Caldense 0 x 5 Cruzeiro – O laboratório ideal

Com a tarefa facilitada pela boba expulsão do atacante Max ainda no primeiro tempo, o Cruzeiro não precisou fazer força para golear a Caldense hoje em Poços de Caldas. Uma clara demonstração de que o time pode se adaptar a diferentes formações dependendo das situações de jogo encontradas.

No primeiro tempo, Cruzeiro no 4-3-3 com Anselmo Ramon na referência e atacantes abertos recompondo para formar um meio-campo com 5 homens

O Cruzeiro veio a campo com o mesmo 4-3-3 que começou as últimas duas partidas, porém com Anselmo Ramon na referência e Marcelo Oliveira na parceria com Leandro Guerreiro. A Caldense veio num tradicional 4-3-1-2, tendo Fábio Neves na articulação atrás dos atacantes Max e Luisinho.

A Caldense começou com tudo, pressionando o Cruzeiro no alto do campo, que teve que ceder a posse em alguns momentos. Porém, o Cruzeiro devolveu na mesma moeda, e em pouco tempo a bola passou a ficar mais tempo em pés azuis do que verdes. A defesa jogava avançada, para tentar empurrar o adversário em seu próprio campo, e com isso a Caldense chegou a ter algumas oportunidades de contra-ataque com o rápido Luisinho, mas sem sucesso.

Ofensivamente, o Cruzeiro tinha mais posse, mas não conseguia passar pela bem montada defesa da Caldense. O primeiro volante Mário era o responsável por marcar Montillo, mas quando o argentino saía da zona central, ele não ia atrás, a marcação mudava de jogador e a estrutura defensiva com 9 homens atrás da bola se mantinha. Assim, o time azul optou por jogadas mais agudas, de menos probabilidade de sucesso, mesmo tendo maior posse de bola. Quando perdia a posse, deixava de pressionar, numa tentativa de atrair um pouco mais a defesa da Caldense para si e jogar em velocidade.

Não foi bem assim que saiu o primeiro gol, mas a falta cobrada rapidamente por Montillo, deixando WP cara a cara com Glaysson e originando o pênalti – convertido pelo próprio atacante – ilustram a proposta de jogo dos visitantes. Atrás no placar, a Caldense tentou sair um pouco mais, avançando seus volantes e laterais, mas isso deixou espaços cruciais atrás destes últimos. E os atacantes abertos trataram de explorar este espaço: logo no minuto seguinte ao gol, Wallyson recebeu, livre, uma inversão em diagonal, numa jogada muito parecida com o segundo gol de Montillo contra o Villa Nova, e cruzou rasteiro, mas nenhum atacante aproveitou. Cinco minutos depois, foi a vez de WP emendar um cruzamento de primeira, mas para fora, também naquele setor.

A expulsão do atacante Max ainda no primeiro tempo só facilitou um jogo que já estava totalmente controlado. A Caldense não mudou o esquema, mantendo somente Luisinho à frente. Se o camisa 11 voltasse para recompor o meio, os volantes azuis tinham todo o tempo do mundo para conectar-se às variadas opções not ataque. Mas se Luisinho ficava à frente, o Cruzeiro tinha um homem a mais no meio, e assim o jogo passou a ser ataque contra defesa. Os visitantes ganhavam todas as segundas bolas, e os zagueiros Victorino e Thiago Carvalho quase não tinham trabalho.

O segundo gol veio após um escanteio cabeceado por Anselmo Ramon e defendido à queima-roupa por Glaysson. A sobra, como esperado, ficou com o lateral Marcos, que achou Montillo no meio e correu para a área, no “contra-fluxo” da defesa adversária. Marcos recebeu a devolução do argentino na medida para dar um tapa de primeira e achar três cruzeirenses livres. A defesa da Caldense acusava impedimento enquanto Victorino comemorava seu primeiro gol com a (nova e lindíssima) camisa cruzeirense.

O primeiro tempo terminou na mesma toada, com WP recebendo passe dentro da área de uma posição aberta, mas desta vez nenhum companheiro estava dentro da área.

O técnico Ademir Fonseca ainda tentou arriscar no intervalo, tirando seu principal articulador, Fábio Neves, e lançando um novo parceiro de ataque para Luisinho, Félix, mudando para um ousado 4-3-2. Mas os planos do treinador da Caldense foram por água abaixo quando Leandrão errou um passe em seu próprio campo e WP aproveitou, avançando com seus dois companheiros de ataque contra dois zagueiros apenas. A conclusão plástica de Anselmo Ramon para o cruzamento de WP resolveu o jogo, e o Cruzeiro passou a administrar. Fonseca fez mais duas alterações, mas trocando seis por meia dúzia em termos táticos, ao invés de fechar seu time e tentar evitar mais gols.

Sem necessidade de correr atrás, o Cruzeiro deixava a Caldense com a bola, sabendo que tinha todos os espaços controlados, esperando o erro do adversário. E num desses erros, o quarteto ofensivo funcionou mais uma vez. WP, aberto pela esquerda, avançou com a bola, vendo Montillo disparar para receber pelo flanco da área. Lançado, o camisa 10 passou com a facilidade que lhe é característica pelo seu marcador e cruzou na cabeça de Wallyson, livre na pequena área.

O 4-2-4 ultra-ofensivo no fim do jogo, com intenso revezamento dos homens de frente e zagueiros adiantados

O quarto gol fez Mancini abrir seu laboratório. Primeiro, tirou Leandro Guerreiro, de característica mais defensiva, para lançar Amaral, um volante que sai mais para o jogo. Marcelo Oliveira passou a ficar mais tempo recuado, e o 4-3-3 se manteve, mas mais ofensivo, algo como um 4-1-2-3. Depois, Diego Renan deu lugar ao garoto Élber, que entrou na articulação central. Marcelo Oliveira foi para a lateral esquerda e Montillo virou atacante, transformando o Cruzeiro numa espécie de 4-2-4 ultra ofensivo. O sexteto ofensivo promoveu uma intensa movimentação, se revezando nas quatro posições frontais constantemente. Além disso, Everton ainda entrou no lugar de Marcelo Oliveira na esquerda, para dar ainda mais ofensividade ao time azul.

Nesse momento, talvez a melhor descrição para a formação seja provavelmente um 2-4-4, pois o domínio era tal que não havia necessidade de os laterais recomporem a última linha de defesa. Nos últimos lances da partida, era comum ver Victorino e Thiago Carvalho além da linha do meio-campo, sem a companhia de Marcos e Everton, que avançavam para combinar aos atacantes abertos. Anselmo Ramon nem teve que saltar para cabecear o quinto gol em centro de Amaral, tal era a fragilidade do sistema defensivo do time de Poços.

Ao fim do jogo, Vágner Mancini disse na entrevista coletiva que o Cruzeiro ainda não jogou contra um adversário à altura. De fato, o resultado não pode empolgar. Contra times mais experientes, nas fases finais da Copa do Brasil e no Brasileiro, o Cruzeiro não terá tanta facilidade. Mas também disse que “o trabalho é feito para finais de campeonato”. Portanto, os jogos contra times menores – leia-se, primeira fase do Campeonato Mineiro e fases iniciais da Copa do Brasil – são o campo de experiências ideal para se chegar às grandes competições com o time formado. E um time formado é aquele que consegue jogar em diferentes esquemas táticos e diferentes situações de jogo.

Vágner Mancini vai, aos poucos, controlando as variáveis e obtendo resultados. Experimentando variações com calma, sem pressa, como um cientista. Quem sabe, no futuro, tenhamos uma máquina engenhosa. De fazer gols.

Cruzeiro 2 x 0 Villa Nova – Quando o craque tem espaço

Montillo se aproveitou das raras vezes em que teve alguma liberdade para dar a sexta vitória seguida ao Cruzeiro contra o Villa Nova hoje em Sete Lagoas.

Cruzeiro no 4-3-3 com Walter de centroavante e Anselmo Ramon aberto pela esquerda, variando para o 4-2-3-1 na fase defensiva

Vágner Mancini optou por uma formação ofensiva, com Everton e Wallyson substituindo o suspenso Marcelo Oliveira e o lesionado Roger, efetivamente compondo um 4-3-3, com Walter de centro-avante e Anselmo Ramon aberto pela esquerda. Já o Villa Nova veio a Sete Lagoas num 3-5-2 clássico, com Francismar na articulação central e os laterais-alas Alex Santos e Zé Rodolfo bem avançados, como é característico do esquema.

Nos primeiros 10 minutos, o Cruzeiro teve total domínio de posse de bola, mas claramente sentiu a falta de Roger na intermediária defensiva para qualificar a saída. Os passes eram lentos e o Villa Nova tinha bastante tempo para encurtar os espaços e se fechar atrás com 9 homens. Nas poucas vezes em que os mandantes arriscavam, as decisões de passe não eram boas e o time perdia a posse de bola. A pressão no alto do campo, porém, fazia o time visitante recorrer a bolas longas para o ataque, que sempre chegavam aos pés de cruzeirenses para mais uma tentativa.

O erro grotesco de passe de Gilson, que produziu mais um milagre de Fábio aos pés do bom lateral Alex Santos, pareceu acordar o Villa Nova. Francismar não era vigiado de perto nem por Leandro Guerreiro, que ficava mais recuado na proteção à zaga, e nem por Everton, que se lançava mais à frente pelo setor esquerdo. O camisa 10 villanovense jogou exatamente no espaço entre os dois, produzindo bons lances. E, com três homens no meio contra cinco adversários, o Cruzeiro não conseguia fechar os espaços do adversário e criar espaços para si próprio.

A primeira finalização cruzeirense só veio depois de uma jogada de muita raça de Montillo. O argentino disputou a bola no chão com um adversário e conseguiu espanar para a chegada de Marcos. O centro achou Anselmo Ramon, que cabeceou fraco. No lance, o atacante bateu a cabeça em um defensor e viria a ser substituído 5 minutos depois. Durante o atendimento ao camisa 11, foi interessante notar a postura do time de Nova Lima. Com um a mais, os visitantes tentaram sobrecarregar o meio-campo com o avanço de um dos defensores, mas o Cruzeiro se fechou bem e evitava jogadas mais agudas.

A entrada de Rudnei no lugar de Anselmo Ramon reequilibrou a equipe no 4-3-1-2 losango habitual. Leandro Guerreiro pôde se concentrar mais em Francismar e deixar Rudnei e Everton com mais liberdade. Os laterais cruzeirenses passaram a avançar muito mais, pois não encontravam mais a barreira natural dos atacantes muito abertos. Walter continuou na referência e Wallyson jogou mais recuado, procurando Montillo. Um exemplo disso foi o primeiro gol, um efeito dominó de uma jogada de Wallyson: ao driblar seu marcador na meia-direita, indefiniu a marcação de Carciano, que não sabia se encurtava em Wallyson ou acompanhava Montillo, que se posicionava para receber. A bola chegou ao argentino que, com espaço e avançando perigosamente, fez o zagueiro central Álvaro deixar a marcação de Walter para tentar barrar o camisa 10. O passe genial por cima achou o atacante que, agora livre dentro da área, só teve o trabalho de bater no canto esquerdo de Elisson.

Em seu melhor momento no jogo, um Cruzeiro num 4-3-3 com muita mobilidade, com Élber na articulação central e Montillo aberto pela direita, de onde saiu o golaço do argentino

No segundo tempo, Mauro Fernandes lançou o veloz Thiaguinho no lugar do lateral esquerdo Zé Rodolfo. O meia jogou bem aberto pela esquerda e pôde atacar sem preocupações, já que Carciano e o volante Higo faziam a cobertura pelo setor. A estratégia deu certo e o lado direito da defesa celeste passou por apuros. O chute para fora de Thiaguinho, em uma jogada iniciada por ele próprio para Henrique e Francismar servir, foi o sinal de alerta para o Cruzeiro recuar a sua linha de volantes e segurar Marcos. Os ataques dos visitantes passaram a não ter tanto efeito, pois Thiaguinho já não tinha tanta liberdade, mas em contra-partida os próprios mandantes não conseguiam atacar com perigo também.

O técnico do Villa Nova então tentou sobrecarregar a defesa azul, colocando o atacante Vinícius. Mas tirou o jogador errado de campo: Francismar, o principal articulador da equipe. Thiaguinho e Eliandro não conseguiram suprir com a mesma criatividade, e o efeito foi que o Villa Nova passou a ter apenas quatro jogadores no meio, o mesmo número que o Cruzeiro. O Villa perdeu em posse, e, para piorar (ou melhorar, do ponto de vista azul), Vágner Mancini lançou o jovem Élber no lugar de Gilson, com Everton indo ocupar a lateral esquerda. O garoto ocupou a faixa central do meio-campo, empurrando Montillo para o ataque, e sem Francismar para vigiar, Leandro Guerreiro pôde fazer a dupla de volantes com Rudnei, fazendo um 4-2-1-3 bem ao estilo da Seleção Brasileira de Mano Menezes.

Não demorou muito a surtir efeito. Em dois lances, Montillo foi lançado pelo lado direito do ataque, em velocidade e sem marcação. No primeiro, centrou rasteiro para Élisson defender a conclusão de Élber e o rebote de Wallyson. No segundo, recebeu inversão de Wallyson, cortou para dentro deixando o volante Anderson Toto na saudade e concluiu rasteiro. Golaço.

Anderson Toto, diga-se de passagem, havia entrado no lugar do zagueiro central Álvaro, fazendo o Villa voltar a ter uma linha de 4 jogadores atrás. No momento do gol, porém, a equipe visitante parecia estar jogando no início do século com 2 zagueiros e 3 volantes, como pode se ver na imagem abaixo.

Acredite, Montillo está sozinho, sem marcação, fora do quadro, momentos antes de fazer o segundo gol do Cruzeiro (globo.com)

Um 2-3-5? Certamente que não, mas sim a velocidade da jogada pegou os laterais villanovenses desprevenidos.

Com a boba expulsão de Walter, o Villa Nova se mandou à frente e Mancini lançou Amaral no lugar de Wallyson. O Cruzeiro recuou bastante num 5-3-1, com Montillo sozinho à frente e Leandro Guerreiro se posicionando afundado entre Victorino e Leo. Os visitantes tiveram muito espaço na intermediária ofensiva, mas o Cruzeiro defendeu bem sua área e cozinhou o jogo até o tempo acabar.

Se por um lado vemos pequena evolução, jogo a jogo, no 4-3-1-2 losango, os jogadores ainda têm certa dificuldade ao executar outros esquemas, já que a vitória por 6 x 0 sobre o fraquíssimo Rio Branco não pode servir de parâmetro. No entanto, o Campeonato Mineiro (e a Copa do Brasil nestas primeiras fases) são excelentes laboratórios para testar o comportamento do time em posicionamentos diferentes. A decisão de se jogar com três na frente contra um 3-5-2 provavelmente não é a melhor, mas é improvável que, no decorrer da temporada, o Cruzeiro vá enfrentar times mais experientes que joguem neste esquema.

Mas, uma coisa é certa: temos um jogador que decide, mesmo sem espaço. Com espaço então…

Nota: Somente ao preparar as imagens deste último post é que percebi que o posicionamento dos zagueiros Léo e Victorino está invertido. Como todos sabem, Léo joga na direita e Victorino na esquerda. A partir do próximo post, tudo estará normal.

Cruzeiro 2 x 0 América/TO – Sob a batuta de Roger

Com Roger ditando o ritmo, o Cruzeiro só precisou de um tempo para definir a vitória contra o América-TO ontem na Arena do Jacaré, com mais 2 de WP. E ao reagir com substituições corretas às mexidas do adversário, Vágner Mancini facilitou a vitória de seus comandados, em um claro exemplo de como mexer na característica do time sem necessariamente mexer na formação.

O costumeiro losango celeste do primeiro tempo, com Roger invertendo com Leandro Guerreiro

O Cruzeiro jogou todo o jogo no 4-3-1-2 usual, com Roger dando qualidade à saída de bola, trocando frequentemente de posição com Leandro Guerreiro. Já o América-TO veio para o jogo num surpreendente 3-4-2-1, com Geraldo na referência, Diego Faria um pouco mais à frente do que Luciano Mourão na ligação. Talvez uma tentativa do técnico Gilmar Estevam de emperrar a criação celeste lotando o meio-campo com seis homens.

Não deu muito certo, no entanto. Como tem feito nos últimos jogos, Roger era frequentemente visto logo à frente dos zagueiros para receber a primeira bola e fazer o time sair,  jogando em uma função cujo nome em inglês é deep-lying playmaker (“articulador recuado”, numa tradução livre), algo como um “falso 10”, que é cada vez mais comum no futebol. E o meia tinha muita liberdade, pois somente Geraldo marcava mais à frente. Os outros nove jogadores de linha do América ficavam atrás da bola, e com isso havia muito tempo para estudar o jogo e encaixar o melhor passe.

Além disso, com três zagueiros, os laterais do time de Teófilo Otoni se posicionavam na penúltima linha. Isso criava espaços às suas costas, que não eram cobertos pelo trio defensivo, mais centralizado. As enfiadas de Roger em diagonal acabaram se tornando comuns, ilustradas pelo primeiro lance do jogo: um gol anulado de Montillo em uma jogada pela esquerda de Marcelo Oliveira, recebendo passe de Roger exatamente naquele setor. Diego Renan também usou este espaço quando lançou Anselmo Ramon, que protegeu e devolveu para o lateral dentro da área. O pênalti inexistente resultou no primeiro gol.

Com os laterais na penúltima linha e os três zagueiros muito centralizados, Roger explorava os espaços deixados dos lados do campo

Montillo ainda recebia marcação especial de Elber, que o seguia para todos os lados do campo. Com muita inteligência tática, o argentino arrastava o volante para os lados do campo, abrindo espaços para seus companheiros. Leandro Guerreiro, em uma das inversões com Roger, aproveitou este espaço e recebeu um excelente passe no meio, avançando sem ser incomodado. Ele conectou Anselmo Ramon que, fazendo muito bem o trabalho de pivô (mais uma vez, diga-se), serviu WP, que emendou de primeira no canto direito de Fábio Noronha.

Do outro lado, o Cruzeiro só era realmente incomodado em contra-ataques. O time mandante dava espaços, devido principalmente à intensa participação de seus volantes na criação, inclusive gerando um contra-ataque três contra três que, felizmente, foi desperdiçado pelo América. O posicionamento muito recuado do meio-campo visitante, entretanto, fazia com que as ações ofensivas fossem mais tímidas. Além disso, Geraldo é muito mais um homem de área do que atacante de movimentação, não sendo o homem ideal para puxar contra-ataques. A vitória azul no primeiro tempo foi justa.

Após as alterações, Cruzeiro no 4-3-1-2 quase 4-3-3 com o ataque super fluido sem centroavante fixo, e LG revezando com MO nas subidas pelo lado esquerdo

No intervalo, Gilmar Estevam colocou o lateral direito Rafinha no lugar do zagueiro Danilo, repaginando sua equipe numa árvore de natal, ou 4-3-2-1. Com mais largura na última linha, o problema dos espaços nas pontas do campo foi resolvido. Mancini tentou explorar o espaço aberto no meio-campo, ocasionado pela redução de jogadores adversários no setor (de 6 para 5), adiantando Roger para se tornar um articulador mais clássico, com Montillo praticamente de atacante, quase num 4-3-3. Mas como é um jogador que se movimenta pouco, Roger não foi tão eficiente na criação com a marcação direta que recebia, mesmo tendo criado alguns lances. Além disso, voltava lentamente para ajudar na parte defensiva, proporcionando mais posse do América.

Assim, o técnico visitante arriscou um 4-2-2-2, colocando o atacante Karreta no lugar do volante Felipe Dias, na tentativa de transformar a maior posse em gols. Mancini respondeu com a entrada de Rudnei no lugar de Roger. O esquema permaneceu sendo 4-3-1-2, mas com Rudnei muito mais móvel que Roger, aparecendo pra jogar e voltando pra marcar pela direita. MO e LG se revezavam: um protegia a zaga, o outro subia para o ataque pelo outro lado. Montillo, agora liberado atribuições defensivas, se adiantou de vez, e o Cruzeiro voltou a ter muito mais posse de bola.

Interssante notar como as batalhas individuais se davam neste momento. Nas duas pontas viam-se batalhas de dois zagueiros contra dois atacantes. Os homens da sobra de ambas as equipes agora se encontravam no meio-campo: três volantes do Cruzeiro contra dois meias do América, e dois volantes do América contra Montillo. A diferença é que os cruzeirenses se preocupavam mais em ajudar o ataque, enquanto os americanos tinha como prioridade vigiar Montillo.

As entradas de Wallyson e Walter nos lugares de WP e AR deram mais fluidez e movimentação, com um ataque sem centroavante fixo, mas tiraram um pouco o poder de conclusão. Gilmar Estevam tentou fazer o mesmo, colocando o rápido Celinho no lugar de Geraldo, mas sem sucesso. O Cruzeiro continuou com mais posse e criou várias chances, mas não conseguiu ampliar, pois o time visitante, mesmo com os dois atacantes, recuou para evitar uma goleada. Mas não precisou, pois o Cruzeiro claramente já se poupava e cozinhou o jogo até o fim, mesmo com a expulsão de Karreta, quando o América se repaginou no clássico 4-4-1.

No jogo de xadrez dos dois treinadores, Mancini venceu, tomando as contra-medidas certas para manter o controle do jogo. WP vem se destacando pelas conclusões certeiras e Roger pela qualidade na saída. Mas é importante lembrar que o Cruzeiro ainda não foi realmente testado na temporada. Contra uma equipe mais técnica e experiente, o meia muito provavelmente não terá tanta liberdade. O ataque mais móvel, com Walter e Wallyson, provavelmente será a melhor opção contra estes times, pois elas saem mais para o jogo e não ficam tão entrincheiradas.

O próximo jogo será interessante do ponto de vista tático, pois Marcelo Oliveira, Diego Renan e Wellington Paulista estão suspensos pelo terceiro cartão. Vamos ver como Vágner Mancini reagirá aos primeiros desfalques forçados da temporada.

Democrata/MG 0 x 2 Cruzeiro – Cuidado com os buracos

Com dois de Montillo (que poderiam muito bem ser creditados a Anselmo Ramon), o Cruzeiro venceu a terceira seguida, mas por sorte não caiu num enorme buraco criado pelo seu próprio treinador.

Formação inicial: 4-3-1-2 losango com muito espaço entre o trio de volantes e o trio ofensivo

Com Rudnei no lugar de Roger, poupado, o Cruzeiro continuou no seu costumeiro 4-3-1-2 losango, mas sem a criatividade de Roger na saída de bola e com mais poder de marcação proporcionado por Rudnei. José Maria Pena escalou o time da casa num 4-2-2-2, mas com o meio-campo todo formado por volantes, e com Adriano um pouco mais recuado que Léo Andrade na frente.

Com três volantes “de raiz”, o Cruzeiro novamente teve problemas de criatividade no primeiro tempo. Leandro Guerreiro, Marcelo Oliveira e Rudnei não são jogadores criativos, e Montillo joga sempre muito avançado, mais próximo do gol. Além disso, o Democrata se alinhava em duas linhas de quatro quando perdia a posse, com os dois “meias” ofensivos recompondo pelos flancos. Com isso, os laterais do Cruzeiro não avançavam muito, sob o risco de deixar um buraco nos flancos defensivos e tomar bolas nas costas em contra-ataque. O Cruzeiro só conseguia sair com a bola pelos lados, quando Montillo ou Wellington Paulista caíam pelo setor e se apresentavam para o primeiro passe, mas a essa altura já estavam muito longe do gol.

Defensivamente, o Cruzeiro se portou bem, pressionando a bola assim que perdia a posse, diminuindo ainda mais a qualidade do passe dos meio-campistas do Democrata, que eram volantes por natureza. A rigor, a única chance criada pelos valadarenses foi num erro de arbitragem, quando a defesa do Cruzeiro fez a linha de impedimento e o auxiliar nada marcou, fazendo com que Fábio tivesse que mostrar porque é um dos ídolos da torcida. De resto, alguns lampejos de Léo Andrade, que tentou se movimentar mais, na tentativa de puxar a marcação de um defensor para fora de sua zona, gerando um efeito cascata. Note como, aos 01:14 deste vídeo, como o zagueiro Leo está fora da área, à caça do atacante democratense, abrindo um buraco na defesa celeste. Diego Renan teve que sair pra fazer a cobertura, deixando dois jogadores sozinhos do lado direito do ataque. A sorte foi que Flávio Lopes, vendo-se sozinho, tentou chutar ao invés de passar para seus companheiros.

Tudo isso, aliado à péssima qualidade do gramado e ao forte calor que fazia em Valadares, contribuíram para um primeiro tempo, ironicamente, morno, de baixa qualidade técnica. O Cruzeiro teve mais posse de bola, mesmo tendo menos homens no meio-campo do que o time mandante (3 contra 4, já que Montillo era praticamente um atacante). Rudnei, mas enérgico que Roger, não conseguiu suprir a ausência deste criativamente, e mais uma vez a ligação entre o trio ofensivo e o trio de volantes foi fraca, com um buraco entre as linhas.

A saída de Rudnei abriu um buraco na meia direita celeste, recomposto mais tarde por Roger

No intervalo, Mancini substituiu Rudnei pelo atacante Walter. Com mais homens à frente, o treinador tentou fazer o time da casa se preocupar mais em defender e dar mais espaço no meio-campo para os volantes jogarem. Efetivamente, o que aconteceu foi que WP recuou ainda mais para se tornar um meia-armador de fato, Montillo continuou na sua posição normal e um buraco se abriu no meio-campo defensivo, onde antes estava Rudnei, já que os volantes não se reposicionaram no novo 4-2-2-2 “torto”. A assistência primorosa de calcanhar de Anselmo Ramon para Montillo marcar seu primeiro gol na temporada e se tornar o maior artilheiro estrangeiro do Cruzeiro (com o perdão das rimas) escondeu um pouco o alto risco da substituição escolhida pelo treinador cruzeirense.

Em desvantagem no placar, o Democrata tratou de tentar atacar o Cruzeiro, e aproveitaram o tal buraco. Se os visitantes tinham um homem a menos no meio-campo no primeiro tempo, com dois a menos ficou impossível ganhar a batalha pela posse. Com a tentativa de pressão, os dois volantes cruzeirenses recuaram ainda demais, e os mandantes ganhavam praticamente todas as bolas rebatidas pela zaga azul. No entanto, o Democrata não conseguiu criar muitas chances, seja pela baixa qualidade criativa de seus volantes, seja pelo ótimo desempenho dos defensores cruzeirenses, particularmante Victorino e Diego Renan. A pressão só foi terminar quando Mancini corrigiu seu próprio “erro” e colocou Roger no lugar de Wellington Paulista, voltando o time ao 4-3-1-2 losango. Roger, novamente, entrou na função de box-to-box, indo de uma área à outra, para fazer o time ter saída de bola e se apresentar a todo momento para receber o passe. Quando recebia, cadenciava o jogo e fazia a bola rodar, invertendo o jogo quando necessário.

Com a pressão “aliviada”, o Cruzeiro conseguiu sair um pouco mais, e gradativamente foi empurrando o time da casa para trás. Para tentar evitar a derrota em sua estréia pelo time, José Maria Pena arriscou e tentou colocar Anderson, um meia de fato, no lugar do volante Elton, para melhorar a ligação ao lado de Bob. O risco era estreitar o meio-campo, agora um quadrado de fato, e “chamar” os laterais cruzeirenses para o apoio. E o castigo veio no minuto seguinte: Diego Renan conseguiu avançar e combinou com Anselmo Ramon, que, novamente fazendo bem uma das funções do homem de referência, que é o pivô, devolveu de calcanhar para o lateral chutar forte em cima do goleiro reserva Jonathan. Montillo, desmarcado, aproveitou o rebote e cavalgou mais uma vez pelo Mamudão, definindo o jogo.

Com a expulsão de Bob, o Democrata se reorganizou num ousado 4-3-2 (ou 4-2-1-2), mas com Adriano voltando para ajudar na marcação, efetivamente um 4-4-1. O time ainda tentou se arriscar, mas o Cruzeiro tinha uma defesa recomposta com a entrada de Roger e parecia satisfeito com o resultado, se postando atrás e dificultando muito a vida dos mandantes. Wallyson ainda entrou no lugar de Anselmo Ramon, fazendo o ataque WWW (Walter Montillo, Walter e Wallyson, que é a aposta de muita gente para o decorrer do ano), mas o time manteve o desenho tático.

Fim de jogo, terceira vitória seguida e mais tranquilidade para Mancini continuar tentando dar uma cara para o Cruzeiro este ano. Destaques para as atuações de Anselmo Ramon (que vem demonstrando ser muito mais um camisa 9 do que WP) e Diego Renan, que, apesar de não ter sido brilhante ofensivamente, teve participação fundamental quando o Cruzeiro não tinha a posse de bola. No entanto, é bom não ficar muito animado, pois foram vitórias contra times mais fracos. Os verdadeiros testes serão contra América e Atlético, mais para o fim da primeira fase.

Será uma caminhada longa, e a estrada já é esburacada o suficiente.

Nacional/MG 2 x 4 Cruzeiro – (Des)confiança

Os três gols de Wellington Paulista e o de Wallyson não podem nem devem mascarar uma atuação regular do Cruzeiro hoje em Divinópolis, contra o Nacional de Nova Serrana.

O 4-3-1-2 celeste do primeiro tempo, com Roger mal passando da linha de meio-campo

O Cruzeiro veio a campo com o costumeiro 4-3-1-2 losango com Roger recuado e responsável pela saída de bola, e Anselmo Ramon mais dentro da área adversário que Wellington Paulista. O Nacional veio no mesmo esquema, um 4-3-1-2 losango montado por Emerson Ávila, com Alex Maranhão articulando para Reinaldo Alagoano e Marcinho.

Porém, apesar de estarem no mesmo desenho, havia duas diferenças: a qualidade dos volantes “natos” e, principalmente, o posicionamento de Roger. Desta vez, o meia se posicionou como um volante clássico, uma mudança fundamental em relação ao jogo contra o Tupi. Sem a bola, Roger fechava o lado direito do losango, por vezes ajudando Marcos na marcação. Com a posse, ele centralizava e recuava ainda mais, frequentemente buscando a bola atrás de Leandro Guerreiro, que teoricamente seria o homem mais plantado do meio-campo. Esporadicamente, Roger subia para articular com Montillo e Guerreiro cobria, mas o meia passou a maior parte do tempo tentando criar de trás, e Guerreiro era quem subia mais frequentemente para ajudar o trabalho ofensivo, juntamente com Marcelo Oliveira.

Mesmo assim, o trabalho de criação mais uma vez não foi bom. Com Roger posicionado desta forma, o Cruzeiro consegue sair melhor para o jogo, mas peca no momento em que precisa jogar mais incisivamente, perto da área adversária. Montillo ora jogava muito enfiado – fazendo com que os volantes fossem responsáveis pela articulação – ora abria pelos lados, dificultando sua característica de jogo, que driblar em velocidade com a bola. Tanto que as melhores chances eram criadas quando o Cruzeiro retomava a posse e partia rapidamente, quando o argentino tinha espaço para correr e dois alvos à frente. A jogada do primeiro gol ilustra isto: um passe de Montillo – mais longe da área e correndo em direção a ela – para Anselmo Ramon, que trabalho de pivô e devolveu para o meia pela esquerda do ataque. O cruzamento foi desviado pelo goleiro, mas WP aproveitou a incrível falha do zagueiro e chutou em ótima posição para vencer Douglas.

O desequilíbrio entre os dois lados do time celeste ainda persiste. Na direita, Marcos mais uma vez fez uma boa partida, apoiando bem e fazendo cruzamentos certeiros, como no segundo gol. Já Diego Renan, cada vez com menos confiança por conta da perseguição da torcida, ficou muito tímido e apoiava pouco, mas fez uma boa partida defensivamente, ajudado por Marcelo Oliveira.

Com os flancos fechados, restou ao Nacional duas opções: entrar tocando ou ligação direta. A primeira era difícil de executar, pois Alex Maranhão foi bem marcado e a criação ficava por conta dos volantes do Nacional, que não são jogadores criativos. Na única vez em que conseguiu se desvencilhar, o meia colocou Reinaldo Alagoano cara a cara com Fábio, que salvou com o pé. Ademais, o time de Nova Serrana se limitou a bolas longas da defesa para o ataque, tentando pegar a defesa azul desprevenida.

Apesar de nenhuma alteração ter sido feita no intervalo, a equipe mandante avançou suas linhas para forçar o Cruzeiro a errar mais passes, além de impor velocidade na recuperação da bola. E deu certo: a defesa azul, jogando alto, tentou deixar o ataque do Nacional impedido, mas Leo deu condições e Éder finalizou um passe em profundidade para empatar. Depois disso, o Nacional ameaçou várias vezes, sempre em passes verticais que desmontavam a zaga cruzeirense. Algo estava errado e os jogadores sabiam, tanto que todos os 11 fizeram uma conferência durante um atendimento a um jogador adversário para tentar resolver a situação.

Em vão. Roger, apagado no segundo tempo (como no jogo anterior contra o Tupi) saiu para a entrada de Rudnei. O time celeste voltava ao 4-3-1-2 ortodoxo, com três volantes de ofício, mas Rudnei deu mais energia e avançava mais que Roger. O jogo ficou mais aberto, com os times procurando mais atacar do que se defender, até que numa blitz de bolas aéreas, a defesa se perdeu – é possível ver três jogadores do Cruzeiro avançando para cima do jogador da sobra, que cruzou para o zagueiro Alessandro Lopes matar a bola no peito, praticamente sozinho dentro da área, e mandar no ângulo de Fábio.

Formação após as alterações, com WP como homem de referência e M. Oliveira como lateral esquerdo fixo

Com a virada, o time da casa recuou e deu campo para o adversário. Mancini pôs Wallyson para jogar pelos flancos na vaga de Diego Renan, com Marcelo Oliveira indo fazer a esquerda, transformando um time num 4-2-1-3. Assim, WP pôde ficar mais dentro da área para jogar como centroavante de referência – posição em que fez dois gols consecutivos e iguais, em cruzamentos da direita de Marcos e Montillo, e que fizeram o Cruzeiro retomar as rédeas do jogo. Novamente atrás no placar, Emerson Ávila lançou o meia-atacante Dudu no lugar do lateral-direito Afonso, tentando criar uma ameaça para o improvisado e já amarelado Marcelo Oliveira, mas Mancini respondeu colocando Everton no lugar de Anselmo Ramon, reequilibrando o setor esquerdo. Ávila ainda tentou pressionar colocando o atacante Juninho Frizzi no lugar do volante Éber, efetivamente transformando o time num 4-2-4, mas uma bola rebatida para longe por Leo e aparentemente perdida foi recuperada por Montillo, sozinho no campo adversário, que acabou sofrendo o pênalti que sacramentou a vitória azul com a conversão de Wallyson.

Em suma, uma vitória construída primeiro pelo talento de Montillo – que deu dois passes pra gol e sofreu o pênalti – e depois pela entrada de Wallyson, que resultou em WP se posicionando dentro da área. Mas, novamente, vale ressaltar a fragilidade do adversário. O ataque foi eficiente mas não foi de encher os olhos: estamos muito presos a bolas aéres pelos flancos. É preciso construir mais jogadas terrestres e linhas de passe. Contra times mais técnicos ou mais experientes, o Cruzeiro terá dificuldades se continuar jogando assim. Já a defesa apresentou novamente ter problemas quando joga contra times que tentam impor velocidade, e não pode ficar tão perdida como ficou nos gols do Nacional. Como o próprio Vágner Mancini disse em entrevista após o jogo, a defesa é um setor que tem que passar confiança. Mas, como bons mineiros, tem muito torcedor por aí (eu inclusive) desconfiado com ela.