Defensor 2 x 0 Cruzeiro – A diferença é menor do que se pensa

Muito se fala na diferença entre as equipes brasileiras e as dos outros países sul-americanos, tanto financeiramente quanto tecnicamente. De fato, essa distância existe, mas o fato de aqui no Brasil a técnica ser muito mais valorizada do que qualquer outra coisa — em detrimento, por exemplo, da tática e até da parte psicológica — acaba-se por ter a ilusão de que as equipes brasileiras são muito melhores e deveriam vencer com um pé nas costas as equipes de outros países.

Mas essa não é a verdade. No futebol, nem sempre dois mais dois é quatro, e uma diferença técnica, por maior que seja, pode ser reduzida ou até anulada com uma tática bem encaixada, com uma estratégia acertada e até mesmo com uma boa dose de ânimo e espírito de luta. Para que a parte técnica faça de fato a diferença, a equipe também tem que ser igualmente aplicada tática e psicologiamente, mas não foi isso que o Cruzeiro fez na noite de terça em Montevidéu.

Titulares

Desta vez, 4-2-3-1 celeste tinha dois volantes marcadores e pouca intensidade á frente; Defensor em duas linhas de quatro e contra-atacando pelas pontas

Desta vez, 4-2-3-1 celeste tinha dois volantes marcadores e pouca intensidade á frente; Defensor em duas linhas de quatro e contra-atacando pelas pontas

A grande novidade foi a opção de Marcelo por uma dupla de volantes mais pesada no 4-2-3-1 habitual. Rodrigo Souza e Nilton jogaram à frente da linha defensiva, formada por Ceará à direita, Egídio à esquerda e Dedé e Bruno Rodrigo protegendo o gol de Fábio. À frente, era o de sempre: Éverton Ribeiro partindo da direita e procurando mais o central Ricardo Goulart, deixando Dagoberto mais aberto pela esquerda, com Marcelo Moreno na referência.

O Defensor veio com a estratégia clara de jogar no erro do Cruzeiro e contra-ataques, mesmo em casa. Armou-se num 4-4-2 em linha, com a baliza de Campaña defendida pelos zagueiros Arias e Malvino, com Zeballos e Herrera nas laterais. A segunda linha era composta pelos volantes Cardaccio e Fleurquin, e pelos ponteiros De Arrascaeta e o brasileiro Felipe Gedoz. À frente, Olivera se movimentava mais do que Risso, mas ambos permaneciam à frente.

Estratégias

Até os quinze minutos o time uruguaio ensaiou aplicar mais intensidade, mas o Cruzeiro controlou bem as ofensivas adversárias e Fábio nem aparecia. A partir de então, o Defensor se contentou em colocar jogadores atrás da bola e deixava os zagueiros celestes tocarem entre si. Os atacantes subiam a pressão de vez em quando, mas não era bem coordenada e facilmente os laterais encontravam os volantes para fazer o primeiro passe.

E nesse ponto é que a opção de Marcelo por uma dupla de marcadores não foi boa. O time ficou sem o passe e o ímpeto que Lucas Silva certamente daria, sobrecarregando os volantes adversário junto com Ribeiro e Goulart. Sem um segundo volante, porém, a marcação ficou mais “curta” e houve menos espaço. Some-se a isso a falta da movimentação característica que o Cruzeiro mostrou no ano passado, a famosa intensidade ofensiva, e o resultado foi um domínio estéril, com muita posse no campo adversário, mas poucas chances criadas.

Contra-ataque uruguaio

Defensivamente, a estratégia do time da casa era claríssima: defender-se, tirar todos os espaços possíveis e esperar o melhor momento para partir em velocidade. Não foi à toa que o treinador Fernando Curuchet colocou dois velocistas nas pontas. Do lado direito, De Arrascaeta era também o responsável por armar o jogo nas raras vezes em que o time uruguaio tinha a posse, centralizando a partir da direita — no estilo Éverton Ribeiro. Do outro lado, Felipe Gedoz ficava mais aberto em cima de Ceará, dando muito trabalho para o lateral celeste, que com isso pouco apoiou.

Assim, ficava para Egídio tentar sair com a bola e ajudar o ataque, e para isso contava com a cobertura de Nilton. Mas o camisa 19 ainda não está na sua melhor forma física, e o lado esquerdo acabou sendo o mapa da mina para o time uruguaio. Felizmente, no primeiro tempo De Arrascaeta não teve grandes oportunidades de explorar este espaço. Sem intensidade, o Cruzeiro ainda tomou um susto no final da primeira etapa, em bola parada, um dos pontos fortes da zaga celeste: o desvio bateu na segunda trave e o rebote dentro da pequena área foi bloqueado por Bruno Rodrigo.

Segundo tempo

Os times voltaram sem mudanças para a etapa complementar, o que considero foi mais um erro de Marcelo. Ele poderia ter colocado Lucas Silva já, mesmo que o time fosse perder combatividade no meio-campo — o que não seria verdade, pois Lucas é bom marcador também. O jogo se desenhava para continuar igual, e por isso a substituição poderia não só ter dado mais volume e controle do meio-campo ao Cruzeiro como também ter desafogado a surpreendente pressão que o time da casa fez no começo da segunda etapa. Sim, pois Lucas Silva daria uma opção a mais de saída de bola, dificultando a marcação alta do adversário e assim o Cruzeiro manteria a bola por mais tempo.

A intensidade foi passando aos poucos, e o jogo foi voltando ao padrão da primeira etapa. Porém, a estratégia dos uruguaios funcionou, sempre pelo lado esquerdo celeste. Os espaços às costas de Egídio, desta vez, foram bem aproveitados por De Arrascaeta. Primeiro, condução rápida pela esquerda em erro de passe celeste, obrigando Nilton a usar todo o fôlego que ainda não tem para desviar a finalização no último momento. Depois, sem opções, Egídio forçou a conexão com Dagoberto, mas De Arrascaeta interceptou o passe, e levou até a entrada da área de Fábio com muita velocidade, sendo parado apenas pela falta de Rodrigo Souza. Na cobrança, Gedoz marcou um belo gol — mérito do cobrador, mas também falha da barreira e de Fábio, que a posicionou mal.

O efeito de um erro

O gol assustou o Cruzeiro. Tanto que, a essa altura, Willian já havia entrado na vaga de Moreno, com Goulart avançando, mas mesmo assim o time começou a levantar bolas na área, quando o correto era baixar a tensão e entrar por baixo. Ironicamente, foi uma bola levantada na área que originou o lance capital do jogo. O zagueiro Arias levantou demais o pé dentro da área e atingiu o Goulart, levando o segundo amarelo. O empate com um a mais certamente animaria o Cruzeiro e as chances de uma virada aumentariam consideravelmente.

Mas o futebol é feito de acertos e de erros, e Dagoberto perdeu seu primeiro penal em um ano e quatro meses vestindo a camisa celeste. O desperdício teve o efeito contrário ao esperado: o time da casa se animou e defendeu com muito mais afinco — em um 4-4-1 recomposto com a entrada do zagueiro Correa na vaga do atacante Olivera — diante de um Cruzeiro já semi-desesperado. É impressionante como a parte mental pode afetar uma partida.

Dez contra onze

Marcelo tentou soltar o time totalmente colocando Marlone na vaga de Rodrigo Souza — o escolhido era o Nilton, mas Rodrigo já tinha cartão amarelo. Nilton ficou plantado, mas desta vez tinha Éverton Ribeiro a seu lado, numa espécie de 4-3-3 super ofensivo, com Willian, Dagoberto, Goulart e Marlone mais à frente. O perigo era abrir o time demais, o que ficou claro quando Ribeiro era o último homem, responsável pela cobertura, em um escanteio cobrado.

A postura desesperada cobraram o seu preço quando, novamente em contra-ataque de bola parada, De Arrascaeta aplicou dois chapéus e lançou Gedoz, desta vez aparecendo atrás de Egídio, que ganhou na corrida e tocou na saída de Fábio. Mesmo com um a menos, o Defensor matou o jogo ali.

No fim, Marcelo tentou consertar o meio-campo com Tinga na vaga de Ribeiro, mas o Defensor já estava satisfeito e não partiu mais para o contra-ataque, se contentando em proteger o resultado — coisa que conseguiu fazer com relativa facilidade. O Cruzeiro terminaria o jogo sem acertar nenhuma das 15 tentativas ao gol (Footstats).

Nenhum chute foi no alvo. Em destaque, o pênalti desperdiçado por Dagoberto

Nenhum chute foi no alvo. Em destaque, o pênalti desperdiçado por Dagoberto

Evoluir, mas fugir do lugar-comum

Quando falamos em dar intensidade, principalmente na parte ofensiva, estamos falando de movimentação e passes velozes. É bom não confundir com a velha “raça”, de se entregar, dar o sangue. Isso é um velho clichê da Libertadores e não há melhor time para destruir este lugar-comum do que o Cruzeiro, um time que joga tecnicamente solto. Bastava impor o ritmo no primeiro tempo que a velha máxima de que “a Libertadores é guerra” não se realizaria: o time uruguaio sairia de suas trincheiras e facilitaria ainda mais o jogo celeste.

Isto posto, esta partida deve servir para tirar algumas conclusões em relação ao time. Marcelo Oliveira ainda tem muito crédito, e normalmente realiza suas trocas quando o time já está à frente no placar. Desta vez, porém, não conseguiu mudar a cara do jogo. Além disso, a opção pela escalação de dois volantes fortes se provou equivocada ao menos para este jogo, e a ousadia demonstrada ao deixar apenas Nilton no time logo após sofrer o primeiro gol não apareceu no intervalo, quando Lucas Silva deveria ter entrado na vaga do próprio Nilton, mesmo com Rodrigo Souza amarelado.

A classificação ficou mais difícil, e agora depende de um bom resultado na quinta rodada, fora de casa, contra o time mais difícil do grupo: a Universidad do Chile.

O Cruzeiro perdeu quando podia? Num Brasileiro com 38 rodadas, talvez sim. Na Libertadores, de tiro curto, nem tanto.

Cruzeiro 1 x 0 Fluminense – Blasé

O Cruzeiro voltou a vencer. Mas não da mesma forma que vencia antes no Mineirão, envolvendo e acuando o adversário, bombardeando o goleiro visitante com finalizações de todos os lados, construídas com jogadas de aproximação e toques curtos e rápidos pelo meio. Foi uma vitória simples, com um gol de puro faro de centroavante, e com o time numa rotação abaixo do que se espera dele. O desgaste da temporada parece estar cobrando seu preço.

Não foi sem correr riscos, no entanto. O Fluminense teve chances e só não empatou porque Samuel, por incompetência, e Fábio, por excelência, não deixaram.

Formações

No início, ambos os times no 4-2-3-1 encaixado, mas com o Cruzeiro levando vantagem pela direita em cima de Ailton

No início, ambos os times no 4-2-3-1 encaixado, mas com o Cruzeiro levando vantagem pela direita em cima de Ailton

Marcelo Oliveira poupou Ceará e escalou Mayke em seu lugar na lateral direita do 4-2-3-1 usual. O goleiro Fábio capitaneou o time que tinha a defesa formada por Léo e Bruno Rodrigo, com Mayke do lado direito e Egídio pela esquerda. NA proteção, Nilton e Lucas Silva mais uma vez fizeram parceria, com o segundo chegando mais próximo do trio articulador formado por Éverton Ribeiro à direita, Ricardo Goulart de central e Willian à esquerda. Na frente, Borges duelava com os zagueiros cariocas.

Diferente do confronto no primeiro turno, quando mandou um losango a campo, Vanderlei Luxemburgo escalou o Fluminense no mesmo 4-2-3-1. A meta de Kléver foi defendida por Bruno na lateral direita, Gum e Leandro Euzébio centralizados e Aílton à esquerda. Mais à frente, Edinho e Jean davam suporte a Rafinha na ponta direita, Wagner mais centralizado e Rafael Sóbis mais agudo à esquerda, próximo de Samuel.

 

 

Ataque pela direita

Tanto o mapa de calor da Footstats quanto o indicador do WhoScored confirmam: o Cruzeiro adorou procurar o lado direito neste jogo (veja as imagens abaixo). Tudo porque Luxemburgo estava sem laterais esquerdos de origem e optou por Aílton naquele lado da defesa, mas o jovem foi mal defensivamente. A troca de posições entre os três meias, uma característica imprescindível para um 4-2-3-1 ofensivo como é o do Cruzeiro funcionar — e que, por sinal, tem acontecido menos do que em partidas anteriores — acabou por confundir a marcação de Ailton.

O mapa de calor da Footstats mostra o Cruzeiro com mais posse pela direita; o índice de ataques do WhoScored.com diz que quase metade dos ataques foram por aquele lado

O mapa de calor da Footstats mostra o Cruzeiro com mais posse pela direita; o índice de ataques do WhoScored.com diz que quase metade dos ataques foram por aquele lado

E após um começo nervoso, com muitos erros de passe pela ansiedade em contra-atacar, o Cruzeiro aproveitou o quarteto ofensivo encaixou alguns passes e abriu o placar com Borges. O passe de Éverton Ribeiro, aqui aparecendo de central, teve como alvo Ricardo Goulart, às costas de Aílton. Goulart avançou cortando pra dentro, mas se enrolou com a bola, que sobrou na entrada da área. Borges foi mais esperto que a cobertura de Bruno e colocou no canto direito de Kléver.

Fluminense muda

Wagner se lesionou e deu seu lugar ao veterano Felipe. Com isso, Luxemburgo reorganizou a equipe no 4-4-2, mandando Felipe para a ponta esquerda para proteger Aílton e dando liberdade a Rafael Sóbis para circular. Funcionou em certa medida, já que Sóbis causou problemas do lado esquerdo da defesa celeste, principalmente com Egídio tendo dificuldades de marcação. Daquele lado, o atacante finalizou uma vez, com certo espaço, e deu uma assistência para Samuel errar o gol dentro da pequena área. Sorte.

Mas se a marcação do lado esquerdo ficou reforçada com Felipe, necessariamente ela foi diminuída em algum outro setor da equipe. E esse setor era o meio-campo ofensivo. Sem um meia central, Nilton e Lucas Silva ficaram sem perseguidores diretos — Jean optava por recuar próximo a Edinho para ter uma sobra no meio-campo. Não por acaso, os volantes celestes tiveram liberdade para avançar e chutar, uma vez cada um.

Luxa queima a regra três

Insatisfeito, Luxemburgo usou de um expediente que lhe é bem característico: queimar todas as substituições no intervalo. Rhayner entrou na vaga de Rafinha para jogar na mesma ponta direita, mas com mais ofensividade; e Igor Julião, lateral direito de origem, entrou na lateral esquerda no lugar de Aílton, mal no primeiro tempo. Além disso, Luxemburgo soltou Jean de vez, que chegava ao ataque com frequência. Vendo que poderia ter problemas com o amarelo que Egídio levou ainda no finzinho do primeiro tempo, Marcelo diminuiu os riscos tirando o camisa 6 e mandando Ceará a campo, novamente na lateral esquerda.

O jogo ficou morno, com o Cruzeiro se contentando em defender a vantagem e o Fluminense arriscando o mínimo possível para não sofrer contra-ataques. Marcelo agiu novamente, tirando Borges e lançando Dagoberto na partida. O camisa 11 foi para a direita, centralizando Ribeiro e mandando Goulart para o ataque — uma substituição que este blogueiro particularmente não gosta, como dito em outros textos. Mas o fato é que Goulart passou a finalizar vária vezes, mas sempre para fora. Talvez pelo fato de não ser um centroavante típico e se movimentar mais, Goulart tenha confundido os zagueiros cariocas.

Sóbis no chuveiro: nada mudou

Com a lesão de Wagner, Luxemburgo repaginou o Fluminense num 4-4-2 reforçando o lado esquerdo com Felipe e dando liberdade para Sóbis, que causou problemas até a expulsão

Com a lesão de Wagner, Luxemburgo repaginou o Fluminense num 4-4-2 reforçando o lado esquerdo com Felipe e dando liberdade para Sóbis, que causou problemas até a expulsão

De toda forma, a partida começou a ficar perigosa demais, já que o Cruzeiro claramente dava indícios de que não iria correr mais do que estava correndo para ampliar o placar. O Fluminense se soltou de vez, chegando com perigo: Fábio chegou a salvar espetacularmente um cabeceio de Samuel, em cruzamento de Bruno da direita.

Mas o ímpeto de empatar acabava dando mais espaço ao Cruzeiro, que contra-atacava. E em um destes contra-ataques, puxado por Dagoberto, Rafael Sóbis fez falta para o segundo amarelo. Parecia que o jogo tinha acabado ali, já que com um a menos o Fluminense parecia não ter mais como reagir. E nos primeiros minutos do novo 4-4-1, o Cruzeiro até ensaiou uma pressão para ampliar, mas esbarrou nas más finalizações de Goulart novamente.

Marcelo Oliveira tentou aproveitar a vantagem numérica e promoveu a reestreia de Élber depois de longo tempo lesionado, na vaga de Willian. Entretanto, a expulsão de Sóbis fez mal ao Cruzeiro, que relaxou demais, e Élber quase não teve tempo na bola. Os jogadores do Fluminense conseguiram perceber este relaxamento e se soltaram novamente, enquanto o Cruzeiro se contentava em deixar o tempo passar. Teria sido uma atitude imperdoável, não fosse Samuel ter perdido mais uma vez um gol dentro da pequena área após chegada pela esquerda.

O lance pareceu ter selado o destino da partida. Mesmo correndo riscos, o Cruzeiro deixou o tempo passar, e sem ser incomodado pelo Fluminense, se reencontrou com a vitória.

O físico e o psicológico

Este blog é sobre tática, mas é claro que esta parte do futebol é também influenciada por outros fatores, e dentre eles estão a questão física e a mental. O desgaste dos jogos em sequência claramente tem emperrado a atuação de alguns jogadores. Além disso, os dois resultados ruins em sequência causaram uma certa ansiedade nos atletas, que por sua vez afetou a parte técnica — muitos erros de passe na ânsia de marcar gols logo e quebrar a sequência negativa. O próprio Marcelo Oliveira mencionou isto.

Entretanto, esses fatores não podem servir de desculpa para o relaxamento celeste no segundo tempo. Com a vitória, este aspecto pode ter ficado em segundo plano para muita gente, mas não aos olhos deste escriba. Claro que o importante era vencer novamente para retomar o caminho do título. Mas o risco de deixar de ganhar três pontos foi grande demais, mesmo em vantagem numérica.

É preciso retomar o futebol de outrora para que a torcida celeste não passe tanto sufoco. Quem sabe agora, com os jogos sendo somente aos fins de semana — exceto contra o Vitória na 34ª rodada — a questão física deixe de ser um fator e o Cruzeiro mostre a intensidade ofensiva que encantou o Brasil no primeiro turno.

A confiança no título segue inabalável, mas o Cruzeiro pode sim jogar mais do que o que jogou. Basta fazer, literalmente, um pequeno esforço a mais.

Grêmio 3 x 1 Cruzeiro – Falta e excesso

O cartão vermelho mostrado a Souza ainda no primeiro tempo foi, com toda a certeza, a principal razão da derrota para o Grêmio em Porto Alegre. Uma expulsão que foi, de certa forma, ocasionada pelo excesso de vontade do volante, em que pese o excesso de rigor do árbitro no segundo cartão amarelo.

Enquanto teve onze jogadores, porém, o Cruzeiro controlou a partida com maturidade, se defendendo bem e lentamente chamando o domínio para si. Mas pecou, novamente, na falta de eficiência nas finalizações. Ou excesso de erros, como preferir.

Escretes

Quando ainda tinha onze em campo, o Cruzeiro foi superior no meio-campo e tinha boa movimentação defensiva pelos lados

Quando ainda tinha onze em campo, o Cruzeiro foi superior no meio-campo e tinha boa movimentação defensiva pelos lados

Desta feita, o poupado da vez foi o lateral Mayke. Assim, Ceará fechava a linha defensiva pela direita, juntamente com os titulares Dedé, Bruno Rodrigo e Egídio, protegendo o gol de Fábio. Mais à frente, Nilton e Souza vigiavam a entrada da área, com Ricardo Goulart mais à frente e flanqueado por Luan à esquerda e Everton Ribeiro, de volta, à direita e circulando. Na frente, Vinicius Araújo era mais uma vez o centroavante.

Já Renato Portaluppi armou o Grêmio num 3-4-1-2 típico. Velho conhecido, o goleiro Dida tinha os zagueiros Werley pela direita, Rhodolfo pelo meio e Bressan pela esquerda. Com isso, os alas Pará pela direita e Alex Telles pela esquerda ficavam alinhados aos volantes Ramiro e Souza. Na ligação, Maxi Rodriguez era o responsável por pensar o jogo para a dupla de atacantes Barcos e Kleber.

O lado esquerdo

O Grêmio começou o jogo marcando muito, recuperando a posse por várias vezes. Entretanto, a marcação do Cruzeiro foi muito eficiente. Quando o jogo ia para a esquerda, Luan subia a pressão em Werley, deixando Pará para Egídio, e Everton Ribeiro centralizava para congestionar o meio-campo. Em teoria, isso deixava Alex Telles livre, mas quando a bola ia para a direita, todo o sistema se repetia do outro lado — Luan ia marcar no meio e Ribeiro pressionava Bressan. Sem passe no meio, o Grêmio não conseguia sair tocando e abusava de bolas longas. A defesa do Cruzeiro repelia sem problemas.

Ofensivamente, o Cruzeiro era acossado pela intensidade adversária, que não durou muito. Aos poucos o Grêmio foi arrefecendo, mas também o Cruzeiro encaixava sequências de passes que conseguiam abrir a defesa gaúcha. Everton Ribeiro contribuiu muito neste sentido, com sua movimentação peculiar de sair da direita para armar o time por dentro — isso confunde demais a marcação adversária. O lance que originou o pênalti é um bom exemplo: jogada de Goulart de letra para Ribeiro, que inverteu rapidamente para Egídio entrar totalmente livre e cruzar.

Para ilustrar o domínio, até o pênalti, o Grêmio atentou 4 vezes contra Fábio, enquato o Cruzeiro disparou 12 vezes. Entretanto, o time da casa acertou metade de suas tentativas, duas, ao passo de que o Cruzeiro acertou apenas três vezes no gol. E ainda acertou a trave logo antes do lance do pênalti com Vinicius Araújo.

Desperdício e expulsão

Everton Ribeiro não cobrou mal o pênalti. Dida é que é um grande goleiro, nos dois sentidos, e foi buscar uma bola no cantinho. Perder pênaltis é natural do futebol, e pra mim o Cruzeiro iria demonstrar maturidade e continuar dominando a partida, mesmo considerando o ganho psicológico que uma defesa de pênalti dá para um time, ainda mais jogando em casa.

Ledo engano. Souza, que já havia sido amarelado, fez uma falta boba no meio-campo, na frente do juiz. Era uma falta normal de jogo, mas PC Oliveira não quis saber e mostrou o segundo amarelo.

Até a entrada de Guerreiro, o Cruzeiro se postou num 4-4-1-1 típico, com Ribeiro, Goulart, Nilton e Luan à frente da linha defensiva. Com a saída de Vinicius Araújo para a recomposição, o Cruzeiro mudou para uma espécie de 4-2-3, com Luan centralizado, Goulart fechando o lado direito e Everton Ribeiro ligeiramente mais avançado pelo lado esquerdo.

Se um sistema com três zagueiros já causavam redundância de cobertura contra o centroavante único de um 4-2-3-1, com dez em campo e sem um centroavante típico, o Grêmio tinha agora três jogadores ociosos, os zagueiros. Luan voltava para pressionar os volantes e os ponteiros Ribeiro e Goulart acompanhavam os alas. Maxi Rodriguez, que já não estava aparecendo no jogo antes, sumiu de vez, e o Cruzeiro se segurou tranquilamente até o fim do primeiro tempo. Pra se ter uma ideia, após a expulsão o Grêmio só finalizou uma vez, um chute bloqueado de Ramiro.

Trocas

Surpreendentemente, Renato Portaluppi não desfez seu esquema já no intervalo. Demorou 9 minutos para isso: tirou Bressan e mandou a campo Guilherme Biteco, que foi jogar de ponteiro esquerdo. Os alas recuaram para a última linha, e o Grêmio agora se postava num 4-2-1-3 “torto”, com Barcos e Kleber ainda à frente, mas Biteco alinhado ao ainda centralizado Maxi Rodriguez.

Até este momento, o jogo continuava como havia terminado na primeira etapa, com o Grêmio tendo dificuldade para penetrar na defesa cruzeirense, mesmo tendo mais a bola nos pés. A partir daquele momento, porém, a marcação se encaixou melhor e os efeitos de se ter um homem a menos começaram a aparecer. O escanteio que originou o lance do primeiro gol só saiu devido a um efeito cascata nas coberturas, iniciadas por um bote errado de Egídio. Quando um bote sai errado, o jogador sobra, e outro defensor tem que sair para cobrir, abrindo outra linha de passe.

Logo após o gol, Marcelo mudou sua estratégia. Com o zero a zero no placar, e uma certa facilidade em segurar o time adversário, segurar a bola era uma opção. Atrás no placar, porém, era preciso ir buscar o empate em contra-ataques, a única opção. E por isso Marcelo Oliveira pôs Willian no jogo na vaga de Everton Ribeiro. O time se mudou para um 4-4-1 novamente, com Luan à frente e Willian e Goulart pelos lados.

Mas nem deu tempo de testar a formação. O segundo gol saiu em uma bola desviada num lance típico de um time com um jogador a mais. Willian saiu da marcação em Pará para pressionar à frente, tentando fechar a opção do passe de Rhodolfo para Werley, mas o zagueiro inverteu pelo alto para Pará. Willian voltou correndo para marcar, e quando chegou, esticou o pé o suficiente para desviar a bola e pegar as coberturas desprevenidas. Barcos aproveitou.

Comportamento típico de um time com um homem a menos: Willian avançaria para pressionar o zagueiro, mas logo tem que voltar para cobrir o avanço de Pará. Ao chegar atrasado, desviaria o passe, que sobra para Barcos marcar o segundo

Comportamento típico de um time com um homem a menos: Willian avançaria para pressionar o zagueiro, mas logo tem que voltar para cobrir o avanço de Pará. Ao chegar atrasado, desviaria o passe, que sobra para Barcos marcar o segundo

Posse de bola?

Depois do segundo gol o Grêmio pareceu relaxar. A grande vantagem no placar e o jogador a mais certamente são fatores para isso, e assim o Cruzeiro começou a ter posse de bola, um quesito atípico para quem está jogando com dez contra onze. E de certa forma até levou algum perigo, chegando ao ponto de Renato Portaluppi colocar Matheus Biteco no lugar de Maxi Rodriguez para formar um 4-4-2 britânico (com o meio-campo em linha), com os irmãos Biteco de ponteiros na segunda linha.

O 4-4-1/4-2-3 do Cruzeiro após a expulsão até segurou bem o Grêmio no 4-2-1-3 e depois no 4-4-2, considerando que os gols saíram em bolas paradas e em um passe desviado

O 4-4-1/4-2-3 do Cruzeiro após a expulsão até segurou bem o Grêmio no 4-2-1-3 e depois no 4-4-2, considerando que os gols saíram em bolas paradas e em um passe desviado

Mesmo assim, o Cruzeiro continuou com mais posse de bola, e mesmo depois do gol de Nilton continuou a tê-la — chegaria ao fim com incríveis 53% de posse (WhoScored), consideradas as circunstâncias. Porém, as esperanças de uma reação épica foram enterradas em um erro de posicionamento em bola parada: Kleber aproveitou, sozinho, o rebote de Fábio em cobrança de falta e fez o terceiro.

As outras trocas em nada mudaram o panorama da partida: Nilton se lesionou e deu seu lugar a Lucas Silva, e Kleber saiu para a entrada do atacante Paulinho, um jogador mais de lado, fazendo Barcos ser um centroavante típico.

Bom futebol, Pontos perdidos

Perder nunca é bom, obviamente. Ainda mais em um campeonato tão equilibrado, onde mesmo perdendo cinco pontos nos últimos dois jogos o Cruzeiro permanece liderando a competição (esta análise está sendo escrita antes do jogo do Botafogo na quinta). Porém, se há um jeito melhor de perder, é perder jogando bem. E foi assim que a partida se apresentou. Se analisarmos bem, nenhum dos gols do Grêmio saiu em jogadas construídas pelo chão, com infiltração na defesa: foram duas bolas paradas e um passe desviado. Indícios de que o Cruzeiro, pelo menos taticamente, se postou bem.

Pela internet, em blogs de torcedores, muitas pessoas questionaram após a partida as trocas de Marcelo, principalmente a saída de Ribeiro para a entrada de Willian. A maioria parecia querer a saída de Luan. Entretanto, acredito que estes críticos só olharam a parte técnica, já que Ribeiro era certamente um dos melhores em campo. Taticamente, porém, ele não é marcador, e com dez em campo todos os jogadores tem que trabalhar defensivamente. Além disso, a tarefa de duelar com os zagueiros pela posse da bola longa é para jogadores mais físicos, coisa que Ribeiro certamente não é.

Enfim, perder é ruim. Agora, perder sabendo que você era melhor na partida pode ser melhor ou pior: depende do ponto de vista. Perspectiva de um bom time para o resto do campeonato, ou lamentações de pontos perdidos?

Sou mais a primeira opção.

Cruzeiro 4 x 0 Resende – Placar “mentiroso”

Quem lê este título pode achar que este blogueiro ficou maluco. Afinal o Cruzeiro foi bem superior ao Resende ontem no Mineirão pela Copa do Brasil e mereceu a vitória elástica. Mas o título tem razão de ser: o Cruzeiro foi tão superior que deveria ter feito mais gols, caso tivesse acertado mais o pé nas finalizações.

Taticamente, as novidades foram a liberdade de Dedé e a variação de ritmo de jogo, mostrando novas facetas para a disputa do Campeonato Brasileiro, dignas de um time bem treinado.

Escalações

Os avanços de Dedé e dos laterais foram marcantes no móvel 4-2-3-1 cruzeirense do 1º tempo

Os avanços de Dedé e dos laterais foram marcantes no móvel 4-2-3-1 cruzeirense do 1º tempo

O maleável 4-2-3-1 de Marcelo Oliveira teve Fábio debaixo das traves, Dedé na zaga direita e Bruno Rodrigo na esquerda. Ceará e Egídio, titular mais uma vez, foram os laterais. A dupla de volantes foi a mesma de sempre, Guerreiro e Nilton, atrás do trio Everton Ribeiro, Diego Souza e Dagoberto, todos procurando a referência na área ofensiva, Borges.

Para tentar parar os laterais cruzeirenses, o técnico Paulo Campos escalou o Resende num esquema pouco usual: o 4-4-2 britânico, com duas linhas atrás dos atacantes. Defendendo o gol de Mauro, os zagueiros Admilton e Thiago Sales foram flanqueados por Marcelo à direita e Kim à esquerda. A segunda linha tinha os meias Guto e Rafael Carioca abertos, com Denilson e Valdeci fechando a entrada da área. Na frente, Acosta e Geovani Maranhão.

Estilos de defesa

De cara, o que chamou a atenção foi a pegada cruzeirense. Os jogadores disputavam a bola como se fosse uma final, parecendo

que estavam em desvantagem. Marcação curta e alta, com correria pra roubar a bola o mais rápido possível. Quando tinha a bola, sabia alternar velocidade com a paciência, um pouco diferente do jogo cadenciado que vinha desenvolvendo no início da temporada. Isso é uma grande evolução, já que torna o time mais imprevisível e dificulta bastante o trabalho defensivo adversário.

Se o plano defensivo de Marcelo Oliveira deu certo, o mesmo não pode ser dito do treinador do time visitante. Primeiro porque deixou os atacantes Acosta e Geovani Maranhão na linha do meio-campo, sem pressionar a saída de bola, dando muita liberdade para os zagueiros e volantes cruzeirenses pensarem o jogo sem ser incomodados. E depois porque usou marcação individual por setor — ou seja, o jogador persegue o adversário que ingressar na sua zona até o fim da jogada. Com a movimentação constante do ataque do Cruzeiro, espaços abriam-se em profusão na retaguarda do Resende.

Jogo lateral

Espaços esses que eram aproveitados por Ceará e Egídio. Com os volantes do Resende tentando bloquear a entrada da área pelo meio, era um caminho natural procurar os flancos. Os ponteiros da segunda linha do Resende, Guto e Rafael Carioca, até que tentavam acompanhar os avanços dos laterais cruzeirenses pelo setor, mas eram sobrecarregados com a chegada de trás de Guerreiro e Nilton. Além disso, ainda havia o suporte dos meias. E foram em jogadas nestes setores que se originaram os lances de bola parada dos dois primeiros gols.

Tudo isso contribuiu para que este fosse o jogo em que o Cruzeiro menos tivesse posse de bola pelo meio: apenas 20,98%, bem abaixo da média de 29,03% até o jogo anterior. Pelos lados, os números demonstram a imprevisibilidade do time: aproximadamente 38% de posse pela esquerda e 40% pela direita (números da Footstats disponibilizados no site da ESPN Brasil).

Zagueiro ofensivo

Este ligeiro favorecimento do Cruzeiro pelo lado direito talvez seja explicado pelos constantes avanços de Dedé. Bem na sua característica, o estreante da noite tinha liberdade total para se juntar ao ataque, num movimento que parecia estar treinado há muito tempo. Guerreiro e Nilton se alternavam na recomposição da zaga quando Dedé avançava como homem-surpresa.

O interessante é que esta movimentação é uma forma diferente de resolver um problema que este blog já vem levantando há algum tempo, que é a falta de um volante criativo e ofensivo no meio-campo celeste. Com um dos volantes defensivos cobrindo a zaga, Dedé pode ser este homem, arrastando consigo a marcação e abrindo espaços preciosos para seus companheiros. É claro que a postura defensiva do Resende, tentando evitar uma goleada histórica, contribuiu para que Dedé tivesse todo o espaço que teve. Mas não deixa de ser uma característica que deve ser bem explorada pelo time celeste no Brasileiro.

Segundo tempo

Nilton se machucou no último lance da etapa inicial e teve de ser substituído no intervalo. Marcelo Oliveira escolheu Lucas Silva, e com isso Dedé passou a ficar mais contido, já que o garoto tende a avançar mais para o ataque e dar opção de passe do que os dois volantes titulares. Mas fora isso, não houve nenhuma mudança tática significativa. Já no Resende, Paulo Campos fez uma dupla substituição: Vinicius Casão entrou na vaga de Guto mas ficou mais avançado, numa tentativa de contar os avanços de Egídio; e Deoclécio entrou na vaga de Denilson para cobrir aquele setor, formalizando um 4-3-3 “defensivo”, ou seja, com três jogadores em linha no meio, ao invés do triângulo usual.

Mas logo as três minutos o Cruzeiro ampliaria em contra-ataque bem executado, iniciado por um bote certeiro de Egídio, que passou por Everton Ribeiro antes de Borges fuzilar de fora da área. A imensa vantagem fez com que o Cruzeiro passasse a tocar mais do que dar velocidade, mas sem chegar os níveis alarmantes de preguiça do jogo de ida em Volta Redonda. E o Resende, já sem esperanças de se classificar, simplesmente queria terminar a partida de forma honrosa, talvez marcando um gol num estádio de Copa do Mundo. A soma destes dois fatores fez com que o jogo ficasse um pouco mais lento.

Mais uma estreia

Com a entrada dos jovens, um 4-2-3-1 mais "tradicional", com dois ponteiros de fato e um volante que sai mais para o jogo

Com a entrada dos jovens, um 4-2-3-1 mais “tradicional”, com dois ponteiros de fato e um volante que sai mais para o jogo

Aos 15, Élber entrou na vaga de Everton Ribeiro, mantendo o 4-2-3-1 inicial mas com o garoto bem mais aberto pela direita. No Resende, Acosta daria lugar a Clebson Monga, uma substituição direta de centro-avante por centro-avante. E no Cruzeiro, Dagoberto deixaria o campo para a estreia de Lucca, que também jogou aberto na esquerda.

Renovado com a energia dos jovens, o Cruzeiro passou a buscar mais o gol, e ele naturalmente veio em jogada dos dois ponteiros. Élber recebeu na direita e achou Lucca dentro da área, totalmente sem marcação, que concluiu com eficiência. Gol logo na estreia para um jogador muito promissor, garantindo a goleada “oficial” (porque 3 x 0, para este blogueiro, não é goleada, nem nunca foi).

Agora é o Brasileirão

A classificação para a terceira fase da Copa do Brasil era mais que esperada, e foi com autoridade, com superioridade durante os 180 minutos. O Cruzeiro jogou bem tecnicamente (apesar de algumas finalizações erradas) e taticamente, mostrou ter peças de reposição e vontade mesmo em partidas em que possui grande vantagem. Ainda houve a estreia de dois reforços que pareciam estar entrosados há muito tempo. É o que dizem: em time bem montado, o encaixe de novas peças é mais fácil.

Então, por tudo isso, acredito que o Cruzeiro está preparadíssimo para a disputa do Brasileirão. Alguns comentaristas ainda não colocam o Cruzeiro como favorito: neste guia, por exemplo, o Cruzeiro está no mesmo patamar do Santos — o que é ridículo — e atrás de Botafogo, Inter, Grêmio e São Paulo, que são no máximo do mesmo nível. Mas como não jogamos o Paulista nem o Carioca — que cá pra nós, são campeonatos bem fraquinhos — e estamos fora da Libertadores (por enquanto), ninguém sabe da força do nosso time senão nós cruzeirenses.

Mas talvez assim seja melhor. Cinco rodadas antes da Copa das Confederações mostrarão ao resto do Brasil que o velho Cruzeiro, que todos temem, está de volta.

Cruzeiro 2 x 1 Caldense – Velhos problemas, novas soluções

O Cruzeiro sofreu com alguns problemas recorrentes, mas conseguiu manter o aproveitamento máximo de pontos jogando no Mineirão, ao virar o jogo contra a Caldense hoje pela sétima rodada do Campeonato Mineiro. A vitória praticamente sela a classificação e pode dar mais tranquilidade para — quem sabe — fazer testes mais ousados.

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

Com Borges lesionado, Marcelo Oliveira optou pelo garoto Vinicius Araújo para comandar o ataque do 4-2-3-1 cruzeirense, à frente dos três meias “titulares”: Everton Ribeiro à direita, Diego Souza mais por dentro e Dagoberto pela esquerda. atrás destes, a imutável dupla de volantes Nilton e Leandro Guerreiro, e a linha defensiva composta por Everton, de volta à lateral esquerda, Ceará do outro lado, e Paulão e Léo, a surpresa, no miolo de zaga. Todos sob a capitania do goleiro Fábio.

A Caldense treinada por Tarcísio Pugliese veio também num surpreendente 4-2-3-1, mais defensivo. Glaysson no gol teve Jeffeson Feijão à direita, Júlio César e Paulão na zaga e Cris na lateral esquerda. Edmilson e Maxsuel eram os volantes, com Chimba pela direita, Rossini centralizado e Everton Maradona pela esquerda. Na frente, Nena era o atacante solitário.

O time visitante mostrou porque é uma das melhores defesas do Campeonato Mineiro até aqui, e conseguiu encaixotar o ataque celeste no primeiro tempo. O Cruzeiro segue com problemas ofensivos e defensivos, mas a mexida na formação de Marcelo Oliveira conseguiu reverter a situação, mostrando que já tem planos táticos alternativos na manga.

Marcação central

Apesar de ser um 4-2-3-1, a Caldense tinha proposta defensiva. Comandados por Rossini, o meia central, o quarteto de frente da Caldense aplicava uma marcação mista: Nena ia atrás do zagueiro que tivesse a bola, forçando o passe para o outro zagueiro e dali para um lateral. E assim que a bola chegava em Everton ou Ceará, o time compactava horizontalmente, ou seja, apertava o campo, tornando-o estreito, fechando qualquer possibilidade de passe curto à frente para os volantes ou meias pelo centro. O preço de deixar o lateral do lado oposto livre, provocando muitos gritos exaltados de “vira o jogo” nas arquibancadas do Mineirão.

A virada de jogo era sim uma opção, mas quando é feita pelo alto, a bola demora a chegar a seu destino e a Caldense “rodava” e compactava novamente do outro lado, mantendo as linhas de passe fechadas. O mais eficiente era fazer isso pelo chão, voltando no zagueiro do lado próximo e dele direto para o outro lateral, fazendo o ponteiro adversário (Chimba se o passe fosse para Everton, e Everton Maradona se o destino fosse Ceará) correrem como loucos para retomarem suas posições. O Cruzeiro se aproveitou disso, principalmente com Everton, que avançava pelo centro do campo e tentava procurar um dos quatro homens de frente.

Volantes passivos

Mas o avanço territorial era quase sempre infrutífero. É claro que enfrentar a segunda melhor defesa do campeonato era um motivo, com os quatro homens de frente bem marcados — laterais marcando os ponteiros, os dois volantes cuidando do meia central e os dois zagueiros encaixotando Vinicius Araújo. Mas o principal fator era a falta de mais gente no centro do meio campo com a posse de bola. Leandro Guerreiro e Nilton, hoje, ficaram passivos demais, não se juntavam à ação ofensiva. E assim a marcação da Caldense foi muito facilitada, e o time visitante executou sua proposta sem muitos sobressaltos. O Cruzeiro só levava perigo em bolas aéreas, cujo excesso demonstrou a falta de criatividade do ataque.

Como se não bastasse, a passividade da dupla volância não foi só quando o Cruzeiro tinha a posse. A marcação em cima dos meias adversários, principalmente em Rossini, foi muito frouxa. O meia tinha liberdade para recuperar a bola e pensar o jogo, sem que Leandro Guerreiro ou Nilton se aproximassem muito. Assim a Caldense criou algumas dificuldades e incomodou Fábio. A falta de pressão sobre o homem da bola, como se diz, fazia os jogadores da Caldense terem bastante tempo de posse de bola sem ser incomodados. Em um desses momentos, a bola foi cruzada na área, Léo rebateu na direção de Paulão, mas o zagueiro dominou mal e perdeu na corrida para Chimba, derrubando-o dentro da área e cometendo o pênalti que abriu o placar.

A alternativa

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

Vendo que mesmo após a conversa no intervalo o time não dava sinais de conseguir sair da excelente marcação adversária, Marcelo Oliveira usou as três substituições para tentar desmontar o esquema defensivo de Pugliese. Primeiro fez uma dupla mudança, com Tinga e Élber nas vagas de Nilton e Diego Souza. Logo depois, Ricardo Goulart entrou na vaga de Paulão. Élber entrou aberto pela direita, Ricardo Goulart fez companhia à Everton Ribeiro como dupla de meias centrais e Dagoberto ficou na esquerda, com Tinga sendo um volante único do novo 4-1-4-1 — Guerreiro foi ser zagueiro.

Porém, o camisa 55 mal teve trabalho, pois depois das substituições o time melhorou muito. Isso porque Everton Ribeiro ficou um pouco mais recuado que Ricardo Goulart, pegando bolas nos pés de Tinga e dos zagueiros para começar as jogadas ofensivas. Isso tirava um dos volantes da sólida linha defensiva da Caldense, abrindo espaços para Goulart e os ponteiros. Estes últimos fizeram a festa, pois agora só tinham os laterais à frente, sem auxílio dos volantes. E foi numa jogada de Dagoberto pela esquerda, driblando em direção ao gol que o juizão apitou um pênalti no mínimo estranho, na modestíssima opinião deste blogueiro.

Duas linhas de quatro

A Caldense já havia trocado Chimba por Tinga (o deles), por lesão, e também Everton Maradona por Rodrigo Paulista. As substituições mantiveram o 4-2-3-1 defensivo, mas não evitaram o empate. Então, Pugliese lançou Luizinho na vaga do cansado Rossini, colocando-o como ponteiro esquerdo e avançando Rodrigo Paulista para o ataque, configurando um típico 4-4-2 britânico — ou seja, com o meio-campo em linha, as famigeradas “duas linhas de quatro”. De certa forma, funcionou, pois os ponteiros já não tinham tanta liberdade com a marcação dobrada.

Mas a Caldense já não tinha mais o mesmo fôlego, e não encurtava tanto. Foi assim que Ceará e Élber trocaram vários passes do lado direito da área, procurando uma brecha, até que Élber centrou aparentemente sem muita esperança de achar alguém ali. Mas Ricardo Goulart, como um bom meia central, saiu da marcação na hora certa, cabeceando no cantinho, tirando de Glaysson para virar e partida, selando a vitória e a manutenção dos 100% no Mineirão.

É preciso testar todos os setores

O Cruzeiro ainda oscila. Faz um jogo excelente e logo na rodada seguinte cai de produção. É normal para um time que só fez sete partidas oficiais no ano — alguns paulistas já fizeram 18 — mas o tempo passa, e a fase inicial do Campeonato Mineiro, que é o ambiente ideal para testes, já está acabando. É claro que ainda há tempo para fazer testes, pois o Cruzeiro, com 19 pontos, já está praticamente garantido na fase final. Entretanto, o treinador me parece querer testar apenas o parceiro para Paulão, que vem mudando a cada jogo. O quarteto ofensivo, os laterais e os volantes já me parecem estar definidos, e é justamente estes últimos que mais me intrigam.

A volância me parece ser o problema mais crônico do time, e Guerreiro e Nilton parecem ter lugar cativo. Não vejo outros volantes serem testados, sequer em treinamentos. Lucas Silva, Henrique e Uelliton parecem não agradar ao treinador. Ok, Henrique ainda não tinha condições de jogo, mas os outros dois sim. Porque não testá-los? Porque não levá-los pelo menos para o banco e usá-los durante a partida? Perguntas que só quem está no dia-a-dia dos treinamentos pode responder.

Alô, Marcelo Oliveira, você lê este blog? É, não, acho que não.