Este é um blog que fala principalmente de tática no futebol, e de vez em quando sobre estatísticas e gráficos também relacionados a futebol. A premissa principal é falar sobre essas coisas e somente sobre essas coisas, apenas dando pinceladas em outros assuntos que são importantes para os dois principais. Entretanto, quando o plano de jogo, a estratégia, a tática e a técnica dão todos certos, mas o resultado não vem assim mesmo, somente duas coisas explicam. Uma é o acaso do futebol, que de fato existe. Outra é a arbitragem.
Assim como o placar verdadeiro da partida foi 2×0, com gols de Marquinhos e Willian, o título deste texto é uma referência ao sistema tático “real” da equipe catarinense. Ora, isso dá mais de dez jogadores de linha, mas quando se consegue passar da defesa e do goleiro, aí foi preciso vencer outro trio: o de apitadores. E dessa vez o Cruzeiro não conseguiu vencer essa última “linha defensiva”.
Escalações
Sem Henrique, suspenso e lesionado, Nilton voltou à volância ao lado de Lucas Silva, reeditando a parceria que deu muito certo no ano passado. O goleiro Fábio ainda foi protegido pela sua linha defensiva, ainda com Mayke à direita, e também com Egídio na esquerda, e Dedé e Léo na zaga central. Mais à frente, Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Marquinhos articulavam coletivamente com a ajuda de Marcelo Moreno na referência: o 4-2-3-1 imutável de Marcelo Oliveira.
O técnico do Criciúma, Wagner Lopes, sabia do poder de criação celeste e articulou seu time num 4-4-1-1 com muita movimentação defensiva, sempre para ter superioridade numérica no seu campo. A última linha de proteção da meta de Luís tinha Eduardo à direita, Fábio Ferreira e Gualberto centralizados e Giovanni à esquerda; e a segunda linha tinha João Vitor à direita, os (velhos conhecidos) volantes Serginho e Martinez pelo centro e do lado esquerdo fechava o atacante Silvinho. Tudo para compensar a falta de combatividade do veteraníssimo Paulo Baier, que se limitou a ocupar os volantes junto com o atacante solitário Gustavo.
Sem espaço
O plano de marcação do treinador do Criciúma funcionou bem no primeiro tempo, e consistia de três partes. Primeiro, aproximar as duas linhas, evitando o trânsito entre elas e o espaço — com a diferença de que era a linha média que se aproximava da de defesa, e não o contrário. Ou seja, o Criciúma marcou em bloco médio-baixo. Segundo, pressionar imediatamente o lateral do Cruzeiro que recebesse a bola, subindo o bote dos meias abertos e fazendo a rotação, de forma que o meia aberto do lado oposto fechava no centro. E terceiro, bloquear o passe de retorno para os volantes do Cruzeiro, ocupando-os com Paulo Baier e o atacante Gustavo, para evitar a inversão rápida para o lado fraco da marcação.
Essas medidas forçavam o Cruzeiro a voltar o lance para os pés dos zagueiros Dedé e Léo, que acabaram por ficar encarregados do primeiro passe. Nesse ponto, Henrique fez falta, pois vinha fazendo muito bem esse papel. Além disso, quando o Cruzeiro conseguia engatar os passes mais rapidamente, o movimento lateral dos volantes centrais, Serginho e Martinez, superlotava o lado da jogada, fazendo não dois contra dois mais sim três contra dois e um na sobra: o lateral pegava o ponteiro mais à frente, o ponteiro e o volante pegavam o lateral, que ainda tinham o outro volante na cobertura cercando Ricardo Goulart.
Mover, mover
A única forma de sair desse ferrolho seria se movimentar. E muito. Os meias do Cruzeiro se movimentaram bem, mas não foi suficiente. E aqui, cabe a cobrança: não adianta culpar o posicionamento adversário pela falta de gols. Cabe ao Cruzeiro, como melhor time do país, encontrar os espaços ou senão criá-los.
Não foi capaz, e o primeiro tempo se esvaiu com apenas três “meias chances” para o Cruzeiro: um contra-ataque desperdiçado em um chute ruim de Marquinhos; um cruzamento de Mayke que Moreno resvalou e achou Goulart, que finalizou duas vezes em cima do goleiro Luís, e a jogada que deveria ter sido gol: em rebote da cobrança de falta de Dedé, Nilton devolve pra área de cabeça e acha Goulart, que divide em lance normal com Fábio Ferreira. Marquinhos completa para o gol e marca, mas o Sr. Jaílson viu um empurrão inexistente de Goulart.
Do outro lado, Fábio devia ter pago ingresso. Pois simplesmente assistiu ao jogo em um lugar privilegiado do estádio Heriberto Hulse.
Observação e trocas
A segunda etapa começou sem trocas. Alguns amigos questionaram nas redes sociais, entendendo que Marcelo deveria fazer as trocas já no intervalo. A ideia, no entanto, era observar a postura dos catarinenses no segundo tempo. Caso eles saíssem um pouco mais, abririam mais espaços e o time que iniciou a partida poderia render mais; caso contrário, uma substituição teria que ser feita.
E foi o que aconteceu. No início do segundo tempo, o Criciúma até saiu um pouco mais, mas apenas nas bolas paradas, mandando uma artilharia aérea na área do Cruzeiro para ver o que acontecia. Um futebol ruim, coisa de time sem repertório. A estratégia é válida, mas não é dá preferência deste. O Cruzeiro se viu defendendo mais do que o normal e não conseguia encaixar as sequências de passes. Mas logo o jogo voltou ao modo do primeiro tempo, e Marcelo tomou providências: mandou Willian na vaga de Marquinhos, dando total liberdade para Éverton Ribeiro se mexer por trás do ataque celeste.
A troca teria sido um sucesso se não fosse o árbitro, Sr. Jaílson, ter entrado em ação novamente. Éverton Ribeiro apareceu na esquerda, tabelou com Egídio e aplicou um corte seco no zagueiro, finalizando no ângulo oposto, tirando de Luís. O arqueiro do Criciúma ainda conseguiu encostar na bola, que beijou caprichosamente a trave e voltou nos pés de Moreno, em totais condições. Ele pegou mal o rebote, mas Willian, atrás da linha da bola, completou para as redes. O assistente viu impedimento.
Baier sai, Éverton recua
Wagner Lopes só tinha o contra-ataque como opção. Por isso, Paulo Baier teve que dar seu lugar ao veloz Lucca — aquele mesmo que passou pelo Cruzeiro no início do ano. O jovem foi jogar aberto à direita, centralizando Gustavo de vez. Silvinho manteve-se na esquerda, e estava configurado um 4-3-3, mas com três volantes preenchendo o meio. Isso acabou abrindo um espaço à frente da defesa do Cruzeiro, que era por onde Paulo Baier transitava. Quase que imediatamente, Éverton Ribeiro sentiu o espaço e já começou a buscá-lo, para armar o time de trás. O Cruzeiro passou a dominar a posse de bola ainda mais.
Sentindo o mesmo espaço, Marcelo Oliveira mudou pra vencer: oficializou Éverton Ribeiro como o “Pirlo cruzeirense”, tirando Lucas Silva e lançando Dagoberto no jogo. O camisa 11 foi para sua posição costumeira à esquerda, mas Willian não foi para a direita, ficou mais próximo de Goulart. Em teoria, Mayke teria campo livre para avançar, mas foi pouco acionado. Assim, o Cruzeiro forçou muito pela esquerda.
Wagner Lopes trocou de centroavante, uma troca física, por cansaço. O sistema não foi alterado. Faltando cinco minutos, Marcelo deu sua última cartada: Alisson na vaga de Moreno, mandando Goulart para a área. Agora havia cinco jogadores leves na frente e dois laterais apoiadores. Não se pode ser mais ofensivo do que isto. Porém, como definiu o próprio treinador na coletiva pós-jogo: faltou o “algo mais”, aquele toque final caprichado para chegar ao terceiro gol, que seria o primeiro válido. Infelizmente o zero teimou em permanecer no placar.
A oscilação normal e a “forçada”
Oscilar num campeonato tão longo e tão equilibrado é normal. Como dito pelo Marcelo Bechler: no Brasil não há nenhum Bayern. Perder pontos considerados mais fáceis é normal aqui. O próprio Cruzeiro fez isso no ano passado. Porém, encaixou uma sequência de 12 jogos sem perder, sendo 11 vitórias, e isso sim esteve fora da normalidade: o Cruzeiro de 2013 foi espetacular. Uma sequência que começou justamente a partir da 15ª rodada, a próxima do certame atual.
Mas a oscilação “normal” do Cruzeiro terminou no sábado. O time jogou o suficiente para fazer dois gols e voltar do sul com mais três pontos. Mas a arbitragem não deixou. E já são sete pontos pelo caminho: 2 contra o São Paulo (a falta invertida no último lance do jogo que gerou o gol de empate), 3 contra o rival citadino (os pênaltis, o inexistente marcado contra e o claro e cristalino não marcado a favor, além do impedimento ridículo da bandeirinha bonitona) e mais 2 agora.
A atuação foi um pouco abaixo do que a apresentada na última partida, mas mesmo assim foi suficiente pra vencer o Criciúma. Taticamente, não há do que reclamar: Marcelo mexeu bem e nos momentos certos, fez a leitura correta da partida. Se a vitória não veio, foi só por conta dos fatores externos já citados. Se o campeonato já seria mais difícil este ano por que os adversários diretos estão melhores, estes fatores fazem o bi se tornar ainda mais difícil. Ainda mais depois de já ter vencido o certame anterior. E ainda mais por ter nos encalços times que têm força política nos bastidores da entidade que rege o futebol.
Mesmo assim, o Cruzeiro mostrou novamente que tem bola pra vencer os 19 adversários do campo — e também os outros fora dele.
Cristiano,
o Marcelo tem se mostrado um ótimo estrategista, com uma leitura de jogo ímpar. Tenho ouvido na mídia muito a respeito da revolução do Fluminense, ou da sólida defesa do Corinthians, mas o equilíbrio mostrado pelo Cruzeiro, em todos os seus setores é incomparável. Compactação, marcação inteligente, trocas de passes, são partes do repertório do time azul que nos acostumamos a ver ultimamente. Claro que os 4 pontos que o time deixou de fazer nas duas ultimas rodas fazem falta, mas ainda somos líderes e o melhor, estamos mantendo um padrão de jogo de médio para alto nível. Ano passado, antes do time engatar a sequencia de vitórias que culminou na arrancada para o título, a equipe chegou a perder jogos, o Grêmio foi um deles, jogando melhor que o adversário.
Temos ótimas perspectivas para o resto do ano, o time está encorpado, ciente da sua qualidade, mas sem desprezar os adversários. O grande risco são os fatores externos. Citando o Kajurú, futebol é 40% dentro de campo e o restante são fatores externos, dentre eles a arbitragem. Nossos concorrentes têm poder e um time com 9 pontos de vantagem (7 “retirados” e os 2 que temos) ainda no primeiro turno seria muito ruim para quem “comercializa” o futebol e, segundo alguns especialistas, para o campeonato. Confio no time para os próximos jogos, lembrando que nossos adversários tropeçaram e ainda tropeçarão. Avante Cruzeiro!