Mesmo sem os considerados titulares Bruno Rodrigo, Souza e Luan, suspensos, o Cruzeiro se impôs no Mineirão contra o Vitória. A manutenção da qualidade do futebol apresentado prova que o elenco celeste é muito bom, quiçá um dos melhores do país. Taticamente, a partida mostrou um Cruzeiro que sabe se adaptar sem alterar seu estilo, e que consegue atacar por todos os lados com a mesma qualidade.
Além disso, a goleada “recuperou” o saldo perdido nos últimos jogos, quando a produção ofensiva não tinha sido a mesma do restante da temporada, muito por causa do alto índice de chances criadas e não aproveitadas — que ainda persistiram nesta partida, mas em menor grau.
Os onze
As três suspensões já obrigariam Marcelo Oliveira a mudar mais peças do que a média das últimas partidas. Porém, ainda mais trocas foram feitas: Mayke retornou e Borges entrou na vaga de Vinicius Araújo. Quase metade do time estava modificado, portanto, mas a estrutura tática se preservou. O 4-2-3-1 teve Fábio no gol, com Mayke e Egídio flanqueando Dedé e seu novo parceiro de zaga Léo. À frente da área, Nilton teve a seu lado Lucas Silva na volância, e Éverton Ribeiro e Ricardo Goulart foram acompanhados por Willian na linha de três meias, tendo Borges no comando do ataque.
Caio Júnior armou o Vitória num 4-3-2-1 que variou para um 4-3-1-2, mas com o meio-campo sem formar um losango. Os volantes, Cáceres, Michel e Luís Alberto fizeram um parede à frente da área, uma linha de três homens bloqueando as ações pelo centro. Atrás deles, a linha defensiva tinha os jovens Dimas e Euler nas laterais direita e esquerda respectivamente, com os zagueiros Victor Ramos e Fabrício defendendo o gol de Wilson. Na frente, Renato Cajá tinha a missão de armar o jogo partindo do centro, com Vander a princípio mais recuado à esquerda e Maxi Biancucchi sozinho à frente.
Dando a volta no “muro”
O posicionamento defensivo do Vitória, inicialmente, pareceu ter dois objetivos: primeiro, fechar o lado direito, principalmente com Vander perseguindo Mayke; e segundo, bloquear as ações pelo centro, com os três volantes bem recuados e centralizados. Com isso, tinha campo para avançar até a intermediária ofensiva, quando Cáceres subia o posicionamento para bloquear o camisa 6. Porém, sem Luan à sua frente para fazer a jogada de pivô e receber de volta, Egídio não procurava tanto Willian, e o jogo não fluiu tanto por aquele lado.
Mas Ricardo Goulart e Éverton Ribeiro, vendo o congestionamento à sua frente, começaram a se movimentar. Goulart procurava os flancos para fugir do muro de volantes, se apresentando com a primeira opção de passe dos laterais. E Ribeiro, além de fazer sua rota regular, saindo da direita para armar o time do centro, desta vez também deu profundidade pela direita, vendo o espaço que o jovem Euler dava por ali, levando ampla vantagem. Primeiro recebeu um lateral de Mayke para cruzar rasteiro e Willian concluir em cima de Wilson, e depois ao limpar a marcação do lateral baiano pra dentro e bater para Wilson espalmar e ceder o escanteio que originou o primeiro gol.
Vander
Não se sabe ao certo porque Caio Júnior decidiu inverter Vander de lado. Talvez ele estivesse considerando que Egídio, sendo a principal saída cruzeirense no jogo, pudesse crescer na partida e se tornar mais uma ameaça. O certo é que, depois do gol, o atacante baiano se posicionou bem aberto pela direita, combatendo Egídio assim que o lateral recebia a bola. Se antes era o camisa 6 quem tinha espaço, desta vez foi Mayke quem tinha mais liberdade. Renato Cajá tentava compensar, saindo do centro para acompanhar o lateral.
Funcionou em certa medida, mas o Cruzeiro continuou a criar e chutar a gol, dominando amplamente a posse de bola. O Vitória só finalizou três vezes no primeiro tempo, sendo duas apenas nos minutos finais. Já o Cruzeiro parecia que seria novamente atacado pelo “fantasma do pé torto”: 8 finalizações, sendo 3 certas (com um gol), 3 erradas e 2 bloqueadas.
Segundo tempo
Mas só parecia. Pois no intervalo Caio Júnior tirou um de seus volantes, Michel, para dar lugar a Dinei, centroavante de ofício, coisa que Maxi Biancucchi nunca foi. O argentino foi jogar atrás de Dinei, empurrando Renato Cajá de vez para o lado direito, formando um 4-2-3-1. A marcação encaixou, mas Éverton Ribeiro continuou levando muita vantagem sobre Euler, que não sabia como marcar o camisa 17 celeste. Renato Cajá não tinha poder de marcação suficiente para acompanhar Mayke, significando que o Cruzeiro fez a festa pelo lado direito, de onde saiu o segundo gol: Ribeiro, bem aberto pela ponta, recebeu de Nilton e viu Mayke passar como um raio às suas costas. Bola pro garoto, que chutou rasteiro e contou com o desvio do zagueiro para fazer seu primeiro gol como profissional. Já era hora.
Caio Júnior finalmente percebeu a mina de ouro que estava entregando ao Cruzeiro e tirou o garoto Euler do time, lançando o zagueiro Reniê, que foi fazer parceria com Victor Ramos no miolo de zaga. Com isso, Fabrício foi deslocado para a lateral esquerda. A tentativa de aumentar a marcação naquele lado era clara. A resposta de Marcelo Oliveira foi imediata: colocou Élber, mais incisivo, na vaga de Everton Ribeiro, provavelmente pensando em poupar o meia para a partida da Copa do Brasil contra o Flamengo. E na sua primeira jogada, Elber já mostrou a que veio, deixando Fabrício sentado no chão antes de concluir para a defesa de Wilson.
Impassível
Mesmo antes do pênalti cometido atabalhoadamente por Dedé em Dinei, Marcelo já preparava sua segunda mudança: Martinuccio na mesma ponta esquerda onde estava o pouco participativo Willian. E mesmo com a conversão da penalidade, Marcelo não modificou sua substituição — sinal de que confia no seu elenco e não viu o resultado ameaçado em nenhum momento. E pouco tempo depois a mudança já surtiria efeito: passe de Egídio, jogando como meia, para Martinuccio levar até o fundo e cruzar na testa de Borges e aumentar a conta.
Logo após o gol, Caio Júnior mexeu pela última vez, trocando Vander por Marquinhos, sem alterar o sistema, talvez para dar mais folêgo ao time. Mas o jogo já estava resolvido, e a defesa baiana seguiu dando espaços. O Cruzeiro passou a dominar amplamente, e consagrou o goleiro baiano Wilson. É até estranho dizer que o goleiro foi o melhor adversário em campo numa partida que terminou em goleada, mas foi o que aconteceu. Tanto Ricardo Goulart quanto Martinuccio tiveram chance de aumentar a conta, até que finalmente, Goulart fez o trigésimo gol celeste no certame em cruzamento de Élber, lançado na velocidade por Nilton.
Marcelo Oliveira ainda tinha uma troca a fazer, e quis dar moral para o garoto Vinicius Araújo, lançando-o na vaga de Borges. Ele não decepcionou: cabeceou firme pro fundo do gol a cobrança de falta pela esquerda de Egídio, fechando a goleada.
Variado e qualificado
Mais uma vez, um adversário é goleado no Mineirão pelo melhor ataque do Brasileirão. Não é pra menos: das 264 conclusões do Cruzeiro até aqui, nada menos do que 115 foram no alvo, o que coloca o Cruzeiro como o terceiro melhor aproveitamento de finalizações (43,56%), atrás de Grêmio (43,68%) e Ponte Preta (44,58%) — mas é preciso levar em conta que estas equipes tem números bem menores em total de finalizações (174 e 166, respectivamente).
Porém, o principal aspecto tático da partida foi que, mesmo com tantas peças modificadas, o time continuou jogando da mesma forma, mas se adaptando dentro de campo para sobrpeujar os diferentes esquemas defensivos dos adversários. Aparentemente, jogar contra o Cruzeiro é o problema do cobertor curto: se você cobre um setor, abre o outro para que o time ataque com a mesma qualidade (se não ainda melhor). O Cruzeiro é uniformemente bom em todos os setores: direita, centro e esquerda; zaga, meio-campo e ataque.
É claro que, quando há trocas, as características mudam. Por exemplo, como ponteiros esquerdos podem jogar Luan, Martinuccio e Dagoberto — jogadores muito diferentes. Assim como Élber, Everton Ribeiro e Willian, pela direita. Ou Borges e Vinicius Araújo na frente; Júlio Baptista e Ricardo Goulart por dentro; Lucas Silva, Henrique, Souza e Nilton — isso só mostra como Marcelo Oliveira tem opções de qualidade para mexer no time sem alterar muito a estrutura tática.
Um treinador disse uma vez que bons times ganham jogos, mas bons elencos ganham campeonatos. Mais uma razão para acreditar-se que o Cruzeiro está, sim, muito bem na briga pelo caneco.
Falou (ou escreveu) tudo! Se o adversário se protege contra o Egídio, vem o Mayke pelo outro lado. Se marca os laterais, tem o meio pros nossos volantes de qualidade saírem jogando. Se fecha também o meio, estica direto pro Luan (ou Borges) escorar enquanto o time chega. E como atacar um time cuja zaga ganha quase todas pelo alto (Dedé o 3o. e Bruno Rodrigo, 8o. em rebatidas no CAMPEONATO segundo o Footstats) e que tem meias que acompanham seus laterais?
Claro que não somos imbatíveis. Coritiba, Santos e o Atlético Mineiro mostraram que é possível nos neutralizar com compactação e, principalmente, intensidade. Mas quantos times no campeonato conseguem fazê-lo?
Cristiano,
Análise perfeita, como sempre.
Você mencionou o Willian. A participação dele foi pequena sim, mas a qualidade do toque que ele possui ficou clara em um lançamento longo que ele fez para o Ribeiro, no lance que gerou o escanteio do gol e uma outra jogada que ele cruzou na cabeça do Borges. Uma curiosidade dos dois lances foi que ele teve de inverter o pé, pois estava na esquerda e é um jogador destro. Digo isso, pois acho que quando ele for escalado na direita e se entrosar melhor, tende a ser uma ótima opção de ataque, pois tem o passe refinado. Inclusive o Marcelo tem mostrado que confia nele.
A volta do Borges foi boa para dar uma sacudida no time. Ele (Borges) sabe que tem uma sombra no banco e o Vinícius está estimulado a mostrar serviço, isso é bom para o time.
No mais, está dando gosto ver o time jogando, variações de jogadas, raça, empenho por parte dos jogadores, o time respeita sem se intimidar pelos adversários.
Um nome que você pouco mencionou foi o do Lucas Silva. Ele foi muito elogiado pela imprensa, bom sinal, significa que a nossa base está mostrando solidez. Alias, que belo trabalho tem sido feito nas nossas categorias de base, mostrado não só pelos títulos, mas pelos jogadores que dispomos no time profissional. Poderíamos ter facilmente, em caso de necessidade, um time com Rafael, Mayke, Lucas Silva, Elber, Alisson e Vinícius Araújo, seis jogadores da base em condições de apresentarem bom futebol.
Avante Cruzeiro!
Rodrigo,
Mesmo o time tendo sido em parte neutralizado, conseguiu criar esbarrando nos erros de finalização, isso é o mais interessante.
O ponto chave é manter os pés no chão e a pegada. Algumas derrotas e tropeços acontecerão, e é até bom para a equipe colocar os pés no chão. O time nunca pode perder o foco e o gás durante o campeonato.
Outra coisa, o Cristiano frisou a posição do Marcelo em manter a entrada do Martinuccio mesmo diante do gol sofrido, mostra o domínio e a confiança que ele tem na equipe, bom sinal!
Um detalhe: Borges no lugar de Vinícius Araújo. Como Borges fica mais preso entre os zagueiros, Ricardo Goulart teve menos espaço para penetrar na área e assim, participou mais da armação das jogadas.
Nos outros jogos, a movimentação de V.Araújo para a infiltração de Goulart foi boa, mas às vezes sobrecarrega o time na armação, com os laterais e volantes errando passes por não ter opção a quem passar a bola.
Boa observação, João Paulo, mas colocar o Willian na direita é só quando o Ribeiro não jogar… Porque nosso camisa 17 é titularíssimo naquele setor. Além disso, gosto de ponteiros de pés invertidos, a la Bayern de Munique. Ainda mais com laterais tão ofensivos como os nossos. Com o pé trocado, a tendência é centralizar e abrir o corredor para o lateral apoiar.
Quanto a Lucas Silva, achei que ele foi bom defensivamente, mas ainda precisa ter mais chegada ofensiva, participar mais da construção de ataque. Talvez pela postura do Vitória, que bloqueou o centro. Com mais espaço por ali, quem sabe ele aumenta sua participação no ataque.
Eu também ia colocar uma observação sobre a base, mas o post acabou ficando grande demais de deixei de fora: no fim do jogo, tínhamos nada menos do que quatro jogadores formados em casa jogando no time de cima. Acho que isso dá uma ideia de como nossa base vem sendo bem aproveitada.
Muito bem colocado, Bruno. Por isso que eu digo sempre, pode ser a mesma posição, mas a característica é totalmente diferente. E isso muda o jeito do time jogar, mesmo mantendo o sistema tático. Quase nunca é trocar seis por meia dúzia.
Acho interessante como o MO trabalha os jogadores da base, dando espaço aos poucos, sem colocá-los em roubadas e, ao mesmo tempo,confiando neles em percalços. Mayke substituiu Ceará numa final, no setor de Ronaldinho Gaúcho e jogou bem. Por isso concordo com sua provável opção de não colocar Lucas Silva como titular contra o Flamengo. Jogo parrudo, sem margem pra erro, melhor não inventar (ainda que o menino tenha dado melhor cobertura a Egídio)
Cristiano,
O Willian está flutuando no ataque, sem guardar posição fixa pela esquerda como o Luan. Mas, até pelo fato do Ribeiro partir da direita para o centro, acho que ele tem lugar sim pela direita, sem embolar muito. Principalmente quando o Ceará for a opção na lateral direita e, talvez o principal, a depender da partida e do adversário.
Quanto ao comentário do Bruno, perfeita leitura. Não sei até que ponto a montagem foi pensada neste sentido, o de ter dois ou mais jogadores por posição, mas com características distintas dentro do campo, fato é que temos este perfil em várias posições. Méritos para o Marcelo e o Alexandre Matos.
Outro detalhe legal, assisti uma reportagem sobre a conquista da tríplice coroa. O Zinho estava comentando sobre o fato do time ter várias opções, o que força alguns jogadores renomados, como o próprio Zinho, a figurarem no banco em vários jogos. Ele disse que o time e a comissão técnica sabiam que um dos fatores chave para vencer o campeonato seria o grande número de opções no elenco. Ele comentou que os jogadores entenderam que participar do grupo era importante, aceitando a condição de reserva em algumas partidas. Na reportagem, o Luxemburgo chegou a afirmar que nem ele sabia ao certo o time titular da época, dado o grande número de jogadores do plantel e a rotatividade do mesmo. Fiquei empolgado, pois é a mesma filosofia adotada este ano.
Avante Cruzeiro!