Fica até chato para o leitor eu ficar repetindo sempre a mesma coisa quando o Constelações fica sem atualizações por um período. Por isso, hoje vou dar uma justificativa diferente. Como sabem, não sou jornalista e não tenho pretensão de ser, porque não quero nem tentar ser imparcial. Eu sou torcedor, e só tenho olhos para o meu time. Só vejo outras equipes quando elas estão no mesmo gramado que o Cruzeiro.
Acontece que sou um torcedor que é empolgado com análise tática. É a razão de ser do Constelações: um blog de tática com foco exclusivo no Cruzeiro. E para as análises saírem com uma qualidade minimamente razoável, é preciso ter um pouco de cabeça fria e calma para observar os movimentos dos jogadores. Porém, a emoção que as partidas celestes tem proporcionado neste fim de campeonato dificulta muito esse aspecto.
Portanto, além de ter pouco tempo para escrever as análises e não ganhar nada com isso, preferi não escrever textos sobre jogos em que a torcida pela vitória celeste prejudicou as observações em campo. Qualidade é melhor do que quantidade, é o que dizem.
Isto posto, voltemos à programação normal.
Onze inicial
Mesmo após desgastantes jogos contra o próprio Santos, Criciúma, Atlético/MG e Botafogo, Marcelo Oliveira não tem alternativas senão escalar o que tinha de melhor. Porém, resolveu poupar Henrique e Lucas Silva, que começaram no banco. Assim, o 4-2-3-1 celeste teve Fábio no gol; Ceará na lateral direita, Manoel e Bruno Rodrigo na zaga e Samudio na esquerda. Nilton foi o escolhido para a parceria com Lucas Silva, no suporte a Willian na direita, Ricardo Goulart por dentro e Marquinhos à esquerda, com Marcelo Moreno na referência do ataque.
Enderson Moreira escalou o Santos da mesma forma que no jogo de volta pela semifinal da Copa do Brasil: um 4-2-3-1 com Robinho na referência móvel do ataque. O goleiro Aranha teve sua desfalcada linha defensiva composta por Cicinho à direita e o jovem Caju à esquerda, com Neto e Bruno Uvini na zaga central. Sem Arouca, Renato foi o volante mais adiantado à frente de Alison, dando suporte à criação centralizada de Lucas Lima. E saindo das pontas para ocupar o espaço deixado por Robinho, Gabriel e Rildo.
Só uma das quatro
Se você lê o blog, sabe que o jogo celeste é baseado inteiramente em intensidade nas quatro fases do jogo: a posse de bola, a recomposição defensiva, a posse do adversário e a transição ofensiva, mais conhecida como contra-ataque. Porém, o que houve no primeiro tempo foi que o Cruzeiro simplesmente não aplicou a intensidade que lhe é característica em nenhuma dessas fases.
Quando tinha a bola, o Cruzeiro não se movimentava muito, e com isso não embaralhava a marcação postada do Santos de forma a explorar os espaços eventualmente abertos. Assim, tentava passes mais difíceis que o habitual e cedia a bola com facilidade. Nesse momento, o Santos sempre tentava sair com velocidade, principalmente com Robinho vindo buscar o primeiro passe, puxando a marcação de um dos zagueiros. O camisa 7 se livrava facilmente da pressão e encaixava o passe para a infiltração dos ponteiros Gabriel e Rildo. Ceará até que conseguiu impedir Rildo pela direita, mas Gabriel levou muita vantagem sobre Samudio, e o paraguaio teve dificuldades.
Foi assim que nasceu o lance mais perigoso do primeiro tempo: Robinho recebeu na linha do meio-campo, arrastando Bruno Rodrigo consigo, girou e deu o passe profundo para Gabriel, que foi exatamente para o espaço que Robinho deveria estar, ficando cara a cara com Fábio. Mas nosso goleiro cresceu pra cima do garoto, fechando o ângulo sem cair na primeira, dando o tempo necessário para Manoel se recuperar e atrapalhar a finalização.
Somente na fase defensiva o Cruzeiro tinha algum equilíbrio, porque apesar da movimentação do Santos ser maior, o Cruzeiro abriu tantos espaços ao time paulista. E quando roubava a bola, a velocidade da transição não era suficiente para pegar a defesa adversária desmontada. O resultado foi claro: apesar da ligeira superioridade do time da casa, nenhum chute foi na direção do gol na primeira etapa.
Segundo tempo
Já no intervalo, Marcelo cobrou duramente os jogadores, como revelado após a partida. Mas além disso, tirou Lucas Silva, mal na marcação de Renato no primeiro tempo, e lançou mão de Henrique. O sistema não se alterou, mas a ocupação dos espaços e a pegada no meio-campo sim. Com pernas frescas, já sem tanto sol e com o time do Santos também já mais cansado, Henrique tomou conta do setor central e reequilibrou o jogo para o Cruzeiro.
E bastaram 7 minutos para que a diferença entre os dois times aparecesse, em linda jogada de muita inteligência tática do sistema ofensivo celeste. Goulart viu Moreno recuar puxar a marcação e fazer a parede, dando oportunidade para a tabela e ao mesmo tempo abrindo espaço para Willian no centro da área. O bigode foi até lá e recebeu o segundo passe de Goulart, que fez a volta na marcação para receber de volta e chutar de canhota fora do alcance de Aranha.
A vantagem no placar fez o Cruzeiro melhorar ainda mais no jogo. Isso porque o desgaste da temporada não é apenas físico e também mental, e a vantagem no placar dá uma tranquilidade, aliviando a pressão pelo resultado.
Trocas
Pouco depois do gol, Enderson pôs Thiago Ribeiro no lugar de Rildo. A tentativa era de dar mais contundência ao ataque, mas o problema estava em outro lugar do campo e o tiro saiu pela culatra: Thiago não fazia tão bem o trabalho de recomposição pela esquerda e expôs o garoto Caju às investidas de Willian. Tentou corrigir colocando outro jovem, Zeca, na vaga de Caju, mas o problema continuou.
Marcelo Oliveira, observando a vantagem no setor, aproveitou para poupar Willian e lançar Éverton Ribeiro na sua posição característica, partindo do lado direito. E o camisa 17 aproveitou o espaço, dando ótimos passes. Enderson deu uma última cartada com Jorge Eduardo no lugar de Gabriel, mas o substituto nada produziu. Marcelo então protegeu o resultado com Willian Farias no lugar de Goulart, formando o 4-1-4-1 usado no fim dos jogos para tal fim. O volante ainda teria a chance de matar o jogo após receber passe magistral de Éverton Ribeiro, de calcanhar, ficando no mano contra Aranha, mas mandou o chute no travessão.
Jogo atípico, resultado excelente
Não foi um jogo normal do Cruzeiro. Afinal, neste fim de temporada, é difícil manter o ritmo intenso durante as partidas que encantou o Brasil no primeiro turno do Brasileirão. Porém, aqui o mais importante era o resultado. Isso pode parecer incoerente com o que eu disse quando do empate com o Botafogo no primeiro turno, por exemplo (o título dessa coluna é o inverso daquela). Mas naquele tempo ainda havia muitos jogos e, a longo prazo, jogar bem significava um número maior de vitórias. Agora, não há mais longo prazo: o fim da temporada está logo ali. Os resultados, nesse momento, são mais importantes.
Melhor que tenha sido assim, portanto: uma vitória sem ter que aplicar a intensidade necessária para furar as retrancas do Mineirão. De certa forma, até se pode dizer que o Cruzeiro venceu sem se desgastar tanto.
Isso aumenta um pouco as chances de fazer mais um bom resultado no difícil confronto com o Grêmio em Porto Alegre. O time gaúcho vem ganhando confiança e será um adversário duríssimo. Porém, o estilo de jogo do Grêmio pode favorecer o Cruzeiro, já que eles preferem marcar forte e sair para o jogo em velocidade pelas pontas, e dificilmente vão tomar a iniciativa do jogo e botar pressão ofensiva. Assim, a chance de um empate sem gols é grande.
Se tudo der certo, estarei no Mineirão no domingo para ver o Cruzeiro erguer o caneco. Fé!