Guarani/MG 1 x 3 Cruzeiro – Devagar se vai ao longe

O Cruzeiro melhorou sensivelmente. A estreia de De Arrascaeta foi uma das causas, mas não a única. Damião também evoluiu, não só por causa dos gols, mas taticamente, com sua boa movimentação, e com isso o time todo tem um ganho significativo. Mas ainda há muito por trabalhar, principalmente na transição defesa-ataque.

Formações de partida

O 4-2-3-1 do Cruzeiro com Arrascaeta como central aplicando bastante movimentação, diante do 4-4-1-1 do Guarani, que com o recuo de Michel Cury se transformava num 4-1-4-1

O 4-2-3-1 do Cruzeiro com Arrascaeta como central aplicando bastante movimentação, diante do 4-4-1-1 do Guarani, que com o recuo de Michel Cury se transformava num 4-1-4-1

Com o uruguaio De Arrascaeta finalmente regularizado, Marcelo Oliveira pôde escalá-lo no centro da linha de 3 do 4-2-3-1 usado desde o início de 2013. O jovem uruguaio se posicionava atrás de Damião e era flanqueado por Marquinhos e Willian. Mais atrás, Willian Farias e Henrique proviam suporte e proteção à zaga, formada por Fabiano e Léo e com Mayke e Mena nas laterais, defendendo o gol de Fábio.

Já Gian Rodrigues armou sua equipe num 4-4-1-1 que variava para um 4-1-4-1 sem a bola. A linha defensiva do goleiro George teve Roger pela direita, Marx e Tiago Papel no miolo e Carlos Renato na lateral esquerda. Na segunda linha, Djalma era o ponteiro direito, Leandro Ferreira e Rafael Jataí ficavam por dentro e Marcinho completava pela esquerda. Michel Cury fazia a ligação para o homem mais avançado, Fábio Júnior.

Compensações do Guarani

O treinador do Guarani disse na entrevista à TV pré-jogo que havia estudado os dois primeiros jogos do Cruzeiro. De fato, inspirado pelo 4-1-4-1 da Caldense no empate da última quarta-feira, Gian mandou a campo as mesmas duas linhas de quatro. Porém, nesta partida, talvez pelo fato de jogar “em casa”, tenha optado por dar mais liberdade a Michel Cury e livrar Fábio Jr. de qualquer trabalho defensivo.

Porém, o jogo começou com o Cruzeiro dominando a posse de bola. Com isso, Michel Cury afundava na segunda linha, de certa maneira “empurrando” um dos dois jogadores centrais para trás — normalmente era Leandro Ferreira — configurando assim o mesmo 4-1-4-1. Ficou a cargo deste homem entrelinhas, portanto, a marcação em cima do estreante De Arrascaeta, por causa do encaixe de marcação.

Mobilidade ofensiva

Mas o jovem uruguaio se movimentava muito, fazendo com que os jogadores do Guarani não conseguissem achar a marcação. Ele aparecia em todos os setores do ataque: pelo centro, pelos lados e até dentro da área, como no primeiro lance de real perigo da partida: quando Damião recuou para participar da construção da jogada, Arrascaeta foi à frente para ocupar o seu lugar. Damião girou em cima de seu marcador e lançou o uruguaio, que driblou o goleiro mas bateu pra fora. Ele tinha dois alvos livres de marcação dentro da área. Na repetição, é possível ver o jogador apontando para a orelha, como quem diz que não ouviu. Sinal da falta de entrosamento.

O lance acima também indica um aspecto muito interessante: a mobilidade de Damião. Quando ele foi contratado, meu receio era de que ele ficasse muito parado dentro da área, se movimentando pouco, com menos intensidade que Moreno fazia no ano passado. Mas aos poucos Damião vai se soltando e entendendo seu papel no sistema de Marcelo Oliveira. Sua movimentação vem sendo fundamental na criação.

Damião entre as linhas e Arrascaeta avançado; Mena passando pela esquerda e Henrique na cobertura: mobilidade já no primeiro lance perigoso do jogo

Damião entre as linhas e Arrascaeta avançado; Mena passando pela esquerda e Henrique na cobertura: mobilidade já no primeiro lance perigoso do jogo

Saída de bola

Já na transição ofensiva, quando a defesa do Guarani já estava recomposta, faltou ao Cruzeiro ter criatividade no primeiro passe, a famosa saída de bola. Fábio Jr. não marcava os zagueiros celestes, deixando-os à vontade para olhar o jogo de frente. Se entregavam a bola a Eurico ou Mena, estes eram imediatamente pressionados e quase sempre eram forçados ao passe de retorno. E como Arrascaeta não voltava para buscar a bola, ficava a cargo dos volantes iniciarem a construção pelo chão.

Ainda que Henrique tenha mais qualidade de passe pra fazer essa função, nem ele nem Willian Farias conseguiam fazer uma transição suave. Os dois conseguiram encaixar alguns passes, mas na maioria das vezes só faziam a bola rodar, sem avançar as linhas da equipe. Isso fazia o Cruzeiro ter maior posse de bola, mas apesar disso, a bola chegou poucas vezes perto da área adversária, sendo que na maioria delas foi em contra-ataques rápidos, quando a defesa do Guarani ainda estava desorganizada.

Segundo tempo

Apesar do placar do primeiro tempo em branco, os treinadores não mexeram nas suas equipes por opção. Apenas Marcelo teve que tirar Willian Farias do jogo por lesão, colocando Seymour no seu lugar. O sistema não se alterou, mas o chileno não teve a mesma pegada no meio-campo. Além disso, ao contrário do primeiro tempo, Seymour tentava aparecer na frente como opção de passe ainda na transição, mas se o passe saía errado, ele era pego fora de posição, deixando um buraco no meio para Henrique cobrir.

Assim, uma simples mudança que teoricamente seria seis por meia dúzia — volante de marcação por outro — foi responsável por reequilibrar o jogo no meio-campo. O Guarani começou a chegar mais e com mais perigo, quase sempre pegando a defesa do Cruzeiro saindo pro jogo e recompondo às pressas. Fábio Jr. chegou a perder um gol incrível, debaixo das traves.

Mas logo após este lance, em um dos raros momentos de apoio pela direita, Eurico cruzou para a área, onde estavam Arrascaeta e Damião. O uruguaio subiu pra disputar a bola e atrapalhou o zagueiro do Guarani, fazendo a bola sobrar no pé de Damião, que como típico centroavante, protegeu com o corpo, esperou o goleiro cair e mandou no outro canto.

As últimas trocas

No fim, Guarani espetou dois atacantes pelas pontas, mas isso desguarneceu seus laterais; no Cruzeiro, Arrascaeta já não se movimentava tanto como no início da partida

No fim, Guarani espetou dois atacantes pelas pontas, mas isso desguarneceu seus laterais; no Cruzeiro, Arrascaeta já não se movimentava tanto como no início da partida

O gol, porém, não parece ter mudado o panorama do jogo, como normalmente acontece. O Guarani, que já atacava mais que no primeiro tempo, seguiu tentando, agora em busca do empate. Pelo lado do Cruzeiro, a intensidade do primeiro tempo não continuou, e as jogadas de ataque fluíam menos. Willian errava muito no campo de ataque, e em um dado momento errou um drible que gerou um contra-ataque do Guarani.

Foi a deixa para Marcelo tirá-lo do jogo e lançar Judivan. O jovem foi jogar do lado esquerdo, pouco usual para ele, que prefere o direito. Mas sua estrela falou mais alto: em momento de recuperação de bola, Marquinhos colocou o garoto pra correr, que ficou no mano a mano com o zagueiro. Com um drible e um chute cruzado, a vantagem celeste foi ampliada.

O segundo gol, aí sim, seria o da tranquilidade. Seria, se João Carlos, que havia acabado de entrar na partida, não tivesse diminuído o placar em rebote de Fábio, numa falha da defesa celeste após um escanteio. Alguém largou a marcação do jogador; pelo replay, Seymour era o jogador mais próximo, mas não dá pra saber se era a função dele marcar o jogador.

João Carlos, entrou na vaga de Roger, que estava na lateral direita. Com isso, Vinicius Kiss, que havia entrado no primeiro tempo na vaga de Djalma, recuou à lateral. Walterson já havia entrado na vaga de Marcinho pelo outro lado. O Guarani se lançou à frente em busca do resultado, mas com dois atacantes pelos lados, a recomposição não era tão boa e a defesa ficava mais exposta. No fim, Mena e Marquinhos dobraram em cima de Vinicius Kiss pela esquerda, fazendo com que o zagueiro Marx abandonasse a área e fosse fazer a cobertura. Damião viu o buraco e foi até ele, recebendo totalmente livre o passe de Marquinhos, apenas encobrindo o goleiro para dar números finais ao jogo.

No terceiro gol, Mena e Marquinhos fizeram 2x1 em V.Kiss e obrigaram Marx a sair na cobertura, abrindo o espaço que Damião soube ler e aproveitar

No terceiro gol, Mena e Marquinhos fizeram 2×1 em V.Kiss e obrigaram Marx a sair na cobertura, abrindo o espaço que Damião soube ler e aproveitar

Melhorar sempre

A evolução do Cruzeiro neste jogo foi nítida, principalmente na fase ofensiva, com a entrada de De Arrascaeta. Além de prover mais criatividade com passes, o uruguaio também aplicou mobilidade, que Marcelo tanto cobra, ainda que no segundo tempo tenha se cansado. Também vi evolução no sistema defensivo, com um meio-campo mais consistente, o que deve ser uma marca dessa temporada.

Mas ainda há o que melhorar. A troca de posição na linha de 3 precisa ser maior; a saída de bola precisa ter mais fluência, mas isso só vem com o já famigerado entrosamento. Ainda há muitos jogadores a serem testados, mas a base está começando a aparecer. O mais importante é dar quilometragem para este grupo, de forma que possam se conhecer melhor.

Até a estreia na Libertadores, que é o que realmente interessa, serão 10 dias e mais um último teste contra o Boa em casa. Não é suficiente para atingir o ápice da forma física e tática, mas o suficiente para não passar sufoco na Bolívia.

Afinal, o ideal é se classificar sem percalços e atingir este ápice quando de fato interessa: das oitavas de final em diante.