Villa Nova 0 x 4 Cruzeiro – Variações sobre um mesmo tema

Uma sutil mas interessante variação tática foi mais um dos fatores que praticamente garantiram a vaga na final do Campeonato Mineiro ao Cruzeiro, na vitória por 4 a 0 sobre o Villa Nova em Nova Lima.

Se na primeira fase o Villa Nova havia sido o adversário mais difícil para o escrete celeste, muito pelo fato de simplesmente ter mais jogadores no centro do meio-campo em um gramado pequeno, no jogo deste domingo Marcelo Oliveira soube neutralizar esta vantagem fazendo número em outro lugar do campo: os flancos.

Escalações iniciais

O 4-2-3-1 usual, mas com os três fazendo uma diagonal que variava para o losango no meio, com o avanço de Nilton e a centralização de Ribeiro

O 4-2-3-1 usual, mas com os três fazendo uma diagonal que variava para o losango no meio, com o avanço de Nilton e a centralização de Ribeiro

Com a bola, Marcelo posicionava sua equipe no 4-2-3-1 usual, com o gol de Fábio sendo protegido pelos zagueiros Léo e Bruno Rodrigo,

e com os laterais Mayke na direita, no lugar do lesionado Ceará, e Éverton na esquerda. Leandro Guerreiro e Nilton formara novamente a dupla de volantes, com o segundo com mais liberdade para atacar que o primeiro. Éverton Ribeiro fez o ponteiro direito, mas com a tendência costumeira de centralizar, se aproximando de Diego Souza, e abrindo o corredor. Do outro lado, mais espetado e entrando em diagonal na área, Dagoberto procurava Anselmo Ramon, o centro-avante de referência.

O Villa Nova de Alexandre Barroso veio no mesmo 4-3-1-2 losango do jogo da primeira fase. O goleiro William Nobre viu Rodrigo Dias à sua direita e Hyago à sua esquerda, flanqueando os zagueiros Heitor e Marco Tiago. Cléber Monteiro foi o cabeça-de-área, com os carrileros Max Carrasco e Marcelo Rosa à frente, ajudando Tchô, a ponta de cima do losango. Na frente, Rafael Gomes e Eraldo esperavam as bolas.

A variação tática

O jogo começou com o Cruzeiro sufocando o Villa Nova em seu próprio campo durante alguns minutos, com uma marcação pressão bem alta, sem deixar o time da casa ter longos períodos de posse de bola. Quando o ritmo da marcação diminuiu naturalmente, o Villa Nova conseguiu ter um pouco mais a bola nos pés e a variação tática apareceu. Everton Ribeiro marcava o volante e não o lateral, e Nilton saía para dar combate no meio. Na prática, era um 4-3-1-2 losango com o avanço do volante e o recuo e centralização do meia.

Com Leandro Guerreiro mais plantado para marcar Tchô, todos os passes simples dos zagueiros do Villa tinham sido cortados. Os laterais saíam pouco, e quando saíam, também não tinham a quem passar a bola. A mudança foi sutil, mas bem eficiente, já que a bola não chegava em Tchô, o principal jogador da partida na primeira fase. Fábio praticamente não tocou na bola no primeiro tempo.

Movimentação ofensiva

Com a bola, o Cruzeiro executou brilhantemente o 4-2-3-1 “diagonal”. A linha de três meias se encontravam constantemente em campo, com toques curtos e rápidos, provocando efeitos dominó de cobertura no sistema defensivo villanovense. A marcação do time adversário era atraída para os flancos, principalmente para a esquerda. Com a marcação concentrada, um espaço imenso se abriu à frente da área, e o Cruzeiro aproveitou. O primeiro gol saiu em uma falta sofrida por Everton Ribeiro naquele setor, e nos dois seguintes Diego Souza teve todo o tempo e espaço do mundo para calibrar o chute e vencer William Nobre de fora da área.

A jogada do terceiro gol: Ribeiro atrai a marcação e tira dois adversários da jogada com o passe de calcanhar, liberando toda a entrada da área para Diego Souza

A jogada do terceiro gol: Ribeiro atrai a marcação e tira dois adversários da jogada com o passe de calcanhar, liberando toda a entrada da área para Diego Souza

A intensidade foi tal que aos 36 do primeiro tempo o jogo já estava resolvido.

Substituições

Alexandre Barros tentou soltar mais seus laterais colocando o zagueiro Evaldo no lugar do volante Marcelo Rosa. No novo 3-4-1-2, os laterais ficam mais altos. Foi uma boa mexida, e não muito arriscada. Logo no começo Fábio finalmente trabalhou, defendendo um cabeceio à queima-roupa do zagueiro Heitor em cruzamento na área.

Mas para reequilibrar a partida, era preciso mais que liberar os laterais. Por isso Tchô tentava se movimentar para sair da perseguição de Leandro Guerreiro, mas o volante levou a melhor no duelo e a principal arma criativa do Villa Nova ficou apagada. O Cruzeiro continuou comandando as ações, e só não ampliou antes porque Diego Souza driblou meio time e não concluiu na hora certa. Mas o quarto gol veio, num contra-ataque com o próprio Diego Souza e Everton Ribeiro. O camisa 17 recebeu na área e, com muita tranquilidade, tirou dois jogadores antes de concluir sem chances para William Nobre.

Imediatamente após o gol, Marcelo lançou Ricardo Goulart na vaga de Dagoberto. Provavelmente a intenção era dar novo ânimo ao time, para continuar buscando o gol. No Villa, Alexandre Barroso tentou sua última cartada mandando Maurim na vaga de Hyago, mas sem alterar o plano tático. O jogador até que avançou bastante, explorando o lado direito do Cruzeiro que Everton Ribeiro deixou de cobrir com a entrada de Goulart, mas sem sucesso.

Vinicius Araújo e Tinga foram a campo nos lugares de Anselmo Ramon e Everton Ribeiro. O cabeludo, quando entrou, foi filmado fazendo um três com a mão e sinalizando para alguém ir para o outro lado. Não deu pra entender muito o que significava, mas provavelmente era a manutenção do 4-2-3-1, sendo que Tinga cobriria o lado direito, Ricardo o centro e Diego o esquerdo. Mesmo assim houve troca de posições, porque Diego não recuava tanto para defender, ao contrário dos outros dois meias. Mas nada de mais aconteceu até o fim da partida, com o Cruzeiro claramente se poupando e satisfeito com o resultado.

Deu liga?

É tentador dizer que o time de Marcelo Oliveira se consolidou tão precocemente. Porém, é inegável a evolução enquanto equipe: os toques rápidos e curtos que envolveram a defesa villanovense no primeiro tempo são prova de que os jogadores já se acham em campo com facilidade, criando espaços uns para os outros.

Além disso, ter uma variação tática e não perder a qualidade é um indicativo de trabalho avançado. É mais comum o treinador chegar e tentar primeiro ter uma base tática bem treinada, antes de pensar em variações com os mesmos onze jogadores. O reposicionamento para o losango não é tão radical, pelas características dos jogadores: Everton Ribeiro já centraliza naturalmente, enquanto Dagoberto já fica mais avançado. Praticamente foi preciso apenas oficializar Guerreiro como o primeiro homem e soltar Nilton, algo que antes não era definido.

Mas ainda há espaço para melhorar mais. Com a posse da bola, o Cruzeiro tem jogado fluentemente, mas pode se beneficiar com a entrada de um volante que saiba jogar, que chegue mais à frente. E quando o Cruzeiro se defende, ainda precisa melhorar a pressão no alto do campo, que precisa ser mais coordenada entre os quatro homens ofensivos, para encurtar os espaços e recuperar a bola o mais rápido possível.

O jogo de hoje contra o Resende será mais uma oportunidade para este time mostrar que não é fogo de palha. Mas o primeiro teste verdadeiro será a final do Campeonato Mineiro, que muito provavelmente será contra o “badalado” rival. Eu diria que chegamos assustando, tão fortes quanto eles. Talvez até mais.

Tupi 0 x 2 Cruzeiro – Um time diferente

Usando uma formação diferente, o Cruzeiro jogou para o gasto, fez dois gols e concluiu a primeira fase do Campeonato Mineiro 2013 com incríveis 94% de aproveitamento. É o melhor início de temporada da história celeste, acima até de 2003, o ano da tríplice coroa.

Com as ausências de Everton e Everton Ribeiro, por acúmulo de cartões, e o primeiro lugar garantido na primeira fase, Marcelo Oliveira promoveu modificações, e deu chances para os laterais e reservas volantes — setores da equipe que pouco variaram desde o início do ano. Oportunidade para Mayke e Egídio, os laterais reservas, além de Lucas Silva poder mostrar seu jogo.

A formação inicial do Cruzeiro tinha um losango no meio, com muito apoio dos laterais mas pouca movimentação de Diego Souza

A formação inicial do Cruzeiro tinha um losango no meio, com muito apoio dos laterais mas pouca movimentação de Diego Souza

O 4-3-1-2 losango cruzeirense teve Rafael no gol, Mayke pela direita e Egídio pela esquerda da linha defensiva, composta ainda por Bruno Rodrigo e Léo no miolo de zaga. Nilton foi o vértice mais baixo do losango, com Tinga pela direita e Lucas Silva pela esquerda no papel de carrileros — os jogadores que atuam pelos lados do losango. Na ligação, Diego Souza, com Dagoberto pelos lados e Borges centralizado na frente.afael

O Tupi veio num tradicionalíssimo 4-2-2-2, o quadrado no meio-campo. O goleiro Jordan teve Lobinho e Fabrício protegendo a área, com Thiago Ryan pelo flanco direito e Dieguinho fechando o lado oposto. Felipe Lima e Maicon Douglas defendiam o meio-campo, atrás dos meias Paulinho e Rafael Assis. Na frente, Vinicius e Wesley.

Embates pelos lados

Os dois sistemas, o losango e o quadrado, tem em comum o fato de tentarem criar superioridade no centro do meio-campo com quatro jogadores, mas ao mesmo tempo abrindo mão de amplitude ofensiva. Por isso dependem bastante do avanço dos laterais, que fazem parte da linha defensiva, para abrirem o jogo e dar opção de passe pelas pontas. Portanto, quando estes sistemas se enfrentam, normalmente vemos uma briga direta entre os laterais: o direito marcar o esquerdo do time adversário e vice-versa.

Porém, como tem acontecido frequentemente no Campeonato Mineiro, quem ficou mais com a bola foi o Cruzeiro, e, consequentemente, os laterais avançaram mais. Mayke e Egídio utilizaram bem o espaço concedido. As principais jogadas ofensivas saíam pelos flancos. O primeiro gol foi um belo exemplo: Tinga puxou a marcação, esperou a passagem de Mayke a lançou uma bola longa para o jovem. Do cruzamento veio a falha de Thiago Ryan, que Dagoberto não perdoou.

O losango

Diego Souza jogou em função diferente: a de trequartista, enganche, ponta-de-lança. É a ponta de cima do losango, o pensador do time, a mesma função de Alex em 2003. Mas o camisa 10 de 2013, também por ter uma característica diferente, teve uma atuação tímida. Ficou escondido na marcação e não se movimentou para receber a bola. Quando recebia, não fazia uma distribuição de jogadas que se espera da função.

A escalação de Diego nesta posição, portanto, deve ser questionada. É até compreensível, pois ele é um jogador que tem um certo nome, e isso atrai a marcação adversária, abrindo espaços para outros jogadores. Mas a característica de Diego não é a de pensar o jogo e criar jogadas, e sim a de conduzir a bola com vigor físico. Sem um jogador de suporte a seu lado, como Everton Ribeiro, por exemplo, para dividir a atenção da defesa, Diego tende a sumir na marcação, pois não se movimenta muito também.

Tinga e Lucas Silva eram os volantes com liberdade pra sair. O primeiro teve um excelente jogo, combinando com Mayke frequentemente pela direita e aparecendo na frente para desafogar o jogo. Lucas Silva, pela esquerda, ficou um pouco mais preso, procurando menos a Egídio. O garoto da base teve um trabalho mais defensivo, porém tentava buscar a primeira bola para iniciar o jogo.

Jogo sem pressão

Talvez por já estar garantido no primeiro lugar, o Cruzeiro não fez pressão na defesa adversária como em outros jogos. Ao invés de pressionar alto, Borges, Diego Souza e Dagoberto se colocavam à frente dos zagueiros, fechando um passe direto nos pés dos volantes do Tupi. A intenção, acredito, era chamar cada vez mais o time de Juiz de Fora — que precisava da vitória para ainda ter chances de se classificar — e partir num contra-ataque para matar o jogo. E assim foi feito: bola roubada, contra-ataque velocíssimo, de Tinga para Dagoberto, que de primeira achou Egídio entrando em altíssima velocidade na cada do goleiro. O lateral driblou Jordan e, ao invés de marcar o gol, deu para Borges, que briga pela artilharia. Uma jogada que mostra a consciência que o time tem de suas ações em campo.

De sua parte, o Tupi também preferiu não incomodar os zagueiros do Cruzeiro. Mas a superioridade dos laterais e a movimentação dos volantes, que vinham buscar a bola nos pés dos zagueiros para iniciar o movimento ofensivo, sobrepujou a marcação do time adversário com facilidade, e o Cruzeiro chegou sem maiores problemas.

Substituições

No segundo tempo, o técnico Felipe Surian tentou consertar uma das laterais, trocando Thiago Ryan por Ygor na direita. Não deu muito certo, e o Cruzeiro continuava sendo superior em ambos os lados do campo. Aos 19, Marcelo Oliveira lançou Élber na vaga de Lucas Silva, refazendo o 4-2-3-1, com Dagoberto indo ser ponteiro esquerdo de vez. Mas o Cruzeiro já se poupava claramente e a mudança não teve muito impacto. Depois Diego Souza saiu para dar lugar a Ananias, transformando o time num híbrido de 4-2-3-1 com 4-4-1-1. E Borges, que não vai jogar na próxima rodada por ter levado a terceira advertência, foi substituído por Anselmo Ramon, para dar ritmo ao provável substituto.

No Tupi, as entradas de Cassiano e Ademílson, atacantes, nos lugares de Paulinho e Felipe Lima, meia e volante, respectivamente, também não funcionaram bem. O Tupi partiu para o tudo ou nada numa espécie de 4-2-4. Com o meio-campo esvaziado, o Cruzeiro controlou o jogo e Rafael foi pouco incomodado.

Agora é pra valer

Na próxima fase, o Cruzeiro vai jogar contra o Villa Nova, que foi o adversário mais difícil na fase de classificação. Naquela oportunidade, o Cruzeiro só equilibrou o jogo quando começou a colocar mais jogadores marcadores no meio-campo para segurar o ímpeto de Tchô, principal cabeça pensante do time de Nova Lima. Só foi superior quando espelhou o 4-3-1-2 losango do Villa com Ricardo Goulart na ligação. Mas é bem provável que Marcelo Oliveira entre com o 4-2-3-1 novamente, com a dupla volância responsável pela marcação de Tchô e do outros volantes que subirem.

Por falar em volância, é bem improvável que Marcelo Oliveira faça uma surpresa nesse setor. A tendência é a volta de Leandro Guerreiro e Nilton. Ambos são mais destruidores de jogadas do que passadores, e insisto que falta um jogador com essa característica no setor. Tinga fez muito bem esse papel contra o Tupi — apesar de ter sido em um sistema diferente — e também quando tem entrado nos jogos.

Mas o mais importante mesmo é que agora existe o clima de decisão. Finalmente saberemos como o Cruzeiro vai se comportar em partidas eliminatórias (a partida contra o CSA não serviu para muita coisa), que valem de verdade.

Finalmente.

Quatro jogos e perspectivas

Antes de mais nada, este blogueiro pede desculpas aos leitores por ter ficado tanto tempo ser dar satisfações. Entrei em um momento de mudança na vida — literalmente — e por isso fiquei sem infra-estrutura necessária para escrever os posts (leia-se: internet e computador).

Então, para não deixar de falar sobre nenhum dos jogos passados, aqui vão notas rápidas sobre os quatro últimos jogos.

Villa Nova 2 x 4 Cruzeiro

Em alguns jogos, o equilíbrio entre as equipes é simplesmente uma questão de número no centro do meio-campo. Que o Cruzeiro tem um elenco superior ao do Villa Nova todos sabemos, mas neste jogo o Villa tinha um quarteto no centro do campo, com o seu 4-3-1-2 losango frente ao 4-2-3-1 do Cruzeiro. Os dois volantes e Tchô, o meia central, se deram melhor em relação a Leandro Guerreiro e Nilton, que não conseguiam marcar os três. A partida tendeu para o domínio do time da casa no primeiro tempo simplesmente por isso.

Já no segundo, Marcelo Oliveira lançou Tinga para fazer um 4-1-2-3 que acertou a marcação: Guerreiro ficou responsável apenas por Tchô, e mesmo perdendo o duelo algumas vezes, como no gol de empate do Villa Nova, conseguiu tirar a liberdade que o camisa 10 adversário tinha na primeira etapa.

Mas com a mudança, Diego Souza foi jogar aberto do lado direito, deixando o time sem um meia central. Com isso, o time equilibrou o centro do meio-campo, mas criou pouco. A entrada de Ricardo Goulart aconteceu justamente para resolver este problema. Com ambos os times com meio-campo em losango, a qualidade técnica fez diferença e o Cruzeiro marcou mais dois gols.

Em suma: quando tinha apenas 2 meio-campistas (já que Diego Souza marca pouco) contra 4 do adversário, o Cruzeiro foi dominado. Com Tinga, o 3 x 4 equilibrou, e com Goulart, o número de meio-campistas se igualou, e aí o Cruzeiro se sobressaiu.

América 1 x 4 Cruzeiro

O América do técnico Paulo Comelli quis jogar de igual para igual contra o Cruzeiro no Mineirão. E foi amplamente dominado, principalmente porque, diferente dos outros times do campeonato, foi um time que tentou sair para o jogo e deu espaço para os jogadores de frente do Cruzeiro.

Também num 4-2-3-1, o time de Paulo Comelli foi facilmente repelido pela linha defensiva celeste. Com Rodriguinho, o meia central, encaixotado entre os volantes, Fábio Júnior tinha que sair muito da área, e Fábio quase não viu a cor da bola.

Já o Cruzeiro, desta vez com Ricardo Goulart na vaga do suspenso Dagoberto, imprimiu movimentação e confundiu a marcação americana. Já aos 16 minutos o Cruzeiro vencia por dois a zero, em jogadas de bola áerea. Depois disso apenas controlou as ações, repelindo as investidas do América com propriedade. Ainda sofreria um gol em falha de Leandro Guerreiro na cobrança de escanteio, mas matou o jogo logo em seguida com excelente trama pela direita com Everton Ribeiro e Ceará e a conclusão de Borges.

O 4-2-3-1 foi mantido do início ao fim. Apesar do placar e do domínio, os volantes ainda tiveram pouca participação ofensiva e uma certa dificuldade na marcação. Acredito ser o setor mais frágil da equipe no momento, ao contrário da maioria dos comentaristas e torcedores que dizem ser a defesa.

CSA 0 x 3 Cruzeiro

Eliminar o segundo jogo era esperado. Mas o futebol apresentado, preguiçoso, não. Era quase como se o Cruzeiro soubesse que tinha que fazer pouca força para avançar de fase, e assim foi. Já o CSA jogava a vida, provavelmente o jogo de maior visibilidade que o time terá no ano, e por isso foram pra cima, com muita velocidade.

A defesa do Cruzeiro jogava bem alta, longe de sua própria área, para compactar o time. Mas isso só funciona se os jogadores de frente também fizerem marcação avançada, o que não acontecia. Assim, o CSA tocava a bola e o Cruzeiro esperava, deixando espaços atrás de sua própria defesa. E time da casa, num moderno 4-1-2-3, jogava bolas longas para jogadores rápidos que tinha abertos, nas costas dos nossos laterais. Para nossa sorte, a pontaria deles não estava boa e pelo menos três chances reais foram mandadas pra fora.

Ofensivamente, o Cruzeiro parecia, de fato, bem preguiçoso. Os gols aconteceram mais por bobeira da defesa do time alagoano do que por mérito celeste. O primeiro numa bola longa de Dagoberto, na direita, para Diego Souza. A defesa estava mal posicionada e deixou o camisa 10 entrar livre. O segundo em um pênalti cometido atabalhoadamente pelo zagueiro. Somente o terceiro pode ser considerado superioridade técnica: Ricardo Goulart recebeu o passe final de uma trama rápida de passes, driblou um marcador, ganhou na força do segundo e concluiu sem chances para o goleiro.

O jogo provou a força do elenco cruzeirense, que mesmo jogando com pouca vontade, mostrou ser forte o suficiente para construir o placar. Entretanto, a mesma preguiça causou dificuldades desnecessárias. Portanto, não foi um jogo bom para se tirar alguma conclusão.

Cruzeiro 5 x 0 Nacional

Ah, goleadas. Como elas têm o poder de enganar o torcedor. Basta fazer uma grande soma de gols num mesmo jogo e automaticamente tudo fica bem, a torcida se empolga e tal. Felizmente, não era esse o caso.

É claro que se deve levar em conta a fragilidade do Nacional, que está brigando para sobreviver no Módulo I do Campeonato Mineiro. Mas é justamente contra estes é que o poderio do time mais capacitado tem que aparecer. E assim foi feito: o Cruzeiro jogou como se fosse um jogo decisivo (não, confirmar a liderança na primeira fase do estadual não dá esse caráter à partida). Ricardo Goulart entrou na vaga do suspenso Diego Souza e promoveu a mesma intensa movimentação de jogos anteriores, e foi o senhor da partida.

O Nacional se entrincheirou numa espécie de 4-3-3 defensivo, contra o 4-2-3-1 costumeiro de Marcelo Oliveira. Os três da frente estreitavam e bloqueavam a saída pelo meio, mas deixavam as laterais livres. Além disso, os volantes cruzeirenses não eram pressionados e buscavam a bola no pé dos zagueiros para iniciar o jogo, quase sempre jogando para um dos laterais. E dali, a bola circulava tranquilamente para os três armadores, trocando de posição a todo momento.

Sem a bola, o Cruzeiro pressionava no alto do campo, com muita sede de roubar a bola. Foi a pressão alta mais intensa até aqui no ano. Quando o Nacional tinha a bola, não tinha muito tempo pra pensar, pois o quarteto ofensivo do Cruzeiro encurtava os espaços dos zagueiros, obrigando ao chutão ou passe errado. Os gols saíram naturalmente, em erros do Nacional provocados pela marcação intensa do Cruzeiro e ataques velocíssimos.

Todos os quatro jogadores de frente participaram dos dois primeiros gols: no primeiro, o tiro de meta ruim veio parar nos pés de Goulart, que de letra achou Everton Ribeiro, que finalizou de fora da área. No segundo, Borges se desloca e tabela com Dagoberto, deixando o companheiro na cara do gol. Já o terceiro foi uma jogada dos defensores: Nilton a Bruno Rodrigo, que de peito passou a Leo dentro da área. O zagueiro cruzeirense ainda marcaria mais um de cabeça em bola parada, ainda no primeiro tempo.

No segundo, o time desacelerou, naturalmente. Mesmo assim, Élber completaria a goleada “roubando” a bola na jogada individual de Ricardo Goulart, tamanha a facilidade que o Cruzeiro criou na partida, muito devido à sua própria atuação.

Outro ponto a se destacar é que, nas raras vezes em que era marcado em seu próprio campo, o Cruzeiro evitava ao máximo a bola longa para o ataque. O objetivo era manter a bola nos pés e construir a jogada de trás. É uma mudança sutil de postura, mas que revela como Marcelo Oliveira quer sua equipe.

Perspectivas

Notadamente, existe uma preocupação da torcida e da crítica em geral com o setor defensivo do Cruzeiro. Quase todos localizam a instabilidade nos zagueiros, mas este blogueiro pensa que o problema está na volância. Leandro Guerreiro e Nilton são bons marcadores, mas não estão com funções definidas. Não sabemos quem sai mais e quem fica mais (pense em Paulinho e Ralf, por exemplo).

Mas, Dedé chegou. E com ele a segurança na zaga que a torcida precisava. Porém, estou esperando muito mais os testes de Henrique ou Lucas Silva no meio para ver como se encaixam neste time. Aparentemente, Lucas Silva jogará neste domingo contra o Tupi, mas não será um 4-2-3-1 e sim num 4-3-1-2 losango ao lado de Tinga, com Nilton no suporte e Diego Souza na ligação. Terá liberdade para atacar. Sorte para o garoto.

Ademais, o time está se encaixando mais rápido do que esperávamos, e não só o time titular. O Cruzeiro hoje tem mais do que 11 titulares, e isso é um luxo que poucos times no Brasil podem ter. O esquema base está definido, variações estão sendo treinadas e têm dado certo em determinadas situações de jogo. Podemos esperar, sim, um bom ano em 2013.

Cruzeiro 2 x 1 Caldense – Velhos problemas, novas soluções

O Cruzeiro sofreu com alguns problemas recorrentes, mas conseguiu manter o aproveitamento máximo de pontos jogando no Mineirão, ao virar o jogo contra a Caldense hoje pela sétima rodada do Campeonato Mineiro. A vitória praticamente sela a classificação e pode dar mais tranquilidade para — quem sabe — fazer testes mais ousados.

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

Com Borges lesionado, Marcelo Oliveira optou pelo garoto Vinicius Araújo para comandar o ataque do 4-2-3-1 cruzeirense, à frente dos três meias “titulares”: Everton Ribeiro à direita, Diego Souza mais por dentro e Dagoberto pela esquerda. atrás destes, a imutável dupla de volantes Nilton e Leandro Guerreiro, e a linha defensiva composta por Everton, de volta à lateral esquerda, Ceará do outro lado, e Paulão e Léo, a surpresa, no miolo de zaga. Todos sob a capitania do goleiro Fábio.

A Caldense treinada por Tarcísio Pugliese veio também num surpreendente 4-2-3-1, mais defensivo. Glaysson no gol teve Jeffeson Feijão à direita, Júlio César e Paulão na zaga e Cris na lateral esquerda. Edmilson e Maxsuel eram os volantes, com Chimba pela direita, Rossini centralizado e Everton Maradona pela esquerda. Na frente, Nena era o atacante solitário.

O time visitante mostrou porque é uma das melhores defesas do Campeonato Mineiro até aqui, e conseguiu encaixotar o ataque celeste no primeiro tempo. O Cruzeiro segue com problemas ofensivos e defensivos, mas a mexida na formação de Marcelo Oliveira conseguiu reverter a situação, mostrando que já tem planos táticos alternativos na manga.

Marcação central

Apesar de ser um 4-2-3-1, a Caldense tinha proposta defensiva. Comandados por Rossini, o meia central, o quarteto de frente da Caldense aplicava uma marcação mista: Nena ia atrás do zagueiro que tivesse a bola, forçando o passe para o outro zagueiro e dali para um lateral. E assim que a bola chegava em Everton ou Ceará, o time compactava horizontalmente, ou seja, apertava o campo, tornando-o estreito, fechando qualquer possibilidade de passe curto à frente para os volantes ou meias pelo centro. O preço de deixar o lateral do lado oposto livre, provocando muitos gritos exaltados de “vira o jogo” nas arquibancadas do Mineirão.

A virada de jogo era sim uma opção, mas quando é feita pelo alto, a bola demora a chegar a seu destino e a Caldense “rodava” e compactava novamente do outro lado, mantendo as linhas de passe fechadas. O mais eficiente era fazer isso pelo chão, voltando no zagueiro do lado próximo e dele direto para o outro lateral, fazendo o ponteiro adversário (Chimba se o passe fosse para Everton, e Everton Maradona se o destino fosse Ceará) correrem como loucos para retomarem suas posições. O Cruzeiro se aproveitou disso, principalmente com Everton, que avançava pelo centro do campo e tentava procurar um dos quatro homens de frente.

Volantes passivos

Mas o avanço territorial era quase sempre infrutífero. É claro que enfrentar a segunda melhor defesa do campeonato era um motivo, com os quatro homens de frente bem marcados — laterais marcando os ponteiros, os dois volantes cuidando do meia central e os dois zagueiros encaixotando Vinicius Araújo. Mas o principal fator era a falta de mais gente no centro do meio campo com a posse de bola. Leandro Guerreiro e Nilton, hoje, ficaram passivos demais, não se juntavam à ação ofensiva. E assim a marcação da Caldense foi muito facilitada, e o time visitante executou sua proposta sem muitos sobressaltos. O Cruzeiro só levava perigo em bolas aéreas, cujo excesso demonstrou a falta de criatividade do ataque.

Como se não bastasse, a passividade da dupla volância não foi só quando o Cruzeiro tinha a posse. A marcação em cima dos meias adversários, principalmente em Rossini, foi muito frouxa. O meia tinha liberdade para recuperar a bola e pensar o jogo, sem que Leandro Guerreiro ou Nilton se aproximassem muito. Assim a Caldense criou algumas dificuldades e incomodou Fábio. A falta de pressão sobre o homem da bola, como se diz, fazia os jogadores da Caldense terem bastante tempo de posse de bola sem ser incomodados. Em um desses momentos, a bola foi cruzada na área, Léo rebateu na direção de Paulão, mas o zagueiro dominou mal e perdeu na corrida para Chimba, derrubando-o dentro da área e cometendo o pênalti que abriu o placar.

A alternativa

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

Vendo que mesmo após a conversa no intervalo o time não dava sinais de conseguir sair da excelente marcação adversária, Marcelo Oliveira usou as três substituições para tentar desmontar o esquema defensivo de Pugliese. Primeiro fez uma dupla mudança, com Tinga e Élber nas vagas de Nilton e Diego Souza. Logo depois, Ricardo Goulart entrou na vaga de Paulão. Élber entrou aberto pela direita, Ricardo Goulart fez companhia à Everton Ribeiro como dupla de meias centrais e Dagoberto ficou na esquerda, com Tinga sendo um volante único do novo 4-1-4-1 — Guerreiro foi ser zagueiro.

Porém, o camisa 55 mal teve trabalho, pois depois das substituições o time melhorou muito. Isso porque Everton Ribeiro ficou um pouco mais recuado que Ricardo Goulart, pegando bolas nos pés de Tinga e dos zagueiros para começar as jogadas ofensivas. Isso tirava um dos volantes da sólida linha defensiva da Caldense, abrindo espaços para Goulart e os ponteiros. Estes últimos fizeram a festa, pois agora só tinham os laterais à frente, sem auxílio dos volantes. E foi numa jogada de Dagoberto pela esquerda, driblando em direção ao gol que o juizão apitou um pênalti no mínimo estranho, na modestíssima opinião deste blogueiro.

Duas linhas de quatro

A Caldense já havia trocado Chimba por Tinga (o deles), por lesão, e também Everton Maradona por Rodrigo Paulista. As substituições mantiveram o 4-2-3-1 defensivo, mas não evitaram o empate. Então, Pugliese lançou Luizinho na vaga do cansado Rossini, colocando-o como ponteiro esquerdo e avançando Rodrigo Paulista para o ataque, configurando um típico 4-4-2 britânico — ou seja, com o meio-campo em linha, as famigeradas “duas linhas de quatro”. De certa forma, funcionou, pois os ponteiros já não tinham tanta liberdade com a marcação dobrada.

Mas a Caldense já não tinha mais o mesmo fôlego, e não encurtava tanto. Foi assim que Ceará e Élber trocaram vários passes do lado direito da área, procurando uma brecha, até que Élber centrou aparentemente sem muita esperança de achar alguém ali. Mas Ricardo Goulart, como um bom meia central, saiu da marcação na hora certa, cabeceando no cantinho, tirando de Glaysson para virar e partida, selando a vitória e a manutenção dos 100% no Mineirão.

É preciso testar todos os setores

O Cruzeiro ainda oscila. Faz um jogo excelente e logo na rodada seguinte cai de produção. É normal para um time que só fez sete partidas oficiais no ano — alguns paulistas já fizeram 18 — mas o tempo passa, e a fase inicial do Campeonato Mineiro, que é o ambiente ideal para testes, já está acabando. É claro que ainda há tempo para fazer testes, pois o Cruzeiro, com 19 pontos, já está praticamente garantido na fase final. Entretanto, o treinador me parece querer testar apenas o parceiro para Paulão, que vem mudando a cada jogo. O quarteto ofensivo, os laterais e os volantes já me parecem estar definidos, e é justamente estes últimos que mais me intrigam.

A volância me parece ser o problema mais crônico do time, e Guerreiro e Nilton parecem ter lugar cativo. Não vejo outros volantes serem testados, sequer em treinamentos. Lucas Silva, Henrique e Uelliton parecem não agradar ao treinador. Ok, Henrique ainda não tinha condições de jogo, mas os outros dois sim. Porque não testá-los? Porque não levá-los pelo menos para o banco e usá-los durante a partida? Perguntas que só quem está no dia-a-dia dos treinamentos pode responder.

Alô, Marcelo Oliveira, você lê este blog? É, não, acho que não.

Boa 1 x 4 Cruzeiro – Amadurecendo

Muito superior ao adversário, mas longe de fazer um jogo perfeito, o Cruzeiro se impôs em Varginha e venceu o Boa Esporte com autoridade.

Marcelo Oliveira escalou, pela primeira vez, o quarteto ofensivo que a torcida vem pedindo: Everton Ribeiro, Diego Souza e Dagoberto fizeram a linha de três armadores atrás de Borges. Leandro Guerreiro e Nilton foram, mais uma vez, a dupla responsável pela volância de um 4-2-3-1 diagonal, que ainda tinha na linha defensiva protegendo Fábio os laterais Ceará pela direita e Egídio pela esquerda, com Paulão e Nirley novamente no miolo de zaga.

O Boa do treinador Sidney Moraes entrou numa espécie de 4-3-1-2 armado em torno de Marcelinho Paraíba. O meio parecia um losango, mas o sistema tinha muitas compensações para tentar travar a saída de bola do Cruzeiro, como fizeram os adversários anteriores. A defesa do goleiro Douglas era composta por Robert à direita, Leandro Camilo e Rodrigo Arroz centralizados e Aírton pelo lado esquerdo. Dos três volantes, Jair era quem ficava mais plantado no meio, com Petros abrindo mais pela direita e Radamés mais perto de Jair. Marcelinho Paraíba era o camisa 10 clássico, responsável pela criação, e tinha o centro-avante Betinho e o atacante Fernando Karanga pelo lado esquerdo do ataque.

Foi uma boa movimentação do quarteto ofensivo — não fosse o chute pra fora de Dagoberto no segundo tempo, cada um teria feito um gol, simbolizando isto. De qualquer forma, foi uma atuação animadora ofensivamente, e uma vitória merecida e que mostra evolução.

Encaixe de marcação

A intensa movimentação dos quatro avançados sentiu falta de um volante mais participativo no 4-2-3-1 do Cruzeiro no primeiro tempo

A intensa movimentação dos quatro avançados sentiu falta de um volante mais participativo no 4-2-3-1 do Cruzeiro no primeiro tempo

Como todos os times do interior que enfrentam o Cruzeiro, a proposta do Boa era se defender da melhor forma possível e partir em velocidade nos contra-ataques. No esquema montado por Sidney Moraes, o atacante Fernando Karanga era responsável por acompanhar Ceará até o fundo do campo, se fosse preciso. Assim, com a subida do lateral quando o Cruzeiro tinha a posse, somente Betinho e Marcelinho Paraíba ficavam à frente do time. Mesmo assim, não incomodavam os zagueiros, se preocupando mais em fechar as linhas de passe aos volantes. Já as subidas de Egídio eram marcadas pelo volante Petros, que abria seu posicionamento exatamente para isso, liberando o lateral Robert para marcar quem chegava por aquele setor — o adversário mais comum era Dagoberto.

Do outro lado do meio campo, Radamés perseguia Everton Ribeiro, enquanto Jair era a sombra de Diego Souza: ia atrás do camisa 10 onde ele fosse no campo. E Borges brigava com os zagueiros.

Movimentação intensa

Mas Borges não permanecia enfiado. Por vezes, o camisa 9 recuava para receber um passe e tirar os zagueiros da área, abrindo espaços para seus companheiros, formando um quarteto ofensivo de excelente movimentação. Cada um dos meias apareceu em alguma das três posições em algum momento: Everton Ribeiro partia da direita e centralizava, ou abria pela esquerda; Diego Souza ora ficava no centro, ora caía pela direita, ora pela esquerda, além de subir para fazer companhia a Borges, sempre arrastando a marcação de Jair consigo; e Dagoberto aparecendo nas duas pontas.

As jogadas saíam com naturalidade, quase sempre passando pelos pés de dois ou mais destes quatro, confundindo a marcação do Boa. Em um destes lances, Dagoberto tinha a bola nos pés pela esquerda e passou a Everton Ribeiro, chegando do centro para dar apoio. O camisa 17 dominou e lançou a Borges já dentro da área, que girou e bateu num zagueiro, sobrando do lado direito para – sim – Everton Ribeiro, que já tinha atravessado a área justamente para receber um eventual passe.

Falta de volantes passadores

Mesmo assim, alguém pode pensar que, se o Cruzeiro tinha tanta movimentação, porque não teve mais chances de gol? Simples: nos faltam volantes passadores e ousados. Leandro Guerreiro e Nilton vêem o campo de frente, e quase sempre um dos dois tem bastante tempo pra pensar o que fazer com a bola. Mas chegam pouco ao ataque. Ter um volante mais rápido e enérgico, que participasse mais do jogo ofensivo (mas com boa marcação, como todo volante deve ter), seria fundamental. A falta destes jogadores fazia o Cruzeiro reter a bola, principalmente com os zagueiros e volantes, mas não havia uma conexão boa com o ataque. O maior sinal disso é que Diego Souza e Everton Ribeiro passaram a recuar para busca a bola nos pés dos zagueiros.

Ironicamente, o primeiro gol saiu num passe para Diego Souza de… Leandro Guerreiro. Mas era uma situação de contra-ataque, onde é mais fácil acertar um passe longo com mais espaço para mirar a bola sem acertar um adversário. Diego entrou pela direita e arrancou bem a seu estilo, cortando pra dentro antes de bater na trave. A bola caprichosamente bateu no calcanhar de Douglas e entrou chorando. Me lembrou aquela disputa de pênaltis contra a França em 1986.

Sem a bola

Logo depois do gol, o Boa empatou, aproveitando a defesa alta do Cruzeiro. Defesa alta significa que os zagueiros estão longe de sua área, mais próximos de seus companheiros de time — a famosa compactação à qual os treinadores tanto se referem. Porém, a liberdade de Betinho para fazer um passe em profundidade para Fernando Karanga evidencia uma característica que pode não ser boa futuramente: o Cruzeiro é um time que joga e deixa jogar. Não vi os jogadores, em nenhum momento, tentarem fazer pressão alta, marcando as jogadas no campo ofensivo, tentando tomar a bola o mais rápido possível (o Barcelona manda lembranças).

Claro que Fernando Karanga se aproveitou da lesão de Ceará, que tinha sofrido entrada dura minutos antes e já não conseguia mais correr tudo o que conseguia. Mas se Betinho não tivesse a liberdade que teve para pensar o passe, certamente o empate não teria saído.

Felizmente, Éverton Ribeiro mostrou mais uma vez porque é uma das principais contratações cruzeirenses da temporada. Ele mesmo interceptou o passe à frente da área defensiva, com todo o campo pra correr. E fez exatamente isso, passando com velocidade por dois adversários e achando Borges, que se movimentava para sair da marcação. O zagueiro do Boa foi atrás do camisa 9, deixando a área totalmente desprotegida, e Éverton Ribeiro aproveitou, já que ninguém o acompanhou. Recebeu de volta de Borges, que não foi fominha, bateu e correu pro abraço.

Segundo tempo

Ceará não conseguiu voltar após o intervalo, e Marcelo Oliveira promoveu a estreia do garoto Mayke, recém-chegado das categorias de base. Já Sidney Moraes lançou Neílson como ponteiro direito na vaga de Radamés. Marcelinho Paraíba permaneceu centralizado, e Fernando Karanga se alinhou aos dois: um 4-2-3-1 típico. A ideia era, provavelmente, bloquear a saída de Egídio pelo lado esquerdo. Não funcionou e o lateral continuou subindo ao ataque da mesma forma, sendo que do outro lado o garoto Mayke não decepcionou: apoiou bem mais do que Ceará no primeiro tempo, dando muito trabalho a Fernando Karanga. Com um a menos no centro do campo do Boa, abriram-se mais espaços para o jogo ofensivo cruzeirense. Ou seja, no fim das contas, as duas substituições foram benéficas ao Cruzeiro.

O terceiro não tardou a chegar. Cruzamento de Egídio que a zaga afastou mal. Borges aproveitou e deixou o dele. Faltava o de Dagoberto, e cinco minutos depois, a chance: Borges deixou seu companheiro na cara do gol, mas o camisa 11 mandou pra fora. Seria a coroação da boa atuação do quarteto ofensivo.

Tinga de meia

Após as mexidas, Tinga jogou como ponto de apoio, um meia central de um 4-2-2-2 que variou para 4-2-3-1 dependendo da posição de Diego Souza

Após as mexidas, Tinga jogou como ponto de apoio, um meia central de um 4-2-2-2 que variou para 4-2-3-1 dependendo da posição de Diego Souza

Pouco antes da chance de Dagoberto, Sidney Moraes havia trocado Petros por Phillip, reforçando a marcação pelo lado direito, por onde chegava Egídio. Ele e Robert revezavam entre a volância e a lateral direita, mas o 4-2-3-1 se manteve. Alguns minutos depois, Marcelo Oliveira fez uma substituição em dois tempos: primeiro lançou Tinga na vaga de Everton Ribeiro, e depois Élber entrou no lugar de Dagoberto. O sistema se tornou um híbrido de 4-2-2-2 com 4-2-3-1, dependendo da movimentação de Diego Souza. Élber fez sua função natural, ponteiro direito, enquanto Tinga foi ser meia central. Diego variava entre ponteiro esquerdo e segundo atacante.

Com Tinga, o centro do meio-campo cruzeirense tinha a combinação clássica: marcador-passador-corredor. Guerreiro ficava mais preso, Nilton teve mais liberdade pra pensar e Tinga corria para se juntar ao ataque. O gol que fechou o placar ilustrou bem isto: Leandro Guerreiro passou a Nilton, que fez um lançamento longo para Diego Souza dentro da área. Com bastante tempo, o camisa 10 esperou o recuo de Tinga, fugindo da marcação, para mandar ao cabeludo bater de primeira no canto esquerdo de Douglas.

Ainda deu tempo de perder mais um gol, com Élber, mas ali o jogo já havia terminado e o Boa estava totalmente entregue.

Maturidade

Todos os quatro jogadores ofensivos tiveram uma boa atuação e foram bastante participativos. Pra usar um termo que nosso treinador gosta, a movimentação promovida “envolveu” a defesa adversária. É claro que, contra equipes do interior, que quase sempre jogarão bem recuadas e tentando somente se defender, o Cruzeiro terá menos espaço para tocar a bola. O primeiro gol, num contra-ataque rápido ao invés de numa jogada trabalhada, ajudou a abrir um pouco o time oponente, que teve de sair para tentar o empate, e isso acabou beneficiando o Cruzeiro.

Entretanto, ainda sinto falta de um volante passador neste time. Nilton e Leandro Guerreiro vem fazendo partidas boas defensivamente, mas com a bola tem deixado a desejar. O desejo deste blogueiro — e de toda a torcida, acredito — é que Marcelo faça mais testes com outras duplas de volantes. Afinal, todos os setores do time estão tendo rotatividade, exceto na volância. Henrique e Lucas Silva são boas opções para este papel de volante passador.

O amadurecimento é claro, e a atuação foi animadora, mas volto a dizer: o time ainda está em formação. Portanto, ainda temos que ter paciência. Se o time já não é mais um recém-nascido, nem uma criança, também ainda não chegou à adolescência. Mas hoje se comportou como um jovem recém-formado: promissor, já com alguma bagagem, mas ainda com muito o que aprender.