Grêmio 3 x 1 Cruzeiro – Falta e excesso

O cartão vermelho mostrado a Souza ainda no primeiro tempo foi, com toda a certeza, a principal razão da derrota para o Grêmio em Porto Alegre. Uma expulsão que foi, de certa forma, ocasionada pelo excesso de vontade do volante, em que pese o excesso de rigor do árbitro no segundo cartão amarelo.

Enquanto teve onze jogadores, porém, o Cruzeiro controlou a partida com maturidade, se defendendo bem e lentamente chamando o domínio para si. Mas pecou, novamente, na falta de eficiência nas finalizações. Ou excesso de erros, como preferir.

Escretes

Quando ainda tinha onze em campo, o Cruzeiro foi superior no meio-campo e tinha boa movimentação defensiva pelos lados

Quando ainda tinha onze em campo, o Cruzeiro foi superior no meio-campo e tinha boa movimentação defensiva pelos lados

Desta feita, o poupado da vez foi o lateral Mayke. Assim, Ceará fechava a linha defensiva pela direita, juntamente com os titulares Dedé, Bruno Rodrigo e Egídio, protegendo o gol de Fábio. Mais à frente, Nilton e Souza vigiavam a entrada da área, com Ricardo Goulart mais à frente e flanqueado por Luan à esquerda e Everton Ribeiro, de volta, à direita e circulando. Na frente, Vinicius Araújo era mais uma vez o centroavante.

Já Renato Portaluppi armou o Grêmio num 3-4-1-2 típico. Velho conhecido, o goleiro Dida tinha os zagueiros Werley pela direita, Rhodolfo pelo meio e Bressan pela esquerda. Com isso, os alas Pará pela direita e Alex Telles pela esquerda ficavam alinhados aos volantes Ramiro e Souza. Na ligação, Maxi Rodriguez era o responsável por pensar o jogo para a dupla de atacantes Barcos e Kleber.

O lado esquerdo

O Grêmio começou o jogo marcando muito, recuperando a posse por várias vezes. Entretanto, a marcação do Cruzeiro foi muito eficiente. Quando o jogo ia para a esquerda, Luan subia a pressão em Werley, deixando Pará para Egídio, e Everton Ribeiro centralizava para congestionar o meio-campo. Em teoria, isso deixava Alex Telles livre, mas quando a bola ia para a direita, todo o sistema se repetia do outro lado — Luan ia marcar no meio e Ribeiro pressionava Bressan. Sem passe no meio, o Grêmio não conseguia sair tocando e abusava de bolas longas. A defesa do Cruzeiro repelia sem problemas.

Ofensivamente, o Cruzeiro era acossado pela intensidade adversária, que não durou muito. Aos poucos o Grêmio foi arrefecendo, mas também o Cruzeiro encaixava sequências de passes que conseguiam abrir a defesa gaúcha. Everton Ribeiro contribuiu muito neste sentido, com sua movimentação peculiar de sair da direita para armar o time por dentro — isso confunde demais a marcação adversária. O lance que originou o pênalti é um bom exemplo: jogada de Goulart de letra para Ribeiro, que inverteu rapidamente para Egídio entrar totalmente livre e cruzar.

Para ilustrar o domínio, até o pênalti, o Grêmio atentou 4 vezes contra Fábio, enquato o Cruzeiro disparou 12 vezes. Entretanto, o time da casa acertou metade de suas tentativas, duas, ao passo de que o Cruzeiro acertou apenas três vezes no gol. E ainda acertou a trave logo antes do lance do pênalti com Vinicius Araújo.

Desperdício e expulsão

Everton Ribeiro não cobrou mal o pênalti. Dida é que é um grande goleiro, nos dois sentidos, e foi buscar uma bola no cantinho. Perder pênaltis é natural do futebol, e pra mim o Cruzeiro iria demonstrar maturidade e continuar dominando a partida, mesmo considerando o ganho psicológico que uma defesa de pênalti dá para um time, ainda mais jogando em casa.

Ledo engano. Souza, que já havia sido amarelado, fez uma falta boba no meio-campo, na frente do juiz. Era uma falta normal de jogo, mas PC Oliveira não quis saber e mostrou o segundo amarelo.

Até a entrada de Guerreiro, o Cruzeiro se postou num 4-4-1-1 típico, com Ribeiro, Goulart, Nilton e Luan à frente da linha defensiva. Com a saída de Vinicius Araújo para a recomposição, o Cruzeiro mudou para uma espécie de 4-2-3, com Luan centralizado, Goulart fechando o lado direito e Everton Ribeiro ligeiramente mais avançado pelo lado esquerdo.

Se um sistema com três zagueiros já causavam redundância de cobertura contra o centroavante único de um 4-2-3-1, com dez em campo e sem um centroavante típico, o Grêmio tinha agora três jogadores ociosos, os zagueiros. Luan voltava para pressionar os volantes e os ponteiros Ribeiro e Goulart acompanhavam os alas. Maxi Rodriguez, que já não estava aparecendo no jogo antes, sumiu de vez, e o Cruzeiro se segurou tranquilamente até o fim do primeiro tempo. Pra se ter uma ideia, após a expulsão o Grêmio só finalizou uma vez, um chute bloqueado de Ramiro.

Trocas

Surpreendentemente, Renato Portaluppi não desfez seu esquema já no intervalo. Demorou 9 minutos para isso: tirou Bressan e mandou a campo Guilherme Biteco, que foi jogar de ponteiro esquerdo. Os alas recuaram para a última linha, e o Grêmio agora se postava num 4-2-1-3 “torto”, com Barcos e Kleber ainda à frente, mas Biteco alinhado ao ainda centralizado Maxi Rodriguez.

Até este momento, o jogo continuava como havia terminado na primeira etapa, com o Grêmio tendo dificuldade para penetrar na defesa cruzeirense, mesmo tendo mais a bola nos pés. A partir daquele momento, porém, a marcação se encaixou melhor e os efeitos de se ter um homem a menos começaram a aparecer. O escanteio que originou o lance do primeiro gol só saiu devido a um efeito cascata nas coberturas, iniciadas por um bote errado de Egídio. Quando um bote sai errado, o jogador sobra, e outro defensor tem que sair para cobrir, abrindo outra linha de passe.

Logo após o gol, Marcelo mudou sua estratégia. Com o zero a zero no placar, e uma certa facilidade em segurar o time adversário, segurar a bola era uma opção. Atrás no placar, porém, era preciso ir buscar o empate em contra-ataques, a única opção. E por isso Marcelo Oliveira pôs Willian no jogo na vaga de Everton Ribeiro. O time se mudou para um 4-4-1 novamente, com Luan à frente e Willian e Goulart pelos lados.

Mas nem deu tempo de testar a formação. O segundo gol saiu em uma bola desviada num lance típico de um time com um jogador a mais. Willian saiu da marcação em Pará para pressionar à frente, tentando fechar a opção do passe de Rhodolfo para Werley, mas o zagueiro inverteu pelo alto para Pará. Willian voltou correndo para marcar, e quando chegou, esticou o pé o suficiente para desviar a bola e pegar as coberturas desprevenidas. Barcos aproveitou.

Comportamento típico de um time com um homem a menos: Willian avançaria para pressionar o zagueiro, mas logo tem que voltar para cobrir o avanço de Pará. Ao chegar atrasado, desviaria o passe, que sobra para Barcos marcar o segundo

Comportamento típico de um time com um homem a menos: Willian avançaria para pressionar o zagueiro, mas logo tem que voltar para cobrir o avanço de Pará. Ao chegar atrasado, desviaria o passe, que sobra para Barcos marcar o segundo

Posse de bola?

Depois do segundo gol o Grêmio pareceu relaxar. A grande vantagem no placar e o jogador a mais certamente são fatores para isso, e assim o Cruzeiro começou a ter posse de bola, um quesito atípico para quem está jogando com dez contra onze. E de certa forma até levou algum perigo, chegando ao ponto de Renato Portaluppi colocar Matheus Biteco no lugar de Maxi Rodriguez para formar um 4-4-2 britânico (com o meio-campo em linha), com os irmãos Biteco de ponteiros na segunda linha.

O 4-4-1/4-2-3 do Cruzeiro após a expulsão até segurou bem o Grêmio no 4-2-1-3 e depois no 4-4-2, considerando que os gols saíram em bolas paradas e em um passe desviado

O 4-4-1/4-2-3 do Cruzeiro após a expulsão até segurou bem o Grêmio no 4-2-1-3 e depois no 4-4-2, considerando que os gols saíram em bolas paradas e em um passe desviado

Mesmo assim, o Cruzeiro continuou com mais posse de bola, e mesmo depois do gol de Nilton continuou a tê-la — chegaria ao fim com incríveis 53% de posse (WhoScored), consideradas as circunstâncias. Porém, as esperanças de uma reação épica foram enterradas em um erro de posicionamento em bola parada: Kleber aproveitou, sozinho, o rebote de Fábio em cobrança de falta e fez o terceiro.

As outras trocas em nada mudaram o panorama da partida: Nilton se lesionou e deu seu lugar a Lucas Silva, e Kleber saiu para a entrada do atacante Paulinho, um jogador mais de lado, fazendo Barcos ser um centroavante típico.

Bom futebol, Pontos perdidos

Perder nunca é bom, obviamente. Ainda mais em um campeonato tão equilibrado, onde mesmo perdendo cinco pontos nos últimos dois jogos o Cruzeiro permanece liderando a competição (esta análise está sendo escrita antes do jogo do Botafogo na quinta). Porém, se há um jeito melhor de perder, é perder jogando bem. E foi assim que a partida se apresentou. Se analisarmos bem, nenhum dos gols do Grêmio saiu em jogadas construídas pelo chão, com infiltração na defesa: foram duas bolas paradas e um passe desviado. Indícios de que o Cruzeiro, pelo menos taticamente, se postou bem.

Pela internet, em blogs de torcedores, muitas pessoas questionaram após a partida as trocas de Marcelo, principalmente a saída de Ribeiro para a entrada de Willian. A maioria parecia querer a saída de Luan. Entretanto, acredito que estes críticos só olharam a parte técnica, já que Ribeiro era certamente um dos melhores em campo. Taticamente, porém, ele não é marcador, e com dez em campo todos os jogadores tem que trabalhar defensivamente. Além disso, a tarefa de duelar com os zagueiros pela posse da bola longa é para jogadores mais físicos, coisa que Ribeiro certamente não é.

Enfim, perder é ruim. Agora, perder sabendo que você era melhor na partida pode ser melhor ou pior: depende do ponto de vista. Perspectiva de um bom time para o resto do campeonato, ou lamentações de pontos perdidos?

Sou mais a primeira opção.

Villa Nova 0 x 4 Cruzeiro – Variações sobre um mesmo tema

Uma sutil mas interessante variação tática foi mais um dos fatores que praticamente garantiram a vaga na final do Campeonato Mineiro ao Cruzeiro, na vitória por 4 a 0 sobre o Villa Nova em Nova Lima.

Se na primeira fase o Villa Nova havia sido o adversário mais difícil para o escrete celeste, muito pelo fato de simplesmente ter mais jogadores no centro do meio-campo em um gramado pequeno, no jogo deste domingo Marcelo Oliveira soube neutralizar esta vantagem fazendo número em outro lugar do campo: os flancos.

Escalações iniciais

O 4-2-3-1 usual, mas com os três fazendo uma diagonal que variava para o losango no meio, com o avanço de Nilton e a centralização de Ribeiro

O 4-2-3-1 usual, mas com os três fazendo uma diagonal que variava para o losango no meio, com o avanço de Nilton e a centralização de Ribeiro

Com a bola, Marcelo posicionava sua equipe no 4-2-3-1 usual, com o gol de Fábio sendo protegido pelos zagueiros Léo e Bruno Rodrigo,

e com os laterais Mayke na direita, no lugar do lesionado Ceará, e Éverton na esquerda. Leandro Guerreiro e Nilton formara novamente a dupla de volantes, com o segundo com mais liberdade para atacar que o primeiro. Éverton Ribeiro fez o ponteiro direito, mas com a tendência costumeira de centralizar, se aproximando de Diego Souza, e abrindo o corredor. Do outro lado, mais espetado e entrando em diagonal na área, Dagoberto procurava Anselmo Ramon, o centro-avante de referência.

O Villa Nova de Alexandre Barroso veio no mesmo 4-3-1-2 losango do jogo da primeira fase. O goleiro William Nobre viu Rodrigo Dias à sua direita e Hyago à sua esquerda, flanqueando os zagueiros Heitor e Marco Tiago. Cléber Monteiro foi o cabeça-de-área, com os carrileros Max Carrasco e Marcelo Rosa à frente, ajudando Tchô, a ponta de cima do losango. Na frente, Rafael Gomes e Eraldo esperavam as bolas.

A variação tática

O jogo começou com o Cruzeiro sufocando o Villa Nova em seu próprio campo durante alguns minutos, com uma marcação pressão bem alta, sem deixar o time da casa ter longos períodos de posse de bola. Quando o ritmo da marcação diminuiu naturalmente, o Villa Nova conseguiu ter um pouco mais a bola nos pés e a variação tática apareceu. Everton Ribeiro marcava o volante e não o lateral, e Nilton saía para dar combate no meio. Na prática, era um 4-3-1-2 losango com o avanço do volante e o recuo e centralização do meia.

Com Leandro Guerreiro mais plantado para marcar Tchô, todos os passes simples dos zagueiros do Villa tinham sido cortados. Os laterais saíam pouco, e quando saíam, também não tinham a quem passar a bola. A mudança foi sutil, mas bem eficiente, já que a bola não chegava em Tchô, o principal jogador da partida na primeira fase. Fábio praticamente não tocou na bola no primeiro tempo.

Movimentação ofensiva

Com a bola, o Cruzeiro executou brilhantemente o 4-2-3-1 “diagonal”. A linha de três meias se encontravam constantemente em campo, com toques curtos e rápidos, provocando efeitos dominó de cobertura no sistema defensivo villanovense. A marcação do time adversário era atraída para os flancos, principalmente para a esquerda. Com a marcação concentrada, um espaço imenso se abriu à frente da área, e o Cruzeiro aproveitou. O primeiro gol saiu em uma falta sofrida por Everton Ribeiro naquele setor, e nos dois seguintes Diego Souza teve todo o tempo e espaço do mundo para calibrar o chute e vencer William Nobre de fora da área.

A jogada do terceiro gol: Ribeiro atrai a marcação e tira dois adversários da jogada com o passe de calcanhar, liberando toda a entrada da área para Diego Souza

A jogada do terceiro gol: Ribeiro atrai a marcação e tira dois adversários da jogada com o passe de calcanhar, liberando toda a entrada da área para Diego Souza

A intensidade foi tal que aos 36 do primeiro tempo o jogo já estava resolvido.

Substituições

Alexandre Barros tentou soltar mais seus laterais colocando o zagueiro Evaldo no lugar do volante Marcelo Rosa. No novo 3-4-1-2, os laterais ficam mais altos. Foi uma boa mexida, e não muito arriscada. Logo no começo Fábio finalmente trabalhou, defendendo um cabeceio à queima-roupa do zagueiro Heitor em cruzamento na área.

Mas para reequilibrar a partida, era preciso mais que liberar os laterais. Por isso Tchô tentava se movimentar para sair da perseguição de Leandro Guerreiro, mas o volante levou a melhor no duelo e a principal arma criativa do Villa Nova ficou apagada. O Cruzeiro continuou comandando as ações, e só não ampliou antes porque Diego Souza driblou meio time e não concluiu na hora certa. Mas o quarto gol veio, num contra-ataque com o próprio Diego Souza e Everton Ribeiro. O camisa 17 recebeu na área e, com muita tranquilidade, tirou dois jogadores antes de concluir sem chances para William Nobre.

Imediatamente após o gol, Marcelo lançou Ricardo Goulart na vaga de Dagoberto. Provavelmente a intenção era dar novo ânimo ao time, para continuar buscando o gol. No Villa, Alexandre Barroso tentou sua última cartada mandando Maurim na vaga de Hyago, mas sem alterar o plano tático. O jogador até que avançou bastante, explorando o lado direito do Cruzeiro que Everton Ribeiro deixou de cobrir com a entrada de Goulart, mas sem sucesso.

Vinicius Araújo e Tinga foram a campo nos lugares de Anselmo Ramon e Everton Ribeiro. O cabeludo, quando entrou, foi filmado fazendo um três com a mão e sinalizando para alguém ir para o outro lado. Não deu pra entender muito o que significava, mas provavelmente era a manutenção do 4-2-3-1, sendo que Tinga cobriria o lado direito, Ricardo o centro e Diego o esquerdo. Mesmo assim houve troca de posições, porque Diego não recuava tanto para defender, ao contrário dos outros dois meias. Mas nada de mais aconteceu até o fim da partida, com o Cruzeiro claramente se poupando e satisfeito com o resultado.

Deu liga?

É tentador dizer que o time de Marcelo Oliveira se consolidou tão precocemente. Porém, é inegável a evolução enquanto equipe: os toques rápidos e curtos que envolveram a defesa villanovense no primeiro tempo são prova de que os jogadores já se acham em campo com facilidade, criando espaços uns para os outros.

Além disso, ter uma variação tática e não perder a qualidade é um indicativo de trabalho avançado. É mais comum o treinador chegar e tentar primeiro ter uma base tática bem treinada, antes de pensar em variações com os mesmos onze jogadores. O reposicionamento para o losango não é tão radical, pelas características dos jogadores: Everton Ribeiro já centraliza naturalmente, enquanto Dagoberto já fica mais avançado. Praticamente foi preciso apenas oficializar Guerreiro como o primeiro homem e soltar Nilton, algo que antes não era definido.

Mas ainda há espaço para melhorar mais. Com a posse da bola, o Cruzeiro tem jogado fluentemente, mas pode se beneficiar com a entrada de um volante que saiba jogar, que chegue mais à frente. E quando o Cruzeiro se defende, ainda precisa melhorar a pressão no alto do campo, que precisa ser mais coordenada entre os quatro homens ofensivos, para encurtar os espaços e recuperar a bola o mais rápido possível.

O jogo de hoje contra o Resende será mais uma oportunidade para este time mostrar que não é fogo de palha. Mas o primeiro teste verdadeiro será a final do Campeonato Mineiro, que muito provavelmente será contra o “badalado” rival. Eu diria que chegamos assustando, tão fortes quanto eles. Talvez até mais.

Araxá 2 x 3 Cruzeiro – Depois do vermelho

Num jogo em que o Araxá executou muito bem sua proposta tática, Borges marcou duas vezes e o Cruzeiro manteve a liderança do Campeonato Mineiro — tarefa que foi facilitada pela expulsão de Carlão no início da etapa final.

O 4-2-3-1 inicial: Diego Souza se movimentando, laterais bloqueados pelos alas adversários e volantes pouco participativos

O 4-2-3-1 inicial: Diego Souza se movimentando, laterais bloqueados pelos alas adversários e volantes pouco participativos

O 4-2-3-1 habitual de Marcelo Oliveira desta vez teve duas novidades no quarteto ofensivo em relação ao jogo passado: atrás do garoto Vinicius Araújo no comando do ataque, Dagoberto voltou ao time titular como ponteiro esquerdo. Diego Souza centralizado e Everton Ribeiro completavam a linha de três meias, suportada por Leandro Guerreiro e Nilton na dupla volância e a linha defensiva formada por Ceará na lateral direita, Everton na lateral esquerda e Nirley estreando ao lado de Paulão no miolo de zaga, protegendo o gol de Fábio.

O Araxá do técnico Flávio Lopes teve três zagueiros “ão” à frente do gol de Marcelo Cruz: dois “Rodrigões”, o Mineiro pela direita e o Paulista por dentro, e Carlão pela esquerda. No meio campo do 3-4-1-2, os alas Osvaldir na direita e Fabiano na esquerda flanqueavam os volantes Bruno Moreno e Balduíno e Braitner era o encarregado da ligação para Evandro e Fabrício Carvalho.

Encaixe

Em seu livro sobre a história da tática no futebol, “Invertendo a Pirâmide” (infelizmente ainda não publicado no Brasil), Jonathan Wilson discorre sobre a ascensão do 4-2-3-1 e, por consequência, o declínio do 3-5-2 (e sistemas derivados). Em resumo, ele diz, citando Nelsinho Batista, que os alas do 3-5-2 têm que recuar para marcar os ponteiros do 4-2-3-1, criando uma sobra redundante de cinco homens contra três. Isso libera os laterais adversários para ser o homem da sobra na defesa, ajudar no meio-campo ou apoiar o ataque sem ser incomodados. Assim, o time do 4-2-3-1 domina a posse de bola e ao mesmo tempo tem mais amplitude.

No entanto, corajosamente, Flávio Lopes pediu justamente o oposto para seus alas: Fabiano e, principalmente, Osvaldir jogavam muito avançados, alinhando-se com os meias, formando uma espécie de 3-2-4-1. O objetivo era justamente bloquear a saída pelas laterais do Cruzeiro, que foi a única alternativa no primeiro tempo do jogo anterior. Era só a bola chegar em Ceará ou Everton que eles já eram pressionados, à frente da linha do meio-campo, pelos alas. Quase não vimos o camisa 2 e o 23 apoiarem o ataque. Isso, somado à pouca participação ofensiva dos volantes, e a forte marcação imposta ao quarteto ofensivo, deixava o Cruzeiro com mais posse de bola — chegou a mais de 60% em um determinado momento do primeiro tempo — mas sem produzir muito.

Sobra no meio

A marcação araxaense na última linha, inclusive, tinha uma particularidade. Os zagueiros não permaneciam centralizados, como é o costume de um sistema com um trio defensivo. Os zagueiros de lado saíam à caça dos ponteiros cruzeirenses, enquanto Rodrigão Paulista ficava a cargo de Vinicius Araújo. Não havia cobertura na zaga, pois ela estava no meio-campo: Diego Souza era perseguido de perto por Balduíno, com Bruno Moreno ajudando. Com todos os jogadores ocupados, sobrava para os zagueiros Paulão e Nirley — nenhum particularmente criativo ou bom passador — iniciarem o trabalho de ataque.

Todos estes fatores fizeram o Araxá ser melhor no primeiro tempo. A cada passe errado do Cruzeiro, a bola chegava rapidamente em Fabrício Carvalho, que fez uma excelente partida na função do centro-avante de referência. Ele abusou dos passes de primeira para o velocíssimo Evandro, sempre levando a melhor sobre Nirley e pegando a defesa do Cruzeiro desprevenida, sem o suporte dos volantes. As chances criadas pelo time da casa não foram em vão.

A jogada do gol não teve particularmente um aspecto tático, tirando o fato do Araxá estar com a marcação bem adiantada na posse de bola azul (a alternância de pressão do Araxá também foi um fator que chamou a atenção). A lambança de Nirley e Fábio gerou o escanteio que expôs novamente o que já podemos dizer ser um problema crônico do Cruzeiro: a bola parada, cada vez mais uma arma no futebol moderno — para a tristeza deste blogueiro, que gosta de gols com bola rolando.

10 contra 11

A movimentação de Diego Souza, tentando cair pelos lados para fugir da perseguição de Balduíno, aumentou um pouco a paciência de Marcelo Oliveira, que não mexeu no intervalo. Ele provavelmente quis testar o comportamento do time atrás no placar. Dez minutos foram suficientes para ver que nada tinha mudado: mesmo vencendo, o time da casa não abdicou do ataque e manteve a proposta, tendo a primeira chance logo a um minuto em contra-ataque velocíssimo, finalizado por Bruno Moreno em cima de Fábio.

Após as substiuições, Luan e Everton Ribeiro se revezavam pela esquerda, mas foi a velocidade de Élber do outro lado que provocou a expulsão

Após as substituições, Luan e Everton Ribeiro se revezavam pela esquerda, mas foi a velocidade de Élber do outro lado que provocou a expulsão

O time precisava de velocidade e movimentação. Élber entrou na vaga de Dagoberto, invertendo Everton Ribeiro de lado, e Borges entrou na vaga de Vinicius Araújo: o 4-2-3-1 estava mantido. Logo no primeiro lance, Élber sofreu falta dura de Carlão, que já tinha amarelo. A expulsão por acúmulo desmontou o sólido sistema defensivo de Flávio Lopes, mesmo após a recomposição do trio de zagueiros com a entrada de Bruno na vaga de Braitner. Isso porque a cobertura no meio-campo deixou de existir, já que um dos volantes agora tinha que cuidar de Nilton ou Leandro Guerreiro, agora livres para apoiar. E com isso um pouco do futebol de Diego Souza apareceu.

Logo após o empate de Paulão, fuzilando de primeira após cabeceio ofensivo de escanteio, o camisa 10 fez uma jogada na sua característica, arrancando na força física. Rodrigão teve de sair da marcação a Borges para tentar parar o avanço do meia, mas o passe de Diego Souza nesse exato momento matou a cobertura e deixou o camisa 9 na cara do gol, que venceu Marcelo Cruz para a virada.

Quando tudo parecia mais tranquilo, o Araxá empatou em pênalti cometido por Nirley em Fabrício Carvalho. Logo após o gol, Marcelo Oliveira lançou Luan de ponteiro esquerdo na vaga de Everton, passando Everton Ribeiro para a lateral esquerda. Na verdade era muito mais um revezamento, mas a intenção era dar mais verticalidade àquele lado do campo. Mas o gol da vitória veio pela direita. Ceará achou Diego Souza fugindo da marcação no meio, indo para a direita da área. Com apenas um marcador à frente, Diego arriscou pro gol, e no rebote de Marcelo Cruz, Borges fez seu segundo gol na partida.

Flávio Lopes ainda tentou mandar o time à frente para tentar novo empate, com as entradas de Roberto Jacaré e Michel Cury no meio-campo nas vagas de Bruno Moreno e Evandro, deixando apenas Fabrício Carvalho à frente. A intenção era repovoar o meio-campo, mas com um homem a menos havia muito chão para cobrir, e o Cruzeiro manteve a tranquilidade com a posse de bola até o fim.

Paciência e elenco

O jogo de ontem mostrou que o Cruzeiro ainda tem deficiências a serem corrigidas — o que é normal, pois ainda considero o time em formação. A bola parada, uma das cinco fases do jogo, ainda não deve ser a prioridade de Marcelo Oliveira nos treinamentos, mas sim as outras quatro: a fase ofensiva (posse de bola no ataque), transição ofensiva (também conhecido como contra-ataque), transição defensiva (contra-ataque do adversário, ou seja, a recomposição) e fase defensiva (posse de bola do adversário). Este blogueiro-torcedor aprova: marcar gols e evitar os do adversário com a bola rolando faz com que eventuais deslizes na bola parada sejam menores.

Um outro possível problema está na volância: o Cruzeiro precisa, nestes jogos, de um volante passador, que apóie mais. Nilton e Leandro Guerreiro são excelentes na marcação, mas contra esquemas como o de ontem não conseguem jogar. A variação tática proporcionada por um jogador como Henrique ou Lucas Silva, por exemplo, seria muito importante para anular estes sistemas defensivos, já que o avanço do volante configuraria um 4-1-4-1 temporário e cancelaria a sobra dupla no meio, dando mais liberdade a Diego Souza.

O camisa 10, aliás, foi uma das notas boa do jogo: movimentou-se mais, recebeu mais bolas e deu mais assistências. Aos poucos vai ganhando “ritmo de futebol brasileiro” e tem tudo para despontar nas fases agudas do Mineiro e nas primeiras rodadas do Brasileirão, no qual os adversários certamente jogarão de maneira menos reativa que os últimos adversários celestes.

É claro que, exigente como é, a torcida cruzeirense já quer que o time esteja voando. Mas é preciso paciência. A boa notícia que é o banco está resolvendo. É como aquela frase famosa diz: “bons times ganham jogos, bons elencos ganham campeonatos”.

E são campeonatos que nós queremos.

Cruzeiro 3 x 0 Náutico – Virada tática

Depois de tomar um baile tático no primeiro tempo, Celso Roth errou na primeira mas acertou na segunda substituição, abrindo caminho para o maior placar cruzeirense do Campeonato até aqui.

Wallyson muito centralizado no 4-3-1-2 losango inicial do Cruzeiro, estreitando o time e facilitando a marcação encaixada do superlotado meio-campo do Náutico

Primeiro onze

Roth repetiu o sistema pelo quinto jogo seguido, mandando a campo um 4-3-1-2 losango formado por Fábio no gol, Léo novamente mais preso na lateral direita, Everton mais solto na esquerda, e Rafael Donato e Mateus fechando o centro da defesa. De volta ao time, Leandro Guerreiro foi a base do meio-campo, que ainda tinha Tinga pela esquerda e Charles pela direita. Substituto do vetado Montillo, Souza foi o homem de ligação no topo do losango, pensando o jogo para Wallyson e Borges.

Alexandre Gallo certamente estudou as partidas do Cruzeiro. O Náutico entrou armado num 3-4-2-1 variava para um 3-5-1-1, lotando o meio campo. O gol de Gideão foi protegido por Ronaldo Alves, Alemão e Jean Rolt. No meio, uma linha defensiva alta, com Patric na direita correndo por todo o flanco com Everton, João Paulo na esquerda tentando explorar as costas de Léo, e Dadá e Souza combatendo muito pelo centro, junto com Martinez, que tinha mais liberdade para se juntar ao ataque formado por Lúcio atrás de Araújo.

Alta densidade demográfica

Logo nos primeiros minutos já ficava claro a tônica da primeira etapa: o time visitante, com dois homens a mais no meio-campo, tinha mais opções de passe e ficou mais com a bola no pé. Os jogadores cruzeirenses apertavam a marcação, mas sempre havia um pernambucano livre. Porém, com poucos alvos à frente, o meio-campo do Náutico não produziu nada muito incisivo. As principais jogadas do adversário vinham pelos flancos, principalmente pelo esquerdo, onde Léo ficava mais preso e esperava o avanço do ala esquerdo João Paulo.

A superlotação do setor central fazia o Cruzeiro ficar sem espaço para pensar o jogo quando tinha a bola, recorrendo a passes arriscados e errando a maioria deles, aumentando ainda mais a posse de bola do time adversário. Com o tempo, o Cruzeiro passou a ignorar o meio-campo e procurar a ligação direta, mas Borges não tem perfil de disputa pelo alto e quase sempre perdia. E mesmo quando ganhava, a segunda bola era sempre do Náutico, pelo simples fato de ter mais gente por perto.

A ponta direita

Outro fator tático interessante do primeiro tempo foi a postura de Wallyson. Como em quase todos os esquemas com três zagueiros, as áreas mais vulneráveis do sistema pernambucano eram os flancos de sua defesa. Quando o time adversário tem um jogador aberto no ataque, ou um zagueiro tem que sair da área para cobrir, ou o ala perde a vantagem de marcar à frente e tem que recuar. Infelizmente, Wallyson não repetiu as boas atuações táticas das últimas partidas e insistia em ficar próximo a Borges, talvez numa tentativa de fazer número. Do outro lado, Everton não apoio tanto devido ao posicionamento alto de Patric, mas mesmo assim criou algumas boas jogadas, como no passe recebido de Souza por cima da defesa em velocidade.

No intervalo, as equipes não mexeram nas peças, mas Celso Roth percebeu o problema na ponta direita e chamou a atenção de Wallyson, que voltou jogando mais aberto. Imediatamente a equipe melhorou de produção e chegou a criar três boas oportunidades, todas pela ponta direita e com a participação de Wallyson. O bandeira deu três impedimentos seguidos. Estranhamente, o time parou de jogar por ali, recorrendo cada vez mais às bolas longas para a disputa pelo alto e tentativa de pegar a sobra — o chamado jogo de “primeira e segunda bola” que Celso Roth tanto menciona em suas entrevistas quando se refere ao tipo de jogo praticado no Independência.

Um erro e um acerto

Aos 15 minutos, os primeiros movimentos dos treinadores: Gallo mandou Kim, mais veloz, na vaga de Araújo, e Lúcio deu lugar a Rogerinho. O sistema permaneceu. No Cruzeiro, Celso Roth tirou Charles, contundido, e lançou Wellington Paulista. Estava claro que ele queria insistir na disputa pela primeira bola no alto, e WP consegue fazer isso melhor do que Borges. Mas o novo 4-3-3 cruzeirense tinha ainda menos jogadores no meio, e tomou um susto justamente no flanco que Charles protegia — o direito. Kim passou por Donato e tocou a João Paulo, que entrava sem marcação na área. Ele centrou, mas Souza não conseguiu finalizar.

Roth então iluminou-se e tirou Wallyson do jogo, mandando Élber fazer a função de ponteiro direito, um pouco mais longe da área, fechando o lado, mas aberto e procurando a velocidade. E mal o garoto entrou, já criou problemas: três lances de perigo pelo lado direito, o terceiro resultando na falta que originou o primeiro gol. O gol foi um lance de oportunismo de Borges, mas na opinião deste blogueiro, era questão de tempo, com o lado esquerdo pernambucano sendo explorado por Élber com qualidade.

Espaço

Após as alterações, Élber explorando a vulnerabilidade do flanco esquerdo do Náutico e Sandro Silva igualando o número de jogadores de meio, no 4-3-2-1 que pendia para a direita

Gol este que mudou o panorama da partida. O Náutico, naturalmente, teve que abandonar sua estratégia de lotar o meio-campo e atacar. Gallo gastou sua última cartada mandando o atacante Romero a campo no lugar do volante Dadá. Os três zagueiros permaneceram compondo a última linha do agora 3-4-1-2 pernambucano. Um minuto depois, Borges sairia para a entrada de Sandro Silva, e assim o Cruzeiro tinha dois volantes puramente de marcação à frente da área — um 4-3-2-1 torto: cinco contra cinco no meio, mas sem um jogador pela esquerda do ataque.

Mas não fez diferença, porque quem ultimamente tem dado amplitude pela esquerda é Everton. Foi com ele que nasceu o segundo gol, em uma belíssima linha de passe. Everton puxou o contra-ataque por aquele lado, tocou a WP que estava aberto pela esquerda. Num altruísmo surpreendente para um atacante, WP devolveu a Everton, que já estava pelo meio. Ele viu Élber do outro lado, vindo como um raio e sem marcação — da forma como Wallyson devia fazer desde o primeiro tempo. O jovem dominou e fuzilou no canto esquerdo alto de Gideão.

O segundo gol matou a reação pernambucana, que desistiu de marcar pressão em cima do campo e ficou assistindo a defesa cruzeirense tocar a bola. Era só esperar o apito do árbitro, mas ainda havia tempo para mais. Tinga, que não fez uma boa partida nem técnica nem taticamente, explorou a defesa avançada e entregue do Náutico, alcançando a linha de fundo e centrando rasteiro para WP fazer o dele no fim da partida.

Conclusão

A vitória pode ter sido a maior do Cruzeiro no campeonato, mas não pode esconder alguns erros táticos cometidos, principalmente no primeiro tempo. Wallyson voltou a oscilar taticamente, e com isso seu jogo técnico também cai. Além disso, Celso Roth precisa arrumar um jeito de sair da armadilha dos 3 zagueiros e a consequente lotação do meio-campo, se quiser continuar jogando com o 4-3-1-2 losango.

Mas há pontos positivos. Everton, que foi muito contestado no início do ano — e mesmo neste campeonato no jogo contra o Grêmio — mais uma vez, demonstrou consistência pela esquerda: por ora, o problema da lateral está, no mínimo, atenuado. Na direita, Léo jogou “improvisado” — por falta de uma palavra melhor — pela terceira vez seguida, também sem comprometer. E Élber, um garoto ainda, mostrando ter competência para ser um reserva que pode mudar a cara da partida, principalmente jogando na função de ontem: ponteiro pela direita. Já vislumbro um time com Montillo e Élber de ponteiros…

Celso Roth disse na entrevista coletiva que torce para que o tão sonhado “equilíbrio” esteja começando a ser encontrado. É o que todos torcemos, e que, pelo menos a princípio, parece mesmo estar sendo alcançado.

Cruzeiro 1 x 0 Flamengo – Raça

Para ir à Arena Independência, preciso tomar uma condução que tem como parte do seu itinerário passar na Praça Sete, no centro de Belo Horizonte. Porém, o “P” do letreiro adesivado que indicava isto no pára-brisa do ônibus havia caído ou se desgastado, fazendo com que no letreiro se lesse “RAÇA 7”. Era um sinal, mas eu só fui me dar conta depois do jogo.

Cruzeiro repetindo o 3-4-1-2, dando liberdade a Ceará pela direita e bloqueando Léo Moura pela esquerda com Marcelo Oliveira, mas com poucos homens no meio com Magrão sendo arrastado para fora do campo por Luiz Antônio

Ao contrário do que tentou prever este blogueiro, Celso repetiu o 3-4-1-2 da vitória contra a Portuguesa. Fábio viu Leandro Guerreiro de pertinho mais uma vez, jogando na sobra dos zagueiros Mateus e Rafael Donato, permitindo aos laterais Ceará e Marcelo Oliveira — substituto do suspenso Diego Renan — jogarem mais avançados. William Magrão e Charles, de volta ao time, fizeram a dupla volância atrás de Montillo, que armava para Wellington Paulista e Borges.

Joel Santana (que não deixou nenhuma saudade por aqui) levou o Flamengo a campo num previsível 4-3-1-2 losango: o gol de Paulo Victor foi defendido pela dupla de zaga Gonzales e Marllon, com Léo Moura e Ramon fechando os flancos. No vértice mais baixo do losango, Amaral tinha Ibson pela direita e Renato Abreu pela esquerda, suportando Luiz Antônio atrás de Vágner Love e Adryan.

No enfrentamento dos esquemas, dois aspectos já se notaram claros. O primeiro era que os alas cruzeirenses, jogando bem à frente, fechavam a porta para o avanço dos laterais do adversário, com Marcelo Oliveira praticamente neutralizando o excelente apoio de Léo Moura. Do outro lado, Ceará fez um bom jogo, marcando bem as subidas de Ramon e dando opção de passe pela direita. Com três volantes bloqueando a entrada da área, como é característica do losango, o ataque pelos lados era o caminho: Ceará cruzou uma bola que passou pelos dois centro-avantes azuis dentro da área, e deopis serviu William Magrão na linha de fundo, que cruzou para cabeceio fraco de WP.

O segundo aspecto era que, com Leandro Guerreiro afundando entre os zagueiros, o Cruzeiro tinha a sobra garantida contra os dois atacantes adversários, mas tinha menor número no meio-campo. William Magrão ficou por conta de perseguir Luiz Antônio, e com isso Charles só podia encurtar em um de dois adversário: ora Ibson, ora Renato Abreu. Quem sobrava tinha certo tempo com a bola e podia pensar melhor a jogada. Além disso o Cruzeiro perdia muitas segundas bolas, a ponto de um torcedor atrás de mim nas arquibancadas ficar gritando “cadê os três volantes, cadê os três volantes”.

Na metade do primeiro tempo, Luiz Antônio passou a abrir pela direita, arrastando William Magrão consigo e abrindo ainda mais espaço para seus companheiros. Renato Abreu arriscou alguns chutes de longe, e Ibson virava o jogo de forma inteligente, aproveitando a compactação lateral do time da casa, fazendo sua equipe ter profundidade rapidamente. Aos poucos o Flamengo foi descobrindo este caminho e ameaçou em dois lances: Adryan teve uma boa escapada pela esquerda, mas cruzou mal, e Vágner Love chegou a ficar de frente com Fábio, mas talvez tinha ficado esperando a decisão do melhor goleiro do mundo. Perdeu o duelo.

Mas justo quando o Flamengo tentava sair mais para o jogo, o Cruzeiro marcou. Montillo passou a Ceará, bem aberto pela direita como um bom lateral. O camisa 2 encaixou um bom cruzamento e achou Borges na pequena área. O atacante se livrou do zagueiro e se antecipou a Paulo Victor, demonstrando excelente senso de posicionamento, cabeceando baixo para o fundo das redes flamenguistas.

Na volta do intervalo não houve mudanças. Joel deve ter considerado o gol um lance isolado, porque seu time teve mais volume de jogo no fim da primeira etapa, e portanto deve ter considerado que assim continuaria o jogo. Mas o Cruzeiro voltou diferente mesmo sem alterações. Ceará recuou um pouco mais, e Leandro Guerreiro pôde enfim participar da briga no meio do campo. Marcelo Oliveira continuava um pouco mais à frente, em mais precauções contra Léo Moura. O Cruzeiro passou então a usar o mesmo 4-3-1-2 do adversário.

O movimento desarmou o ataque flamenguista. Nas arquibancadas, este blogueiro pernsou que o Cruzeiro se fecharia, deixaria a bola com o Flamengo e partiria em contra-ataques, o que tem sido sua arma mais letal nos últimos jogos. Mas a equipe acabou ficando mais com a bola do que o Flamengo, que já não tinha o mesmo espaço de antes. Além disso, Guerreiro tinha mais liberdade para se juntar às ações ofensivas, aparecendo em vários momentos como elemento surpresa, inclusive arriscando finalizações. No entanto, a grande quantidade de erros no último passe, como tem sido quando o Cruzeiro quer criar, não resultaram em chances claras.

Borges se contundiu sozinho em um lance e Anselmo Ramon entrou em seu lugar, mantendo a formação, apesar da característica diferente deste último Anselmo — Borges tem mais presença na área, e Anselmo é mais forte, faz melhor o pivô. Talvez por isso, Anselmo recuava um pouco mais para receber um bola longa e segurá-la até a chegada de seus companheiros. A consequência direta foi o avanço das linhas do Flamengo, o que ajudou Ramon a explorar mais o corredor à sua frente, já que Ceará estava mais preso na segunda etapa.

O Flamengo foi avançando e ganhando volume: livre, Ibson recebeu passe de Ramon na entrada da área e arriscou, mas Fábio espalmou a escanteio; Adryan finalizou dentro da área em rebote da defesa e foi bloqueado por William Magrão; e logo após um bom avanço de Marcelo Oliveira em contra-ataque veloz, mas desperdiçado pelo péssimo passe, Léo Moura aproveitou o espaço, passou a Adryan do outro lado, que passou a Renato Abreu finalizar, mas Ceará não deixou a bola chegar a Fábio.

Vendo a situação, os treinadores trataram de mexer em suas equipes, e dos 27 aos 31, quatro substituições em sequência: no Cruzeiro, Élber e Sandro Silva entravam nas vagas de Charles e Wellington Paulista, e no Flamengo Hernane e Camacho substituíam Adryan e Renato Abreu. A intenção de Joel era abrir o time, e Hernane foi jogar aberto pela direita, com Camacho e Ibson articulando para ele, Love e Luis Antônio do outro lado. Já Celso queria explorar o espaço que se abria nas costas de Ramon para puxar o contra-ataque com Élber naquele setor, e também auxiliar Marcelo Oliveira na marcação pela esquerda, com Sandro Silva caindo por ali.

Uma árvore de natal (4-3-2-1) que Joel Natalino Santana tentou, mas não conseguiu derrubar

Não era o jogo que o Cruzeiro costuma fazer, fechando os flancos e partindo em velocidade num 4-4-1-1. Era um espécie de 4-3-2-1 “torto”, já que Sandro Silva e Marcelo Oliveira praticamente ocupavam o mesmo setor, muito afundados, e do outro lado Élber esperava ao lado de Montillo uma bola perdida para contra-atacar, o que acabou não acontecendo. O jogo tinha ficado perigoso demais, e o Cruzeiro precisava avançar um pouco, afastar o Flamengo de sua área.

Mas é preciso fazer isso com inteligência, pois aos 33, com a linha defensiva jogando muito alta, Léo Moura saiu de trás e recebeu uma bola longa da defesa, iniciando o lance mais emblemático da partida. Ele entrou na área e preferiu cruzar ao invés de finalizar, talvez por respeitar demais o melhor goleiro do mundo. Do lado esquerdo chegavam Vágner Love e Hernane, acompanhados por Donato. O zagueiro conseguiu atrapalhar a primeira conclusão de Love, mas a bola ainda sobrou para ele, Fábio abafou, a bola bateu em Hernane e beijou o travessão, voltando mais uma vez para Love, que foi novamente abafado por Fábio em defesa espetacular. Na sobra, Hernane girou e bateu, mas Marcelo Oliveira já tinha conseguido voltar e estava debaixo das traves, mandando o empate para escanteio.

Parecia ter sido o último suspiro do time carioca, que não conseguiu mais finalizar. Matheus ainda entraria na vaga de Luis Antônio, oficializando o 4-3-3 alto, mas foi o Cruzeiro quem teve outra chance, com Élber pela esquerda. O garoto pôs velocidade e cruzou para Montillo que chegava pelo meio. O argentino deixou a bola passar para Anselmo Ramon, mas ela veio um pouco antes do que ele esperava e a conclusão saiu torta.

A vitória chegou, mas foi muito mais fruto de raça e entrega dos jogadores do que pelo posicionamento tático. A mexida para proteger o lado esquerdo dos avanços de Léo Moura foi inteligente, mas desguarneceu o meio-campo no primeiro tempo. O losango do segundo tempo poderia ter sido usado desde o início, diminuindo o tempo de bola dos meias flamenguistas. Claro, isso faria com que Ceará avançasse menos, mas a experiência do lateral compensaria.

Por outro lado, Leandro Guerreiro vem se mostrando um jogador versátil, expandindo sua área de atuação ao invés de ficar preso à frente da zaga. Universalidade, como diz Jonathan Wilson na última frase de “Invertendo a Pirâmide”, parece ser o futuro do futebol, e a desenvoltura de Guerreiro em outra função é excelente notícia.

Além disso, Ceará parece ter resolvido o problema da lateral direita. Assim, a dúvida sobre a recuperação de Borges dirige minha aposta para o jogo contra o Corinthians para a volta de Fabinho ao time, retomando o 4-2-3-1 diagonal para o enfrentamento contra o 4-2-3-1 variando para 4-2-4-0 (ou seja, sem centro-avantes de ofício) de Tite. Afinal, jogar no 3-4-1-2 contra um time que executa o 4-2-3-1 tão bem é problemático. Além disso, Tite provavelmente vai armar algum esquema para não deixar Montillo jogar, talvez destacando Ralf para a marcação do argentino. Daí a importância de se ter, também, volantes que saiam para o jogo com qualidade, para aproveitar o espaço que certamente será gerado com a movimentação de Montillo para as pontas. A volta de Tinga poderá ser importante neste sentido, ainda mais se Roth escalá-lo como ponteiro direito, abrindo o corredor para o apoio de Ceará e fazendo número no meio-campo.

O Cruzeiro é visitante indigesto do Corinthians no Brasileirão. No entanto, para vencer o Corinthians de Tite — um dos times mais táticos do país, senão o mais tático —  é preciso acrescentar à gororoba um tempero a mais do “chef” Roth. Ou temos grandes chances de voltar de São Paulo com a barriga vazia.