Tupi 0 x 2 Cruzeiro – Um time diferente

Usando uma formação diferente, o Cruzeiro jogou para o gasto, fez dois gols e concluiu a primeira fase do Campeonato Mineiro 2013 com incríveis 94% de aproveitamento. É o melhor início de temporada da história celeste, acima até de 2003, o ano da tríplice coroa.

Com as ausências de Everton e Everton Ribeiro, por acúmulo de cartões, e o primeiro lugar garantido na primeira fase, Marcelo Oliveira promoveu modificações, e deu chances para os laterais e reservas volantes — setores da equipe que pouco variaram desde o início do ano. Oportunidade para Mayke e Egídio, os laterais reservas, além de Lucas Silva poder mostrar seu jogo.

A formação inicial do Cruzeiro tinha um losango no meio, com muito apoio dos laterais mas pouca movimentação de Diego Souza

A formação inicial do Cruzeiro tinha um losango no meio, com muito apoio dos laterais mas pouca movimentação de Diego Souza

O 4-3-1-2 losango cruzeirense teve Rafael no gol, Mayke pela direita e Egídio pela esquerda da linha defensiva, composta ainda por Bruno Rodrigo e Léo no miolo de zaga. Nilton foi o vértice mais baixo do losango, com Tinga pela direita e Lucas Silva pela esquerda no papel de carrileros — os jogadores que atuam pelos lados do losango. Na ligação, Diego Souza, com Dagoberto pelos lados e Borges centralizado na frente.afael

O Tupi veio num tradicionalíssimo 4-2-2-2, o quadrado no meio-campo. O goleiro Jordan teve Lobinho e Fabrício protegendo a área, com Thiago Ryan pelo flanco direito e Dieguinho fechando o lado oposto. Felipe Lima e Maicon Douglas defendiam o meio-campo, atrás dos meias Paulinho e Rafael Assis. Na frente, Vinicius e Wesley.

Embates pelos lados

Os dois sistemas, o losango e o quadrado, tem em comum o fato de tentarem criar superioridade no centro do meio-campo com quatro jogadores, mas ao mesmo tempo abrindo mão de amplitude ofensiva. Por isso dependem bastante do avanço dos laterais, que fazem parte da linha defensiva, para abrirem o jogo e dar opção de passe pelas pontas. Portanto, quando estes sistemas se enfrentam, normalmente vemos uma briga direta entre os laterais: o direito marcar o esquerdo do time adversário e vice-versa.

Porém, como tem acontecido frequentemente no Campeonato Mineiro, quem ficou mais com a bola foi o Cruzeiro, e, consequentemente, os laterais avançaram mais. Mayke e Egídio utilizaram bem o espaço concedido. As principais jogadas ofensivas saíam pelos flancos. O primeiro gol foi um belo exemplo: Tinga puxou a marcação, esperou a passagem de Mayke a lançou uma bola longa para o jovem. Do cruzamento veio a falha de Thiago Ryan, que Dagoberto não perdoou.

O losango

Diego Souza jogou em função diferente: a de trequartista, enganche, ponta-de-lança. É a ponta de cima do losango, o pensador do time, a mesma função de Alex em 2003. Mas o camisa 10 de 2013, também por ter uma característica diferente, teve uma atuação tímida. Ficou escondido na marcação e não se movimentou para receber a bola. Quando recebia, não fazia uma distribuição de jogadas que se espera da função.

A escalação de Diego nesta posição, portanto, deve ser questionada. É até compreensível, pois ele é um jogador que tem um certo nome, e isso atrai a marcação adversária, abrindo espaços para outros jogadores. Mas a característica de Diego não é a de pensar o jogo e criar jogadas, e sim a de conduzir a bola com vigor físico. Sem um jogador de suporte a seu lado, como Everton Ribeiro, por exemplo, para dividir a atenção da defesa, Diego tende a sumir na marcação, pois não se movimenta muito também.

Tinga e Lucas Silva eram os volantes com liberdade pra sair. O primeiro teve um excelente jogo, combinando com Mayke frequentemente pela direita e aparecendo na frente para desafogar o jogo. Lucas Silva, pela esquerda, ficou um pouco mais preso, procurando menos a Egídio. O garoto da base teve um trabalho mais defensivo, porém tentava buscar a primeira bola para iniciar o jogo.

Jogo sem pressão

Talvez por já estar garantido no primeiro lugar, o Cruzeiro não fez pressão na defesa adversária como em outros jogos. Ao invés de pressionar alto, Borges, Diego Souza e Dagoberto se colocavam à frente dos zagueiros, fechando um passe direto nos pés dos volantes do Tupi. A intenção, acredito, era chamar cada vez mais o time de Juiz de Fora — que precisava da vitória para ainda ter chances de se classificar — e partir num contra-ataque para matar o jogo. E assim foi feito: bola roubada, contra-ataque velocíssimo, de Tinga para Dagoberto, que de primeira achou Egídio entrando em altíssima velocidade na cada do goleiro. O lateral driblou Jordan e, ao invés de marcar o gol, deu para Borges, que briga pela artilharia. Uma jogada que mostra a consciência que o time tem de suas ações em campo.

De sua parte, o Tupi também preferiu não incomodar os zagueiros do Cruzeiro. Mas a superioridade dos laterais e a movimentação dos volantes, que vinham buscar a bola nos pés dos zagueiros para iniciar o movimento ofensivo, sobrepujou a marcação do time adversário com facilidade, e o Cruzeiro chegou sem maiores problemas.

Substituições

No segundo tempo, o técnico Felipe Surian tentou consertar uma das laterais, trocando Thiago Ryan por Ygor na direita. Não deu muito certo, e o Cruzeiro continuava sendo superior em ambos os lados do campo. Aos 19, Marcelo Oliveira lançou Élber na vaga de Lucas Silva, refazendo o 4-2-3-1, com Dagoberto indo ser ponteiro esquerdo de vez. Mas o Cruzeiro já se poupava claramente e a mudança não teve muito impacto. Depois Diego Souza saiu para dar lugar a Ananias, transformando o time num híbrido de 4-2-3-1 com 4-4-1-1. E Borges, que não vai jogar na próxima rodada por ter levado a terceira advertência, foi substituído por Anselmo Ramon, para dar ritmo ao provável substituto.

No Tupi, as entradas de Cassiano e Ademílson, atacantes, nos lugares de Paulinho e Felipe Lima, meia e volante, respectivamente, também não funcionaram bem. O Tupi partiu para o tudo ou nada numa espécie de 4-2-4. Com o meio-campo esvaziado, o Cruzeiro controlou o jogo e Rafael foi pouco incomodado.

Agora é pra valer

Na próxima fase, o Cruzeiro vai jogar contra o Villa Nova, que foi o adversário mais difícil na fase de classificação. Naquela oportunidade, o Cruzeiro só equilibrou o jogo quando começou a colocar mais jogadores marcadores no meio-campo para segurar o ímpeto de Tchô, principal cabeça pensante do time de Nova Lima. Só foi superior quando espelhou o 4-3-1-2 losango do Villa com Ricardo Goulart na ligação. Mas é bem provável que Marcelo Oliveira entre com o 4-2-3-1 novamente, com a dupla volância responsável pela marcação de Tchô e do outros volantes que subirem.

Por falar em volância, é bem improvável que Marcelo Oliveira faça uma surpresa nesse setor. A tendência é a volta de Leandro Guerreiro e Nilton. Ambos são mais destruidores de jogadas do que passadores, e insisto que falta um jogador com essa característica no setor. Tinga fez muito bem esse papel contra o Tupi — apesar de ter sido em um sistema diferente — e também quando tem entrado nos jogos.

Mas o mais importante mesmo é que agora existe o clima de decisão. Finalmente saberemos como o Cruzeiro vai se comportar em partidas eliminatórias (a partida contra o CSA não serviu para muita coisa), que valem de verdade.

Finalmente.

Quatro jogos e perspectivas

Antes de mais nada, este blogueiro pede desculpas aos leitores por ter ficado tanto tempo ser dar satisfações. Entrei em um momento de mudança na vida — literalmente — e por isso fiquei sem infra-estrutura necessária para escrever os posts (leia-se: internet e computador).

Então, para não deixar de falar sobre nenhum dos jogos passados, aqui vão notas rápidas sobre os quatro últimos jogos.

Villa Nova 2 x 4 Cruzeiro

Em alguns jogos, o equilíbrio entre as equipes é simplesmente uma questão de número no centro do meio-campo. Que o Cruzeiro tem um elenco superior ao do Villa Nova todos sabemos, mas neste jogo o Villa tinha um quarteto no centro do campo, com o seu 4-3-1-2 losango frente ao 4-2-3-1 do Cruzeiro. Os dois volantes e Tchô, o meia central, se deram melhor em relação a Leandro Guerreiro e Nilton, que não conseguiam marcar os três. A partida tendeu para o domínio do time da casa no primeiro tempo simplesmente por isso.

Já no segundo, Marcelo Oliveira lançou Tinga para fazer um 4-1-2-3 que acertou a marcação: Guerreiro ficou responsável apenas por Tchô, e mesmo perdendo o duelo algumas vezes, como no gol de empate do Villa Nova, conseguiu tirar a liberdade que o camisa 10 adversário tinha na primeira etapa.

Mas com a mudança, Diego Souza foi jogar aberto do lado direito, deixando o time sem um meia central. Com isso, o time equilibrou o centro do meio-campo, mas criou pouco. A entrada de Ricardo Goulart aconteceu justamente para resolver este problema. Com ambos os times com meio-campo em losango, a qualidade técnica fez diferença e o Cruzeiro marcou mais dois gols.

Em suma: quando tinha apenas 2 meio-campistas (já que Diego Souza marca pouco) contra 4 do adversário, o Cruzeiro foi dominado. Com Tinga, o 3 x 4 equilibrou, e com Goulart, o número de meio-campistas se igualou, e aí o Cruzeiro se sobressaiu.

América 1 x 4 Cruzeiro

O América do técnico Paulo Comelli quis jogar de igual para igual contra o Cruzeiro no Mineirão. E foi amplamente dominado, principalmente porque, diferente dos outros times do campeonato, foi um time que tentou sair para o jogo e deu espaço para os jogadores de frente do Cruzeiro.

Também num 4-2-3-1, o time de Paulo Comelli foi facilmente repelido pela linha defensiva celeste. Com Rodriguinho, o meia central, encaixotado entre os volantes, Fábio Júnior tinha que sair muito da área, e Fábio quase não viu a cor da bola.

Já o Cruzeiro, desta vez com Ricardo Goulart na vaga do suspenso Dagoberto, imprimiu movimentação e confundiu a marcação americana. Já aos 16 minutos o Cruzeiro vencia por dois a zero, em jogadas de bola áerea. Depois disso apenas controlou as ações, repelindo as investidas do América com propriedade. Ainda sofreria um gol em falha de Leandro Guerreiro na cobrança de escanteio, mas matou o jogo logo em seguida com excelente trama pela direita com Everton Ribeiro e Ceará e a conclusão de Borges.

O 4-2-3-1 foi mantido do início ao fim. Apesar do placar e do domínio, os volantes ainda tiveram pouca participação ofensiva e uma certa dificuldade na marcação. Acredito ser o setor mais frágil da equipe no momento, ao contrário da maioria dos comentaristas e torcedores que dizem ser a defesa.

CSA 0 x 3 Cruzeiro

Eliminar o segundo jogo era esperado. Mas o futebol apresentado, preguiçoso, não. Era quase como se o Cruzeiro soubesse que tinha que fazer pouca força para avançar de fase, e assim foi. Já o CSA jogava a vida, provavelmente o jogo de maior visibilidade que o time terá no ano, e por isso foram pra cima, com muita velocidade.

A defesa do Cruzeiro jogava bem alta, longe de sua própria área, para compactar o time. Mas isso só funciona se os jogadores de frente também fizerem marcação avançada, o que não acontecia. Assim, o CSA tocava a bola e o Cruzeiro esperava, deixando espaços atrás de sua própria defesa. E time da casa, num moderno 4-1-2-3, jogava bolas longas para jogadores rápidos que tinha abertos, nas costas dos nossos laterais. Para nossa sorte, a pontaria deles não estava boa e pelo menos três chances reais foram mandadas pra fora.

Ofensivamente, o Cruzeiro parecia, de fato, bem preguiçoso. Os gols aconteceram mais por bobeira da defesa do time alagoano do que por mérito celeste. O primeiro numa bola longa de Dagoberto, na direita, para Diego Souza. A defesa estava mal posicionada e deixou o camisa 10 entrar livre. O segundo em um pênalti cometido atabalhoadamente pelo zagueiro. Somente o terceiro pode ser considerado superioridade técnica: Ricardo Goulart recebeu o passe final de uma trama rápida de passes, driblou um marcador, ganhou na força do segundo e concluiu sem chances para o goleiro.

O jogo provou a força do elenco cruzeirense, que mesmo jogando com pouca vontade, mostrou ser forte o suficiente para construir o placar. Entretanto, a mesma preguiça causou dificuldades desnecessárias. Portanto, não foi um jogo bom para se tirar alguma conclusão.

Cruzeiro 5 x 0 Nacional

Ah, goleadas. Como elas têm o poder de enganar o torcedor. Basta fazer uma grande soma de gols num mesmo jogo e automaticamente tudo fica bem, a torcida se empolga e tal. Felizmente, não era esse o caso.

É claro que se deve levar em conta a fragilidade do Nacional, que está brigando para sobreviver no Módulo I do Campeonato Mineiro. Mas é justamente contra estes é que o poderio do time mais capacitado tem que aparecer. E assim foi feito: o Cruzeiro jogou como se fosse um jogo decisivo (não, confirmar a liderança na primeira fase do estadual não dá esse caráter à partida). Ricardo Goulart entrou na vaga do suspenso Diego Souza e promoveu a mesma intensa movimentação de jogos anteriores, e foi o senhor da partida.

O Nacional se entrincheirou numa espécie de 4-3-3 defensivo, contra o 4-2-3-1 costumeiro de Marcelo Oliveira. Os três da frente estreitavam e bloqueavam a saída pelo meio, mas deixavam as laterais livres. Além disso, os volantes cruzeirenses não eram pressionados e buscavam a bola no pé dos zagueiros para iniciar o jogo, quase sempre jogando para um dos laterais. E dali, a bola circulava tranquilamente para os três armadores, trocando de posição a todo momento.

Sem a bola, o Cruzeiro pressionava no alto do campo, com muita sede de roubar a bola. Foi a pressão alta mais intensa até aqui no ano. Quando o Nacional tinha a bola, não tinha muito tempo pra pensar, pois o quarteto ofensivo do Cruzeiro encurtava os espaços dos zagueiros, obrigando ao chutão ou passe errado. Os gols saíram naturalmente, em erros do Nacional provocados pela marcação intensa do Cruzeiro e ataques velocíssimos.

Todos os quatro jogadores de frente participaram dos dois primeiros gols: no primeiro, o tiro de meta ruim veio parar nos pés de Goulart, que de letra achou Everton Ribeiro, que finalizou de fora da área. No segundo, Borges se desloca e tabela com Dagoberto, deixando o companheiro na cara do gol. Já o terceiro foi uma jogada dos defensores: Nilton a Bruno Rodrigo, que de peito passou a Leo dentro da área. O zagueiro cruzeirense ainda marcaria mais um de cabeça em bola parada, ainda no primeiro tempo.

No segundo, o time desacelerou, naturalmente. Mesmo assim, Élber completaria a goleada “roubando” a bola na jogada individual de Ricardo Goulart, tamanha a facilidade que o Cruzeiro criou na partida, muito devido à sua própria atuação.

Outro ponto a se destacar é que, nas raras vezes em que era marcado em seu próprio campo, o Cruzeiro evitava ao máximo a bola longa para o ataque. O objetivo era manter a bola nos pés e construir a jogada de trás. É uma mudança sutil de postura, mas que revela como Marcelo Oliveira quer sua equipe.

Perspectivas

Notadamente, existe uma preocupação da torcida e da crítica em geral com o setor defensivo do Cruzeiro. Quase todos localizam a instabilidade nos zagueiros, mas este blogueiro pensa que o problema está na volância. Leandro Guerreiro e Nilton são bons marcadores, mas não estão com funções definidas. Não sabemos quem sai mais e quem fica mais (pense em Paulinho e Ralf, por exemplo).

Mas, Dedé chegou. E com ele a segurança na zaga que a torcida precisava. Porém, estou esperando muito mais os testes de Henrique ou Lucas Silva no meio para ver como se encaixam neste time. Aparentemente, Lucas Silva jogará neste domingo contra o Tupi, mas não será um 4-2-3-1 e sim num 4-3-1-2 losango ao lado de Tinga, com Nilton no suporte e Diego Souza na ligação. Terá liberdade para atacar. Sorte para o garoto.

Ademais, o time está se encaixando mais rápido do que esperávamos, e não só o time titular. O Cruzeiro hoje tem mais do que 11 titulares, e isso é um luxo que poucos times no Brasil podem ter. O esquema base está definido, variações estão sendo treinadas e têm dado certo em determinadas situações de jogo. Podemos esperar, sim, um bom ano em 2013.