Atlético/PR 2 x 2 Cruzeiro – Futebol de lama

Abro a análise de hoje com a síntese do jogo que o técnico Marcelo Oliveira deu ao repórter do Premiere FC após a partida.

“Foram tempos distintos. O Atlético nos dominou no primeiro tempo, se adaptou melhor ao gramado — se é que posso chamar de gramado. Então foi chutão pra lá e pra cá, [o Atlético] aproveitou da bola parada e da segunda bola. E nós equilibramos no segundo tempo, fizemos alguns contra-ataques importantes, e desperdiçamos. Mas acho que ficou de bom tamanho, foi justo o empate.”

Marcelo fala de três fatores determinantes para o resultado de hoje: (1) o arremedo de gramado prejudica a execução de qualquer estratégia que não seja (2) a bola longa e a bola parada. E foi usando exatamente desse expediente que o Cruzeiro mudou a forma de jogar no segundo tempo e conseguiu (3) contra-ataques que poderiam resultar em mais três pontos.

Porém, há outros aspectos que também devem ser levados em conta.

Escalações

A grande distância entre os volantes e os meias e a sobrecarga pelo lado esquerdo dificultaram o jogo cruzeirense na primeira etapa

A grande distância entre os volantes e os meias e a sobrecarga pelo lado esquerdo dificultaram o jogo cruzeirense na primeira etapa

Marcelo mandou a campo o 4-2-3-1 de sempre, o que hoje pode ser considerado o time titular. A linha defensiva que protegia o gol de Fábio era formada por Dedé e Bruno Rodrigo na zaga, ladeados por Ceará à direita e Egídio do outro lado. Leandro Guerreiro e Nilton, este último ligeiramente mais avançado, faziam a proteção à área. Everton Ribeiro era o ponteiro direito, com a famosa tendência a centralizar e se juntar a Diego Souza, o meia central. Na ponta esquerda, Dagoberto ficava um pouco mais espetado e procurava se juntar a Borges, na frente.

O Atlético Paranaense do técnico Ricardo Drubscky entrou num 4-3-3 clássico, com um volante e dois meias (4-1-2-3). O gol de Weverton foi defendido por Léo na lateral direita, Manoel e Cleberson no miolo e Pedro Botelho à esquerda. Deivid foi o volante mais preso, liberando João Paulo e Everton para se juntarem ao ataque, formado por Ederson na ponta direita, Marcão centralizado e Felipe pela esquerda.

Terrestre x aéreo

O Cruzeiro tinha confiança que ia superar o péssimo estado do gramado tentando jogar da mesma forma de sempre: trocando passes, cadenciando e girando a bola. Mas o gramado venceu essa batalha prejudicando muito a estratégia celeste, simbolizada num lance em que Everton Ribeiro pega uma sobra de bola e passa a Borges. A devolução do camisa 9 foi boa, e Everton Ribeiro se posicionou de forma a esperar a bola que certamente chegaria em seus pés se o gramado fosse minimamente razoável, mas que ficou presa em uma poça de lama que freou sua trajetória, atrasando o que seria um excelente contra-ataque.

Já o Atlético não quis saber de transições pelo chão e jogava a bola longa pelo alto. Foi assim que o Atlético Paranaense chegava com facilidade à frente da área cruzeirense. Pra essa estratégia funcionar, entretanto, é preciso que o time atacante pegue a segunda bola. Chama-se de” segunda bola” a sobra da disputa de cabeça pelo alto, que é a “primeira bola” Quando treinadores falam que o jogo foi de primeira e segunda bola, eles querem dizer “disputas pelo alto e vamos ver quem pega a sobra”.

Descompactação

No Atlético, a ligação direta quase sempre procurava Marcão, que disputava na maioria das vezes com Dedé. Ele não ganhou muitas, mas a segunda bola era sempre do time da casa, isso porque os setores do Cruzeiro estavam muito espaçados. Marcelo queria a marcação no alto do campo, e quarteto ofensivo tentava fazer isso, mas a zaga e os volantes era pressionados pra trás pela bola longa, abrindo um clarão de Guerreiro e Nilton aos três meias. A segunda bola quase sempre caía por ali, e com isso os jogadores de meio do Atlético avançavam com a bola dominada quase sempre com pouca marcação.

Dois contra um

Mas a parte mais vulnerável do time era o lado esquerdo da defesa. Ricardo Drubscky certamente estudou o Cruzeiro e notou que o trabalho defensivo de Dagoberto por aquele setor não é tão intenso. Ele escalou Léo, um jovem lateral com muito ímpeto ofensivo e grande velocidade, e Ederson, também muito veloz e driblador. Sem Dagoberto para auxiliar na marcação, Egídio se viu sobrecarregado e precisou da ajuda constante dos volantes Nilton e Guerreiro. Em uma jogada específica é possível ver os dois volantes celestes jogando por aquele lado, deixando a direita e o meio totalmente desprotegidos.

Com essa dificuldade, o Cruzeiro cometia sucessivas faltas, deixando a oportunidade da bola aérea em sua própria defesa. Todos os fatores combinados originaram os gols da equipe da casa. Falta cometida por Guerreiro pela esquerda, bola na área, a defesa afasta mal e a bola volta. Sem marcação, do outro lado, o lateral esquerdo Pedro Botelho completou no canto de Fábio. Depois, mais uma falta pela esquerda, e desta vez Manoel completou a bola aérea em falha dos dois zagueiros do Cruzeiro, que subiram errado na bola e deixaram o zagueiro atleticano livre.

O feitiço contra o feiticeiro

Ainda no fim do primeiro tempo, o jovem Léo sentiu uma lesão e foi substituído pelo volante Derley na lateral direita. Isso representou um alívio imediato para Egídio, e também para Dagoberto, que agora não precisava voltar tanto já que Derley era muito mais marcador que Léo. Com menos pressão, Egídio começou a se aventurar mais na frente, e foi numa falta sofrida pelo lateral cruzeirense em tabela com Diego Souza — naquele momento pela esquerda, com Dagoberto pela direita e Everton Ribeiro no meio — que o empate começou a ser construído. Cobrança de Dagoberto, a zaga afasta mal e Dedé, de pé esquerdo, jogou mansinho para o gol.

No intervalo, Marcelo Oliveira percebeu que o jogo tinha que ser feio: muito mais físico do que técnico. Aproveitou a indisposição de Dagoberto para lançar Luan, muito menos driblador mas bem mais forte, pelo lado esquerdo do campo. O empate veio no primeiro toque do camisa 88 na bola, numa jogada que ilustra como o Cruzeiro teve que mudar sua estratégia de jogo. Logo na saída, bola longa para Luan disputar pelo alto. A bola sobrou pra Borges, que foi desarmado, mas depois também sobrou limpa para Luan completar de fora da área.

Taticamente mais preso àquele setor, Luan não só segurou Derley por ali como também voltava muito mais para marcar do que Dagoberto, praticamente anulando as investidas de Ederson pela direita do ataque atleticano. Com Egídio mais livre, era Ederson quem tinha que voltar, e com isso a situação se invertia: o lado esquerdo do Cruzeiro, direito do Atlético Paranaense, antes o caminho do gol para o time da casa, era agora vantajoso para o time celeste.

Contra-ataques

A entrada de Luan e o recuo da linha ofensiva ajudaram a resolver os problemas da primeira etapa e o Cruzeiro por pouco não conseguiu a virada

A entrada de Luan e o recuo da linha ofensiva ajudaram a resolver os problemas da primeira etapa, e o Cruzeiro por pouco não conseguiu a virada

O jogo de fato ficou bem mais feio, mais pegado e disputado, e com muito menos técnica. Celso Roth diria que era um jogo não para se jogar, mas para se “competir”. E o Cruzeiro entendeu bem isso, disputando cada bola e equilibrando a partida na base da força. O Atlético sentiu o empate e procurava ficar mais com a bola. Mas Marcelo Oliveira certamente pediu para seus homens de frente marcarem atrás da linha do meio-campo, e a aproximação dos setores compactou o time fechando todas as brechas. A segunda bola já não era sempre do time da casa, e não havia brechas por onde entrar.

Com o time mais recuado, o Cruzeiro chamava o Atlético a seu campo e partia em contra-ataques, quase sempre usando a bola longa para Luan ou Borges. Numa jogada, Egídio pegou uma segunda bola e achou Diego Souza pela esquerda, que fez o pivô e mandou a Borges sozinho na área. O cabeceio veio fraco, mas o lance ilustra como o Cruzeiro teve chances em jogadas de velocidade e pelo alto. Luan ainda teria mais duas oportunidades, e também Everton Ribeiro para decretar a virada, mas o placar insistiu no empate.

As outras trocas feitas pelos treinadores não alteraram as plataformas táticas nem as estratégias de jogo. Borges por Anselmo na referência, Everton Ribeiro por Ricardo Goulart na meia, mandando Diego Souza para a direita. No Atlético, as trocas foram diretas e simples, e o 4-3-3 se manteve até o fim.

Números e o “gramado”

Ao invés de fazer uma conclusão, darei aqui alguns números que provam como o Cruzeiro poderia ter saído com os três pontos se não tivesse errado tanto. Ambos os times acertaram 50% de suas finalizações, mas o Cruzeiro finalizou 18 vezes, contra 14 do Atlético. Considerando que o Atlético teve mais posse de bola (60% x 40%), o Cruzeiro foi mais eficiente e chegou mais ao gol adversário — fruto da estratégia do segundo tempo.

O site da ESPN Brasil também disponibiliza os números da Footstats de tempo de posse de bola por setor do campo. O Atlético passou 42,47% do tempo com a bola em seu lado direito, e o Cruzeiro 43,09%, mostrando como o jogo se concentrou naquele lado do campo. Também, o Cruzeiro foi a equipe que passou menos tempo em seu meio-campo do que nos setores de ataque e defesa nesta rodada, ilustrando bem o jogo de bola longa que o gramado permitia.

O jogo de hoje mostrou que o Cruzeiro tem capacidade de adaptação e elenco variado e heterogêneo, aspectos quase indispensáveis para se almejar o título. Por outro lado, também mostrou algumas falhas, como erros em bolas aéreas e algumas decisões estratégicas equivocadas, mas estes fatores foram causados mais pelo péssimo estado do campo do que propriamente pelo adversário.

Como acho difícil jogarmos novamente em um gramado tão ruim, o Cruzeiro ainda está muito credenciado ao título.

Cruzeiro 5 x 0 Goiás – Erros e acertos

Com dois gols de Nilton, que somado aos de Bruno Rodrigo e Diego Souza somam quatro em jogadas de bola parada, o Cruzeiro goleou o Goiás na estreia do Brasileirão e já contabiliza uma rodada na liderança.

Muitos disseram que o Goiás errou muito, e por isso o resultado. Os erros na marcação contribuíram, mas não há como negar o mérito cruzeirense em provocar estes erros: os escanteios não aconteceram porque o Goiás errou, mas sim porque o Cruzeiro atacou com qualidade. Não fosse uma ótima atuação do goleiro Harlei, o placar poderia ser ainda maior.

Escretes iniciais

O 4-2-3-1 costumeiro, mas com Egídio e Dagoberto se alternando como quarto homem de meio e Borges fugindo da zaga goiana

O 4-2-3-1 costumeiro, mas com Egídio e Dagoberto se alternando como quarto homem de meio e Borges fugindo da zaga goiana

Marcelo Oliveira parece ter se decidido num time titular e repetiu a escalação da partida contra o Resende: Fábio; Ceará, Dedé, Bruno Rodrigo e Egídio; Leandro Guerreiro e Nilton; Everton Ribeiro, Diego Souza e Dagoberto; Borges. O mesmo 4-2-3-1 usual, que você leitor, já está acostumado a ver por aqui.

Foi difícil precisar o sistema tático do Goiás. O goleiro Harlei teve uma linha de quatro na defesa: Vítor na lateral, Ernando e Valmir Lucas no miolo e William Mateus na esquerda. À frente da defesa, Amaral fazia a proteção. Na frente Walter atuava centralizado, tendo o suporte de Araújo pela esquerda e Renan Oliveira partindo da direita e se movimentando. Na recomposição, Renan Oliveira fechava o lado direito e Hugo ficava centralizado, formando uma linha de três. A dúvida ficou por conta do posicionamento de Thiago Mendes. Então é provável que fosse um 4-2-3-1, ou no máximo um 4-1-4-1 desconjuntado, com o camisa 8 do time goiano mais recuado que o normal.

O sistema foi difícil de identificar o meio-campo do Goiás praticamente não participou do jogo. O time visitante optava pela ligação direta com Walter, que não conseguiu vencer nenhum duelo contra Dedé e Bruno Rodrigo, muito seguros. Araújo foi bem marcado por Ceará e nada fez, e Renan Oliveira, que em teoria era o principal articulador, pouco tocou na bola ante a forte marcação de Leandro Guerreiro.

Forte lado esquerdo

Quando o Cruzeiro tinha a bola, vários foram os fatores para que a meia cancha esmeraldina ficasse perdida na marcação. Os três meias fizeram as trocas de posição habituais, e os ponteiros do Goiás não acompanhavam as descidas dos laterais celestes: nem Araújo voltava com Ceará, nem Renan Oliveira ou Hugo desciam com Egídio.

O mais interessante, entretanto, foi um padrão que já havia acontecido no fim do jogo contra o Resende: as rotas de Egídio. O lateral esquerdo tem frequentemente procurado o centro enquanto Dagoberto dá amplitude pela esquerda, num movimento “inverso” ao que fazem Everton Ribeiro e Ceará na direita. Assim ele conseguiu ficar sozinho para arriscar a primeira finalização do jogo, e assim ele deu a assistência para o gol de Borges, o terceiro do Cruzeiro.

Mas o camisa 6 não deixa de fazer a ultrapassagem quando Dagoberto tenta cortar pra dentro para usar a sua melhor perna, a direita. Essa variação confundiu totalmente o lateral direito Vitor, que ficou sobrecarregado na marcação e não foi ao apoio uma única vez.

Foi daquele lado que veio a falta que originou o primeiro gol. Diego Souza aproveitou a lambança da zaga do Goiás pra fazer o primeiro gol celeste no Brasileirão. Erro do adversário, sim, mas mérito de Diego que ali estava no lugar certo. É possível notar que Diego pára de ir em direção ao gol, enquanto a defesa goiana continua correndo pra trás.

Borges

Também foi do lado esquerdo que saiu a jogada que originou o escanteio do segundo gol. Dagoberto recebe, procura o centro e aciona Borges. O camisa 9 quase sempre vencia os zagueiros do Goiás no giro quando duelava no um contra um. A finalização saiu forte, mas Harlei espalmou. Na cobrança do tiro esquinado, Bruno Rodrigo ganhou pelo alto e aumentou a contagem.

Borges também saía da área e fugia da marcação dos zagueiros goianos. Em contra-ataque puxado por Nilton, ele vinha correndo pelo lado esquerdo, longe do alcance de Ernando e Valmir Lucas. Como é de sua característica, assim que chegou perto o suficiente, mandou a bomba, para mais uma vez Harlei espalmar para escanteio. Desta vez foi Nilton quem apareceu para completar a cobrança de escanteio e fazer o terceiro.

O quarto gol foi tanto um prêmio pela boa movimentação de Borges quanto uma boa ilustração dos dois conceitos aqui expostos: Dagoberto e Egídio tabelam pela esquerda, com o lateral correndo para o centro e destruindo a marcação goiana. Borges fugiu de seu marcador e apareceu livre para receber o passe. A defesa ficou pedindo um impedimento que não existiu e Borges fuzilou. Desta vez Harlei não conseguiu espalmar para escanteio.

Entrando com a garotada

O intervalo veio com o jogo já definido. Mas Enderson Moreira ainda tinha esperança de diminuir o prejuízo e tirou Hugo, inoperante no meio-campo, para a entrada do meia Ramon. Era uma tentativa de dar um pouco mais de posse de bola e criatividade no meio-campo, para evitar as ligações diretas. A grande vantagem que o Cruzeiro tinha no placar fez com a equipe naturalmente tirasse o pé, e com isso a alteração surtiu algum efeito, no sentido de que o Cruzeiro parou de jogar na intensidade que vinha jogando e o Goiás tinha mais a bola, mas sem ter chances reais.

Mas o Cruzeiro chegava facilmente quando acelerava, pelos mesmos atalhos do primeiro tempo. E foi cozinhando o jogo dessa forma. Fábio era um espectador privilegiado, praticamente não sujou o uniforme. Marcelo Oliveira, porém, queria mais, e com o jogo controlado, lançou os garotos para tentar reacender o time: Élber entrou na vaga de Diego Souza e Lucca na de Everton Ribeiro. No início Élber foi ser ponteiro esquerdo e Lucca o direito, ao contrário do esperado, mas poucos minutos depois inverteram. Com isso Dagoberto passou a ser o meia central, uma posição diferente da que está acostumado.

No Goiás, os leves e rápidos Júnior Viçosa e Eduardo Sasha entraram nas vagas dos pesados Araújo e Walter — neste último caso, literalmente. O ataque do Goiás passou a se movimentar mais, e Eduardo Sasha chegou a finalizar duas vezes à direita de Fábio. Se Enderson Moreira tivesse começado com eles, talvez os zagueiros do Cruzeiro teriam mais problemas.

A última alteração foi a entrada de Ricardo Goulart na vaga de Dagoberto, completando a troca da linha de três meias. À exceção do gol de Nilton, em mais um cabeceio de escanteio, nada de mais importante aconteceu no jogo.

Erros e acertos

É claro que os erros de marcação do Goiás, principalmente nas bolas paradas, contribuíram para o resultado. Mas estamos vendo por aí favoritos ao título jogando contra times que também erram muito, e no entanto o placar não foi tão elástico, ou sequer favorável. O Cruzeiro só fez o que todo time em busca do título deve fazer: aproveitar destes erros sem dó nem piedade. Além disso, o outro time só erra quando o adversário causa as situações para o erro.

Assim, podemos dizer que, se o Goiás errou muito, o Cruzeiro acertou muito. Tanto tecnicamente (vitórias em disputas pessoas, por exemplo) como taticamente (a movimentação ofensiva que anulou a retaguarda goiana). Neste aspecto, aliás, Marcelo parece ter arrumado uma solução para o volante ofensivo que o Cruzeiro não tem, e que este blog vem levantando há algumas partidas. Ao invés de escalar um volante com chegada e perder o poder de marcação no meio, este papel pode ser exercido alternadamente por Everton Ribeiro ou Egídio, quando centralizam, ou Dedé, quando vai à frente.

Esses movimentos mostram que o encaixe do time está vindo bem mais rápido que o esperado. Estamos no caminho certo.

Cruzeiro 4 x 0 Resende – Placar “mentiroso”

Quem lê este título pode achar que este blogueiro ficou maluco. Afinal o Cruzeiro foi bem superior ao Resende ontem no Mineirão pela Copa do Brasil e mereceu a vitória elástica. Mas o título tem razão de ser: o Cruzeiro foi tão superior que deveria ter feito mais gols, caso tivesse acertado mais o pé nas finalizações.

Taticamente, as novidades foram a liberdade de Dedé e a variação de ritmo de jogo, mostrando novas facetas para a disputa do Campeonato Brasileiro, dignas de um time bem treinado.

Escalações

Os avanços de Dedé e dos laterais foram marcantes no móvel 4-2-3-1 cruzeirense do 1º tempo

Os avanços de Dedé e dos laterais foram marcantes no móvel 4-2-3-1 cruzeirense do 1º tempo

O maleável 4-2-3-1 de Marcelo Oliveira teve Fábio debaixo das traves, Dedé na zaga direita e Bruno Rodrigo na esquerda. Ceará e Egídio, titular mais uma vez, foram os laterais. A dupla de volantes foi a mesma de sempre, Guerreiro e Nilton, atrás do trio Everton Ribeiro, Diego Souza e Dagoberto, todos procurando a referência na área ofensiva, Borges.

Para tentar parar os laterais cruzeirenses, o técnico Paulo Campos escalou o Resende num esquema pouco usual: o 4-4-2 britânico, com duas linhas atrás dos atacantes. Defendendo o gol de Mauro, os zagueiros Admilton e Thiago Sales foram flanqueados por Marcelo à direita e Kim à esquerda. A segunda linha tinha os meias Guto e Rafael Carioca abertos, com Denilson e Valdeci fechando a entrada da área. Na frente, Acosta e Geovani Maranhão.

Estilos de defesa

De cara, o que chamou a atenção foi a pegada cruzeirense. Os jogadores disputavam a bola como se fosse uma final, parecendo

que estavam em desvantagem. Marcação curta e alta, com correria pra roubar a bola o mais rápido possível. Quando tinha a bola, sabia alternar velocidade com a paciência, um pouco diferente do jogo cadenciado que vinha desenvolvendo no início da temporada. Isso é uma grande evolução, já que torna o time mais imprevisível e dificulta bastante o trabalho defensivo adversário.

Se o plano defensivo de Marcelo Oliveira deu certo, o mesmo não pode ser dito do treinador do time visitante. Primeiro porque deixou os atacantes Acosta e Geovani Maranhão na linha do meio-campo, sem pressionar a saída de bola, dando muita liberdade para os zagueiros e volantes cruzeirenses pensarem o jogo sem ser incomodados. E depois porque usou marcação individual por setor — ou seja, o jogador persegue o adversário que ingressar na sua zona até o fim da jogada. Com a movimentação constante do ataque do Cruzeiro, espaços abriam-se em profusão na retaguarda do Resende.

Jogo lateral

Espaços esses que eram aproveitados por Ceará e Egídio. Com os volantes do Resende tentando bloquear a entrada da área pelo meio, era um caminho natural procurar os flancos. Os ponteiros da segunda linha do Resende, Guto e Rafael Carioca, até que tentavam acompanhar os avanços dos laterais cruzeirenses pelo setor, mas eram sobrecarregados com a chegada de trás de Guerreiro e Nilton. Além disso, ainda havia o suporte dos meias. E foram em jogadas nestes setores que se originaram os lances de bola parada dos dois primeiros gols.

Tudo isso contribuiu para que este fosse o jogo em que o Cruzeiro menos tivesse posse de bola pelo meio: apenas 20,98%, bem abaixo da média de 29,03% até o jogo anterior. Pelos lados, os números demonstram a imprevisibilidade do time: aproximadamente 38% de posse pela esquerda e 40% pela direita (números da Footstats disponibilizados no site da ESPN Brasil).

Zagueiro ofensivo

Este ligeiro favorecimento do Cruzeiro pelo lado direito talvez seja explicado pelos constantes avanços de Dedé. Bem na sua característica, o estreante da noite tinha liberdade total para se juntar ao ataque, num movimento que parecia estar treinado há muito tempo. Guerreiro e Nilton se alternavam na recomposição da zaga quando Dedé avançava como homem-surpresa.

O interessante é que esta movimentação é uma forma diferente de resolver um problema que este blog já vem levantando há algum tempo, que é a falta de um volante criativo e ofensivo no meio-campo celeste. Com um dos volantes defensivos cobrindo a zaga, Dedé pode ser este homem, arrastando consigo a marcação e abrindo espaços preciosos para seus companheiros. É claro que a postura defensiva do Resende, tentando evitar uma goleada histórica, contribuiu para que Dedé tivesse todo o espaço que teve. Mas não deixa de ser uma característica que deve ser bem explorada pelo time celeste no Brasileiro.

Segundo tempo

Nilton se machucou no último lance da etapa inicial e teve de ser substituído no intervalo. Marcelo Oliveira escolheu Lucas Silva, e com isso Dedé passou a ficar mais contido, já que o garoto tende a avançar mais para o ataque e dar opção de passe do que os dois volantes titulares. Mas fora isso, não houve nenhuma mudança tática significativa. Já no Resende, Paulo Campos fez uma dupla substituição: Vinicius Casão entrou na vaga de Guto mas ficou mais avançado, numa tentativa de contar os avanços de Egídio; e Deoclécio entrou na vaga de Denilson para cobrir aquele setor, formalizando um 4-3-3 “defensivo”, ou seja, com três jogadores em linha no meio, ao invés do triângulo usual.

Mas logo as três minutos o Cruzeiro ampliaria em contra-ataque bem executado, iniciado por um bote certeiro de Egídio, que passou por Everton Ribeiro antes de Borges fuzilar de fora da área. A imensa vantagem fez com que o Cruzeiro passasse a tocar mais do que dar velocidade, mas sem chegar os níveis alarmantes de preguiça do jogo de ida em Volta Redonda. E o Resende, já sem esperanças de se classificar, simplesmente queria terminar a partida de forma honrosa, talvez marcando um gol num estádio de Copa do Mundo. A soma destes dois fatores fez com que o jogo ficasse um pouco mais lento.

Mais uma estreia

Com a entrada dos jovens, um 4-2-3-1 mais "tradicional", com dois ponteiros de fato e um volante que sai mais para o jogo

Com a entrada dos jovens, um 4-2-3-1 mais “tradicional”, com dois ponteiros de fato e um volante que sai mais para o jogo

Aos 15, Élber entrou na vaga de Everton Ribeiro, mantendo o 4-2-3-1 inicial mas com o garoto bem mais aberto pela direita. No Resende, Acosta daria lugar a Clebson Monga, uma substituição direta de centro-avante por centro-avante. E no Cruzeiro, Dagoberto deixaria o campo para a estreia de Lucca, que também jogou aberto na esquerda.

Renovado com a energia dos jovens, o Cruzeiro passou a buscar mais o gol, e ele naturalmente veio em jogada dos dois ponteiros. Élber recebeu na direita e achou Lucca dentro da área, totalmente sem marcação, que concluiu com eficiência. Gol logo na estreia para um jogador muito promissor, garantindo a goleada “oficial” (porque 3 x 0, para este blogueiro, não é goleada, nem nunca foi).

Agora é o Brasileirão

A classificação para a terceira fase da Copa do Brasil era mais que esperada, e foi com autoridade, com superioridade durante os 180 minutos. O Cruzeiro jogou bem tecnicamente (apesar de algumas finalizações erradas) e taticamente, mostrou ter peças de reposição e vontade mesmo em partidas em que possui grande vantagem. Ainda houve a estreia de dois reforços que pareciam estar entrosados há muito tempo. É o que dizem: em time bem montado, o encaixe de novas peças é mais fácil.

Então, por tudo isso, acredito que o Cruzeiro está preparadíssimo para a disputa do Brasileirão. Alguns comentaristas ainda não colocam o Cruzeiro como favorito: neste guia, por exemplo, o Cruzeiro está no mesmo patamar do Santos — o que é ridículo — e atrás de Botafogo, Inter, Grêmio e São Paulo, que são no máximo do mesmo nível. Mas como não jogamos o Paulista nem o Carioca — que cá pra nós, são campeonatos bem fraquinhos — e estamos fora da Libertadores (por enquanto), ninguém sabe da força do nosso time senão nós cruzeirenses.

Mas talvez assim seja melhor. Cinco rodadas antes da Copa das Confederações mostrarão ao resto do Brasil que o velho Cruzeiro, que todos temem, está de volta.

Cruzeiro 2 x 1 Atlético/MG – Com onze contra onze é outra história

O Cruzeiro venceu o seu rival, consolidando os 100% de aproveitamento no Mineirão em 2013 e quase conseguiu uma título histórico sobre o melhor time que o rival teve nos seus últimos anos. Uma partida que serviu para provar que o caneco era sim uma possibilidade bem real, não fosse a expulsão no primeiro jogo — àquela altura o jogo estava 1 x 0 e o Cruzeiro ensaiava uma reação.

O jogo em si foi muito mais decidido em termos de estratégia do que propriamente na parte tática, mas o Cruzeiro soube explorar bem alguns pontos fracos do Atlético Mineiro e venceu merecidamente.

O onze inicial

No 1º tempo, Diego Souza e Everton Ribeiro ocuparam os volantes adversários para dar liberdade a Dagoberto nas costas de Marcos Rocha pela esquerda

No 1º tempo, Diego Souza e Everton Ribeiro ocuparam os volantes adversários para dar liberdade a Dagoberto nas costas de Marcos Rocha pela esquerda

Marcelo Oliveira mandou o 4-2-3-1 usual a campo, com duas mudanças na linha defensiva de Fábio: Paulão na vaga do suspenso Bruno Rodrigo e Egídio promovido à lateral esquerda. Léo e Ceará na direita completaram a defesa. Leandro Guerreiro se plantou na cabeça da área, tendo Nilton a seu lado como suporte. À frente, Diego Souza se movimentava, ajudado por Everton Ribeiro à direita e Dagoberto pela esquerda, no posicionamento mais espetado de costume. Borges foi a referência dentro da área ofensiva.

O Atlético Mineiro de Cuca,  também no 4-2-3-1, veio com a mesma defesa do primeiro jogo, contrariando expectativas pela volta de Leonardo Silva à zaga. O gol de Victor foi mais uma vez defendido por Réver e Gilberto Silva, flanqueados por Marcos Rocha pela direita e Richarlyson pela esquerda. No lugar do suspenso Pierre, Josué fez a dupla volância com Leandro Donizete. E à frente, o quarteto ofensivo costumeiro: Tardelli partindo da direita, Bernard da esquerda, Jô de centro-avante e Ronaldinho na faixa central.

Estratégias

Com grande vantagem no placar agregado, o Atlético Mineiro jogou todo o primeiro tempo se poupando. Talvez já estivessem pensando na partida pela Libertadores, mas não foi a postura “normal” do time rival, aquela que vem arrancando elogios pelo Brasil afora: intensidade e marcação avançada. Um estilo de jogo que se encaixa mais na proposta cruzeirense, de rodar a bola, cadenciar e esperar os momentos certos para acelerar o jogo. Assim, os quatro homens de frente dos visitantes limitaram-se a dar o primeiro combate na linha de meio-campo, tentando pegar um erro de passe do Cruzeiro para encaixar um contra-ataque.

Porém, o Cruzeiro foi paciente, mesmo sabendo que devia fazer três gols e não levar nenhum para ser campeão. Tocou a bola com paciência e aos poucos achou as brechas na marcação atleticana. Mas não sem se arriscar, pois assim é o futebol, e o Atlético Mineiro teve algumas chances em contra-ataques nas costas dos laterais — mais especificamente Egídio, que apoiava com mais intensidade. Do outro lado, Ceará venceu mais uma vez o duelo com Bernard e foi seguro na marcação, apoiando só na boa.

Caminhos do gol

Com os flancos bloqueados, restou ao time rival atacar pelo centro. Mas Ronaldinho se aquietou diante da ótima marcação individual de Leandro Guerreiro — que desta vez se limitou a fazer apenas isso, como na partida inaugural da temporada. Assim, restou a Jô tentar desarrumar a defesa cruzeirense. O grandalhão até que ganhou alguns duelos individuais, mas sempre havia mais cruzeirenses que atleticanos na segunda bola, e assim a principal jogada aérea estava comprometida.

No Cruzeiro foi o inverso. Richarlyson era lateral zagueiro e quase nunca apoiava, mas o ímpeto ofensivo natural de Marcos Rocha abria espaço às suas costas. Dagoberto explorou muito bem este setor, ajudado pela movimentação de Diego Souza e Éverton Ribeiro, que ocupavam os volantes adversários em duelos sem claros vencedores, obrigando Gilberto Silva a fazer a cobertura no um contra um. Assim nasceu o lance do primeiro pênalti. O drible veloz venceu a experiência e o próprio Dagoberto converteu o pênalti sofrido.

A desvantagem no placar não mudou a postura do time visitante, que continuava assistindo a posse paciente do Cruzeiro e tentando partir em velocidade. O lance do segundo pênalti mostra a diferença de atitude: Richarlyson foi tranquilo demais para uma bola que parecia perdida, enquanto Borges foi com sede ao pote, resultando no pênalti convertido que reduziu a vantagem atleticana ao mínimo.

Segundo tempo

Sem alterações, os times voltaram com posturas diferentes. O Atlético Mineiro avançou a marcação e tentou ficar mais com a bola nos pés, e aí o jogo mudou de lado. O time visitante tentou sair pro abafa para marcar logo o gol que praticamente selaria o caneco. Mas o Cruzeiro se defendia bem e só deixou a meta de Fábio ser ameaçada em um chute de Jô na trave. Mas esse estilo de jogo não era suficiente, pois o Cruzeiro precisava de mais um gol e não de se defender, e por isso Marcelo Oliveira mandou Ricardo Goulart na vaga de Diego Souza. Goulart é mais criativo e tentaria passes mais incisivos.

A alteração surtiu algum efeito, já que o jogo ficou mais equilibrado, com uma chance de cada lado: Réver em cabeceio para linda defesa de Fábio e Borges em lance de contra-ataque que Victor defendeu. Logo depois desse lance, ele sairia para Anselmo Ramon, numa tentativa de Marcelo Oliveira de usar o feitiço contra o feiticeiro: bola longa para o pivô disputar de cabeça ou segurar para os companheiros chegarem, afastando o time rival da área defensiva.

Erro fatal

No fim, o Cruzeiro foi para o abafa, muito mais na vontade, mas não superou a linah de 5 defensores do rival

No fim, o Cruzeiro foi para o abafa, muito mais na vontade, mas não superou a linha de 5 defensores do rival

Durante dez minutos, nos quais houve somente trocas diretas — Ceará por Mayke, e no rival, Bernard por Luan, e Jô por Alecsandro — o jogo ficou aberto, com qualquer lado podendo marcar. O Cruzeiro teve chances e ensaiava um domínio quando Egídio, que ironicamente era um dos melhores do jogo, errou um passe e entregou a bola para Luan, que avançou pra cima de Léo. O próprio Egídio dobrou a marcação com o zagueiro e Luan caiu dentro da área. O pênalti inexistente foi marcado, e o gol do rival esfriou o que poderia ser um fim de jogo eletrizante.

A partir daí o Cruzeiro foi pra cima mais na vontade. O Atlético se contentou em segurar o Cruzeiro, sabendo que agora tinha dois gols de vantagem. Na única alteração tática da partida, Cuca mandou Leonardo Silva a campo na vaga de Diego Tardelli, fechando a porta da área num 5-3-1-1 com o recuo dos alas para a linha dos três zagueiros e explorando o contra-ataque, que agora era cedido amplamente pelo Cruzeiro. Marcos Rocha quase faz um golaço assim, mas Fábio salvou.

O Cruzeiro ainda teve algumas finalizações, e Luan ainda seria expulso por falta em Dagoberto, faltando três e acréscimos para terminar, mas se sentou no gramado após o cartão e a confusão que se sucedeu enterrou as esperanças dos gols necessários.

Foi por pouco

A segunda vitória do Cruzeiro sobre o rival no ano foi inconteste e merecida, provando que o time atleticano não está tão à frente como pregam. O título não veio, mas a vitória, com autoridade, mostrou que o Cruzeiro tinha sim time para fazer frente ao tão “badalado” rival também no primeiro jogo. Não há como negar que a expulsão de Bruno Rodrigo foi fator determinante para o placar elástico naquela partida.

Com cinco meses de trabalho, um time ainda em formação conseguiu equilibrar uma decisão praticamente perdida contra uma equipe que joga junto há dois anos. O início de trabalho é excelente. É claro que os jogadores precisam se entrosar ainda mais, tendo em vista que alguns jogadores ainda nem estrearam, como Dedé e o possível volante passador que virá, assim como o próprio Marcelo Oliveira precisa conhecer mais as características de seus jogadores e ter a leitura correta do jogo em situações adversas.

Assim, se o Cruzeiro fosse campeão, não seria nada surpreendente. Apenas serviria para alertar o Brasil todo o que nós, cruzeirenses, já sabemos desde o ínicio da temporada: o bom e velho Cruzeiro está de volta e vai brigar na frente nesta temporada. Por outro lado, o fato de não termos campeonado tenha este único aspecto bom: ninguém vai olhar para nós como favoritos, e todos apostarão suas fichas em outras equipes. Enquanto isso o Cruzeiro vai comendo pelas beiradas, e quando prestarem atenção, já estaremos à frente.

Como bons mineiros.

Atlético/MG 3 x 0 Cruzeiro – Podia ter sido menos pior

Em Superclássicos como o do último fim de semana — no qual os dois times passam por bons momentos tanto nos resultados quanto no futebol mostrado — qualquer pequeno detalhe faz a diferença. E, para azar nosso, estas diferenças foram todas contra nós: a falha de Éverton, a expulsão de Bruno Rodrigo, substituições questionáveis de Marcelo Oliveira e, principalmente, a diferença na postura defensiva de ambos os times.

Talvez o lance que mais ilustre esta última diferença foi o primeiríssimo de todos. Assim que o juiz apitou, os jogadores do Cruzeiro não tocaram na bola imediatamente, esperando a reação dos rivais, que foi invadir o grande círculo atrás da bola, na ânsia de roubá-la o mais rápido possível. Tiveram de voltar, pois a bola ainda não estava em jogo, mas foi uma boa ilustração de como o Cruzeiro queria estudar o adversário em campo, enquanto o Atlético Mineiro queria pressionar o Cruzeiro e aumentar a velocidade do jogo.

Estratégia inicial

O 4-2-3-1 sem graça do Cruzeiro no primeiro tempo. Repare na falta de setas que indicam movimentação.

O 4-2-3-1 sem graça do Cruzeiro no primeiro tempo. Repare na falta de setas que indicam movimentação.

Nenhuma surpresa na escalação e no sistema de ambas as equipes, o 4-2-3-1. Como previsto, os times tiveram estratégias diferentes com a posse de bola: o Cruzeiro tentava cadenciar, tirando a velocidade do jogo, pois a intensidade favorece o estilo de jogo do rival. O Atlético Mineiro, por sua vez, acelerava assim que roubava a bola, pela mesma razão.

Mas, diferente do que este blogueiro imaginou, os esquemas de marcação também eram diferentes. Enquanto o Atlético Mineiro de fato fazia o encaixe individual por função, ou seja, “cada um no seu”, mas com uma sobra atrás — o Cruzeiro não fez o mesmo. Talvez por falta de entrosamento, mas os jogadores relutaram em sair de suas posições iniciais, fazendo uma espécie de marcação zonal meio capenga. Leandro Guerreiro não foi atrás de Ronaldinho por todo o campo, e o camisa 10 adversário passou por todas as quatro posições ofensivas, trocando frequentemente com Jô e Bernard. Isso confundia a marcação celeste, ilustrada no único lance de real perigo nos quinze minutos iniciais: ligação direta para Ronaldinho que, mesmo marcado por Léo e Ceará, conseguiu girar e bater pro gol, encontrando Fábio.

Desvantagem

Foi então que a intensidade que o Atlético Mineiro queria impor surtiu efeito. Éverton, com a bola dominada, foi pressionado imediatamente por Marcos Rocha e Bernard. Ao invés de se livrar da bola, tentou sair jogando e perdeu para o lateral atleticano, que entrou para dentro do campo e deu a Ronaldinho na esquerda, marcado de longe por Ceará. De primeira, ele achou Jô entrando livre entre os dois zagueiros para abrir o placar. Uma jogada de altíssima velocidade, mas que poderia ter sido evitada se os defensores cruzeirenses tivessem reações mais rápidas após a perda da bola. Coisas que certamente virão com mais entrosamento.

Com o controle do placar, a postura do time mandante mudou. Deixou de fazer pressão no campo adversário e ficava esperando o Cruzeiro em seu próprio campo, que, diferentemente das outras partidas, não se movimentava na frente como deveria. Borges ficou muito preso no duelo com Gilberto Silva, mesmo levando vantagem em certos lances; Éverton Ribeiro sumido com a marcação forte imposta por Richarlyson; Diego Souza tentando variar entre o centro e a direita, mas sem sucesso, e Dagoberto isolado do lado esquerdo.

Sem criatividade de trás — coisa que já falamos neste blog antes — o Cruzeiro não ameaçou o gol de Victor e tomava contra-ataques seguidos. Fábio salvou algumas bolas importantes, garantindo a desvantagem mínima até o fim do primeiro tempo.

Pequena melhora e expulsão

Com vários jogadores amarelados, Marcelo Oliveira resolveu mexer no time, mas tinha que escolher os jogadores que sairiam. Fez uma troca direta, com o nervoso Éverton dando lugar a Egídio, e tirou o apagado e amarelado Éverton Ribeiro para lançar Ricardo Goulart, que foi tentar dar mais criatividade à saída de bola. Deu certo por alguns minutos, com o Cruzeiro aparecendo mais no campo do rival, com Egídio fazendo boa jogada pela esquerda.

Porém, quando o Cruzeiro dava sinais de que podia reagir, Bruno Rodrigo levou o segundo amarelo e deixou o time celeste com dez jogadores. O segundo cartão foi inquestionável, mas o primeiro foi bobo — uma disputa aérea impossível de vencer contra Victor na área atleticana. Faltou tranquilidade ao zagueiro que vinha sendo o mais regular do time.

Se com onze contra onze, com o rival em boa fase, já era difícil, com um a menos ficou ainda mais. Assim, a estratégia correta era segurar o adversário num 4-4-1 com as linhas próximas, tentando sair em contra-ataques, principalmente nas costas de Marcos Rocha, o lateral que avançava mais. E o homem perfeito para isso era Dagoberto. Além de jogar naturalmente pelo lado esquerdo, justamente nas costas do lateral atleticano, ele era o único dos três homens de frente titulares com velocidade para recompor a linha defensiva e partir em contra-ataque.

Assim, o sacrificado para a recomposição da zaga com a entrada de Paulão devia ser Borges ou Diego Souza, com preferência pelo primeiro, pois Diego é mais físico e tinha mais condições de disputar bolas aéreas e dar casquinhas para Dagoberto partir no um contra um. Mas Marcelo Oliveira tirou o camisa 11 e deixou dois jogadores lentos à frente. Estranhamente, após a expulsão, o Atlético Mineiro pareceu relaxar. E o Cruzeiro ficou mais com a bola, tentando achar passes no ataque despovoado e sem amplitude. Foi um período infrutífero de posse de bola, exceção feita à bola na trave de Diego Souza em chute de longe. Pelo menos serviu para manter o adversário longe do gol de Fábio.

Com um a menos, o Cruzeiro abriu os corredores para os laterais adversários ao invés de se plantar em duas linhas de quatro

Com um a menos, o Cruzeiro abriu os corredores para os laterais adversários, ao invés de se plantar em duas linhas de quatro

Aos poucos, o rival foi avançando as linhas e empurrando o Cruzeiro pra trás, até retomar o controle da bola. A instrução de Marcelo Oliveira após a substituição era fazer o 4-4-1, mas o time se portou mais numa espécie de 4-2-2-1, pois Diego não foi fechar o lado esquerdo como deveria, abrindo um corredor para os laterais apoiarem sem ter preocupações defensivas. Pela direita, Richarlyson ficou naturalmente mais preso, mas do outro lado Marcos Rocha avançava constantemente, o que teria implicações mais pro fim da partida.

Os outros gols

O segundo gol atleticano começou num escanteio mal cobrado por Ronaldinho. Mesmo assim, o Atlético manteve a posse da bola e rodou até chegar novamente a Ronaldinho, marcado por Egídio mas que não impediu novo cruzamento pra área. Paulão fez o corte e foi atrapalhado por Jô, e Léo, que não é zagueiro rápido, não conseguiu ir atrás de Tardelli para impedi-lo de aproveitar a sobra.

Sem ofensividade, já que àquela altura o Atlético mandava na posse de bola, o Cruzeiro nada mais fez. E o corredor aberto pelo lado esquerdo cobrou o seu preço. O terceiro gol foi de Marcos Rocha, pegando rebote da defesa de Fábio dentro da área, e sem nenhuma marcação por perto.

Cuca fez substituições, mas que não tiveram nenhum impacto tático na partida, e assim foi sacramentada a primeira derrota cruzeirense em 2013.

Dá pra virar?

É claro que é fácil apontar culpados, mas o futebol é um esporte coletivo. Se Léo estava falhando na zaga, se Bruno Rodrigo teve que fazer a falta em Ronaldinho e levar o segundo amarelo, é porque estiveram sobrecarregados, não tiveram ajuda defensiva na frente. Se Éverton perdeu a bola, foi porque não teve socorro ou linhas de passe fáceis após ser pressionado. Então o Cruzeiro inteiro é que foi abaixo, não só alguns jogadores.

Mas o futebol é maravilhoso. Não só porque, mesmo após derrotas como essa, onde se vê o maior rival sendo superior em praticamente todos os quesitos, o torcedor continue amando e torcendo pelo seu time, mas também porque ele já nos provou, inúmeras vezes, como é capaz de produzir resultados que ninguém espera. Um gol a cada trinta minutos não é nada surpreendente para quem já venceu este mesmo time por um placar bem mais elástico e em condições muito mais desfavoráveis — há que se considerar que o treinador e metade dos jogadores do rival estava presente naquele 6 a 1.

Para isso é preciso mudar. Mais do que de peças, mais do que de sistema, é preciso mudar de postura. O Cruzeiro da primeira partida respeitou demais a boa fase do Atlético Mineiro e não foi o Cruzeiro que nos acostumamos a ver neste início de ano — marcando forte, querendo a bola para si e tê-la nos pés. O Atlético jogou o que vem jogando sempre; o Cruzeiro é que não. É claro que eles poderiam vencer mesmo se o Cruzeiro jogasse tudo o que jogou até agora, pois assim é o futebol.

Mas que seria menos pior, seria.