Depois de tomar um baile tático no primeiro tempo, Celso Roth errou na primeira mas acertou na segunda substituição, abrindo caminho para o maior placar cruzeirense do Campeonato até aqui.
Primeiro onze
Roth repetiu o sistema pelo quinto jogo seguido, mandando a campo um 4-3-1-2 losango formado por Fábio no gol, Léo novamente mais preso na lateral direita, Everton mais solto na esquerda, e Rafael Donato e Mateus fechando o centro da defesa. De volta ao time, Leandro Guerreiro foi a base do meio-campo, que ainda tinha Tinga pela esquerda e Charles pela direita. Substituto do vetado Montillo, Souza foi o homem de ligação no topo do losango, pensando o jogo para Wallyson e Borges.
Alexandre Gallo certamente estudou as partidas do Cruzeiro. O Náutico entrou armado num 3-4-2-1 variava para um 3-5-1-1, lotando o meio campo. O gol de Gideão foi protegido por Ronaldo Alves, Alemão e Jean Rolt. No meio, uma linha defensiva alta, com Patric na direita correndo por todo o flanco com Everton, João Paulo na esquerda tentando explorar as costas de Léo, e Dadá e Souza combatendo muito pelo centro, junto com Martinez, que tinha mais liberdade para se juntar ao ataque formado por Lúcio atrás de Araújo.
Alta densidade demográfica
Logo nos primeiros minutos já ficava claro a tônica da primeira etapa: o time visitante, com dois homens a mais no meio-campo, tinha mais opções de passe e ficou mais com a bola no pé. Os jogadores cruzeirenses apertavam a marcação, mas sempre havia um pernambucano livre. Porém, com poucos alvos à frente, o meio-campo do Náutico não produziu nada muito incisivo. As principais jogadas do adversário vinham pelos flancos, principalmente pelo esquerdo, onde Léo ficava mais preso e esperava o avanço do ala esquerdo João Paulo.
A superlotação do setor central fazia o Cruzeiro ficar sem espaço para pensar o jogo quando tinha a bola, recorrendo a passes arriscados e errando a maioria deles, aumentando ainda mais a posse de bola do time adversário. Com o tempo, o Cruzeiro passou a ignorar o meio-campo e procurar a ligação direta, mas Borges não tem perfil de disputa pelo alto e quase sempre perdia. E mesmo quando ganhava, a segunda bola era sempre do Náutico, pelo simples fato de ter mais gente por perto.
A ponta direita
Outro fator tático interessante do primeiro tempo foi a postura de Wallyson. Como em quase todos os esquemas com três zagueiros, as áreas mais vulneráveis do sistema pernambucano eram os flancos de sua defesa. Quando o time adversário tem um jogador aberto no ataque, ou um zagueiro tem que sair da área para cobrir, ou o ala perde a vantagem de marcar à frente e tem que recuar. Infelizmente, Wallyson não repetiu as boas atuações táticas das últimas partidas e insistia em ficar próximo a Borges, talvez numa tentativa de fazer número. Do outro lado, Everton não apoio tanto devido ao posicionamento alto de Patric, mas mesmo assim criou algumas boas jogadas, como no passe recebido de Souza por cima da defesa em velocidade.
No intervalo, as equipes não mexeram nas peças, mas Celso Roth percebeu o problema na ponta direita e chamou a atenção de Wallyson, que voltou jogando mais aberto. Imediatamente a equipe melhorou de produção e chegou a criar três boas oportunidades, todas pela ponta direita e com a participação de Wallyson. O bandeira deu três impedimentos seguidos. Estranhamente, o time parou de jogar por ali, recorrendo cada vez mais às bolas longas para a disputa pelo alto e tentativa de pegar a sobra — o chamado jogo de “primeira e segunda bola” que Celso Roth tanto menciona em suas entrevistas quando se refere ao tipo de jogo praticado no Independência.
Um erro e um acerto
Aos 15 minutos, os primeiros movimentos dos treinadores: Gallo mandou Kim, mais veloz, na vaga de Araújo, e Lúcio deu lugar a Rogerinho. O sistema permaneceu. No Cruzeiro, Celso Roth tirou Charles, contundido, e lançou Wellington Paulista. Estava claro que ele queria insistir na disputa pela primeira bola no alto, e WP consegue fazer isso melhor do que Borges. Mas o novo 4-3-3 cruzeirense tinha ainda menos jogadores no meio, e tomou um susto justamente no flanco que Charles protegia — o direito. Kim passou por Donato e tocou a João Paulo, que entrava sem marcação na área. Ele centrou, mas Souza não conseguiu finalizar.
Roth então iluminou-se e tirou Wallyson do jogo, mandando Élber fazer a função de ponteiro direito, um pouco mais longe da área, fechando o lado, mas aberto e procurando a velocidade. E mal o garoto entrou, já criou problemas: três lances de perigo pelo lado direito, o terceiro resultando na falta que originou o primeiro gol. O gol foi um lance de oportunismo de Borges, mas na opinião deste blogueiro, era questão de tempo, com o lado esquerdo pernambucano sendo explorado por Élber com qualidade.
Espaço
Gol este que mudou o panorama da partida. O Náutico, naturalmente, teve que abandonar sua estratégia de lotar o meio-campo e atacar. Gallo gastou sua última cartada mandando o atacante Romero a campo no lugar do volante Dadá. Os três zagueiros permaneceram compondo a última linha do agora 3-4-1-2 pernambucano. Um minuto depois, Borges sairia para a entrada de Sandro Silva, e assim o Cruzeiro tinha dois volantes puramente de marcação à frente da área — um 4-3-2-1 torto: cinco contra cinco no meio, mas sem um jogador pela esquerda do ataque.
Mas não fez diferença, porque quem ultimamente tem dado amplitude pela esquerda é Everton. Foi com ele que nasceu o segundo gol, em uma belíssima linha de passe. Everton puxou o contra-ataque por aquele lado, tocou a WP que estava aberto pela esquerda. Num altruísmo surpreendente para um atacante, WP devolveu a Everton, que já estava pelo meio. Ele viu Élber do outro lado, vindo como um raio e sem marcação — da forma como Wallyson devia fazer desde o primeiro tempo. O jovem dominou e fuzilou no canto esquerdo alto de Gideão.
O segundo gol matou a reação pernambucana, que desistiu de marcar pressão em cima do campo e ficou assistindo a defesa cruzeirense tocar a bola. Era só esperar o apito do árbitro, mas ainda havia tempo para mais. Tinga, que não fez uma boa partida nem técnica nem taticamente, explorou a defesa avançada e entregue do Náutico, alcançando a linha de fundo e centrando rasteiro para WP fazer o dele no fim da partida.
Conclusão
A vitória pode ter sido a maior do Cruzeiro no campeonato, mas não pode esconder alguns erros táticos cometidos, principalmente no primeiro tempo. Wallyson voltou a oscilar taticamente, e com isso seu jogo técnico também cai. Além disso, Celso Roth precisa arrumar um jeito de sair da armadilha dos 3 zagueiros e a consequente lotação do meio-campo, se quiser continuar jogando com o 4-3-1-2 losango.
Mas há pontos positivos. Everton, que foi muito contestado no início do ano — e mesmo neste campeonato no jogo contra o Grêmio — mais uma vez, demonstrou consistência pela esquerda: por ora, o problema da lateral está, no mínimo, atenuado. Na direita, Léo jogou “improvisado” — por falta de uma palavra melhor — pela terceira vez seguida, também sem comprometer. E Élber, um garoto ainda, mostrando ter competência para ser um reserva que pode mudar a cara da partida, principalmente jogando na função de ontem: ponteiro pela direita. Já vislumbro um time com Montillo e Élber de ponteiros…
Celso Roth disse na entrevista coletiva que torce para que o tão sonhado “equilíbrio” esteja começando a ser encontrado. É o que todos torcemos, e que, pelo menos a princípio, parece mesmo estar sendo alcançado.