Goiás 1 x 2 Cruzeiro – Sem referência

O título acima havia nascido na cabeça deste que vos escreve já na metade do primeiro tempo, pois sintetiza bem o que foi a partida entre Goiás e Cruzeiro no Serra Dourada — atualmente o maior campo do Brasil. Lesionados, os atletas que jogam na referência — jargão do futebol que é sinônimo da posição de centroavante, ou target man no inglês — ficaram de fora. No Cruzeiro, Borges foi vetado pouco antes da partida, e no Goiás já se sabia que Walter dificilmente iria para o jogo — muito mais prejuízo, já que é referência para todo o time e não só para o ataque.

A falta de referência, porém, não estava somente na posição de centroavante, como veremos a seguir.

Formações iniciais

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Marcelo Oliveira escolheu o jovem Alisson para a vaga de Borges, avançando Ricardo Goulart para jogar entre os zagueiros. Com isso, o posicionamento de partida dos três meias também foi modificado — Éverton Ribeiro passou a ser o central, Alisson entrou caindo mais pela esquerda e Willian trocou de lado. O resto do time foi o mesmo que iniciou a última partida, com Fábio no gol, Ceará e Egídio nas laterais direita e esquerda, respectivamente, e Dedé e Bruno Rodrigo na zaga central. Nilton e Lucas Silva mais uma vez fizeram uma boa dupla volância, com o primeiro mais preso que o segundo.

Enderson Moreira armou o Goiás num 4-3-3/4-1-4-1 para encaixar a marcação no meio-campo com o Cruzeiro: um apoiador em cada volante e dois homens abertos para bater com os laterais. A linha defensiva que protegia o gol de Renan tinha Vítor à direita, Walmir Lucas e Rodrigo na zaga e William Matheus na lateral esquerda. David foi o volante, tendo Hugo e Thiago Mendes mais à frente, com Ramon pela direita e Renan Oliveira pela esquerda. Na frente, Neto Baiano.

Respeito

Logo no começo da transmissão do jogo, a TV captou a tradicional reunião no túnel de acesso do Goiás ao gramado. Um dos jogadores falava em não pensar em empate, mas sim em vitória. Irõnico, pois o simples fato de ter que se dizer isso já indica que o empate era considerado um bom resultado. É o efeito da liderança inconteste.

E foi por isso que o Goiás se limitou a esperar o Cruzeiro e marcar forte nos minutos iniciais. Marcou em bloco médio/baixo, com Neto Baiano no círculo central olhando Dedé e Bruno Rodrigo tocarem a bola um para o outro. Se a jogada ia para os pés de Ceará, Renan Oliveira pressionava, e se fosse em Egídio, Ramon subia a marcação. O resto do time se postou num marcação individual por setor: laterais batendo com ponteiros, o volante David com o central, e os zagueiros contra Ricardo Goulart.

O central

Para sair dessa forte marcação, era preciso muita mobilidade. Na teoria, a entrada de Ricardo Goulart na vaga de Borges era exatamente pra isso — se o camisa 31 não é centroavante nato, ele se movimenta mais, saindo da área para inverter posições com os ponteiros e o central. Mas Goulart não fez isso, preferindo se limitar a jogar enfiado entre os zagueiros. E com a adição de Alisson, a linha de três não estava tão entrosada, tanto mais com Éverton Ribeiro por dentro. Assim, o time ficou também sem uma referência no meio-campo central, alguém para se movimentar, receber a bola e distribuir de volta: exatamente o papel que Ricardo Goulart faz.

O resultado direto foi que o Cruzeiro não criou pelo chão e tentava a ligação direta. Porém, Goulart dificilmente é o jogador certo para este tipo de jogo, a famosa disputa de 1ª e 2ª bola. Os zagueiros goianos ganhavam quase tudo. Sem ser agredido como esperava, o Goiás foi se soltando aos poucos e foi avançando o time, sem descuidar de seu esquema de marcação. Mesmo assim, não incomodou muito a meta de Fábio, exceção feita ao chute de Hugo pra fora após roubar uma bola na pressão alta.

Mas o Goiás achou seu gol numa falha de marcação de Egídio (veja imagem abaixo), e com a vantagem voltou ao modo inicial da partida — a meta era dificultar ao máximo as ações ofensivas celestes. Se o discurso do túnel de acesso serve de parâmetro, um vitória simples sobre o líder era um excelente resultado. Porém, a defesa goiana não contava com um passe maravilhoso do garoto Alisson. Tentando deixar Goulart em impedimento, se esqueceu de Willian, que desviou de Renan e empatou.

Fim do experimento

No intervalo, Marcelo Oliveira desfez a tentativa. Recuou Goulart e colocou os três meias nas posições “originais” — Ribeiro na direita, Goulart por dentro e Willian na esquerda — tirando Alisson da partida e lançando Anselmo Ramon. Normalmente seria Vinícius Araújo o escolhido, mas o jovem da base não foi relacionado por estar em vias de servir a seleção sub-20. A ideia era conseguir fazer o tal jogo de primeira e segunda bola, com retenção de posse no ataque, e ainda contar com o entrosamento dos três meias para dominar a posse de bola no meio.

Somente o segundo item funcionou. Com Goulart como central, a diferença no fluxo de passes era visível. Anselmo, porém, destoou do time e não venceu nenhum duelo aéreo, servindo apenas para ocupar os zagueiros do Goiás. Foram os quinze minutos de maior domínio do Cruzeiro na partida, até que Marcelo Oliveira tirou Goulart da partida e mandou Dagoberto. No Goiás, Neto Baiano saiu para a entrada de Júnior Viçosa, mais veloz, mas mantendo o sistema tático.

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre as duas primeiras trocas do Cruzeiro

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre a primeira e a segunda troca

Erro ou acerto?

Difícil dizer que a troca foi um erro após o resultado conhecido, mas no momento não me pareceu a melhor escolha. Dagoberto ainda está voltando de lesão, pegando o ritmo, e notadamente não tem a mesma aplicação defensiva que os outros ponteiros celestes. Além disso, o Cruzeiro novamente ficou sem sua referência de passe no meio-campo, com Éverton Ribeiro voltando a ser o central para dar espaço a Dagoberto na direita. Willian continuou pelo lado esquerdo.

O Goiás passou a dominar a posse de bola novamente e chegou com perigo algumas vezes. Enderson Moreira sentiu que podia vencer e colocou Tartá na ponta direita na vaga de Ramon, para pressionar Egídio. No Cruzeiro, Ceará sentiu cansaço ou lesão, e deixou o gramado para a entrada de Mayke — uma troca que é aparentemente seis por meia dúzia, mas quem acompanha o blog sabe que não é bem assim. Mayke é mais ofensivo e veloz, enquanto Ceará dá mais segurança na marcação.

Virada de líder

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

Ter queimado a regra três logo aos 25 do segundo tempo acabou por ser determinante, porque três minutos após a substituição, Lucas Silva virou a bola para Dagoberto na direita. Mayke passou como um raio em direção à linha de fundo e foi acionado. Levantou a cabeça e achou Willian na marca do pênalti, fazendo o famoso “facão” da esquerda pra dentro e virando o placar.

Depois do gol, Enderson Moreira tentou abriu totalmente o time num misto de 4-2-3-1 e 4-2-4 super ofensivo com Araújo na vaga de Hugo, recuando levemente Viçosa para o meio. Incomodou, é verdade, mas correu o risco de dar o contra-ataque para o time celeste, que desperdiçou duas oportunidades. Mas Fábio e a trave nos deram a sexta vitória seguida e a manutenção da vantagem na liderança.

Até quando se erra, se acerta

Ousadamente, manterei a minha opinião: a saída de Goulart foi um erro. A entrada de Dagoberto pode ter sido boa, mas a saída de Ricardo diminuiu consideravelmente o domínio territorial no meio-campo, e correu-se risco demais de sofrer um gol por causa disso.

Entretanto, mesmo com este equívoco, o Cruzeiro venceu. E não foi num erro do adversário, mas sim mérito: jogada construída, com passes conscientes, movimentação e excelência técnica. Além disso, contou com uma pitada de sorte nas duas bolas na trave que levou, e ainda com uma grande defesa de Fábio quando o jogo ainda estava em 1 a 1 — nosso capitão foi praticamente um espectador nas últimas partidas, mas provou que quando acionado é um dos melhores do Brasil. Ou seja, todos os ingredientes de um time campeão: elenco variado, qualidade técnica, time entrosado, confiança e sorte.

É aquela história: quando a fase é boa, tudo dá certo.

Bahia 1 x 3 Cruzeiro – Tranquilidade agitada

Jogando com certa tranquilidade — por vezes até excessiva — o Cruzeiro venceu o Bahia na Fonte Nova num jogo em que poderia ter tomado menos sustos se não tivesse, por iniciativa própria, tentado se poupar ao máximo. A temporada é desgastante e certamente esta é uma decisão consciente da comissão técnica, mas esta postura perigosa pode dificultar demais alguns jogos aparentemente controlados. Por outro lado, indica a consciência que o time tem sobre si mesmo, o que é importante ao definir a proposta de jogo para cada partida em um campeonato tão longo.

O triunfo garantiu a liderança ao fim do turno com uma rodada de antecedência. Um título simbólico, é verdade, mas que indica a força do elenco celeste e o bom trabalho do treinador: mudam-se as peças, o estilo e até a estratégia, mas a consistência é mantida.

Alinhamentos iniciais

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Marcelo Oliveira continuou com sua política de fazer rodízio com os jogadores, procurando poupar os que vem tendo sequências grandes. O escolhido da vez foi Ricardo Goulart, e com isso, Júlio Baptista e Borges foram escalados juntos, em suas posições normais do 4-2-3-1: Borges à frente e Júlio centralizado no meio. Fazendo a linha de três junto ao camisa 10 estiveram Éverton Ribeiro à direita e Willian à esquerda. Atrás deles, Henrique e Lucas Silva repetiram a parceria na volância, protegendo a linha defensiva formada por Ceará à direita, Dedé e Bruno Rodrigo no miolo e Egídio à esquerda. Fábio foi o goleiro e capitão.

Já o Bahia de Cristóvão Borges surpreendeu, abandonando o 4-3-3 das últimas partidas e vindo a campo numa espécie de 3-1-4-2. Defendendo a meta de Marcelo Lomba, Titi comandava a defesa, com Demerson à sua direita e Lucas Fonseca pela esquerda. Fahel era o cão de guarda do triângulo no círculo central, com Hélder mais avançado à esquerda e Marquinhos Gabriel um pouco mais centralizado à direita. Lado este que era fechado por Mádson, bem avançado e batendo com Egídio, e Raul na ala esquerda, um pouco mais atrás, mas ainda bem alto em relação a um lateral. Na frente, Wallyson caía mais pela esquerda e Fernandão ficava na referência.

Movimentos iniciais

Desde o apito inicial, o Bahia mostrou o que queria: se defender e jogar no erro do Cruzeiro. Fernandão marcava a partir da linha divisória; Wallyson acompanhava Ceará, deixando Raul mais preocupado com Éverton Ribeiro; do outro lado, Mádson batia com Egídio; os dois meias centrais duelavam com os volantes e Fahel perseguia Júlio Baptista; e na zaga, Willian era marcado por Demerson, Borges por Titi e Lucas Fonseca ficava na sobra da Raul. Praticamente uma marcação mano-a-mano, mas com sobras no meio e na direita, deixando os zagueiros do Cruzeiro completamente livres.

Por já ter a bola nos pés, o Cruzeiro agradeceu ao Bahia por não precisar dar intensidade na marcação, poupando-se do desgaste. Porém, este parecia também ser um dos objetivos com a bola: descansar. Com muita paciência e tocando a bola como em um jogo de handebol, alterando entre os lados até conseguir uma brecha, o time celeste dominou a posse de bola, mas sem a costumeira troca de posições e movimentação que caracterizam o time. O resultado foi o baixo número de finalizações do time se comparado com ele mesmo em outras partidas: foram apenas 5 no primeiro tempo.

Buscando outra rota

Com o meio completamente congestionado, e sem muita vontade de desorganizar o sistema defensivo do Bahia, o Cruzeiro procurou a rota aérea. Primeiro com Egídio achando Júlio Baptista no meio da área, com a bola beijando a trave, e no lance seguinte, Willian centrou a Borges que, entre os zagueiros, mandou de peixinho para abrir o placar.

Nem com o gol sofrido o Bahia mudou a postura — a posse de bola chegou a ficar em 64% a 36%. O que mudou foi que o Cruzeiro também passou a administrar e deixava os zagueiros do Bahia com a bola também. Porém, o time baiano não sabia bem o que fazer com ela, já que a defesa celeste estava bem sólida num 4-4-1-1, com os ponteiros voltando e se alinhando aos volantes. O sistema do Bahia não favorecia, porque causava a sobra dupla redundante na zaga (3 zagueiros contra Borges) e assim o Cruzeiro dobrava a marcação pelos lados.

O intervalo parecia longe já que o jogo estava bem insosso, mas Everton Ribeiro tratou de aumentar a emoção, ao receber cruzamento da direita, driblar dois zagueiros e concluir forte no ângulo direito de Lomba.

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

Fim da linha de três

Marcelo Oliveira não fez trocas, mas Cristóvão Borges percebeu que a defesa com três zagueiros não funcionou e mandou William Barbio a campo na vaga de Mádson. O atacante foi ser ponteiro direito, puxando Demerson para a lateral direita, deixando os outros dois zagueiros no meio e recuando Raul para a linha defensiva. Fahel continuou mais plantado e Wallyson abriu de vez pela esquerda, configurando o 4-3-3 clássico.

Em teoria, a troca daria mais velocidade de contra-ataque ao time da casa, já que agora os pontas não tinham mais tantas atribuições defensivas. Porém, para existir o contra-ataque, era preciso existir o ataque primeiro — mas o Cruzeiro estava obviamente satisfeito com o resultado, tentando se poupar o máximo possível, já que o Bahia não conseguia chegar perto de Fábio quando tinha a bola nos pés.

Talisca

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Anderson Talisca na vaga do lesionado Marquinhos Gabriel, porém, mudou este panorama. O jovem deu mais criatividade e certa fluência nos passes do time da casa, que chegou algumas vezes em velocidade pelos lados. Wallyson e William Barbio tiveram chances, mas desperdiçaram. Marcelo Oliveira respondeu “aproveitando” a lesão de Borges para lançar Ricardo Goulart, mas desta vez como meia central, mandando Júlio Baptista à frente. A intenção era voltar a acelerar o jogo quando o Cruzeiro tinha a bola, pois o jogo começava a ficar arriscado demais.

E ficou de vez depois do gol de Fahel, em cabeceio sozinho dentro da pequena área, após cruzamento da esquerda. Imediatamente, Cristóvão Borges queimou a regra três mandando Feijão na vaga de Hélder, um volante com mais saída e melhor passe. O Bahia se animou e tentou atacar, dando trabalho principalmente a Egídio pela esquerda. Foi então que Marcelo Oliveira promoveu o inusitado: tirou Egídio de campo e mandou Mayke. Ceará foi ser, talvez pela primeira vez na vida, lateral esquerdo — era clara a intenção de acabar com as investidas de William Barbio por ali.

Lado esquerdo

Apesar do cartão amarelo logo em seu primeiro lance, Ceará aparentemente deu conta do recado e o Bahia parou de ter tantas chances. Só chegou em um chute de Fernandão por cima em passe de Talisca. A última troca teria Éverton Ribeiro dando seu lugar a Martinuccio, jogando Willian para a direita. Em seu primeiro lance, o argentino já tentou o gol — sinal de que, agora sim, o Cruzeiro tinha alguém para acelerar o jogo e definir o confronto de uma vez por todas.

A origem do terceiro gol é o exemplo: Martinuccio recebe o passe e acelera, sofrendo falta. Depois da cobrança, a bola chega em Goulart, que também dá intensidade e sofre nova falta. Na cobrança, Willian achou Dedé na segunda trave, que cabeceou para defesa parcial de Lomba. Júlio Baptista, sumido desde que virou centro-avante, pegou o rebote e — finalmente — matou a partida.

Com “emoção”

O final da partida na Fonte Nova provou que o Cruzeiro poderia sim ter matado a partida em um momento anterior, se optasse por acelerar ao invés de tirar a velocidade do jogo. Mas não se pode culpar totalmente os jogadores, que enxergaram no jogo uma chance de se pouparem do grande desgaste físico que a temporada impõe sem perder pontos. Sem dúvida, é uma postura arriscada, mas que deu certo desta vez.

Outro aspecto tático a ser notado é que, com a entrada de Júlio Baptista, a equipe perde em mobilidade e leveza no meio, mas o camisa 10 compensa isto com experiência e poder de conclusão — já são dois gols em dois jogos e meio. Mais uma opção de formação para o 4-2-3-1, com uma característica diferente.

E essa é a principal virtude desta equipe: ser mutante e adaptável, tendo à sua disposição estratégias, estilos e rotas de ataque diferentes — mas sem alterar a plataforma tática. Essa manutenção é muito importante para os jogadores, pois quem entra já sabe como a equipe joga e de que posição deve partir para exercer sua função em campo, obviamente, adaptada para sua característica.

Isso faz com que o elenco rode e a regularidade se mantenha — aspecto primordial de muitos campeões de pontos corridos…

Cruzeiro 5 x 3 Vasco – Transplante de coração

Cruzeiro e Vasco fizeram um jogo de muitos eventos, dentre eles os vários gols. E parte deles podem ser explicados pela escalação diferente, principalmente no triângulo do meio-campo — o “coração” do time, formado pelos dois volantes e pelo meia central — que modificou o estilo de jogo celeste. Para o bem e para o mal.

Formações

Com um novo trio no círculo central, o 4-2-3-1 celeste teve menos mobilidade na linha de 3 e menos pegada defensiva, mas compensou com o avanço dos volantes e de Júlio

Com um novo trio no círculo central, o 4-2-3-1 celeste teve menos mobilidade na linha de 3 e menos pegada defensiva, mas compensou com o avanço dos volantes e de Júlio

Marcelo Oliveira armou o Cruzeiro no 4-2-3-1 usual, mas com o trio central do meio-campo totalmente diferente. A dupla de volantes titular estava lesionada, e para seus lugares Henrique e Lucas Silva foram os escolhidos. À frente deles, Júlio Baptista herdou a vaga de Borges, com Ricardo Goulart indo para o comando do ataque. O restante do time não foi alterado: Fábio no gol, linha defensiva com Ceará e Egídio pelos lados e Dedé e Bruno Rodrigo no miolo; Lucas Silva e Henrique dando suporte a Everton Ribeiro na direita, Willian na esquerda e Júlio Baptista por dentro, com Ricardo Goulart na frente.

O Vasco de Dorival Júnior veio num 4-3-3/4-1-2-3 que encaixou a marcação no círculo central. Protogendo o gol de Diogo Silva estavam os zagueiros Cris e Rafael Vaz, flanqueados por Fagner na direita e Yotún na esquerda. Abuda era o volante único, com Juninho Pernambucano armando pela direita e Wendel (aquele de 2003) pela esquerda. A linha de ataque era comandada por André, e ainda tinha Willie aberto pela direita e Marlone pela esquerda.

Diferenças de estilo

O jogo começou já com 1 a 0 no placar, pois o gol de Willian em cobrança de lateral de Ceará aconteceu antes de qualquer tipo de análise. Depois, quando o jogo assentou, foi mais fácil entender o que se passava.

Júlio é um jogador diferente de Ricardo Goulart: mais físico e forte, e ao mesmo tempo menos móvel. Isso teve consequências diretas no estilo de jogo celeste, que com Willian, Ribeiro e Goulart no meio, é de movimentação e troca de posições. Com Júlio, o time ficou um pouco mais engessado, com menos inversões. Além disso, Goulart também não é um centro-avante típico, e por isso o jogo de primeira e segunda bola não poderia ser empregado, e nem a estratégia da bola longa pelo chão para a retenção, de costas para o gol, enquanto o time chega de trás.

Porém, o uso de dois volantes mais técnicos, como Lucas e Henrique, ao invés dos dois mais marcadores Nilton e Souza, deu uma certa compensada, já que Júlio se infiltrava mais na área adversária do que se movimentava lateralmente, abrindo espaços para quem chega de trás — Lucas teve mais liberdade para isso do que Henrique, que guardou mais sua posição. Porém, isso também teve seu preço: a marcação menos intensa no meio-campo e nas coberturas aos laterais.

Todos esses fatores podem ser vistos nos gols que se seguiram. No empate do Vasco, Willian sai na marcação de Fagner, que encontra Willie livre por dentro, por onde devia estar Lucas Silva; no replay, é possível ver o jogador atrasado na jogada para tentar barrar o bom chute do jovem vascaíno. Porém, o mesmo Lucas Silva receberia uma bola na frente da área, com muito espaço e sem nenhum tipo de marcação, atraída para outros setores pelos meias, e mandar um balaço no canto para colocar o Cruzeiro novamente na frente.

Os quatro de frente mais os laterais atraem a marcação e abrem espaço para Lucas Silva chutar de longe e marcar o seu primeiro gol na noite

Os quatro de frente mais os laterais atraem a marcação e abrem espaço para Lucas Silva chutar de longe e marcar o seu primeiro gol na noite

Estratégias de marcação

Sem a bola, o Cruzeiro não pressionou os zagueiros com a mesma fome de partidas anteriores. Em parte isso pode ser explicado pelo desgaste físico, provocado pelo apertadíssimo calendário do futebol brasileiro. Mas um outro fator é que essa pressão alta tem que ser coordenada para funcionar, e se somente Goulart fosse pressionar os zagueiros, sem a ajuda de Júlio atrás dele, somente abriria as linhas de passe para que os volantes recebessem a bola. Ou seja, um desgaste desnecessário. Mesmo assim, o Vasco não tentou sair jogando pelo chão, e tentava mais a bola longa.

Já o time carioca tentou se inspirar no seu maior rival e corajosamente avançou seus jogadores para fazer a pressão no campo adversário. Willie, Marlone e André tentavam induzir os zagueiros e laterais a dar o chutão, e frequentemente conseguiam. Isso também pode ser explicado pela diferença de estilo entre os volantes que estavam jogando e os titulares Nilton e Souza. Henrique e Lucas tem mais característica de tentar uma primeira criação, já tentando um passe mais incisivo, enquanto que Nilton e Souza mais recolhem a bola e passam para algum meia.

O resultado foi uma profusão de bolas longas de parte a parte, e nesse quesito Júlio Baptista se destacou: vencia praticamente todos os duelos aéreos, matando a bola e girando para sair jogando. O que me faz pensar que talvez a melhor posição para o jogador, nesse momento em que ele se encontra, sem muito ritmo de jogo, fosse a de centroavante, com Goulart de volta à sua posição “normal”. Talvez ainda vejamos esta experiência.

Egídio

Pelos lados, duelos interessantes. Na direita, Ceará não tinha dificuldades para vigiar Marlone, mas também não apoiava muito; já Éverton Ribeiro dava bastante trabalho para Yotún com a sua movimentação típica da direita para o centro, como pode ser visto na jogada que originou a falta do terceiro gol. Nela, Júlio está pela esquerda e Willian pela direita, com Ribeiro conduzindo em velocidade pela faixa central do campo até sofrer o calço. Cartão de visitas perfeito para Júlio, que mandou por cima da barreira como manda o figurino e aumentou a conta.

Mas pelo lado esquerdo a coisa não ia tão bem. Se Willian foi muito importante e participou tanto das jogdas ofensivas quanto da marcação em Fagner, Egídio teve bastante dificuldade para marcar o garoto Willie. Nem tanto no segundo gol do Vasco, já que o lateral teve que abandonar a composição da linha defensiva para tentar bloquear o cruzamento de Fagner que entrava livre. Mas não conseguiu e André completou para as redes antes de Bruno Rodrigo.

O terceiro, no entanto, poderia ter sido evitado se Egídio não tivesse parado na jogada. Fagner lançou bola longa e Bruno Rodrigo espanou de cabeça, para cima. Willie e Egídio vinham acompanhando, mas o lateral parou confiando que o zagueiro iria tirar. A bola caiu com Willie que driblou com o peito e bateu cruzado para empatar no fim do primeiro tempo.

Uma troca em duas

Os treinadores obviamente estavam satisfeitos com o rendimento de suas equipes, e não promoveram alterações. Mas Marcelo fez um pequenos ajustes: segurou Egídio mais na defesa para vigiar o garoto Willie mais de perto. De fato o garoto pouco fez no segundo tempo.

Assim como o Cruzeiro até as substituições. O resultado de empate era ótimo para o time visitante, especialmente jogando contra o líder do campeonato no Mineirão. E, claro, nada bom para quem almeja o título, caso do Cruzeiro. Então a obrigação de atacar passava cada vez mais a ser do Cruzeiro, e junto com ela crescia a impaciência da torcida, que insistentemente pedia a volta de Dagoberto. Marcelo queria era voltar ao modo “mobilidade” do 4-2-3-1 cruzeirense, e por isso Dagoberto não era o cara certo para entrar, e sim Vinicius Araújo. Inteligentemente, para evitar as vaias, primeiro atendeu ao pedido da torcida, sacando Éverton Ribeiro, e poucos minutos depois fez o que realmente queria, lançando Vinicius Araújo na vaga de Júlio Baptista. Ricardo Goulart voltou ao centro da linha de três. Dagoberto continuava pela direita e Willian pela esquerda — estranhamente, o inverso de seus lados “preferenciais”.

Não demorou muito para que o gol saísse, em uma roubada de bola de Willian, e que se transformou em 40 segundos de posse até sair o gol mais bonito da rodada: Lucas Silva, novamente de fora da área, driblando ninguém menos que Juninho para mandar o sapato e achar o ângulo esquerdo de Diogo Silva.

Um quase déjà vu

Roteiro clássico: após o quarto gol, Dorival arriscou com o atacante Marlone na direita e dois centroavantes, se expondo ao contra-ataque. Pagou o preço

Roteiro clássico: após o quarto gol, Dorival arriscou com o atacante Marlone na direita e dois centroavantes, se expondo ao contra-ataque. Pagou o preço

Pouco depois do gol, Dorival promoveu quase que três substituições de uma vez só. Primeiro, Montoya entrou na vaga de Wendel e Edmílson na de Fagner. O colombiano foi para a mesma posição do ex-cruzeirense, mas tem uma característica mais ofensiva. Já Edmilson foi ocupar a ponta esquerda batendo com Ceará, mandando Marlone para a lateral direita numa tentativa de fazer dois contra um junto com Willie pelo lado de Egídio.

Com isso, o Cruzeiro recuou novamente para proteger o resultado. Mais uma vez, de maneira perigosa. Willian marcava com afinco pela esquerda as investidas de Marlone, frustrando os planos de Dorival, que mandou Tenório a campo na vaga do jovem Willie na sua última cartada: a famosa bola aérea para o cabeceio desesperado.

Felizmente, Dagoberto, Goulart e Vinicius Araújo encaixaram o contra-ataque que aumentou a diferença. Em outros jogos, este gol mataria a partida, mas ainda haveria tempo para Alisson entrar no lugar de Willian e Dagoberto ser expulso em jogada infantil.

A adversidades e os três pontos

A formação com Júlio Baptista e os dois volantes mais técnicos claramente mudou o estilo de jogo do Cruzeiro. Foram “apenas” 15 finalizações, abaixo da média de 17,44 finalizações por jogo até então — mas ainda assim acima da média de 17 das outras 19 equipes. Também teve menos pegada: foi o segundo jogo do Cruzeiro com menos desarmes (19, com 14 certos), perdendo apenas para a partida contra o Fluminense fora de casa (18, sendo 12 certos). Todos os números de acordo com a Footstats.

Não seria exagero dizer que o Cruzeiro praticamente testou uma formação nova, ainda que o 4-2-3-1 estivesse lá, imutável. E mesmo sofrendo com os problemas defensivos na cobertura dos volantes aos laterais, o ataque produziu o suficiente para a vitória. Só há vantagens: rodar o elenco, aumentar a imprevisibilidade do time e o leque de opções, além de manter a confiança.

Vencer o Bahia na Fonte Nova garantirá o título simbólico de campeão do primeiro turno com uma rodada de antecedência. Nos dez nacionais de pontos corridos até aqui, somente por três vezes a equipe com mais pontos no primeiro turno não se sagrou campeã.

Assim, a vitória não nos garantirá o título, mas será “70%” do caminho andado.

Flamengo 1 x 0 Cruzeiro – Sempre em frente

Esta postagem está atrasada. Deveria ter sido escrita na quinta, um dia após a queda nas oitavas de final da Copa do Brasil. Porém, é preciso lembrar que, antes de ser blogueiro, este que vos fala é cruzeirense de carteirinha — literalmente. Não sou jornalista, e este blog é iniciativa pessoal e voluntária. Por isso, me reservei ao direito de não escrever ainda no calor do revés. Entretanto, acabou sendo melhor para poder balizar a postagem com as reações de todos perante a este resultado inesperado. Ouvi e considerei opiniões e explicações de comissão técnica, jogadores, direção, torcedores e analistas da grande mídia, e elas estão todas de uma forma ou de outra neste texto abaixo.

Não foi possível identificar um único fator que fosse determinante para esta eliminação. Antes de Leandro Guerreiro deixar Elias sem marcação para a conclusão fatal, Vinicius Araújo havia perdido mais de uma chance frente a frente com Felipe. Porém, antes disso, o Cruzeiro já havia saído de sua característica principal, que é marcar mais à frente quando não tem a bola. Porém, muito antes disso tudo acontecer, Dedé havia falhado naquele gol no Mineirão, mas isso foi só depois de o ataque perder muitos gols que poderiam ter aumentado a vantagem.

Mas este blog é sobre a tática da partida, então vamos a ela.

Formações

Na primeira etapa, Flamengo insistiu pela direita usando um híbrido 4-3-3/4-2-3-1, mas o Cruzeiro passou poucos sustos

Na primeira etapa, Flamengo insistiu pela direita usando um híbrido 4-3-3/4-2-3-1, mas o Cruzeiro passou poucos sustos

Ao contrário do que muitos “profetas do acontecido” disseram após o jogo, Marcelo Oliveira não postou um Cruzeiro diferente das características do Brasileirão. Prova disso é a escalação de Lucas Silva na vaga de Souza, lesionado, como parceiro de Nilton na volância do 4-2-3-1. Fosse uma postura de defender o resultado, Leandro Guerreiro teria sido a melhor opção. Assim, a meta de Fábio foi defendida por Dedé e Bruno Rodrigo, com Ceará e Egídio nos flancos. Nilton e Lucas Silva davam o suporte para o trio de meias mais móvel da temporada até aqui, com Everton Ribeiro à direita, Willian à esquerda e Ricardo Goulart centralizado, atrás de Borges no ataque.

Já Mano Menezes mudou em relação à partida no Mineirão. No papel parecia ser o 4-3-3 (ou 4-1-2-3) costumeiro, mas ao longo do primeiro tempo tinha cara de 4-2-3-1 com uma inversão de papéis pelo lado esquerdo. O goleiro Felipe viu Luiz Antônio à direita e João Paulo à esquerda, fechando os lados da defesa composta por Chicão e Wallace. Víctor Cáceres, que normalmente é o volante único, teve mais a companhia de Elias, que não estava em sua condição física ideal. Rafinha era o ponteiro direito clássico, preso daquele lado, e Carlos Eduardo e André Santos revezavam entre o centro e a esquerda, com o primeiro se movimentando mais pelo centro. Na frente, apenas Marcelo Moreno.

Estratégias

Como era previsto, o Flamengo tentou ser intenso logo no início, tentando pegar carona na euforia da torcida. O Cruzeiro, porém, marcou em bloco alto — com os meias e atacantes fazendo pressão nos zagueiros e volantes do Flamengo. Que é a característica do time. Quando o time da casa conseguia passar pela pressão inicial, encontrava uma defesa sólida que só dava espaços pelos lados, apesar da partida inconstante de Lucas Silva no centro.

E foi pelos flancos que a equipe carioca deu alguns sustos, principalmente pela esquerda, com Luiz Antônio bem insistente no apoio e Rafinha prendendo Egídio. Willian até voltava para ajudar e conseguia de certa forma, com o Flamengo chegando muito mais no ímpeto do que no toque de bola.

Do outro lado, no entanto, Ceará controlava o setor com mais tranquilidade. André Santos tinha dificuldades em vencer o camisa 2, e João Paulo não apoiava tanto, facilitando o trabalho defensivo de Everton Ribeiro. Aos poucos, o Cruzeiro começou a conseguir concatenar mais passes no seu próprio campo, fugindo da intensidade carioca. Lentamente, o Flamengo foi deixando de marcar o Cruzeiro no seu próprio campo, e o tine celeste conseguiu fazer um primeiro tempo bem controlado defensivamente.

Os dados da Footstats mostram a preferência do Flamengo pela direita: 41,31% do tempo de posse

Os dados da Footstats mostram a preferência do Flamengo pela direita: 41,31% do tempo de posse

Já quando tinha a bola, o Cruzeiro não foi tão eficiente quanto vinha sendo. A estratégia de cadenciar, tirando a velocidade do jogo, foi certamente um dos fatores, já que este Cruzeiro é um time que sabe jogar melhor com intensidade na criação. Outra causa foi o alto índice de passes errados no terço final do campo — o famoso último passe, o decisivo, o passe para gol. Foram 25 contra 18 do Flamengo, o que é muito considerando a menor posse de bola (45% x 55%). Mesmo assim, esteve mais perto de abrir o placar que o Flamengo, quando Dedé completou escanteio com o pé direito e o zagueiro Chicão salvou com Felipe já vendido.

Mais para o fim do primeiro tempo, veio o primeiro sinal de que o jogo poderia ser mais perigoso do que devia: a marcação dos meias e atacantes havia recuado lentamente, e Borges já estava sendo visto atrás da linha de meio-campo, sem correr atrás dos zagueiros para pressioná-los. Nunca saberemos ao certo a causa disso, mas o caráter decisivo do jogo e o resultado favorável podem ter contribuído para o inconsciente dos jogadores.

O intervalo misterioso

Marcelo Oliveira e Fábio já disseram em entrevistas após o jogo que era preciso avançar novamente a marcação. E assim foi combinado no vestiário. Porém, não foi o que aconteceu. A marcação continuou baixa demais, sem pressão e sem intensidade na frente. Isso chamou ainda mais o Flamengo a avançar, o que já seria certo devido à desvantagem no resultado agregado.

Além disso, Mano tirou Cáceres e lançou Paulinho, que é atacante, na lateral direita, empurrando Luiz Antônio para sua posição de origem. Elias também foi fazer mais companhia a Carlos Eduardo, e assim foi formado um 4-3-3 mais claro. Com as linhas adiantadas e jogadores estritamente ofensivos em posições de defesa, e com o Cruzeiro continuando a errar passes e marcar muito atrás, o volume de jogo do Flamengo continuou. Naquele momento, a partida foi bem definida pelo narrador da ESPN Brasil como “ataque contra defesa”.

Incrivelmente, Fábio nada teve que fazer durante este tempo todo. Se você assistir aos melhores momentos da partida, verá que o goleiro celeste não fez nenhuma defesa. O Flamengo tinha mais a bola, mas não conseguia fazer nada muito bom com ela. A rigor, até os 28, foram só duas finalizações no segundo tempo, ambas de Moreno e para fora.

Contra-ataques

Aos 28, os treinadores fizeram suas segundas trocas — Borges já havia deixado o campo lesionado para a entrada de Vinicius Araújo. Mano Menezes tirou Carlos Eduardo e lançou Adryan, mais meia-atacante do que meia de criação, com presença de área. Já Marcelo Oliveira colocou Martinuccio em campo na vaga de Éverton Ribeiro, que já estava amarelado e visivelmente nervoso. Willian passou à direita.

A partir daí, foram quase 10 minutos de um jogo muito bom. Martinuccio deu a movimentação e a intensidade que o Cruzeiro precisava para sair de trás, e gerou três lances de perigo com Vinicius Araújo. O primeiro em passe de Willian, em que ele fez um corta-luz e deixou Vinicius dentro da área, mas a finalização saiu muito errada. Depois, recebeu pela esquerda e acionou Vinicius no meio da área para marcar, mas em impedimento. E por fim, deu um passe sensacional para o camisa 30 ficar frente a frente com Felipe, mas Vinicius não conseguiu driblá-lo e saiu com bola e tudo.

Cedo demais?

No fim, Flamengo lotou a grande área para usar bola aérea, e Marcelo quis fechar os flancos com a entrada de Guerreiro -- funcionou exceto por um único lance...

No fim, Flamengo lotou a grande área para usar bola aérea, e Marcelo quis fechar os flancos com a entrada de Guerreiro — funcionou exceto por um único lance…

Aos 36, Marcelo Oliveira sentiu que era a hora de defender o resultado, e tirou Willian de campo e lançou Leandro Guerreiro. O volante foi para o centro do meio-campo defensivo, empurrando Nilton para a esquerda e Lucas Silva para a direita, fazendo um 4-3-2-1 bem recuado, com a intenção de fazer 3 contra 2 pelos lados e evitar a única arma que o Flamengo ainda tinha — o chuveirinho na área. Tese que foi provada pela entrada de Hernane na vaga de André Santos, ou seja, mais um centroavante, mais um alvo na área para os cruzamentos. O Flamengo jogava àquela altura numa espécie de 4-2-4, mas bem desorganizado e na base do desespero.

Em certa medida, deu certo, exceto pelo lance fatal. Egídio decidiu subir a pressão no momento errado e foi driblado, deixado Martinuccio e Nilton no mano a mano pelo lado esquerdo e gerando um efeito cascata nas coberturas. Nilton não conseguiu impedir o cruzamento rasteiro de Paulinho para Elias, sozinho na entrada da área, concluir no canto direito e fechar o jogo aos 43. Já não havia mais tempo.

A derrota ensina

O resultado só é doloroso porque sabemos do que o Cruzeiro já é capaz de fazer. Ninguém é líder do Brasileirão na 16ª rodada por acaso ou por sorte. É competência. Mas a Copa do Brasil é uma competição diferente, porque são apenas dois jogos — um erro é muito mais determinante. E o Cruzeiro cometeu vários pequenos, que se tornaram poucos grandes e decidiram o confronto.

Porém, é preciso lembrar sempre que 2013 ainda é o primeiro ano desta equipe. Parece desculpa, mas não: o time ainda está em formação. Talvez não na questão do entrosamento, que obviamente veio antes do “normal”. Mas existe uma coisa que pode ainda não ter chegado: a maturidade para lidar com jogos muito decisivos. Ribeiro, Goulart, Vinicius e Lucas Silva são exemplos de jogadores jovens e com pouca experiência em decisões. Além disso não é somente a experiência dos jogadores individualmente que conta neste quesito. Também é preciso levar em conta a experiência da equipe como um todo — c Corinthians contra o Tolima é um bom exemplo. Foi somente a segunda decisão de grande importância deste grupo.

Nas derrotas também vem um crescimento. E é nisso que todo cruzeirense deve acreditar, até o fim do Brasileirão.

Ponte Preta 0 x 2 Cruzeiro – Saber é metade da batalha

Totalmente ciente do que era capaz e do nível do adversário, o Cruzeiro jogou o que era necessário para vencer a Ponte Preta sem passar nenhum susto — literalmente. Mesmo tendo um adversário que mudou de tática e estratégia várias vezes no jogo, o time celeste foi superior em toda a partida e chegou à liderança do Brasileirão, desta vez isoladamente.

Era claro que o objetivo era poupar forças para o jogo de volta pelas oitavas da Copa do Brasil, que tem caráter muito mais decisivo. Mesmo assim, não foi preciso fazer muita força para vencer o time de Campinas.

Formações iniciais

Ao leitor mais assíduo deste blog, as análises devem parecer muito repetitivas, e em alguns casos até parece que o objeto de estudo é muito mais o time adversário que o próprio Cruzeiro. Mas isto é um sinal da consistência da equipe celeste: joga sempre no mesmo esquema, variando apenas estratégias, às vezes na mesma partida, além do estilo usado e da intensidade aplicada nas fases do jogo.

Ante o 4-2-3-1 cruzeirense que ganhou o meio-campo com mais homens, a Ponte Preta fez linha defensiva com quatro no primeiro tempo

Mesmo assim, é necessário que se explique sempre como o time se posta em campo, principalmente para o leitor que aparecer neste espaço pela primeira vez. E Marcelo Oliveira mandou a campo o seu 4-2-3-1 costumeiro, com o gol do capitão Fábio sendo protegido por Dedé e Bruno Rodrigo, com Ceará e Everton fechando os lados da defesa — Mayke se recupera de lesão e Egídio estava no banco, poupado. Nilton e Souza novamente fizeram parceria à frente da área, dando suporte ao trio de meias que jogou muito bem contra o Flamengo no meio da semana: Everton Ribeiro pela direita, Ricardo Goulart por dentro e Willian de ponteiro esquerdo. À frente, Borges era o centroavante.

Já a Ponte Preta de Paulo César Carpegiani, ao contrário do que informou o repórter e do que o comentarista do Premiere FC insistentemente dizia, não se postou em campo com uma linha defensiva de três — pelo menos no primeiro tempo. Apesar de ter três zagueiros no papel, o onze de Campinas era um 4-4-2 britânico — ou seja, com o meio-campo em linha, as famosas “duas linhas de quatro”. Isso porque o “ala” direito Régis recuava até a linha de defesa, e Diego Sacoman fechava o lado esquerdo com César e Betão no miolo de zaga, protegendo a baliza de Roberto. Já o ala esquerdo Uendel fechava a segunda linha de quatro pela esquerda, junto com Fernando Bob e Magal, com Chiquinho pela direita. À frente, Rildo e Dennis.

Postura de líder

Logo no início o Cruzeiro já demonstrava ter bastante facilidade, tanto para chegar quanto para se defender, alternando momentos de subir a pressão na marcação e dar velocidade no ataque com momentos de cadenciar a partida e esperar o time em seu próprio campo. Ceará vencia todos os duelos com Uendel, e Chiquinho somente cercava Everton, que não apoiou muito, mesmo sempre sendo uma boa opção de passe pela esquerda.

O gráfico de posição média dos 11 titulares do Cruzeiro mostra um claro 4-2-3-1: Ceará um pouco mais solto que Éverton e os três meias bem próximos

O gráfico de posição média dos 11 titulares do Cruzeiro mostra um claro 4-2-3-1: Ceará um pouco mais solto que Éverton e os três meias bem próximos

No meio-campo, a superioridade numérica falou mais alto. Como mencionado na análise do último jogo, os três meias estão se movimentando de maneira muito inteligente, sempre próximos uns dos outros para que as linhas de passe se abram. Pode-ser dizer que eram praticamente cinco contra dois no meio-campo central, apesar de quatro ser o número mais frequente: os dois volantes, sem terem a quem marcar, subiam e davam a opção para o passe de segurança, e o meia do lado oposto à jogada fechava próximo de Goulart.

E assim, bem consciente de que era melhor, o Cruzeiro tomou conta da partida e abriu o marcador numa pedrada de cabeça de Dedé, em cobrança de escanteio de Willian. Ainda houve mais chances para aumentar — além do gol, outras seis finalizações foram à meta de Roberto, sendo três defendidas, duas bloqueadas e uma para fora. Abaixo da média “normal”, mas suficiente para ir ao intervalo com a vitória parcial.

Trocas

Lucas Silva já havia entrado na vaga de Souza no fim do primeiro tempo, por lesão. Na Ponte, Carpegiani iniciou a etapa final com o meia Luis Ramírez na vaga do volante Magal e com o atacante Rafinha, mais veloz, no lugar de Dennis. Agora sim o time da casa tinha uma linha de três zagueiros (César, Betão e Sacoman), com Régis na ala direita e Chiquinho trocando de lado para ser o ala esquerdo. Entre eles, apenas Fernando Bob fazia a proteção, já que o antes ponteiro esquerdo Uendel foi fazer a meia-esquerda, ao lado de Ramírez. Rildo ficou mais centralizado e Rafinha procurou se movimentar pelas pontas — uma espécie de 3-3-2-2, ou 3-5-2 com o triângulo de meio de base alta.

Porém, como acontece na maioria das vezes quando uma linha defensiva de três encontra um ataque com apenas um jogador centralizado e dois abertos chegando, existe indefinição na marcação, que para ser solucionada, exige o recuo dos alas até a linha defensiva, causando uma redundância na sobra (três zagueiros para apenas um atacante), que por sua vez acarreta em inferioridade numérica em outro setor do campo. Assim, o que já estava tranquilo ficou ainda mais: Fábio não apareceria na imagem nem pra cobrar tiro de meta até a terceira mexida de Carpegiani. Diego Sacoman deu seu lugar a mais um atacante, Giovanni, e com isso a linha de 3 estava desfeita: Uendel voltou à lateral esquerda, Chiquinho avançou à meia direita com Ramirez invertendo de lado, e se configurou um 4-3-3 (ou 4-1-2-3).

No Cruzeiro, mais uma lesão, desta vez de Éverton, forçou Marcelo Oliveira a usar o até então poupado Egídio. A marcação estava mais encaixada, mas mesmo assim o Cruzeiro se movimentou o suficiente para chegar ao segundo gol e matar a partida, quando Borges fez um gol típico de centroavante: recebeu o passe de Ribeiro de costas para o gol, girou em cima da marcação e venceu Roberto, para se redimir do inacreditável gol perdido um minuto antes dentro da pequena área.

Com o jogo resolvido, todos esperariam uma nova entrada de Júlio Baptista, para dar ritmo ao jogador, mas Marcelo promoveu a reestreia do volante Henrique na vaga de Goulart. Mais do que uma substituição tática, é parte de um planejamento para rodar o elenco, já que a condição física será fator determinante até o fim da temporada. Com Everton Ribeiro totalmente livre com o suporte do trio de volantes, às vezes era um 4-3-1-2 losango quando o camisa 17 ficava centralizado, às vezes era um 4-3-3 quando ele caía pela direita.

Fábio só fez uma defesa — um chute de Rafinha de fora da área, fácil para o capitão — um lance símbolo do domínio completo e total que o Cruzeiro teve na partida.

Na única defesa que fez, Fábio nem sujou o uniforme (WhoScored.com)

Na única defesa que fez, Fábio nem sujou o uniforme (WhoScored.com)

Vencer descansando

Sun Tzu, autor do famoso livro “A Arte da Guerra”, dizia: “se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas.” O futebol é uma analogia da guerra — e é dela que vêm tantos termos hoje futebolísticos, como “artilheiro” e “tática” — e portanto cabe o paralelo: saber o nível do adversário é tão importante quanto saber o seu próprio.

E foi com essa mentalidade que os jogadores entraram em campo, provavelmente assim instruídos por Marcelo Oliveira. Ciente de sua superioridade, mas sem subir no famoso salto alto e entrar em clima de “já ganhou”, jogando sério e simples, ou seja, o suficiente para vencer o jogo e ao mesmo tempo preservar energias para enfrentar o Maracanã lotado na quarta. Uma missão bem mais difícil, mesmo considerando a vantagem e o fato de o Flamengo estar em um momento ruim e talvez sem seu principal jogador de criação.

A inédita liderança isolada no Brasileirão é merecida e dá tranquilidade para a Copa do Brasil. A concorrência de datas entre as duas competições, novidade neste ano, fará com que algumas equipes priorizem uma em detrimento da outra, mas o elenco do Cruzeiro vem provando que pode ser possível chegar bem nas duas.

Dez anos depois, a coroa poderia ter duas pontas apenas, mas não seria menos brilhante.