas chegou a hora de dar uma cara ao time, definir qual é o jeito de jogar, qual o esquema base, e treiná-lo exaustivamente.

Só assim poderemos sonhar com algo mais do que uma vaga na Sulamericana neste campeonato.

Corinthians 2 x 0 Cruzeiro – Xeque-mate

No jogo de xadrez que a partida contra o Corinthians certamente seria, Celso Roth perdeu para Tite. O treinador corintiano mostrou que, mesmo sem brilho, um time aplicado taticamente consegue controlar o jogo e errar menos para construir a vitória.

Na volta do 4-2-3-1 diagonal, WP e Magrão mal como ponteiros, e Sandro Silva se preocupando somente com Paulinho sem sair para o jogo

Celso Roth “atendeu” aos meus apelos e voltou ao 4-2-3-1 diagonal, mas um pouco diferente dos anteriores: a meta de Fábio foi defendida por Ceará pela direita e Diego Renan pela esquerda, flanqueando Léo e Mateus; estes eram protegidos por Leandro Guerreiro, ligeiramente pela direita, Sandro Silva um pouco mais avançado e mais à esquerda, e William Magrão, fazendo um híbrido de meia e terceiro volante, mais aberto pela direita. Montillo articulava pelo centro caindo pelas pontas, Wellington Paulista caía mais pela esquerda mas ficava mais avançado — daí o “diagonal”.  No centro do ataque, Borges.

Tite mandou um 4-2-3-1 “clássico” a campo, mas sem um centroavante de área, por vezes parecia um 4-2-4-0, devido à intensa movimentação do quarteto ofensivo. O goleiro Cássio viu sua dupla de zaga Chicão e Paulo André formarem a linha defensiva com Alessandro pela direita e Fábio Santos do outro lado. Ralf e Paulinho na dupla volância, o primeiro mais preso, à esquerda, o segundo saindo mais para o jogo, à direita. Jorge Henrique e Romarinho fechavam os lados do campo e Emerson e Danilo alternavam entre o comando do ataque e a criação central.

Quando dois 4-2-3-1 se enfrentam, os duelos naturais são: lateral contra ponteiro nos quatro cantos do campo, dois zagueiros contra um centroavante nas duas áreas e dois trios no meio, normalmente com um volante se ocupando do meia central adversário e o outro volante mais livre. Assim foi: Guerreiro se ocupava com Danilo e Ralf com Montillo: sobravam Sandro Silva e Paulinho. Teoricamente, ambos deveriam sair mais para o jogo, mas o que aconteceu foi que Sandro ficou por conta de marcar as investidas de Paulinho quando o Corinthians tinha a bola. Até funcionou, mas isso deixou o Cruzeiro sem muitas opções de saída, já que os laterais apoiavam pouco, presos pelos ponteiros adversários, e William Magrão marcava mais do que jogava. WP recuava para buscar o jogo mas ficava isolado contra dois ou três corintianos e perdia a bola.

Por isso, até os 20 minutos, o jogo seguiu equilibrado, sem muitas chances de gol para cada lado. Mas havia uma diferença clara: ambos os times marcavam muito, mas enquanto o Cruzeiro era forçado ao erro quando era pressionado, o Corinthians conseguia encaixar uma sequência de passes, fazendo os jogadores cruzeirenses correrem mais atrás da bola do que os adversários. Assim, o Corinthians conseguia impedir as jogadas adversárias forçando o passe ruim ou a devolução da posse, enquanto o Cruzeiro chegava atrasado e fazia mais faltas. Sandro Silva, sem ritmo de jogo, seria amarelado já aos 14 minutos por cometer seguidas infrações consecutivamente.

Este amarelo viria a ser crucial na partida momentos depois. Sandro Silva, em um lance em que tinha a bola controlada e era só clarear para frente, tentou sair jogando, errou o tempo da bola e ela escapou, muito mais para Jorge Henrique, já dentro da área, do que para ele próprio. Assim que ele partiu para tentar dividir a bola, este blogueiro previu o pênalti acontecendo. Carrinho imprudente, pênalti indiscutível. Só não foi pior porque o árbitro da partida, Leandro Vuaden, errou ao não mostrar o segundo amarelo para o jogador.

Chicão converteu o pênalti e pôs o time da casa em vantagem. E se o juiz não expulsou Sandro do jogo quando deveria, foi o próprio técnico Celso Roth quem o fez: “expulsou” o jogador via substituição, temendo o inevitável cartão vermelho, e lançando Fabinho em seu lugar. Com isso, Magrão foi para a esquerda segurar Paulinho e Fabinho foi jogar aberto pela direita, mas como atacante. O Cruzeiro se configurava num 4-2-1-3 ainda no primeiro tempo.

Tite respondeu mudando seus jogadores de posição. Romarinho inverteu para tentar jogar mais avançado às costas de Diego Renan, e Jorge Henrique veio para o lado esquerdo mais recuado, fazendo um 4-2-3-1 diagonal que era quase um losango de meio-campo. A intenção era clara: dominar a posse de bola no meio-campo, fazendo quatro jogadores contra três, e foi isso o que aconteceu. Depois do gol o Cruzeiro passou a ser pressionado em sua própria área, e não conseguia sair dela. Todas as segundas bolas eram dos mandantes, e o segundo gol só não saiu ainda na primeira etapa porque temos Fábio debaixo das traves: o camisa 1 fechou em cima de Romarinho, que tentou encobri-lo ao receber lançamento de Emerson.

Os times voltaram do intervalo sem mudanças. Talvez Celso temesse queimar a segunda substituição ainda no intervalo, o que é um argumento plausível, mas era hora de arriscar. Para a sorte do treinador, Tite desconfiou do poderio de ataque celeste e recuou seu time para jogar em velocidade nos contra-ataques. Os volantes cruzeirenses tiveram mais tempo na bola em algums momentos, com a marcação corintiana variando na pressão alta e no bloco médio. Porém, novamente os passes errados apareceram novamente, e o Corinthians jogava extamente aí: em um lance, a bola já havia sido perdida pelos atacantes da casa, mas ainda estava em disputa. Magrão recuou para Diego Renan, que recuou de primeira para Fábio, sob pressão de Fábio Santos. O goleiro tentou dar um chutão para frente, a bola pegou na mão do lateral corintiano, o juiz nada marcou e ele cruzou para Emerson, sozinho e sem goleiro, furar.

O estreito e cambaleante 4-2-2-2 do fim da partida, com WP e Borges de vez no ataque, Souza tentando passar mas errando e com os laterais apoiando pouco; Fabinho entrou, mas saiu e por isso não está neste diagrama

Celso esperou 15 minutos para tirar Ceará do jogo e lançar Marcelo Oliveira, com Diego Renan indo para a direita. O treinador revelou na entrevista coletiva após o jogo que Ceará havia se contundido. Portanto, substituição nula em termos táticos. Somente aos 25 ele tentaria mudar novamente a partida, com sua última troca: Souza na vaga de Fabinho, que havia entrado no primeiro tempo. O resultado foi um estreito 4-2-2-2, com Borges e WP se transformando em centroavantes de vez e com os flancos teoricamente abertos para os laterais apoiarem, e fazer cruzamentos na área. Mas Tite plantou seus laterais e, com os ponteiros recuando para ajudar na marcação, fazendo dois contra um de cado lado, as chances de cruzamento se tornaram raras. Mesmo quando o jogador conseguia chegar ao fundo para cruzar, errava.

Só aos 38 do segundo tempo é que Tite foi fazer a primeira mudança — sinal de que as coisas iam bem para ele, e mal, muito mal para nós. Edenilson entrou no lugar de Romarinho para fazer um losango no meio: Ralf atrás, Edenilson na direita, Paulinho na esquerda e Danilo à frente, com Emerson e Jorge Henrique no ataque. Foi o movimento final para matar a tentativa de apoio pelos lados do Cruzeiro: com dois atacantes, pelo menos um dos laterais tinha que ficar para fazer a sobra, diminuindo muito o já baixo poderio ofensivo do Cruzeiro. Guerrero, centroavante de ofício peruano, ainda estrearia pelos paulistas no lugar de Emerson, para tentar fazer o pivô e reter a bola no ataque para chegada dos seus companheiros.

O jogo caminhou para seu final melancólico, com o Corinthians dominando as ações e o Cruzeiro já entregue. O gol de Paulinho foi só a ilustração do que aconteceu durante todos os 90 minutos: com facilidade, Jorge Henrique achou Danilo no meio, que tocou de primeira a Paulinho, já partindo para receber e enganando a marcação. Com espaço, encaixou um chute tão rente à trave que Fábio nem foi na bola. O jogo terminou sem a terceira substiuição de Tite.

A impressão que ficou é que o Cruzeiro perdeu a chance de vencer um jogo teoricamente difícil. Afinal, perder para o Corinthians em São Paulo tem que estar nos planos de qualquer clube do Brasil, por isso o jogo de ontem foi uma chance de ouro para ganhar pontos certamente não previstos. Entretanto, o Corinthians, mesmo não jogando todo o seu potencial — assim como o Cruzeiro — conseguiu vencer o Cruzeiro até com certa facilidade. A culpa cai sobre Sandro Silva, claro, mas também sobre Roth, que escalou o volante sem ritmo para atuar desde o início. Se a intenção era parar Paulinho, porque não escalar Marcelo Oliveira ou Magrão? Porque deixar Fabinho no banco, que faz a função de ponteiro muito melhor do que WP ou Magrão? Ou ainda pior: porque escalar WP e Borges no mesmo time num 4-2-3-1? São perguntas difíceis de explicar.

Na última substituição, poderia ter sido melhor lançar Souza no lugar de um dos centroavantes ao invés de sacar Fabinho. Souza entraria centralizado e Montillo poderia jogar aberto, tendo uma única referência no ataque. Acredito que assim o Cruzeiro teria força tanto pelo chão quanto pelo ar. Porém, Celso disse, após o jogo, que precisava de um passador, e eu concordo; mas ao mesmo tempo, optou por deixar dois centroavantes dentro da área para aproveitar uma jogada aérea que nunca aconteceu. Passador e jogadas aéreas — não me parece coerente.

Por fim, deixo as seguintes estatísticas do jogo, de acordo com números da ESPN Brasil, para reflexão: quem mais desarmou foi Jorge Henrique — um ponteiro — 4 vezes; Quem mais finalizou foi Danilo, apenas 2 vezes; e a mais incrível de todas: das 6 finalizações do Cruzeiro, 6 foram erradas.

Isso mesmo. Aproveitamento zero.

Evolução da porcentagem de acerto de finalizações do Cruzeiro: nota zero no último jogo

Cruzeiro 1 x 3 Grêmio – Irreconhecível

O título acima é um jargão futebolístico bastante usando. Serve para descrever resumidamente a atuação muito abaixo do que se espera de um time de futebol. Portanto, é um título apropriado, mesmo porque este blog trata de tática — e o Cruzeiro esteve, de fato, irreconhecível taticamente.

Cruzeiro num 4-3-1-2 losango, com zero profundidade pelos lados do campo e um ataque inerte – difícil de explicar porque Celso mandou esta formação a campo

Celso Roth surpreendeu a todos escalando Marcelo Oliveira no meio-campo. O volante jogou pela esquerda num inexplicável 4-3-1-2 losango, tendo o estreante Borges acompanhado por Wellington Paulista à frente, uma combinação de ataque pouco móvel e lenta. A saída de Fabinho é um mistério. Talvez Roth tivesse ficado com receio de perder a batalha no meio, já que Luxemburgo manteve seu preferido esquema com 4 no meio-campo, mesmo com a estreia confirmada de Elano. O meio-campo gremista, no entanto, tinha dois meias mais claros, ou seja, um 4-2-2-2 com Elano pela esquerda e Zé Roberto pela direita.

Assistindo ao vivo das arquibancadas, a primeira coisa que veio na cabeça deste blogueiro quando saíram as escalações foi a de que seria um jogo sem amplitude. Sem jogadores caindo pelas pontas mais claramente, o jogo tendia a ser concentrado entre as duas intermediárias. E assim foi, com o Cruzeiro tomando mais a iniciativa, mas sem grandes perigos de lado a lado, exceção feita em um cabeceio de Borges em bola alçada por Leandro Guerreiro pela direita — mas de uma posição mais recuada.

Com o jogo preso no meio e a falta de jogadas pelas laterais, o caminho para tentar algo diferente era — obviamente — os lados do campo de ambas as equipes. Atrás de mim na arquibancada, saíam gritos insistentes de “abre o jogo, abre o jogo!”. Estava claro que fizesse a primeira jogada bem trabalhada pelo setor levaria muito perigo ao gol adversário, e para nossa infelicidade, foi o Grêmio quem o fez. Na aproximação de Elano e Kléber com o lateral Tony, Everton e Leandro Guerreiro foram sobrecarregados e Elano fez a ultrapassagem pela esquerda para receber passe profundo de Kléber. Com muita liberdade, o estreante cruzou na cabeça de Marcelo Moreno, destaque da partida, que ganhou de Léo para vencer Fábio.

Nem bem a bola rolou novamente e o Cruzeiro tomou outro gol pelo mesmo lado. Desta vez, foi o próprio Tony que acreditou numa bola muito longa colocada por ele mesmo. Everton desistiu da jogada achando que a bola ia sair, mas o lateral conseguiu alcançar e, mesmo tendo o combate de Léo, mandou rasteiro para a área. Moreno, mais esperto que Mateus, tomou a frente e deu um toque sutil para trás, o suficiente para chegar a Kléber que estava de prontidão para concluir com muita liberdade. Efeito cascata: Everton saiu da bola, Léo teve que ir pra cobertura, saindo da marcação de Moreno, fazendo Mateus dar combate e deixando Kléber livre. Leandro Guerreiro só chegou depois que o camisa 30 já havia concluído.

Como aconteceu nas últimas partidas, o Cruzeiro saiu atrás no placar, e não poderia mais usar a estratégia da reatividade. Teria que sair ainda mais para o jogo. Já o Grêmio, ciente de que tinha construído uma imensa vantagem, contentou-se em cozinhar o jogo e repelir a investidas celestes — deixando claro que o Cruzeiro não deve apostar em uma proposta de jogo de iniciativa. A expulsão de Werley no fim do primeiro tempo pelo segundo cartão amarelo foi, por incrível que pareça, prejudicial ao Cruzeiro, pois significaria que o Grêmio iria se fechar atrás para segurar a vantagem, dificultando ainda mais a vida celeste.

Dito e feito: no intervalo, Luxemburgo sacou Kléber e mandou Vilson a campo, recompondo a zaga e fazendo duas linhas de quatro bem definidas, com Elano e Zé Roberto abertos e somente Moreno à frente. No Cruzeiro, Souza ia a campo na vaga do vaiado Everton, com Marcelo Oliveira passando à lateral esquerda. Montillo foi jogar aberto do lado direito com Tinga e Souza de meias: uma espécie de 4-3-3, já que Wellington Paulista não permanecia aberto pela esquerda do ataque. A alteração não funcionou, pois o Grêmio tinha agora seus flancos bem fechados e as duas linhas bem compactadas. Celso então colocou Fabinho em campo, algo que deveria ter feito desde o início, já aos 7 minutos da segunda etapa, no lugar de Diego Renan. Tinga passou a jogar na lateral direita, mantendo o 4-3-3. Montillo pela direita e Souza pela esquerda, protegidos por Leandro Guerreiro, passaram a compor o meio-campo celeste.

Mas o Cruzeiro pecou e muito em fundamentos básicos: passes e cruzamentos. O goleiro Marcelo Grohe foi pouco incomodado, já que os constantes erros de passe anulavam a possibilidade de criação de chances. Os poucos cruzamentos na área na área eram afastados pela zaga gremista. E com praticamente todo o time à frente e o meio-campo despovoado, somente Leandro Guerreiro ficava atrás da área adversária para pegar as sobras, contra 2 ou 3 do Grêmio. O resultado era previsível: na grande maioria das jogadas o Grêmio recuperava a posse nas segundas bolas, evitando que o Cruzeiro tivesse a bola por períodos prolongados, e conduzia-a sem dificuldades até o campo de ataque.

Foi assim que veio o golpe fatal: uma jogada de Souza (do Grêmio) pela esquerda do ataque. De posse da bola, o volante não teve marcação e avançou até um vazio atrás de Mateus, que estava cobrindo pelo a subida de Tinga para o ataque. Leandro Guerreiro foi atrás, mas marcou de longe, e o volante conseguiu achar Marcelo Moreno totalmente livre de marcação dentro da área. O atacante limpou o combate de Léo e bateu cruzado, sem chances para Fábio. Fim de jogo aos 19 do segundo tempo.

O desorganizado 4-3-3 cruzeirense do fim da partida, sem qualquer criatividade e super exposto na retaguarda

As três últimas substituições foram diretas: Borges por Anselmo Ramon, e no Grêmio Moreno por André Lima e Elano por Marquinhos. O Grêmio seguiu no 4-4-1 até o fim, senhor da partida, contra um Cruzeiro desesperado e já desorganizado, mesmo com um jogador a mais. A equipe pouco finalizou, a não ser em uma bicicleta de Anselmo Ramon dentro da área que Grohe defendeu e alguns chutes sem direção. No fim da partida, um lance que resume bem a falta de criatividade celeste: o time rodou a bola de um lado a outro, mas sem partir para definição nem arriscar um passe mais profundo. Coube a Léo, um zagueiro, se juntar à ação ofensiva, receber um passe, limpar a marcação e finalizar. Grohe pôs a escanteio.

Celso Roth resumiu assim a partida: “(…) Até o jogo estar 0 a 0, o Cruzeiro tinha iniciativa e estava bem, mas o gol alterou tudo, duas falhas lamentáveis nossas. Depois coloquei o Souza e o Marcelo pelo lado esquerdo, o Souza para passar a bola e abrimos o Montillo para os dois jogarem com velocidade, mas não funcionou. Tentei o Montillo pela meia, junto com o Souza, e colocamos o Tinga aberto pela direita para ter profundidade com três atacantes, mas não funcionou. E quando nada funciona, aí cria essa confusão, e o Grêmio foi superior.”

De fato, o Grêmio foi superior, mesmo com um a menos. Cogitei dar o título de “Como jogar com 10” para esta análise, mas este é um blog sobre o Cruzeiro e não sobre os outros times.

É de Celso Roth grande parte da culpa pela derrota de hoje. Claro, os jogadores erraram fundamentos básicos, mas o jogo seria menos perigoso se Fabinho estivesse em campo desde o começo, pois seguraria o lateral direito gremista, protegendo Everton um pouco mais. Além disso, escalar Borges e WP no mesmo não contribuiu para a mobilidade do time, que ficava a cargo de Montillo — novamente anulado pela marcação forte, desta vez do excelente volante Fernando — e Tinga, que correu por todos.

É mais sensato retornar ao 4-2-3-1 diagonal de volta contra a Portuguesa, mais cauteloso. Foi a postura reativa que nos levou à liderança, e é assim que temos que continuar a jogar. Vai contra as tradições cruzeirenses de times vistosos e propositivos, mas é o que podemos fazer hoje. Sair para o jogo, atualmente, é fatal para nós.

E não, não esqueci o gol de Wellington Paulista, cobrando pênalti no fim. Mas é que ele foi tão irrelevante que nem valeria a pena citá-lo.

Eu nem comemorei.

Botafogo 2 x 3 Cruzeiro – A camisa 10 não é por acaso

É claro que os números de camisa não obrigam um jogador a um determinado posicionamento em campo. Mas bastou ter uma companhia na extrema direita e voltar ao meio-campo para o futebol do Caballero Azul despertar novamente e quebrar a maldição do Engenhão, na vitória por 3 a 2 sobre o Botafogo ontem. Direta ou indiretamente, o argentino teve papel importante nos três gols da virada convincente do time celeste.

Cruzeiro do primeiro tempo num 4-2-2-2 pendendo pra o lado direito, com Souza lento, Marcelo Oliveira alto demais e muitas compensações defensivas

O Cruzeiro entrou no jogo com o mesmo onze da partida anterior, mas com uma mudança tática: Souza voltou ao lado direito e “puxou” o 4-2-2-2 cruzeirense para seu lado, já que ele pouco centralizava, forçando Tinga a fazê-lo para cobrir os avanços de Montillo, novamente usado como segundo atacante. Oswaldo de Oliveira armou o Botafogo no tradicional 4-2-3-1, com Vitor Júnior, Andrezinho e Maicosuel atrás de Herrera, e Renato mais livre que Jadson.

O detalhe tático mais importante do primeiro tempo foi o lado direito do ataque local, esquerdo da defesa celeste. Dois aspectos: com Tinga mais por dentro, Marcelo Oliveira tinha dois adversários para marcar, já que Lucas avançava sem ser incomodado. Além disso, o camisa 6 jogava frequentemente muito alto, talvez numa tentativa de explorar este espaço que havia no ataque, e o Botafogo tratou de aproveitar aquele setor. Charles e Tinga tentavam revezar a primeira marcação pela canhota, mas o primeiro frequentemente tinha que cobrir as investidas de Marcelo Oliveira e o segundo estava centralizado demais.

Assim, o Botafogo começou a controlar as ações através dos pés de Vitor Júnior, o extremo direito. O meia foi o melhor do primeiro tempo, criando várias chances para si e para seus companheiros. Sorte nossa que temos Fábio embaixo do gol e que eles têm Herrera, que perdeu duas chances excelentes de marcar. Ele próprio emendou uma finalização na rede por fora, e no lance do escanteio que originou o gol contra de Amaral, foi ele quem serviu Herrera mais uma vez, que dividiu com Léo e Fábio num lance estranho, e a bola acabou sobrando e se encaminhando lentamente para o gol, que o camisa 1 conseguiu mandar para fora.

Amaral, aliás, não fez uma má partida, mas ficou sobrecarregado na marcação de vários jogadores. Souza e Diego Renan até que conseguiam dar conta do recado pelo lado direito, mas quando ambos avançavam era o camisa 5 que fazia a cobertura. Ele também tinha de marcar Andrezinho, o articulador central botafoguense. Ainda bem que o meia não fez uma boa partida e, como já dito, o Botafogo escolheu mais o lado direito para atacar, com Maicosuel apagado na partida. Por isso o volante só apareceu no jogo na hora do gol contra, quando poderia ter sido muito pior.

Ofensivamente, o Cruzeiro pecou em dois aspectos: previsibilidade e lentidão. Souza, preso do lado direito, cadenciava demais o jogo, por duas razões: a característica dele é essa, segurar a bola, dar um ritmo mais lento ao jogo, e também porque ele não tinha opções para o passe rápido. Montillo era vigiado de perto por Jadson, que se afundava na defesa atrás do argentino; WP encaixotado entre os dois zagueiros, Diego Renan era bem marcado por Maicosuel e Amaral ficava mais preso na proteção à zaga. Tinga tentava ser opção, mas estava centralizado demais e era perseguido por Renato. O Cruzeiro só criou quando Montillo conseguiu se livrar da marcação e centrar a bola. Ela chegou a WP que tentou driblar seu marcador, mas recebeu um toquezinho leve no joelho, o suficiente para tentar cavar uma penalidade inexistente.

Cruzeiro lento e previsível, Botafogo veloz e com espaço pela direita. Assim foi o primeiro tempo, e os números comprovam: apesar de ter tido mais posse de bola (53%), comprovando o excesso de cadência, o Cruzeiro só finalizou uma vez, contra 8 do Botafogo. De nada adianta reter a bola se o time não souber o que fazer com ela.

No intervalo, Celso Roth fez o óbvio e tirou Souza do jogo. O meia não conseguiu dar profundidade pela direita, coisa que Fabinho fez muito bem. E logo de cara o jogo mudou, pois Montillo havia voltado à sua posição original e Fabinho foi ser o segundo atacante acompanhando WP. O veloz camisa 17 confundiu a marcação e congelou o lateral esquerdo Márcio Azevedo. Além disso, se tornava opção para o passe de Montillo, que buscava a bola no círculo central e avançava com liberdade e velocidade, como lhe é característico. O Cruzeiro passou a ter volume e ocupou o campo adversário.

Mas o futebol é futebol: justo quando estava melhor na partida, o Cruzeiro sofreu o segundo gol. Tinga perdeu uma bola para Renato no meio-campo, ela sobrou para Vitor Júnior que rapidamente enfiou uma bola longa para Herrera, entre os zagueiros do Cruzeiro. Mateus estava longe do camisa 9 botafoguense e foi pego de surpresa, mas nada pode fazer para evitar o gol. Surpreendentemente, o Cruzeiro não se abalou e logo no primeiro lance após a saída de bola, Fabinho, excelente no jogo, completou cruzamento de Marcelo Oliveira para mandar na trave e reafirmar a blitz no campo de ataque.

Celso Roth então soltou o time mandando Anselmo Ramon e Everton nas vagas de Tinga e Marcelo Oliveira. Estava formado o 4-2-1-3 da era Vágner Mancini, mas com Everton como opção de velocidade pelo lado esquerdo, Fabinho pelo lado direito e WP pela esquerda próximo a Anselmo Ramon, enfiado e brigando com os zagueiros. Os dois pecados do primeiro tempo foram resolvidos, e no primeiro lance de Anselmo, ele tabelou com WP e mandou na rede pelo lado de fora. Depois, recebeu passe de Montillo e dividiu com o goleiro Milton Raphael, a bola sobrou para WP, fora da área, que tentou encobrir o jovem arqueiro, mas sem sucesso.

Então aconteceu a virada. Primeiro, Montillo recebeu passe pela direita, tentou driblar seu marcador e acabou arrumando um escanteio. Na cobrança, a zaga afastou mal, Mateus concluiu e Anselmo desviou levemente para fazer o primeiro gol cruzeirense no Brasileirão 2012.

Um minuto depois, em um contra-ataque ultraveloz, Montillo conduziu com muito espaço e conectou a Anselmo Ramon na quina direita da área. Ele viu WP dentro mas viu também Everton erguendo os braços e correndo como um raio, sem marcação pelo outro lado. O impulso da corrida fez o cabeceio sair forte e vencer Milton Raphael.

A velocidade no gol de empate celeste: Montillo com muito campo pra avançar, e Everton livre pela esquerda para testar para o fundo das redes

O Botafogo se lançou à frente para buscar a vitória, mas o Cruzeiro não deixou o time da casa respirar, e mais alguns minutos depois, Fabinho recebeu uma bola longa, dominou com categoria e achou Montillo que ia escapando entre os zagueiros do time da casa. O goleiro dividiu com ele, mas cometendo falta. Pênalti que WP converteu contra seu ex-time.

O time que virou o jogo era um 4-2-3-1 que virava um 4-2-1-3 com a bola, muito mais equilibrado, veloz e atacando por todos os lados

Logo após o terceiro gol, que WP preferiu não comemorar, foi possível ver Celso Roth passando instruções para o camisa 9. Certamente foi para recuar pelo lado esquerdo para recompor o 4-2-3-1, deixando Anselmo Ramon sozinho à frente. Ele conseguiu bloquear bem os avanços de Lucas, de maneira análoga a Fabinho do lado direito. Oswaldo de Oliveira tentou um único movimento: puxou Vitor Júnior para o centro, tirou Andrezinho e lançou Elkeson pela direita. Isso acabou facilitando o trabalho de Everton, que conseguiu bloquear bem os avanços dele. Vitor Junior já não tinha mais o mesmo espaço para jogar e nada fez. O Botafogo seguiu tendo mais posse de bola mas não conseguiu produzir boas chances até o fim do jogo.

Conclusões deste jogo: primeiro, Montillo é meia, e fim de papo. O próprio Celso Roth admitiu na coletiva após o fim da partida que o argentino é bom driblador, porém não dá profundidade. Ora, se ele não dá profundidade, então porque escalá-lo como segundo atacante? Além disso, ele mesmo disse preferir atuar como camisa 10. Segundo, Tinga deve render melhor se jogar como segundo volante, ao lado de Amaral ou Leandro Guerreiro. Terceiro, Fabinho entrou muito bem e fez muito mais que Souza, que não é jogador de lado de campo, é central. Merece uma chance pelo lado direito. Quarto, talvez seja melhor dar uma chance a Everton no time titular, escalando-o na extrema esquerda, e prendendo Marcelo Oliveira, como foi na primeira partida contra o Atlético/GO. Isso geraria uma 4-2-3-1 torto a la Brasil 2010, mas com os lados invertidos. E quinto, Anselmo Ramon talvez faça melhor a função de referência do que WP. É o caso de se dar uma chance.

Meu time para o jogo contra o Sport, portanto, seria Fábio; DR, Leo, Mateus e MO; Amaral e Charles (Tinga); Fabinho, Montillo e Éverton; WP (Anselmo Ramon). No entanto, como só avalio os jogos, e o treinador está lá todo dia, não acredito que isso vá acontecer.

Mas que Montillo tem que voltar à meia central, ah, pelo menos isso tem.

Náutico 0 x 0 Cruzeiro – Em branco de novo

Mostrando evolução defensiva mais uma vez, mas com uma queda brusca de criatividade, o Cruzeiro não sofreu gol de um esforçado Náutico no Recife. Mas também não fez, num jogo fraco tecnicamente pela segunda rodada do Brasileirão 2012.

O 4-2-2-2 torto cruzeirense da primeira etapa: quem dá amplitude de ataque pela direita?

O esquema de jogo mudou de Celso Roth mudou em relação à primeira rodada, com Everton saindo para a entrada do recém-contratado Tinga. Ambos são volantes de origem que jogam como meias, mas a diferença é que Everton joga mais aberto, e Tinga centraliza mais – região onde Montillo atua mais costumeiramente. A solução encontrada por Celso Roth para escalar ambos foi adiantar o argentino, transformando-o num segundo atacante. Souza trocou de lado e foi para a esquerda, e o Cruzeiro ficou num 4-2-2-2 torto, com Charles novamente tendo mais liberdade do que Amaral para sair com a bola.

O Náutico de Alexandre Gallo entrou num 4-2-2-1. Não, eu não errei a conta: somente 9 dos jogadores de linha guardavam posição. Araújo era servido por Cleverson e Ramon, e os 4 defensores tinham a proteção de Elicarlos e Glaydson. Derley, o jogador que faltou, ficou com a missão de ser a sombra de Montillo, e perseguia o camisa 10 por todo o campo, onde quer que fosse, até mesmo quando a posse de bola era do time da casa. O resultado é que o esquema do Náutico ficou bem difícil de definir. Por vezes parecia mais um 3-4-1-2, já que Derley afundava na caça à Montillo e com isso os laterais puderam atuar bem avançados, alinhados aos volantes.

Com o recuo de Derley no encalço de Montillo, os laterais avançavam, quase se alinhando ao dois meias atrás de Araújo no 4-3-2-1 (3-4-2-1) do Náutico

O Cruzeiro começou o da mesma forma que contra o Atlético/GO: marcando alto no campo. Deu certo, pois ora o Cruzeiro retomava a posse em uma posição melhor, ora a qualidade do passe do time da casa era muito reduzida, ocasionando chutões ou passes afoitos, facilitando os desarmes. O resultado foi mais posse de bola, e como a escola Barcelona nos ensina, consequentemente mais passes e mais finalizações, correto? Errado. O Cruzeiro teve um aproveitamento tanto de passes quanto de finalizações menor do que na primeira rodada. Das 9 conclusões, só uma foi ao alvo, o pior aproveitamento entre todos os times nas duas rodadas, de acordo com números da ESPN Brasil.

Ainda, com Souza preso do lado esquerdo, Tinga mais por dentro e Montillo tentando ser um segundo atacante, o time pouco usava o lado direito do ataque. Quando Montillo caía por ali, sempre acompanhado de Derley, acabava cercado por mais adversários. Lúcio, sem ter a quem marcar, jogou avançado e prendeu Diego Renan. O resultado é que, neste jogo, o Cruzeiro concentrou 10,6% da sua posse de bola na ponta esquerda contra 6,39% do outro lado. Contra o Atlético/GO, estes números eram 5,6% e 12,21% respectivamente, um indício de quanto Souza é atualmente responsável por fazer a bola chegar ao ataque.

O Náutico, sem opções, optou por esperar o Cruzeiro em seu campo para jogar na transição ofensiva, também conhecida como contra-ataque. Mas não obtinha muito sucesso, já que a defesa azul estava bem postada e não deixava espaços aos atacantes pernambucanos. Além disso, o Náutico conseguiu ter um aproveitamento de passes ainda pior que o Cruzeiro: apenas 80,4% de acerto (contra 82,68%).

A solidez defensiva é boa notícia, mas isso se refletiu na criatividade do time. Como já dito, poucos passes trocados, pouca qualidade nos que eram e poucas finalizações no alvo, apesar da maior posse de bola no primeiro tempo. Souza se movimentava pouco, preso na esquerda, Montillo parou na marcação implacável de Derley e Tinga foi um lutador, aparecendo para jogar em todos os setores do campo, mas recebendo poucas bolas e dando passes mais seguros (como se espera dele). Assim, foi uma primeira etapa chata, a não ser por uma bobeada de Fábio ao dominar com os pés que o Náutico não conseguiu aproveitar, e por um lance curioso do juiz que “desexpulsou” Charles ao transferir o que seria o segundo cartão amarelo do volante para Diego Renan, que também estava no lance. Sorte do camisa 7, pois foi ele de fato quem fez a falta.

No fim, Cruzeiro num 4-3-1-2 muito defensivo, com vários jogadores recuando demais

No segundo tempo o Náutico veio com mais gás, ou o Cruzeiro veio com menos, e a pressão alta já não era exercida. Com William Magrão, mais um estreante, no lugar do amarelado e “desexpulso” Charles, o Cruzeiro manteve o esquema, mas decidiu se afundar e sair na boa, dando liberdade para o primeiro passe dos volantes do Náutico. Derley até esqueceu Montillo por alguns momentos para tentar uma jogada mais profunda para seus companheiros, que agora tinham Rhayner e Souza nos lugares de Cleverson e Glaydson. O primeiro jogou como meia-atacante, fazendo mais companhia a Araújo; o segundo entrou como volante pela esquerda, no mesmo local onde Glaydson atuava: seis por meia dúzia em termos táticos, mas com pernas descansadas e com mais liberdade para infernizar a vida de Diego Renan e Amaral. Era um 4-3-2-1 com cara de 4-3-1-2.

A qualidade defensiva mostrada no primeiro tempo aos poucos foi sendo minada, com algumas falhas individuais que poderiam comprometer todo o plano. O trio ofensivo do time de Pernambuco promovia movimentação e atuavam sempre próximos, tentando confundir a marcação azul. Diego Renan ficou cada vez mais preso, e os volantes já não tinham liberdade para manter a posse da bola, mesmo que ineficiente, como no primeiro tempo. A situação estava se invertendo.

Aos 15, Celso Roth enxergou o óbvio e sacou Souza, mais lento, e promoveu a entrada de Everton. O volante foi jogar na mesma posição que jogou no primeiro jogo, aberto pela esquerda. Mas infelizmente a situação não mudou: o Náutico continuava encurtando os espaços e até obrigou Fábio a fazer algumas defesas difíceis. Alexandre Gallo então soltou o time de vez, com Rodrigou Tiuí na vaga de Ramon para fazer um 4-3-3, e Celso Roth respondeu logo em seguida lançando Wallyson no lugar do cansado Tinga. Wallyson foi fazer companhia ao inoperante WP e Montillo recuou para sua posição de origem. O Náutico tinha, de fato, apenas um volante, principalmente se considerarmos que Derley continuava vigiando Montillo de perto, e o argentino o arrastava para fora de posição (se é que havia uma para o camisa 150).

O Cruzeiro só foi ter uma posse de bola mais tranquila aos 29 minutos, que parou num impedimento de WP. Pouco para quem marcava pressão com sucesso no início da partida a agora recuava suas linhas para tentar um chutão de contra-ataque para os atacantes. Até Montillo, que normalmente não recua tanto, estava jogando à frente da sua própria área cercando os espaços do trio ofensivo.

6-3-1?

Mas não teve de fazer muito esforço, já que o Náutico martelava, mas já não finalizava tanto e se contentava com jogadas de bola parada. Talvez pelo cansaço do adversário, nos últimos minutos o Cruzeiro conseguiu segurar mais a bola, mas sem o ímpeto do ataque. Só podia dar em um zero a zero entediante.

Jonathan Wilson, autor do livro Inverting the Pyramid: A History of Football Tactics, disse bem em seu blog no The Guardian: “Simetria não é essencial, mas o equilíbrio é”. O Cruzeiro jogou sem simetria mas mostrou que agora sabe se defender melhor. Mas agora precisa encontrar equilíbrio e mostrar que sabe atacar também, como o próprio Roth disse na coletiva após o jogo.

Melhor pra ele, pois aqui é Cruzeiro: futebol ofensivo sempre foi a nossa marca. Chega de zero a zero, eu quero é ver gol.