Goiás 1 x 2 Cruzeiro – Sem referência

O título acima havia nascido na cabeça deste que vos escreve já na metade do primeiro tempo, pois sintetiza bem o que foi a partida entre Goiás e Cruzeiro no Serra Dourada — atualmente o maior campo do Brasil. Lesionados, os atletas que jogam na referência — jargão do futebol que é sinônimo da posição de centroavante, ou target man no inglês — ficaram de fora. No Cruzeiro, Borges foi vetado pouco antes da partida, e no Goiás já se sabia que Walter dificilmente iria para o jogo — muito mais prejuízo, já que é referência para todo o time e não só para o ataque.

A falta de referência, porém, não estava somente na posição de centroavante, como veremos a seguir.

Formações iniciais

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Marcelo Oliveira escolheu o jovem Alisson para a vaga de Borges, avançando Ricardo Goulart para jogar entre os zagueiros. Com isso, o posicionamento de partida dos três meias também foi modificado — Éverton Ribeiro passou a ser o central, Alisson entrou caindo mais pela esquerda e Willian trocou de lado. O resto do time foi o mesmo que iniciou a última partida, com Fábio no gol, Ceará e Egídio nas laterais direita e esquerda, respectivamente, e Dedé e Bruno Rodrigo na zaga central. Nilton e Lucas Silva mais uma vez fizeram uma boa dupla volância, com o primeiro mais preso que o segundo.

Enderson Moreira armou o Goiás num 4-3-3/4-1-4-1 para encaixar a marcação no meio-campo com o Cruzeiro: um apoiador em cada volante e dois homens abertos para bater com os laterais. A linha defensiva que protegia o gol de Renan tinha Vítor à direita, Walmir Lucas e Rodrigo na zaga e William Matheus na lateral esquerda. David foi o volante, tendo Hugo e Thiago Mendes mais à frente, com Ramon pela direita e Renan Oliveira pela esquerda. Na frente, Neto Baiano.

Respeito

Logo no começo da transmissão do jogo, a TV captou a tradicional reunião no túnel de acesso do Goiás ao gramado. Um dos jogadores falava em não pensar em empate, mas sim em vitória. Irõnico, pois o simples fato de ter que se dizer isso já indica que o empate era considerado um bom resultado. É o efeito da liderança inconteste.

E foi por isso que o Goiás se limitou a esperar o Cruzeiro e marcar forte nos minutos iniciais. Marcou em bloco médio/baixo, com Neto Baiano no círculo central olhando Dedé e Bruno Rodrigo tocarem a bola um para o outro. Se a jogada ia para os pés de Ceará, Renan Oliveira pressionava, e se fosse em Egídio, Ramon subia a marcação. O resto do time se postou num marcação individual por setor: laterais batendo com ponteiros, o volante David com o central, e os zagueiros contra Ricardo Goulart.

O central

Para sair dessa forte marcação, era preciso muita mobilidade. Na teoria, a entrada de Ricardo Goulart na vaga de Borges era exatamente pra isso — se o camisa 31 não é centroavante nato, ele se movimenta mais, saindo da área para inverter posições com os ponteiros e o central. Mas Goulart não fez isso, preferindo se limitar a jogar enfiado entre os zagueiros. E com a adição de Alisson, a linha de três não estava tão entrosada, tanto mais com Éverton Ribeiro por dentro. Assim, o time ficou também sem uma referência no meio-campo central, alguém para se movimentar, receber a bola e distribuir de volta: exatamente o papel que Ricardo Goulart faz.

O resultado direto foi que o Cruzeiro não criou pelo chão e tentava a ligação direta. Porém, Goulart dificilmente é o jogador certo para este tipo de jogo, a famosa disputa de 1ª e 2ª bola. Os zagueiros goianos ganhavam quase tudo. Sem ser agredido como esperava, o Goiás foi se soltando aos poucos e foi avançando o time, sem descuidar de seu esquema de marcação. Mesmo assim, não incomodou muito a meta de Fábio, exceção feita ao chute de Hugo pra fora após roubar uma bola na pressão alta.

Mas o Goiás achou seu gol numa falha de marcação de Egídio (veja imagem abaixo), e com a vantagem voltou ao modo inicial da partida — a meta era dificultar ao máximo as ações ofensivas celestes. Se o discurso do túnel de acesso serve de parâmetro, um vitória simples sobre o líder era um excelente resultado. Porém, a defesa goiana não contava com um passe maravilhoso do garoto Alisson. Tentando deixar Goulart em impedimento, se esqueceu de Willian, que desviou de Renan e empatou.

Fim do experimento

No intervalo, Marcelo Oliveira desfez a tentativa. Recuou Goulart e colocou os três meias nas posições “originais” — Ribeiro na direita, Goulart por dentro e Willian na esquerda — tirando Alisson da partida e lançando Anselmo Ramon. Normalmente seria Vinícius Araújo o escolhido, mas o jovem da base não foi relacionado por estar em vias de servir a seleção sub-20. A ideia era conseguir fazer o tal jogo de primeira e segunda bola, com retenção de posse no ataque, e ainda contar com o entrosamento dos três meias para dominar a posse de bola no meio.

Somente o segundo item funcionou. Com Goulart como central, a diferença no fluxo de passes era visível. Anselmo, porém, destoou do time e não venceu nenhum duelo aéreo, servindo apenas para ocupar os zagueiros do Goiás. Foram os quinze minutos de maior domínio do Cruzeiro na partida, até que Marcelo Oliveira tirou Goulart da partida e mandou Dagoberto. No Goiás, Neto Baiano saiu para a entrada de Júnior Viçosa, mais veloz, mas mantendo o sistema tático.

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre as duas primeiras trocas do Cruzeiro

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre a primeira e a segunda troca

Erro ou acerto?

Difícil dizer que a troca foi um erro após o resultado conhecido, mas no momento não me pareceu a melhor escolha. Dagoberto ainda está voltando de lesão, pegando o ritmo, e notadamente não tem a mesma aplicação defensiva que os outros ponteiros celestes. Além disso, o Cruzeiro novamente ficou sem sua referência de passe no meio-campo, com Éverton Ribeiro voltando a ser o central para dar espaço a Dagoberto na direita. Willian continuou pelo lado esquerdo.

O Goiás passou a dominar a posse de bola novamente e chegou com perigo algumas vezes. Enderson Moreira sentiu que podia vencer e colocou Tartá na ponta direita na vaga de Ramon, para pressionar Egídio. No Cruzeiro, Ceará sentiu cansaço ou lesão, e deixou o gramado para a entrada de Mayke — uma troca que é aparentemente seis por meia dúzia, mas quem acompanha o blog sabe que não é bem assim. Mayke é mais ofensivo e veloz, enquanto Ceará dá mais segurança na marcação.

Virada de líder

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

Ter queimado a regra três logo aos 25 do segundo tempo acabou por ser determinante, porque três minutos após a substituição, Lucas Silva virou a bola para Dagoberto na direita. Mayke passou como um raio em direção à linha de fundo e foi acionado. Levantou a cabeça e achou Willian na marca do pênalti, fazendo o famoso “facão” da esquerda pra dentro e virando o placar.

Depois do gol, Enderson Moreira tentou abriu totalmente o time num misto de 4-2-3-1 e 4-2-4 super ofensivo com Araújo na vaga de Hugo, recuando levemente Viçosa para o meio. Incomodou, é verdade, mas correu o risco de dar o contra-ataque para o time celeste, que desperdiçou duas oportunidades. Mas Fábio e a trave nos deram a sexta vitória seguida e a manutenção da vantagem na liderança.

Até quando se erra, se acerta

Ousadamente, manterei a minha opinião: a saída de Goulart foi um erro. A entrada de Dagoberto pode ter sido boa, mas a saída de Ricardo diminuiu consideravelmente o domínio territorial no meio-campo, e correu-se risco demais de sofrer um gol por causa disso.

Entretanto, mesmo com este equívoco, o Cruzeiro venceu. E não foi num erro do adversário, mas sim mérito: jogada construída, com passes conscientes, movimentação e excelência técnica. Além disso, contou com uma pitada de sorte nas duas bolas na trave que levou, e ainda com uma grande defesa de Fábio quando o jogo ainda estava em 1 a 1 — nosso capitão foi praticamente um espectador nas últimas partidas, mas provou que quando acionado é um dos melhores do Brasil. Ou seja, todos os ingredientes de um time campeão: elenco variado, qualidade técnica, time entrosado, confiança e sorte.

É aquela história: quando a fase é boa, tudo dá certo.

Bahia 1 x 3 Cruzeiro – Tranquilidade agitada

Jogando com certa tranquilidade — por vezes até excessiva — o Cruzeiro venceu o Bahia na Fonte Nova num jogo em que poderia ter tomado menos sustos se não tivesse, por iniciativa própria, tentado se poupar ao máximo. A temporada é desgastante e certamente esta é uma decisão consciente da comissão técnica, mas esta postura perigosa pode dificultar demais alguns jogos aparentemente controlados. Por outro lado, indica a consciência que o time tem sobre si mesmo, o que é importante ao definir a proposta de jogo para cada partida em um campeonato tão longo.

O triunfo garantiu a liderança ao fim do turno com uma rodada de antecedência. Um título simbólico, é verdade, mas que indica a força do elenco celeste e o bom trabalho do treinador: mudam-se as peças, o estilo e até a estratégia, mas a consistência é mantida.

Alinhamentos iniciais

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Marcelo Oliveira continuou com sua política de fazer rodízio com os jogadores, procurando poupar os que vem tendo sequências grandes. O escolhido da vez foi Ricardo Goulart, e com isso, Júlio Baptista e Borges foram escalados juntos, em suas posições normais do 4-2-3-1: Borges à frente e Júlio centralizado no meio. Fazendo a linha de três junto ao camisa 10 estiveram Éverton Ribeiro à direita e Willian à esquerda. Atrás deles, Henrique e Lucas Silva repetiram a parceria na volância, protegendo a linha defensiva formada por Ceará à direita, Dedé e Bruno Rodrigo no miolo e Egídio à esquerda. Fábio foi o goleiro e capitão.

Já o Bahia de Cristóvão Borges surpreendeu, abandonando o 4-3-3 das últimas partidas e vindo a campo numa espécie de 3-1-4-2. Defendendo a meta de Marcelo Lomba, Titi comandava a defesa, com Demerson à sua direita e Lucas Fonseca pela esquerda. Fahel era o cão de guarda do triângulo no círculo central, com Hélder mais avançado à esquerda e Marquinhos Gabriel um pouco mais centralizado à direita. Lado este que era fechado por Mádson, bem avançado e batendo com Egídio, e Raul na ala esquerda, um pouco mais atrás, mas ainda bem alto em relação a um lateral. Na frente, Wallyson caía mais pela esquerda e Fernandão ficava na referência.

Movimentos iniciais

Desde o apito inicial, o Bahia mostrou o que queria: se defender e jogar no erro do Cruzeiro. Fernandão marcava a partir da linha divisória; Wallyson acompanhava Ceará, deixando Raul mais preocupado com Éverton Ribeiro; do outro lado, Mádson batia com Egídio; os dois meias centrais duelavam com os volantes e Fahel perseguia Júlio Baptista; e na zaga, Willian era marcado por Demerson, Borges por Titi e Lucas Fonseca ficava na sobra da Raul. Praticamente uma marcação mano-a-mano, mas com sobras no meio e na direita, deixando os zagueiros do Cruzeiro completamente livres.

Por já ter a bola nos pés, o Cruzeiro agradeceu ao Bahia por não precisar dar intensidade na marcação, poupando-se do desgaste. Porém, este parecia também ser um dos objetivos com a bola: descansar. Com muita paciência e tocando a bola como em um jogo de handebol, alterando entre os lados até conseguir uma brecha, o time celeste dominou a posse de bola, mas sem a costumeira troca de posições e movimentação que caracterizam o time. O resultado foi o baixo número de finalizações do time se comparado com ele mesmo em outras partidas: foram apenas 5 no primeiro tempo.

Buscando outra rota

Com o meio completamente congestionado, e sem muita vontade de desorganizar o sistema defensivo do Bahia, o Cruzeiro procurou a rota aérea. Primeiro com Egídio achando Júlio Baptista no meio da área, com a bola beijando a trave, e no lance seguinte, Willian centrou a Borges que, entre os zagueiros, mandou de peixinho para abrir o placar.

Nem com o gol sofrido o Bahia mudou a postura — a posse de bola chegou a ficar em 64% a 36%. O que mudou foi que o Cruzeiro também passou a administrar e deixava os zagueiros do Bahia com a bola também. Porém, o time baiano não sabia bem o que fazer com ela, já que a defesa celeste estava bem sólida num 4-4-1-1, com os ponteiros voltando e se alinhando aos volantes. O sistema do Bahia não favorecia, porque causava a sobra dupla redundante na zaga (3 zagueiros contra Borges) e assim o Cruzeiro dobrava a marcação pelos lados.

O intervalo parecia longe já que o jogo estava bem insosso, mas Everton Ribeiro tratou de aumentar a emoção, ao receber cruzamento da direita, driblar dois zagueiros e concluir forte no ângulo direito de Lomba.

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

Fim da linha de três

Marcelo Oliveira não fez trocas, mas Cristóvão Borges percebeu que a defesa com três zagueiros não funcionou e mandou William Barbio a campo na vaga de Mádson. O atacante foi ser ponteiro direito, puxando Demerson para a lateral direita, deixando os outros dois zagueiros no meio e recuando Raul para a linha defensiva. Fahel continuou mais plantado e Wallyson abriu de vez pela esquerda, configurando o 4-3-3 clássico.

Em teoria, a troca daria mais velocidade de contra-ataque ao time da casa, já que agora os pontas não tinham mais tantas atribuições defensivas. Porém, para existir o contra-ataque, era preciso existir o ataque primeiro — mas o Cruzeiro estava obviamente satisfeito com o resultado, tentando se poupar o máximo possível, já que o Bahia não conseguia chegar perto de Fábio quando tinha a bola nos pés.

Talisca

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Anderson Talisca na vaga do lesionado Marquinhos Gabriel, porém, mudou este panorama. O jovem deu mais criatividade e certa fluência nos passes do time da casa, que chegou algumas vezes em velocidade pelos lados. Wallyson e William Barbio tiveram chances, mas desperdiçaram. Marcelo Oliveira respondeu “aproveitando” a lesão de Borges para lançar Ricardo Goulart, mas desta vez como meia central, mandando Júlio Baptista à frente. A intenção era voltar a acelerar o jogo quando o Cruzeiro tinha a bola, pois o jogo começava a ficar arriscado demais.

E ficou de vez depois do gol de Fahel, em cabeceio sozinho dentro da pequena área, após cruzamento da esquerda. Imediatamente, Cristóvão Borges queimou a regra três mandando Feijão na vaga de Hélder, um volante com mais saída e melhor passe. O Bahia se animou e tentou atacar, dando trabalho principalmente a Egídio pela esquerda. Foi então que Marcelo Oliveira promoveu o inusitado: tirou Egídio de campo e mandou Mayke. Ceará foi ser, talvez pela primeira vez na vida, lateral esquerdo — era clara a intenção de acabar com as investidas de William Barbio por ali.

Lado esquerdo

Apesar do cartão amarelo logo em seu primeiro lance, Ceará aparentemente deu conta do recado e o Bahia parou de ter tantas chances. Só chegou em um chute de Fernandão por cima em passe de Talisca. A última troca teria Éverton Ribeiro dando seu lugar a Martinuccio, jogando Willian para a direita. Em seu primeiro lance, o argentino já tentou o gol — sinal de que, agora sim, o Cruzeiro tinha alguém para acelerar o jogo e definir o confronto de uma vez por todas.

A origem do terceiro gol é o exemplo: Martinuccio recebe o passe e acelera, sofrendo falta. Depois da cobrança, a bola chega em Goulart, que também dá intensidade e sofre nova falta. Na cobrança, Willian achou Dedé na segunda trave, que cabeceou para defesa parcial de Lomba. Júlio Baptista, sumido desde que virou centro-avante, pegou o rebote e — finalmente — matou a partida.

Com “emoção”

O final da partida na Fonte Nova provou que o Cruzeiro poderia sim ter matado a partida em um momento anterior, se optasse por acelerar ao invés de tirar a velocidade do jogo. Mas não se pode culpar totalmente os jogadores, que enxergaram no jogo uma chance de se pouparem do grande desgaste físico que a temporada impõe sem perder pontos. Sem dúvida, é uma postura arriscada, mas que deu certo desta vez.

Outro aspecto tático a ser notado é que, com a entrada de Júlio Baptista, a equipe perde em mobilidade e leveza no meio, mas o camisa 10 compensa isto com experiência e poder de conclusão — já são dois gols em dois jogos e meio. Mais uma opção de formação para o 4-2-3-1, com uma característica diferente.

E essa é a principal virtude desta equipe: ser mutante e adaptável, tendo à sua disposição estratégias, estilos e rotas de ataque diferentes — mas sem alterar a plataforma tática. Essa manutenção é muito importante para os jogadores, pois quem entra já sabe como a equipe joga e de que posição deve partir para exercer sua função em campo, obviamente, adaptada para sua característica.

Isso faz com que o elenco rode e a regularidade se mantenha — aspecto primordial de muitos campeões de pontos corridos…

Cruzeiro 4 x 1 Atlético/MG – Futebol moderno

Intensidade. Os leitores mais assíduos já devem ter reparado que essa palavra é muito usada por aqui. Naturalmente, o futebol moderno exige intensidade — não confundir com velocidade. Eduardo Cecconi, grande blogueiro tático deste país e atualmente analista de desempenho das categorias de base do Grêmio, recentemente escreveu em um post no seu blog:

“Hoje no futebol, talvez muito mais importante que os sistemas táticos e os principais movimentos sincronizados entre os jogadores esteja a INTENSIDADE. Se houver intensidade de TODOS os jogadores em TODAS as cinco fases da partida que se alternam constantemente (e são elas, repetindo: posse de bola, recomposição defensiva, posse para o adversário, contra-ataque e bola parada) tudo é possível.”

De fato, foi o que o Cruzeiro procurou fazer desde o início da partida contra o Atlético Mineiro, reservas ou não: marcar com intensidade, encurtando espaços, e se movimentar com intensidade quanto tinha a bola. Futebol moderno, que culminou em mais uma goleada em cima do rival e na liderança do certame.

Formações

A intensidade do 4-2-3-1 cruzeirense do primeiro tempo foi o fator mais claro para o domínio do jogo

A intensidade do 4-2-3-1 cruzeirense do primeiro tempo foi o fator mais claro para o domínio do jogo

O Cruzeiro veio a campo no seu 4-2-3-1 de sempre, com Fábio no gol, Mayke e Egídio flanqueando Dedé e Bruno Rodrigo. Mais à frente, Nilton e Souza protegiam a área e se alternavam na ajuda ao trio de meias, formado por Everton Ribeiro na direita, Ricardo Goulart no centro e Luan à esquerda. Na frente, Vinicius Araújo.

Cuca poupou seus titulares, mas mandou o Atlético no mesmo sistema. O goleiro Giovane foi protegido pelos zagueiros Rafael Marques e Lucas Cândido, com Michel na lateral direita e Junior César na esquerda. Gilberto Silva comandou a volância, ajudado por Rosinei que saía um pouco mais para o ataque. A linha de três tinha Luan pela direita, Marcos Rocha no meio e Richarlyson na esquerda, atrás do centro-avante Alecsandro.

De ponta a ponta

Logo nos primeiros minutos já se via qual seria o padrão da partida: o Cruzeiro dominando as ações e tendo muito mais volume de jogo — também conhecido como posse de bola — e o time adversário mais recuado, se defendendo pra sair em contra-ataques. Esta marcação era feita com encaixe individual — não é por setor, é cada um no seu com um na sobra, como no time titular. E por essa razão que foi Richarlyson quem ocasionou a lesão de Mayke no início: o lateral cruzeirense nem estava na sua posição inicial, estava no círculo central, mas Richarlyson, que nesse jogo foi o ponteiro esquerdo e, portanto, o marcador de Mayke, foi atrás do garoto e fez a falta.

Logo após a substituição forçada, Dedé se viu sem cobertura numa despretensiosa cobrança de lateral e deu um bote errado dentro da área. O pênalti convertido assustou um pouco o time, e a intensidade se transformava em pressa por mais vezes do que o necessário. Alguns passes forçados demais, mais longos e errados. Já o Atlético queria proteger a todo custo a vantagem alcançada e se retraiu ainda mais, com Alecsandro recuando até a linha divisória e fazendo um quarteto com os ponteiros e Marcos Rocha, tentando bloquear os passes nos pés dos volantes cruzeirenses.

Passado o susto, o jogo voltou ao seu padrão inicial: Cruzeiro intenso e se movimentando. Com a bola nos pés, Everton Ribeiro e Ricardo Goulart alternavam tentando desorganizar a marcação no meio. Chegou duas vezes, em jogada de Everton Ribeiro para Ceará em velocidade pela direita, cruzando para Vinicius Araújo, e em passe de Egídio para Luan, que deixou passar inteligentemente para Everton Ribeiro emendar, mas em cima de Giovane.

Virada com autoridade

Mas foi com intensidade em outra fase do jogo que saiu o empate. Quando perdia a bola, os jogadores celestes tentavam asfixiar o time adversário, forçando o chutão ou o passe errado. Alecsandro, ajudando na defesa, sofreu a pressão e tentou fazer uma jogada forçada, perdendo a dividida para Egídio. A bola sobrou na frente, Luan e Vinicius Araújo duelaram com Gilberto Silva, com o primeiro ganhando o lance e achando Everton Ribeiro dentro da área. Cercado por três, Ribeiro limpou todos com um toque e mandou no canto.

O gol não só tranquilizou como animou ainda mais o Cruzeiro, que continuou intenso e criando chances: Everton Ribeiro em passe preciso para Vinicius emendar, e depois Souza em cruzamento de Vinicius Araújo. A virada chegou numa cobrança de escanteio de Egídio, que resvalou na defesa e parou em Vinicius Araújo do outro lado. O garoto dominou com tranquilidade e cruzou rasteiro para Ricardo Goulart completar para o fundo do gol. E ainda havia tempo pra mais um lance, em que o Cruzeiro finalizou pelo menos três vezes ao gol, com nove jogadores do time adversário dentro da área — um lance que ilustrou bem a intensidade cruzeirense do primeiro tempo.

Jovens e atropelados

No segundo tempo, Cuca tirou Richarlyson da ponta esquerda e lançou Leleu em seu lugar. Mas a troca que delatou seu esquema defensivo foi a segunda: Jemerson na vaga de Rosinei, com o jovem zagueiro foi jogar no meio-campo, ao lado de Lucas Cândido, que inverteu com Gilberto Silva. Mas a intenção de usar a experiência do pentacampeão mundial na zaga, como Luxemburgo fez com sucesso no Grêmio no ano passado, saiu pela culatra, já que a volância é um dos setores onde se precisa de mais experiência para o combate direto no meio-campo. O ataque celeste simplesmente não tomou conhecimento dos dois jovens volantes, e já aos 7 Nilton aumentaria a vantagem em cobrança de escanteio, novamente, de Egídio, que já havia cruzando na cabeça de Dedé em tiro esquinado anterior.

Vinicius Araújo atrai Gilberto Silva para fora da área e abre espaço para Ricardo Goulart aproveitar ótimo passe de Everton Ribeiro

O lance do quarto gol exemplifica bem estes conceitos todos aqui postos. A marcação individual do Atlético fez com que Gilberto Silva, agora zagueiro, abandonasse a área e viesse acompanhar Vinicius Araújo, que havia recuado para receber um passe mais longo. O garoto dominou com o peito, a bola escapou um pouco, mas Everton Ribeiro vinha chegando e fez um passe de primeira para Ricardo Goulart, que vinha em velocidade exatamente na área que Gilberto Silva havia deixado. Jemerson tentou acompanhar, mas Goulart protegeu bem e tirou de Giovane.

Outras trocas

Muito para a infelicidade da torcida, que gritava “Eu acredito” no Mineirão, em alusão ao épico 6 a 1 de 2011, este gol resolveu a partida e, finalmente, o Cruzeiro respirou. Nem o Atlético se interessou por tentar diminuir a diferença nem o Cruzeiro em aumentá-la, e com os passes de Dedé pra Bruno Rodrigo e vice-versa, vieram os primeiros gritos de “olé”, aos 20 minutos da etapa final — o Cruzeiro terminaria com quase 60% de posse de bola, um número pouco comum em clássicos.

Marcelo Oliveira ainda trocaria Luan por Martinuccio, também ponteiro esquerdo, e Vinicius Araújo pelo estreante Willian, que foi para a direita, mandando Everton Ribeiro para o centro, com Ricardo Goulart se tornando o centro-avante. Cuca também lançou Elder na vaga de Luan, mas sem mudar posições, e nada mais interessante aconteceu na partida. Sinal disso é que o segundo tempo terminou sem acréscimos, aos 45.

Pés no chão

A sequência de 5 vitórias seguidas no Brasileiro e na Copa do Brasil, marcando 16 gols e sofrendo apenas um, sem dúvidas é um fator que anima o cruzeirense a sonhos mais altos nessa temporada. No entanto, mais importante que isso é a consistência tática do time, fruto do trabalho de Marcelo Oliveira. Insistir sempre no mesmo esquema pode tornar a equipe previsível para o adversário, mas a movimentação e intensidade “bagunçam” tudo de novo.

Assim, acredito que o Cruzeiro esteja taticamente bem servido. Entretanto, é preciso testar outros limites deste time, que já fogem ao escopo deste blog: o limite psicológico, o limite físico, a pressão de se brigar pelo título, de manter a liderança, o ambiente no vestiário. O próximo jogo contra um Fluminense em crise será um bom termômetro.

E se o Cruzeiro foi aprovado em todos os testes até agora, não há razão para não crer que não passará por estes outros.

Cruzeiro 2 x 1 Atlético/MG – Com onze contra onze é outra história

O Cruzeiro venceu o seu rival, consolidando os 100% de aproveitamento no Mineirão em 2013 e quase conseguiu uma título histórico sobre o melhor time que o rival teve nos seus últimos anos. Uma partida que serviu para provar que o caneco era sim uma possibilidade bem real, não fosse a expulsão no primeiro jogo — àquela altura o jogo estava 1 x 0 e o Cruzeiro ensaiava uma reação.

O jogo em si foi muito mais decidido em termos de estratégia do que propriamente na parte tática, mas o Cruzeiro soube explorar bem alguns pontos fracos do Atlético Mineiro e venceu merecidamente.

O onze inicial

No 1º tempo, Diego Souza e Everton Ribeiro ocuparam os volantes adversários para dar liberdade a Dagoberto nas costas de Marcos Rocha pela esquerda

No 1º tempo, Diego Souza e Everton Ribeiro ocuparam os volantes adversários para dar liberdade a Dagoberto nas costas de Marcos Rocha pela esquerda

Marcelo Oliveira mandou o 4-2-3-1 usual a campo, com duas mudanças na linha defensiva de Fábio: Paulão na vaga do suspenso Bruno Rodrigo e Egídio promovido à lateral esquerda. Léo e Ceará na direita completaram a defesa. Leandro Guerreiro se plantou na cabeça da área, tendo Nilton a seu lado como suporte. À frente, Diego Souza se movimentava, ajudado por Everton Ribeiro à direita e Dagoberto pela esquerda, no posicionamento mais espetado de costume. Borges foi a referência dentro da área ofensiva.

O Atlético Mineiro de Cuca,  também no 4-2-3-1, veio com a mesma defesa do primeiro jogo, contrariando expectativas pela volta de Leonardo Silva à zaga. O gol de Victor foi mais uma vez defendido por Réver e Gilberto Silva, flanqueados por Marcos Rocha pela direita e Richarlyson pela esquerda. No lugar do suspenso Pierre, Josué fez a dupla volância com Leandro Donizete. E à frente, o quarteto ofensivo costumeiro: Tardelli partindo da direita, Bernard da esquerda, Jô de centro-avante e Ronaldinho na faixa central.

Estratégias

Com grande vantagem no placar agregado, o Atlético Mineiro jogou todo o primeiro tempo se poupando. Talvez já estivessem pensando na partida pela Libertadores, mas não foi a postura “normal” do time rival, aquela que vem arrancando elogios pelo Brasil afora: intensidade e marcação avançada. Um estilo de jogo que se encaixa mais na proposta cruzeirense, de rodar a bola, cadenciar e esperar os momentos certos para acelerar o jogo. Assim, os quatro homens de frente dos visitantes limitaram-se a dar o primeiro combate na linha de meio-campo, tentando pegar um erro de passe do Cruzeiro para encaixar um contra-ataque.

Porém, o Cruzeiro foi paciente, mesmo sabendo que devia fazer três gols e não levar nenhum para ser campeão. Tocou a bola com paciência e aos poucos achou as brechas na marcação atleticana. Mas não sem se arriscar, pois assim é o futebol, e o Atlético Mineiro teve algumas chances em contra-ataques nas costas dos laterais — mais especificamente Egídio, que apoiava com mais intensidade. Do outro lado, Ceará venceu mais uma vez o duelo com Bernard e foi seguro na marcação, apoiando só na boa.

Caminhos do gol

Com os flancos bloqueados, restou ao time rival atacar pelo centro. Mas Ronaldinho se aquietou diante da ótima marcação individual de Leandro Guerreiro — que desta vez se limitou a fazer apenas isso, como na partida inaugural da temporada. Assim, restou a Jô tentar desarrumar a defesa cruzeirense. O grandalhão até que ganhou alguns duelos individuais, mas sempre havia mais cruzeirenses que atleticanos na segunda bola, e assim a principal jogada aérea estava comprometida.

No Cruzeiro foi o inverso. Richarlyson era lateral zagueiro e quase nunca apoiava, mas o ímpeto ofensivo natural de Marcos Rocha abria espaço às suas costas. Dagoberto explorou muito bem este setor, ajudado pela movimentação de Diego Souza e Éverton Ribeiro, que ocupavam os volantes adversários em duelos sem claros vencedores, obrigando Gilberto Silva a fazer a cobertura no um contra um. Assim nasceu o lance do primeiro pênalti. O drible veloz venceu a experiência e o próprio Dagoberto converteu o pênalti sofrido.

A desvantagem no placar não mudou a postura do time visitante, que continuava assistindo a posse paciente do Cruzeiro e tentando partir em velocidade. O lance do segundo pênalti mostra a diferença de atitude: Richarlyson foi tranquilo demais para uma bola que parecia perdida, enquanto Borges foi com sede ao pote, resultando no pênalti convertido que reduziu a vantagem atleticana ao mínimo.

Segundo tempo

Sem alterações, os times voltaram com posturas diferentes. O Atlético Mineiro avançou a marcação e tentou ficar mais com a bola nos pés, e aí o jogo mudou de lado. O time visitante tentou sair pro abafa para marcar logo o gol que praticamente selaria o caneco. Mas o Cruzeiro se defendia bem e só deixou a meta de Fábio ser ameaçada em um chute de Jô na trave. Mas esse estilo de jogo não era suficiente, pois o Cruzeiro precisava de mais um gol e não de se defender, e por isso Marcelo Oliveira mandou Ricardo Goulart na vaga de Diego Souza. Goulart é mais criativo e tentaria passes mais incisivos.

A alteração surtiu algum efeito, já que o jogo ficou mais equilibrado, com uma chance de cada lado: Réver em cabeceio para linda defesa de Fábio e Borges em lance de contra-ataque que Victor defendeu. Logo depois desse lance, ele sairia para Anselmo Ramon, numa tentativa de Marcelo Oliveira de usar o feitiço contra o feiticeiro: bola longa para o pivô disputar de cabeça ou segurar para os companheiros chegarem, afastando o time rival da área defensiva.

Erro fatal

No fim, o Cruzeiro foi para o abafa, muito mais na vontade, mas não superou a linah de 5 defensores do rival

No fim, o Cruzeiro foi para o abafa, muito mais na vontade, mas não superou a linha de 5 defensores do rival

Durante dez minutos, nos quais houve somente trocas diretas — Ceará por Mayke, e no rival, Bernard por Luan, e Jô por Alecsandro — o jogo ficou aberto, com qualquer lado podendo marcar. O Cruzeiro teve chances e ensaiava um domínio quando Egídio, que ironicamente era um dos melhores do jogo, errou um passe e entregou a bola para Luan, que avançou pra cima de Léo. O próprio Egídio dobrou a marcação com o zagueiro e Luan caiu dentro da área. O pênalti inexistente foi marcado, e o gol do rival esfriou o que poderia ser um fim de jogo eletrizante.

A partir daí o Cruzeiro foi pra cima mais na vontade. O Atlético se contentou em segurar o Cruzeiro, sabendo que agora tinha dois gols de vantagem. Na única alteração tática da partida, Cuca mandou Leonardo Silva a campo na vaga de Diego Tardelli, fechando a porta da área num 5-3-1-1 com o recuo dos alas para a linha dos três zagueiros e explorando o contra-ataque, que agora era cedido amplamente pelo Cruzeiro. Marcos Rocha quase faz um golaço assim, mas Fábio salvou.

O Cruzeiro ainda teve algumas finalizações, e Luan ainda seria expulso por falta em Dagoberto, faltando três e acréscimos para terminar, mas se sentou no gramado após o cartão e a confusão que se sucedeu enterrou as esperanças dos gols necessários.

Foi por pouco

A segunda vitória do Cruzeiro sobre o rival no ano foi inconteste e merecida, provando que o time atleticano não está tão à frente como pregam. O título não veio, mas a vitória, com autoridade, mostrou que o Cruzeiro tinha sim time para fazer frente ao tão “badalado” rival também no primeiro jogo. Não há como negar que a expulsão de Bruno Rodrigo foi fator determinante para o placar elástico naquela partida.

Com cinco meses de trabalho, um time ainda em formação conseguiu equilibrar uma decisão praticamente perdida contra uma equipe que joga junto há dois anos. O início de trabalho é excelente. É claro que os jogadores precisam se entrosar ainda mais, tendo em vista que alguns jogadores ainda nem estrearam, como Dedé e o possível volante passador que virá, assim como o próprio Marcelo Oliveira precisa conhecer mais as características de seus jogadores e ter a leitura correta do jogo em situações adversas.

Assim, se o Cruzeiro fosse campeão, não seria nada surpreendente. Apenas serviria para alertar o Brasil todo o que nós, cruzeirenses, já sabemos desde o ínicio da temporada: o bom e velho Cruzeiro está de volta e vai brigar na frente nesta temporada. Por outro lado, o fato de não termos campeonado tenha este único aspecto bom: ninguém vai olhar para nós como favoritos, e todos apostarão suas fichas em outras equipes. Enquanto isso o Cruzeiro vai comendo pelas beiradas, e quando prestarem atenção, já estaremos à frente.

Como bons mineiros.

Cruzeiro 2 x 0 América/TO – Cada um pega o seu

Assim como no jogo contra o rival, Anselmo Ramon — desta vez oficialmente — e Dagoberto foram às redes novamente para dar a segunda vitória ao Cruzeiro em dois jogos na temporada 2013. Entretanto, o jogo teve um ritmo bem mais calmo, com o América de “Tocantins” bem recuado para tentar parar o criativo e rápido ataque celeste.

Escalação inicial do Cruzeiro no já costumeiro 4-2-3-1, aqui com Everton Ribeiro liberando o corredor pra Ceará e Everton e Egídio alternando do outro lado

Escalação inicial do Cruzeiro no já costumeiro 4-2-3-1, aqui com Everton Ribeiro liberando o corredor pra Ceará e Everton e Egídio alternando do outro lado

Sem Leandro Guerreiro, suspenso por marcar Ronaldinho Gaúcho, Marcelo Oliveira mandou Tinga em seu lugar. O sistema e os outros dez eram os mesmos do jogo anterior: o 4-2-3-1 tinha Fábio no gol e sua linha defensiva com Ceará à direita, Egídio à esquerda e os zagueiros Bruno Rodrigo e Paulão. Nilton e Tinga davam suporte para a trinca de meias composta por Everton Ribeiro, Ricardo Goulart pelo meio e Everton à esquerda, todos atrás de Anselmo Ramon.

Confesso que, das arquibancadas do Mineirão, demorei a entender o esquema com o qual Gilmar Estevam armou o América. Com a proposta de marcação individual, pura e simples, a equipe passou a maior parte do jogo num 4-3-2-1, também conhecida como “árvore de natal”. O goleiro Eládio tinha à sua frente a defesa composta por Iran à direita, Elder e Rodrigo Sena centralizados e Daniel à esquerda. Os volantes Felipe Dias, Luisinho e Matheus Gonzaga marcavam um meia cada um. Luciano Mourão era o responsável pela ligação e Almir subia e descia o campo. Só Erivelto ficava mais à frente.

Jogo de um time só

Se antes do jogo já estava claro que o América iria estrear no Mineirão para não perder, com este sistema, ficou ainda mais visível a proposta de tentar parar o ataque cruzeirense. Eram três volantes, um pra cada meia adversário. Isso fazia os laterais ficarem bem fundos, esperando o lateral adversário subir. Por vezes, parecia que o time visitante tinha escalado dois laterais de cada lado. A dupla de zaga brigava contra Anselmo Ramon, para garantir a sobra. E, como se não bastasse todo esse aparato defensivo, Luciano Mourão e Almir, o segundo atacante ainda se aproximavam dos volantes azuis para fechar as linhas de passe. Só Erivelto, o camisa 9, ficava à frente, mas sem fazer pressão sobre os zagueiros celestes.

Domínio total, com destaque para o número barcelonístico de passes

Domínio total, com destaque para o número barcelonístico de passes

Isso resultou em grande posse de bola para o Cruzeiro. De acordo com os números da Footstats, publicados pelo site da ESPN Brasil, em 67,52% do tempo que a bola rolou, estava em pés azuis. Outros números comprovam o domínio: veja na imagem ao lado.

Destes números, o que mais chama a atenção é o de passes: O Cruzeiro alcançou uma marca “a la Barcelona” de 653 passes trocados durante a partida, com somente 48 erros — mais de 92% de aproveitamento. Uma média excelente, e que expressa bem o que foi a partida. Naturalmente (devido ao adversário, estreia no Mineirão e outros fatores), a intensidade do time celeste foi bem menor do que no jogo anterior. Por isso o Cruzeiro foi bem mais paciente, tocando bem a bola, rodando para tentar furar o ferrolho teófilo-otonense, gerando estes números.

Os caminhos do gol

Considerando, portanto, que praticamente se tratava de um jogo ataque contra defesa, e que a defesa já foi analisada nos parágrafos acima, passemos ao time atacante.

Pela direita, era Ceará quem dava amplitude — termo usado para designar a distância entre os jogadores horizontalmente, “alargando o campo”, para tentar abrir a defesa adversária. Normalmente, num 4-2-3-1, quem faz isso é o ponteiro, com o suporte na intermediária do lateral. Mas Everton Ribeiro se aproximava mais de Ricardo Goulart no centro para dar opções, liberando o corredor direito para o apoio de Ceará. Daniel ficava esperando o experiente lateral, que mesmo assim conseguiu ganhar em algumas jogadas e mandar a bola para a área.

Do outro lado, Everton e Egídio revezavam como ponteiro e lateral, dando muito trabalho para o volante Felipe Dias (que estava a cargo de marcar Everton) e o lateral Iran (que ia mais à frente bater com Egídio), gerando até uma pequena discussão entre os dois, A troca de posições confundiu a marcação e o Cruzeiro chegava com frequência por aquele lado também.

E finalmente, pelo meio, Ricardo Goulart até tinha um bom timing de tentar um passe mais profundo, mas ainda precisa acertar a força do passe. Ou seja, o passe era dado na hora certa, sem deixar o jogador que corre em profundidade impedido, mas a bola era forte demais ou de menos, sempre ficando mais para os defensores. De qualquer forma, ele contribuiu bastante para ocupar um marcador e tentar abrir o jogo para seus companheiros. Tinga e Nilton tentavam participar da construção ofensiva, o primeiro mais que o segundo, mas não tem a mesma visão e criatividade dos meias.

Em todos os casos, o Cruzeiro esbarrava no famoso último passe, aquele que deixa o companheiro na cara do gol, em condições de finalizar. Minha digníssima esposa, me acompanhando no jogo — também para conhecer o estádio — já estava ficando impaciente com todas as bolas que o time jogava na área nas mãos de Eládio. Mas no primeiro lance em que isso não aconteceu a bola foi às redes. Tinga achou Ceará livre pelo lado direito, aproveitando a desatenção de Daniel. O “2” cruzou rasteiro para a chegada de Anselmo Ramon, que completou de letra, para dar justiça ao placar.

Intervalo

Como era esperado, Dagoberto entrou no jogo, mas novamente quem saiu não foi Egídio, como se pensava, e sim Ricardo Goulart. Marcelo Oliveira certamente pensou que o América não arriscaria mesmo estando atrás no placar, e que continuaria defensivo. Por isso, Dagoberto, que marca menos que Everton Ribeiro, foi ser o ponteiro direito, deslocando Everton Ribeiro para o meio. E se o jogador não foi brilhante tecnicamente, mostrou que tem muita estrela, assim como no jogo contra o rival: mal entrou e deixou sua marca, desta vez convertendo pênalti.

No fim, Cruzeiro manteve o 4-2-3-1, mas com bem menos intensidade. Dagoberto nem precisou ter trabalho defensivo

No fim, Cruzeiro manteve o 4-2-3-1, mas com bem menos intensidade. Dagoberto nem precisou ter trabalho defensivo

Com a excelente vantagem, o Cruzeiro naturalmente se acomodou. Gilmar Estevam, com isso, perdeu um pouco de medo e tentou sair um pouco de trás, colocando Edilson para criar ao lado de Luciano Mourão, tirando Iran do jogo e oficializando Felipe Dias na lateral direita. Um clássico 4-2-2-2 “brasileiro”, o famoso quadrado no meio-campo. Mas o jogador mal tocou na bola, pois ela continuava na maioria do tempo em poder do time da casa. Egídio saiu para a entrada de Alisson, que foi jogar de ponteiro esquerdo, passando Everton à lateral esquerda. E o futebol do camisa 23 cresceu, e ele chegou na área em condições de finalizar algumas vezes.

Vendo as ameaças, Gilmar Estevam voltou atrás e pôs Nilo, zagueiro, na vaga de Matheus Gonzaga. Os laterais subiram para o meio e estava configurado o 3-4-2-1: Felipe Dias, agora lateral, e Daniel flanqueavam Luizinho e Edilson — mais ajudando na marcação que criando — na linha de 4 do meio. Marcelo Oliveira ainda colocaria o garoto Vinicius Araújo na vaga de Anselmo Ramon, mantendo o sistema, mas o jovem teve poucas chances para aproveitar, principalmente porque o resto do time tirou o pé no segundo tempo.

Perspectivas de um futuro animador

O Mineirão, na noite de quarta, estava iluminado com luzes azuis em seus pórticos. As redes, pra quem não reparou, eram azuis e brancas. A torcida foi em bom número, considerando que o jogo estava passando na TV, estava programado em um horário ruim e o ingresso era caro. Este não são fatores táticos, claro, mas somados ao fato de que Marcelo Oliveira quer implantar uma filosofia de posse de bola e futebol vistoso — que sempre foi a característica cruzeirense — criam uma atmosfera que faz a torcida suspirar por bons momentos em 2013. As últimas notícias dão conta de que os jogadores estão felizes e imbuídos de um objetivo comum, que é reerguer o Cruzeiro ao lugar onde sempre esteve: o céu.

Mas é preciso ter os pés no chão. Ainda há muito o que melhorar, mas estamos no caminho certo. Que o Carnaval não nos faça perder o embalo, mas que sirva pra amenizar um pouco e trazer os pés de toda a Cruzeiridade um pouco mais para o chão — afinal de contas é precisa ter cautela no início da temporada.

Bom carnaval a todos e usem camisinha.