Cruzeiro 1 x 0 Flamengo – Força e leveza

Com bons desempenhos nas duas pontas do campo, o Cruzeiro completou a quina e fechou o primeiro turno do Brasileirão com uma bela soma de pontos e boa vantagem para o segundo colocado (e que se não fosse um gol do Botafogo no último minuto do jogo contra o Criciúma, poderia ter sido ainda maior).

Foi um jogo mais difícil do que pareceu. Mesmo tendo muito volume de jogo, os jogadores celestes tomaram algumas decisões erradas no momento do passe decisivo. Mas a atuação defensiva quase perfeita em termos táticos compensou a baixa taxa de conversão de finalizações em gols do ataque: 22 tentativas, 5 no alvo e 1 pra dentro.

Os sistemas

Muitas setas nos três meias: intensidade ofensiva e defensiva para abrir espaços com a bola e ajudar na marcação sem ela

Muitas setas nos três meias: intensidade ofensiva e defensiva para abrir espaços com a bola e ajudar na marcação sem ela

Sem Júlio Baptista, o poupado da vez, Marcelo Oliveira mandou a campo o tradicional 4-2-3-1 que tem usado o ano inteiro, com o trio de meias mais móvel da temporada: Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Willian atrás de Borges. Com a volta de Nilton, Henrique cedeu seu lugar ao lado de Lucas Silva na proteção da linha defensiva, formada por Ceará pela direita, Egídio pela esquerda e Dedé e Bruno Rodrigo por dentro, guardando a meta de Fábio.

Mano Menezes inverteu a orientação do triângulo do meio-campo, abandonando o 4-3-3 em favor do mesmo 4-2-3-1 celeste. Sem Felipe, Paulo Victor ficou na moldura, tendo Léo Moura de volta à lateral direita, Wallace e Samir no miolo de zaga e André Santos na lateral esquerda. Luiz Antônio e Cáceres foram os volantes, com Elias desta vez como meia central, e flanqueado por Gabriel à esquerda e Rafinha à direita. Na frente, Hernane continuou no comando do ataque.

Quinze minutos de pressão

O Cruzeiro começou o jogo tentando sufocar o Flamengo, marcando no alto do campo para roubar a bola o mais rápido possível. Com menos de um minuto, Willian já havia tentando o seu primeiro chute, e logo depois foi Éverton Ribeiro quem fez nova tentativa. O Flamengo, porém, se contentou em jogar defensivamente, com linhas bem próximas, exatamente para tentar evitar o toque de bola envolvente que o Cruzeiro tentava impor. Até os 15 minutos, só o Cruzeiro jogou, e o Flamengo só rebatia a bola e esperava novo ataque. O time celeste chegou a ter 75% de posse de bola nesse período.

Depois disso, no entanto, o Cruzeiro baixou sua marcação e deixou os zagueiros do Flamengo livres, talvez numa tentativa de espaçar as linhas do time adversário para encontrar mais liberdade. Não funcionou bem, em parte porque o Flamengo não quis sair para o jogo — continuou simplesmente tirando a velocidade celeste e atrasando o máximo possível os ataques — e em parte porque o único jogador mais criativo da equipe carioca, Elias, estava mais à frente, marcado, e sem estar em sua melhor forma física, e por isso o Flamengo ficou sem saída de bola.

Defesas

Mas isso também foi ocasionado pela ótima marcação do Cruzeiro. Se com a bola o trio de meias tinha certa dificuldade em vencer a marcação adversária, defensivamente eles mostraram uma aplicação impressionante. Até mesmo Éverton Ribeiro, que em jogos anteriores não era tão exigido na marcação, voltou até a linha de fundo para marcar e cobrir o lateral se estivesse por um dos lados, e marcava os volantes quando estava pelo meio. O mesmo pode ser dito de Ricardo Goulart e Willian, que fizeram o tradicional carrossel na linha de três, e por isso marcavam um adversário diferente a cada momento.

Já o posicionamento defensivo do Flamengo era mais rígido. Hernane se alinhava a Elias no centro e o Flamengo desenhava uma espécie de 4-2-4-0 — Dedé e Bruno Rodrigo tinha todo o tempo do mundo com a bola nos pés. Rafinha vigiava Egídio pela esquerda e Gabriel fazia o mesmo com Ceará pela direita, mas o Cruzeiro usava uma estratégia interessante de atrair o time adversário para um lado do campo, puxando o ponta oposto do Flamengo para o centro do gramado, e girava a bola rapidamente para o lateral do outro lado, que ganhava espaço para avançar e fazia o ponta recuar em diagonal.

Último passe

A partir dessa linha, porém, o Cruzeiro teve dificuldade. O Cruzeiro aplicava movimentação, com a já mencionada troca de posições entre os meias e a participação de Lucas Silva como ponto de apoio mais atrás — coisa que o Cruzeiro não tem tanto quando Nilton e Souza estão em campo — e com isso os espaços eram criados, mas o último passe não encaixava ou não saía. Exemplos foram o lance de Willian pela direita em tabela com Éverton Ribeiro, quando cruzou fraco e fechado demais nas mãos de Paulo Victor; e um passe de Willian para Ribeiro que deveria ter sido devolvido — Éverton preferiu finalizar e errou.

O jogo seguiu nessa toada até o fim, não só do primeiro tempo mas como do jogo. Um bom resumo seria: o ataque cruzeirense e a defesa carioca travando um duelo equilibrado e a defesa do Cruzeiro levando ampla vantagem sobre o inoperante e quase inexistente ataque do Flamengo.

Invertendo o lado

No fim do primeiro tempo, uma falta no meio-campo rendeu um cartão amarelo para Egídio, que fez Marcelo Oliveira agir com cautela e tirar o lateral do jogo. Sem um lateral esquerdo reserva devido à lesão de Éverton, Ceará foi deslocado para lá e Mayke entrou no jogo. Isso acabou dando uma solidez defensiva ainda maior, já que a experiência de Ceará falou bem mais alto que os atacantes do Flamengo, e ele simplesmente venceu todos os duelos. Nenhum cruzamento partiu da lateral de onde Ceará se encontrava, tanto no primeiro quanto no segundo tempo.

Por outro lado, sem Egídio e com Mayke, o Cruzeiro acabou ganhando uma opção ofensiva pelo lado “contrário” ao que está acostumado. Ceará naturalmente se resguarda mais e libera Mayke, e foi numa jogada síntese do Cruzeiro 2013 que saiu o gol da vitória. Drible de Éverton Ribeiro, passe para Willian à frente, que recuou para Ricardo Goulart — todos os meias pelo centro e abrindo os corredores — que imediatamente conectou a Mayke, totalmente livre de marcação por causa dessa movimentação. Ele centrou para Goulart, que já estava dentro da pequena área. O camisa 31 errou o cabeceio, mas a bola beijou a trave e voltou em seus pés com o goleiro vendido. Uma dose de sorte, afinal, a sorte acompanha os competentes.

Com Ceará mais preso na esquerda, Mayke pôde se soltar mais e o Cruzeiro acabou preferindo o lado direito para atacar

Com Ceará mais preso na esquerda, Mayke pôde se soltar mais e o Cruzeiro acabou preferindo o lado direito para atacar

Outras trocas

Mesmo depois do gol, as posturas não se alteraram. O Cruzeiro com a bola, atacando e tentando criar, e a defesa do Flamengo mostrando uma determinação tática impressionante. Mano fez sua primeira mexida mandando Nixon a campo na vaga de Rafinha, sem alterar o desenho tático. Talvez fosse uma tentativa de jogar em velocidade às costas de Ceará, mas nosso camisa 2 inutilizou essa substituição com uma atuação defensiva impecável.

No Cruzeiro, Marcelo Oliveira tentou “bagunçar” a rigidez ofensiva do Flamengo tirando Borges, o centro-avante do time para lançar Dagoberto. A princípio, Dagoberto ficou pela esquerda batendo com Léo Moura, com Éverton Ribeiro pelo meio, Willian pela direita e Goulart à frente. Mas a ideia era ter um quarteto totalmente móvel, e que funcionou exatamente dessa forma. Goulart recuava, Dagoberto invertia de lado, Willian passava ao centro e Éverton Ribeiro caía pela esquerda — um verdadeiro carrossel que melhorou um pouco a produção ofensiva. Porém, o último passe continuou não saindo, ou saindo para o lado errado.

Mano trocou ainda Gabriel e Luiz Antônio por Bruninho e Carlos Eduardo. Elias recuou à faixa dos volantes e Carlos Eduardo foi ser o meia central, mantendo o 4-2-3-1. E no Cruzeiro, Alisson entrou na vaga de Willian e jogou mais pelo centro, com os outros três orbitando, mas houve pouco tempo para que o garoto tivesse uma maior influência na partida.

Liquidez e solidez

Muito se fala do ataque do Cruzeiro neste Brasileirão. Maior número de gols marcados, de finalizações e finalizações certas. Quem acompanha o blog sabe que isto se deve também à maleabilidade e intensidade do sistema ofensivo, com o trio de meias e sua movimentação e aproximação, não guardando posição e sempre abrindo linhas de passe para os companheiros.

A posição média mostra como o Cruzeiro foi maleável e o Flamengo rígido; Éverton Ribeiro (17), Ricardo Goulart (31) e Willian (41) atuam tão próximos quee se confundem. Ceará (2) está no centro porque atuou um tempo em cada lateral

A posição média mostra como o Cruzeiro foi maleável e o Flamengo rígido; Éverton Ribeiro (17), Ricardo Goulart (31) e Willian (41) atuam tão próximos quee se confundem. Ceará (2) está no centro porque atuou um tempo em cada lateral

Mas se voltarmos os olhos para a outra ponta do campo também vamos ver um time sólido, taticamente bem postado e com muita intensidade também na marcação. O Flamengo só chutou 5 vezes, e nenhuma delas no gol — Fábio nem sujou o uniforme. O trabalho sem a bola começa já no ataque, e a aplicação dos meias neste jogo em particular saltou aos olhos. Isto vai de encontro ao que Marcelo Oliveira disse no programa “Bem, Amigos!” do SporTV quando lá foi entrevistado: é mais fácil fazer um jogador técnico marcar do que um jogador mais físico e defensivo jogar. Esta aí a prova.

Agora vem o segundo turno. Mais 19 partidas, porém concentradas em um menor espaço de tempo — o desgaste físico pode influenciar. Além disso, a posição incontestável no topo da tabela faz do Cruzeiro um time mais visado, mais estudado, o que é mais um fator de dificuldade.

Mas, para ser campeão, é preciso vencer isso também — e a possibilidade é grande.

2 pensamentos sobre “Cruzeiro 1 x 0 Flamengo – Força e leveza

  1. Rodrigo disse:

    Gostei do “carrossel” celeste. Previsível como, sem Júlio Baptista, o Cruzeiro voltou a errar muitas finalizações. Ressalvas feitas ao eventual preciosismo nas jogadas, mobilidade e solidez ofensiva impressionam.

    Mesmo sendo os torcedores realistas que somoe, começamos a acreditar no título na 9a. rodada. Depois de 11 rodadas, liderando com o melhor ataque, com 4 de folga para o Botafogo e 13 para o “candidato ao título” Corinthians, a grande imprensa COMEÇA a acreditar que o Cruzeiro é CANDIDATO a campeão. O elenco qualificado, técnico competente e a disparidade para os concorrentes me fazem pensar que é irreversível. Não tem o quê dar errado. Contagem regressiva para o tri.

  2. João Paulo disse:

    Cristiano
    Boa análise. Tivemos mais uma prova de que a eliminação na Copa do Brasil foi um golpe de sorte do Flamengo.
    Importante foi que o time manteve a liderança, a vantagem de pontos e fez uma partida controlada e pontuou.
    Estou muito impressionado com o trabalho do Marcelo. Apesar do pouco tempo a frente do time, a consistência tática da equipe impressiona. Como já afirmei no passado, a maneira do time jogar lembra muito a de times europeus como o Borussia Dortmund. O time está praticando um futebol moderno.
    Quanto as possibilidades de título, claro que o time está na briga, mas temos de esperar pelas próximas rodadas, acho que o comportamento do time até o jogo contra o Grêmio irá nos mostrar o que o time irá almejar, eu acredito muito neste título.
    De qualquer forma, está dando gosto ver o time jogar este ano!
    Avante Cruzeiro.

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