URT 0 x 2 Cruzeiro – Mais do mesmo

O Cruzeiro venceu em Patos de Minas, mas apresentou os mesmos problemas de sempre na fase ofensiva, mesmo com um “meia de ofício” no centro do meio-campo — um sinal de que o problema não era esse. Com o quarteto de frente muito estático e pouco intenso, a equipe teve dificuldades em sair da marcação individual imposta pela URT.

No segundo tempo, abriu o placar numa troca de posição simples, mas depois recuou, se contentando em absorver a pressão patense e tentando contra-atacar. Só conseguiu este objetivo no finzinho, após levar dois sustos.

O onze inicial

No 1º tempo, Cruzeiro no 4-2-3-1, com Charles avançando pela esquerda mas um quarteto ofensivo estático diante da marcação individual do time da URT

No 1º tempo, Cruzeiro no 4-2-3-1, com Charles avançando pela esquerda mas um quarteto ofensivo estático diante da marcação individual do time da URT

Marcelo Oliveira mandou seu fiel 4-2-3-1 a campo, com o retorno de alguns jogadores poupados e descanso para outros. Assim, a linha defensiva do goleiro Fábio começava com Ceará, com Manoel e Léo na zaga e Gilson na lateral esquerda. A proteção tinha Willian Farias e Charles atrás do central Marcos Vinícius, com Marquinhos à direita e Judivan jogando pelo outro lado. Damião foi o centroavante.

Já a URT do treinador Eugênio Souza entrou marcando individualmente, o que fazia o desenho uma espécie de 4-1-4-1. O gol de Luiz Fernando foi protegido pelos zagueiros Martinez e Carciano, com Rafinha na lateral direita e Marcel na esquerda. O meio-campo começava com Formigoni, ligeiramente mais atrás de Marzagão e Robinho, com Ramon pela direita e Edu Pina pela esquerda. Júnior Paraíba ficava solto na frente.

Muito volume, poucas chances

Com a proposta de marcação individual, a URT abdicava da briga pela posse e deixava a bola com os zagueiros celestes. Jr. Paraíba era o único que não tinha funções defensivas, apenas ocupando espaço na frente sem fazer pressão em Léo ou Manoel. Todos os outros jogadores tinham seu respectivo homem a marcar, com um dos zagueiros na sobra, o que naturalmente desfigurava as linhas de marcação.

Com isso, o Cruzeiro até conseguia fazer uma transição mais suave, sem muitas bolas longas. Mas bastava ela chegar aos pés de um cruzeirense que um adversário fazia pressão. Isso é esperado na marcação individual, mas o Cruzeiro estava sem intensidade e se mexia pouco, o que facilitava o trabalho da URT. Qualquer movimentação ou troca de posições, por menor que seja, já poderia tirar um adversário e deixar um jogador celeste sozinho, mas isso não aconteceu.

Flagrante da marcação individual da URT: note como os jogadores correm por todo campo atrás de seu adversário designado (ex.: Ramon x Gilson ou Rafinha x Judivan), com Carciano na sobra

Flagrante da marcação individual da URT: note como os jogadores correm por todo campo atrás de seu adversário designado (ex.: Ramon x Gilson ou Rafinha x Judivan), com Carciano na sobra

Charles e Marcos Vinícius

Mesmo assim, o Cruzeiro conseguiu ter algum controle da bola no campo de ataque. Isso porque Charles não se limitou à sua faixa de campo — como os volantes fizeram contra o Mamoré — e avançava pela esquerda sempre que possível, para dar suporte a Judivan e Gilson. Além disso, o jovem Marcos Vinícius recebeu mais passes e fez o jogo fluir um pouco mais, ainda que os jogadores tivessem muito longe uns dos outros.

As duas melhores chances do Cruzeiro no 1º tempo partiram dos pés dele. Na primeira, ele faz o passe para Damião no pivô, que de costas para o gol abre para Marquinhos chutar pra fora. E depois, numa ação de raciocínio rápido, quando a bola sobra e ele imediatamente aciona Damião na frente. O passe saiu meio torto e longo, mas mesmo assim Damião conseguiu chutar para a defesa de Luiz Fernando.

Organização defensiva

Sem a bola, o comportamento do Cruzeiro foi igualmente sem intensidade. Sem fazer pressão alta, o time se postava nas suas três linhas, fazendo marcação individual por setor — isto é, combater o adversário que entrar na área de ação do jogador. Foi suficiente para conter o pouco ímpeto ofensivo do time patense: a URT finalizou apenas três vezes contra o gol de Fábio. Nenhuma delas foi na direção certa, e duas foram de muito longe com Jr. Paraíba.

A única finalização mais de perto foi exatamente por causa da movimentação do camisa 10 da URT. Ele era o homem mais avançado quando o Cruzeiro atacava, mas quando a URT tinha a bola, os outros atacantes ultrapassavam e ele flutuava entre as linhas, funcionando como um armador de fato. Foi nessa posição que ele recebeu um passe, livre de marcação, fazendo Gilson sair de sua posição na lateral esquerda para cobrir, abandonando Ramon — que recebeu a bola e cruzou. A bola desviou no próprio Gilson e sobrou para Marzagão que bateu muito mal.

Segundo tempo

Após o jogo, Marcelo Oliveira revelou que pediu duas coisas aos jogadores no intervalo: mais mobilidade e saída de bola mais rápida. Os jogadores atenderam pelo menos a primeira requisição e logo no início do segundo tempo, uma troca de posições simples entre Marcos Vinícius e Marquinhos, com o apoio de Ceará pela direita, finalmente confundiu a marcação da URT.

A jogada do gol, inclusive, começa com uma espécie de pick-and-roll — uma jogada do basquete na qual um companheiro se aproxima e para para bloquear o avanço do marcador do homem da bola. Ceará passa para Marquinhos e bloqueia Formigoni, que foi arrastado por Marcos Vinícius para a direita. Com isso, o jovem meia tem campo para avançar e dar o passe para Marquinhos, também livre no centro, executar uma linda finalização e abrir o placar.

O início da jogada do 1º gol: Ceará e Marcos Vinícius fizera um "pick-and-roll" e tiraram Formigoni do caminho

O início da jogada do 1º gol: Ceará e Marcos Vinícius fizera um “pick-and-roll” e tiraram Formigoni do caminho

Recuo das linhas

Imediatamente após o gol, Eugênio Souza trocou Ramon pelo atacante Wellington, soltando mais o time da casa, mas sem mexer no sistema. O Cruzeiro teve mais espaços, mas parecia satisfeito com o empate e não os aproveitava. A URT então fez a segunda troca, sacando o lateral Marcel e lançando o meia Bruno Donizete a campo pelo lado esquerdo, abrindo de vez o time.

A URT começou a ter mais a bola e empurrar o Cruzeiro contra sua própria área. Marcelo então quis aproveitar o contra-ataque que se oferecia e mandou Joel a campo na vaga de Marcos Vinícius, para desespero da maioria da torcida. O camaronês ocupou a faixa central, mas não fez como no jogo contra o Mamoré, onde insistia em entrar na área e por lá ficar. Desta vez ele transitou melhor e sem a bola recuava até junto dos volantes.

Depois, Eurico entrou na vaga de Charles, aumentando o poder de marcação no meio. Isso só reforçou a tese de que a busca era por um contra-ataque que matasse a partida. A URT estava aberta, mas também não sufocava o Cruzeiro quando se defendia, o que pode ter dado a Marcelo alguma segurança para a sua terceira a última alteração.

Gabriel Xavier

No fim, o Cruzeiro recuou suas linhas e adotou uma postura reativa, procurando um contra-ataque que matasse o jogo -- só conseguiu no finzinho

No fim, o Cruzeiro recuou suas linhas e adotou uma postura reativa, procurando um contra-ataque que matasse o jogo — só conseguiu no finzinho

O treinador celeste lançou Gabriel Xavier no lugar de Judivan. Com isso, Joel foi ocupar a faixa esquerda. A ideia provavelmente era valorizar a posse no meio-campo, e ao mesmo tempo qualificar o último passe na transição ofensiva veloz, o popular contra-ataque.

O jovem meia só conseguiu cumprir a segunda função. Com Robson Duarte na vaga de Robinho, a URT se lançou totalmente ao ataque. O Cruzeiro se defendeu razoavelmente, mas não conseguia reter a bola. Com isso, em dois erros defensivos celestes, o time patense assustou: na primeira, uma sobra de bola parada em que Jr. Paraíba driblou Marquinhos dentro da área, e na segunda, um erro de Eurico no meio-campo que desmontou a cobertura da zaga celeste, deixando Léo sem ação contra Jr. Paraíba. Nas duas, Fábio salvou.

E o contra tão esperado finalmente saiu no finzinho da partida, com Gabriel Xavier. O “pensador” recebeu de Joel, girou driblando e passou imediatamente a Marquinhos na direita, ligeiramente impedido. O camisa 30 deu de primeira para Joel do outro lado, que invadiu a área e levou sorte na conclusão: o goleiro desviou, a bola iria pra fora, mas desviou também no zagueiro e entrou. Foi o último lance do jogo.

Mudar ou não mudar?

É fato que o Cruzeiro não vem jogando o futebol que a torcida espera. Talvez o time ofensivo e intenso de 2013/14 tenha feito os cruzeirenses ficarem mal-acostumados, o que pode aumentar o nível de exigência em relação a este time de 2015. Mas o Cruzeiro pode mais, principalmente na fase ofensiva, no ataque posicional.

Por isso, vejo muita gente pedindo que Marcelo reveja o esquema de jogo, e abandone o 4-2-3-1. O sistema mais pedido parece ser o 4-3-1-2 losango, bastando para isso recuar Marquinhos da ponta direita para o meio-campo. Eu particularmente não sou fã deste sistema, que tem como vantagem ter mais gente no centro do meio-campo, mas por outro lado expõe os laterais ao 2 contra 1 com o lateral e o ponta adversário.

Na minha visão, o problema é mais o modelo de jogo, a execução do esquema, do que o sistema em si. Ou seja, é muito mais uma questão de como o Cruzeiro joga o 4-2-3-1 do que o próprio 4-2-3-1 adotado. É como um bolo: se ele não fica gostoso, o problema está muito mais na receita e nos ingredientes do que na fôrma em que o bolo foi assado.

Além disso, trocar agora pode significar dois meses de trabalho fora. Eu ainda insistiria no 4-2-3-1 e cobraria uma execução melhor: mais mobilidade no quarteto de frente e participação dos volantes na construção, e ao perder a bola, ensaiar uma compactação ofensiva em bloco alto para recuperar a bola o mais rápido possível: o famoso pressing.

Mas, se o time continuar com o mesmo comportamento, a mudança no sistema pode ser o fato novo que faça este elenco responder.