Criciúma 1 x 2 Cruzeiro – Pressa vs. pressão

Assimetria equilibrada: a posição média dos jogadores mostra o ímpeto de Egídio (6) em comparação a Mayke (32); Guerreiro (55) plantado liberando Souza (78) e a centralização de Everton Ribeiro (17) com Luan (88) mais aberto

Assimetria equilibrada: a posição média dos jogadores mostra o ímpeto de Egídio (6) em comparação a Mayke (32); Guerreiro (55) plantado liberando Souza (78) e a centralização de Everton Ribeiro (17) com Luan (88) mais aberto

No futebol, simetria não implica necessariamente em equilíbrio. O próprio Cruzeiro de 2013 é um exemplo disso, com as diferentes características dos ponteiros de seu 4-2-3-1, tanto faladas aqui: Everton Ribeiro partindo da direita para o centro e pensando mais o jogo, e do outro lado Luan/Dagoberto mais agudo e penetrando na área.

Da mesma forma, pressa não significa velocidade. Ou, no caso específico desta partida, pressão. As duas palavras podem ser bem parecidas, mas semanticamente estão bem distantes uma da outra. O Criciúma teve pressa com e sem a bola, e por isso praticamente não incomodou Fábio. O Cruzeiro não teve pressa, mas também não foi tão intenso como nos últimos jogos.

Tudo isso faz ser ainda mais irônico o fato de que justamente o jogador que afirmou antes da partida que o Criciúma precisava “correr mais” fosse o que deu o presente para Vinicius Araújo abrir o placar no Heriberto Hulse.

Onze iniciais

Marcação "encaixada" no primeiro tempo, com Guerreiro sobrando e Egídio tendo problemas com Lins

Marcação “encaixada” no primeiro tempo, com Guerreiro sobrando e Egídio tendo problemas com Lins

Sem Nilton, poupado, Marcelo Oliveira pôs Leandro Guerreiro na companhia de Souza à frente da área. O resto do time não foi modificado em relação aos últimos jogos. O 4-2-3-1 teve Fábio no gol, com Mayke pela direita, Dedé e Bruno Rodrigo pelo centro e Egídio fechando o lado esquerdo da defesa. Guerreiro, por característica, ficou naturalmente mais plantado e se preocupando em marcar, dando total liberdade a Souza. Everton Ribeiro era o ponteiro direito, mais perto de Ricardo Goulart, o meia central, enquanto Luan permanecia mais aberto à esquerda. Na frente, Vinicius Araújo se movimentava.

O Criciúma do técnico Vadão veio armado num ousado 4-2-1-3 que encaixou a marcação com o Cruzeiro. O gol de Helton Leite foi protegido pelos zagueiros Matheus Ferraz e Fábio Ferreira, com Sueliton de lateral direito e Marlon pela esquerda. Ewerton Páscoa, zagueiro de origem, foi o volante, liberando Gilson — aquele mesmo que era lateral esquerdo por aqui — pra atacar e bater com Souza. Ivo foi o responsável pela criação para o trio de atacantes, formado por Lins à direita, Cassiano na referência e Fabinho à esquerda.

Pressa

O jogo começou com o time da casa a mil por hora. Mas isso não quer dizer que dominou as ações. Sem a bola, o Criciúma apertava sempre no dois contra um, às vezes até no três contra um, fazendo os jogadores do Cruzeiro tomarem decisões apressadas e errar muitos passes. Bola recuperada e os catarinenses imprimiam velocidade, mas sem organização. Por conta disso, a bola pouco parava no meio-campo, chegando rapidamente à área cruzeirense. Mas a partir daí a defesa levava a melhor, e a rigor, o Criciúma só teve uma chance, numa jogada pelo lado direito de Lins batendo de fora da área.

O Cruzeiro, por sua vez, tentava ser veloz, mas errando muitos passes, acossado pela correria do adversário. Mayke era perseguido por Fabinho e Egídio por Lins; Souza tinha Gilson em seu encalço e Goulart era marcado por Ewerton Páscoa. Só Ivo trabalhava menos defensivamente, o que significava que Leandro Guerreiro tinha mais tempo com a bola. Mas, como sabemos, ele não é o cara do primeiro passe, e também estava um pouco desentrosado, e por isso acabava por dar um passe pro lado pra não comprometer muito.

Chances em profusão

As muitas faltas cometidas perto da área poderiam ser um problema maior se a dupla de zagueiros não estivesse em ótima fase, ganhando todos os duelos. Aos poucos, a correria diminuiu, e cessou de vez quando Sueliton deu um presentaço para Vinicius Araújo dentro da pequena área, que bateu de canhota do jeito que veio e guardou.

O gol fez o time da casa se assustar. Fábio Ferreira se lesionou e foi substituído por Leonardo Moura, sem alterar o esquema, mas a postura era outra, sem tantas perseguições individuais dos jogadores do Criciúma. Vendo a chance de dar a intensidade que queria, e o Cruzeiro começou a encaixar passes e dar velocidade. O primeiro tempo acabou com o Cruzeiro finalizando 14 vezes a gol, sendo que 11 conclusões foram depois dos 29 minutos — o gol saiu aos 24.

Destas, 4 foram bloqueadas, 5 foram para fora e apenas 2 foram defendidas por Helton Leite, significando que o Cruzeiro criou mas ora demorava a finalizar, deixando os zagueiros catarinenses chegarem para bloquear, ora chutava mal. Isso por enquanto ainda não é um problema devido ao bom momento da defesa, mas pode significar pontos perdidos, como quase aconteceu no segundo tempo.

Acomodação?

No intervalo, Marcelo Oliveira tirou Luan, sob ameaça de expulsão por acúmulo de amarelos, para promover a entrada de William. O treinador disse à beira do campo antes da bola rolar que a intenção era explorar o contra-ataque, e que o jogador tem essa característica. Porém, o Criciúma também queria usar da mesma arma, e ao contrário do que Marcelo imaginou, o time catarinense recuou para “chamar” o Cruzeiro e partir em velocidade. Restou então ao time celeste tocar a bola e gastar o tempo, ocasionalmente chegando na área.

Mas bastaram dois lances mais ou menos perigosos para a torcida local se animar. Não dá pra afirmar que essa foi a causa, mas o Criciúma mudou de postura e avançou as linhas, retomando a estratégia do início do jogo. O Cruzeiro tentou acalmar novamente os ânimos, mas deixava demais a bola com os mandantes, e quase sempre perdia a segunda bola no meio-campo, tendo seus volantes muito recuados e distantes do trio de meias. Os contra-ataques não fluíam.

Bruno Lopes substituiu Cassiano na referência do ataque e logo perderia um gol em jogada pela direita de Lins. O cruzamento rasteiro não encontrou o substituto, mas logo depois, o mesmo Lins conseguiria mandar uma meia-bicicleta na trave sob a marcação de Bruno Rodrigo, e que foi completado para as redes por Bruno Lopes. Aqui, novamente, Lins brigava com Bruno Rodrigo e não com o seu marcador natural, que deveria ser Egídio.

Retomada com Egídio

Até o empate, o Cruzeiro só havia concluído a gol duas vezes no segundo tempo, com Souza e William, ambas no comecinho. Com o gol sofrido, o time parece ter acordado e resolveu jogar. Martinuccio entrou na vaga de Everton Ribeiro e foi para o lado esquerdo, colocando William na sua posição favorita pelo lado direito. Goulart permanecia no centro do meio-campo ofensivo.

A entrada do argentino parece ter favorecido o jogo de Egídio, que apesar do problema defensivo com Lins às suas costas, começou a apoiar corajosamente o ataque, fazendo bons cruzamentos e até arriscando chutes. O Criciúma recuou novamente. Borges entrou no lugar de Vinicius Araújo e logo na primeira bola quase marcou, com o lateral Marlon chegando no último momento para ceder o escanteio. A cobrança pela esquerda foi afastada pela zaga, mas William brigou pela sobra, passou a Martinuccio, que girou para o lado direito indo até a linha de fundo, achando Ricardo Goulart sozinho no meio da área para completar o cruzamento rasteiro de letra, decretando a vitória.

Futebol de campeão?

Nesta partida, o Cruzeiro mostrou segurança defensiva, principalmente nos duelos aéreos. Mesmo levando em conta que a equipe catarinense era um pouco desorganizada no ataque, os defensores celestes não tiveram tanto trabalho assim. Fábio só foi acionado de verdade uma ou duas vezes.

Ofensivamente, porém, o time celeste pecou em vários aspectos. O mais gritante deles é a ineficiência nas finalizações — parece um paradoxo falar isso do melhor ataque do campeonato. Porém, concluir 24 vezes e acertar apenas 4 no gol não pode ser considerado normal.

Cada chuteirinha representa uma finalização. Note a concentração nos momentos após os gols, representados pelas bolinhas

Mas este é um aspecto técnico. Taticamente, talvez tenha demorado um pouco para entender que tinha de tirar a velocidade do adversário antes de impor a sua própria. Porém, não é de se esperar esse nível de maturidade de um time em seu primeiro ano, por mais que já esteja “dando liga”. E esse aspecto pode ser atualmente o maior obstáculo para o time: saber quando acelerar e quando pisar no freio, “lendo” a partida da melhor maneira. Isso é estratégia, que também é um aspecto tático do jogo.

Assim, ainda não arrisco dizer a frase do título desta seção. Faltam aspectos importantes para isso, mas que eles vêm notadamante evoluindo a cada jogo, ah, isso vêm.

5 pensamentos sobre “Criciúma 1 x 2 Cruzeiro – Pressa vs. pressão

  1. Marcelo Albuquerque disse:

    Pois eu, meu caro Christiano, antes receoso (como comentei em outros posts) já me arrisco: o Cruzeiro é candidatíssimo ao título e tem apresentado futebol de campeão (se vai ganhar ou não são outros quinhentos). Creio, inclusive, que o astral anda muito bom para os lados da Toca da Raposa, o que é fator importante.
    Em relação ao jogo, concordo que errar tantas finalizações é preocupante (do ponto de vista do desempenho técnico), mas creio que isso é o mais fácil de corrigir, podendo ser, até mesmo, circunstancial. O que importa é que o desempenho tático favorece as múltiplas finalizações e, como sempre diz o Marcelo Oliveira, um time com essa intensidade ofensiva, vai sempre marcar gols. O que faltava, de fato, era o time mostrar segurança e entrosamento defensivos, o que mostrou tanto na partida contra o Coritiba quanto nesta contra o Criciúma. Se o adversário (desta última) não era lá grandes coisas, certo é que tentou pressionar (jogando em casa) e a nossa zaga foi bastante segura.
    As inúmeras finalizações após os gols revelam que, em alguma medida, o time sabe, sim, o momento de colocar intensidade na partida, assim como sua capacidade de reação (o time não se abateu tomando um gol no segundo tempo, numa partida em que jogava melhor, algo que, nos últimos anos, era motivo de desespero).
    Só acho que o Willian (talvez pelas circunstâncias de sua vinda) está em outra “passada”. Não entrou bem em nenhuma partida. Pela Esquerda, Martinuccio (e Dagoberto, quando voltar) são melhores opções a Luan e, pela Direita, já sinto saudades do Elber (mas o Lucca está mais no ritmo do time, razão pela qual não entendo a opção de Marcelo Oliveira pelo Willian).
    Pode acreditar, este ano, já entramos na briga.

  2. João Paulo disse:

    Cristiano,
    Mais uma análise perfeita. Talvez o único ingrediente de toda a receita que você tem poucas formas de atuar sobre é o tempo. O time azul começa a adquirir maturidade, principalmente depois de revezes e partidas difíceis como a contra o Criciúma, pois o jogo foi sim difícil, mas vai demorar um tempo para que a equipe adquira maturidade plena.
    Positivo foi o fato da equipe se mobilizar e conseguir o desempate mudando o curso da partida que estava para o adversário naquele momento.
    Como bem comentado, um dos poucos pontos que estamos sofrendo desde o início da competição, diria desde o jogo contra o Botafogo, é a questão das finalizações. Claro que não é por falta de trabalho, as outras virtudes do time nos mostram que um trabalho sério e bem estruturado está sendo feito. Mas está faltando um componente, talvez a tranquilidade, que está impedindo a “capitalização” da vantagem técnica e do grande volume de chances de gols criadas. Acho que a entrada do Batista irá contribuir efetivamente nesse quesito, pois ele é bom finalizador.
    Teve um lance emblemático na partida que ilustra bem o que você disse sobre a demora nas finalizações, mas que demonstra um efeito colateral do posicionamento invertido. O Ribeiro recebeu uma bola do Luan e ficou de cara para o gol, com totais condições de arrematar de fora da área. Como ele está na direita, ele teve que ajeitar a bola para a esquerda para o chute, fração de tempo que permitiu a chegada da defesa adversária. Se fosse um jogador destro ou ambidestro, o arremate poderia ter saído de primeira e o gol marcado.
    Outro fato positivo deste time é que mesmo nas derrotas e empates, não tivemos um jogo onde o adversário tenha nos dominado completamente. Isso mostra a categoria do time.
    Quanto ao jogo contra o Santos, quem vocês acham que será o substituto do Ribeiro? Eu arriscaria a entrada do Martinuccio, deslocando o Luan para a direita. A meu ver, o único problema dessa modificação seria o enfraquecimento da marcação pela esquerda, setor mais forte do Santos. Confio nos três pontos.
    Avante Cruzeiro!

  3. Marcelo Albuquerque disse:

    João Paulo,
    sua análise complementar foi bastante pertinente. E, realmente, o lance citado por você estava claro na minha lembrança. Outro exemplo: Vinícius Araújo hesitou na frente do gol na jogada mais fácil do jogo contra o Coritiba. Foi o psicológico, não o técnico, que o impediu de marcar ali, mas, tranquilo, o garoto tem qualidade e a maturidade está vindo mais rápido do que esperávamos (acho que a maioria dos que comenta neste blog concorda que o time seria ideal para o ano que vem).
    Quanto à sua pergunta, creio que o Marcelo é bastante coerente e, por isso, o mais provável é a entrada do Willian. Ele quer repetir o time o máximo possível e o deslocamento do Luan para a direita significaria, na prática, duas alterações. Eu gostaria de ver o Lucca de volta ao time, pois gostei de quando ele atuou na meia direita. Abraços a todos e avante Cruzeiro!

  4. João Paulo disse:

    Prezados,
    Com relação ao Willian, longe de ser craque, ele é um jogador com a famosa consciência tática, um dos motivos para ser mais lembrado pelo Marcelo. Além disso, ele está retornando do futebol Europeu e para se readaptar ao nosso estilo de jogo necessitará de um tempo. Na época de Corinthians era um pouco inconstante, mas é bom jogador.
    A vantagem de termos um banco com boas opções é que se o Marcelo optar pela entrada do Willian e não der certo, pode colocar o Martinuccio no decorrer do jogo. Apesar que eu preferiria o gringo para substituir o Ribeiro desde o início.
    Avante Cruzeiro.

  5. Rodrigo disse:

    Interessantíssima a demonstração gráfica das finalizações próximas aos gols. No caso do gol sofrido, pareceu realmente uma chicotada num time que parecia calcular o mínimo esforço pra vencer um adversário tão inferior.

    Sobre o substituo do ER, concordo com o Marcelo: queria o Lucca, mas acho que MO já sinalizou que, na cabeça dele, Willian é o substituto natural de ER.

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