Superioridade (numérica)

Se me dissessem pra resumir a parte tática no futebol — e tudo que a ela envolve, como sistema, estratégia e afins — em uma frase só, eu diria que é “buscar ter mais gente perto da bola que o adversário”. Em qualquer momento do jogo: com bola, sem bola, bolas paradas. Na defesa, no meio-campo, no ataque. Por dentro, pelos lados. Isso não varia nunca.

O que muda, de fato, é a forma como os treinadores pensam pra atingir esse objetivo. E no jogo de ontem, no qual Cruzeiro e Atlético/PR empataram e o Cruzeiro avançou de fase pela Copa do Brasil, se pôde ver muitas dessas diferentes formas de buscar essa superioridade numérica.

Sem a bola

A primeira é mais óbvia: quando o Cruzeiro se defende, formava as duas linhas de quatro tão características dessa equipe, deixando apenas Thiago Neves e Sobis à frente. Rafinha e Arrascaeta fechavam os lados, com os volantes por dentro e a linha defensiva postada atrás. Mas futebol, como se sabe, não é totó, e as movimentações dos jogadores procuravam a superioridade numérica. Se a bola vinha pelo lado esquerdo (direito do adversário), o ponta do lado contrário (no caso, Rafinha) centralizava bastante, deixando o corredor esquerdo livre. Tudo pra que tenha um acúmulo de jogadores no setor da bola e criasse também um sistema de coberturas. A mesma coisa ocorria se a bola entrava pelo lado direito: Rafinha dava o combate, os volantes se aproximavam e Arrascaeta fechava bem no centro, deixando o lado direito aberto.

Isso até funcionou de maneira razoável, já que o Cruzeiro pressionava bastante o adversário com a bola e fechava linhas de passe próximas, obrigando o jogador a voltar com a bola ou tentar um passe mais difícil, que resultava em erro. Poucas vezes o Atlético-PR conseguiu inverter de lado a jogada pra aproveitar este espaço, e quando o fez, não foi de maneira rápida, de forma que o Cruzeiro conseguia rodar e mudar a pressão de lado até a bola chegar lá.

Léo longe da linha defensiva, encaixado no seu jogador; Rafinha bem fechado por dentro; ponta oposto do CAP “livre”; acúmulo de jogadores sobre a bola. Mesmo assim, o passe para o centroavante sai, na única finalização certa do adversário

O que não gostei muito foram os encaixes de marcação. O Cruzeiro marca por encaixes no setor, isto é, jogadores ficam em suas zonas, mas quando um adversário entra ali, o cruzeirense cola nele e vai com ele até o fim da jogada. Se a bola sai de perto, aí eles voltam para as suas zonas. Por vezes víamos Rafinha atrás de Edilson, por exemplo, o que é um forte indício deste tipo de marcação: Rafinha encaixava no lateral e Edilson no ponta, e quando o lateral passava, não havia a “troca” de marcação típica de uma zonal pura: Edilson continuava com o ponta e Rafinha afundava até o fim com o lateral deles.

Do lado esquerdo do Cruzeiro, isso era ainda mais claro. E esse tipo de marcação gerava, por vezes, uma indefinição para Egídio, que começava na saída de bola do Atlético/PR. O time paranaense, quando entrava em modo de construção, realizava o que se chama de “saída de 3”: três jogadores ficam por trás para gerar superioridade numérica — olha ela aí — e sair com a bola mais limpa. No caso, um volante entrava entre os dois zagueiros, que abriam, formando temporariamente uma linha de 3. Os laterais subiam ao mesmo tempo, empurrando os pontas do Cruzeiro pra trás, e assim apenas Sobis e Thiago Neves encurtavam nos zagueiros. Com dois contra três, Paulo André, o zagueiro da direita, por vezes conseguia bastante campo pra conduzir a bola sem ser incomodado. Quando o fazia, Arrascaeta tinha que deixar Jonathan para pressionar, e Egídio não sabia se permanecia na linha de 4 contra o ponteiro ou se saía pra combater Jonathan. Na maioria das vezes, Egídio deixava o ponta para os zagueiros pegarem e subia a marcação. Mas em pelo menos duas vezes, o lateral direito do Atlético/PR teve chance de fazer um cruzamento limpo.

Com a bola

Já quando atacava, o Cruzeiro procurava muito os lados do campo. Talvez até induzido pela marcação do Atlético/PR, que fechava bem o corredor central, empilhando jogadores na entrada da área — superioridade numérica. Muito dessa falta de jogo pelo meio decorre, claro, da falta de um centroavante que pudesse fazer a parede num passe vertical e deixar para alguém chegar de trás. Tanto é que, com a entrada de Raniel, a equipe passou a atuar num 4-2-3-1, e Raniel conseguiu dar um bom apoio pelo centro em várias jogadas.

Além disso, Thiago Neves também não está em seus melhores dias tecnicamente, pois essa região do campo é dele, entre as linhas do adversário. Em um setor tão vigiado, é preciso ter técnica para se desvencilhar da primeira pressão (que chega imediatamente ao receber a bola) e ter um mínimo de tempo pra olhar o jogo de frente e dar o passe. Outra forma de se ter espaço ali é se desmarcar, movendo-se alguns passos e se separando momentaneamente do marcador. O passe tem que entrar exatamente nessa hora, é uma janela de tempo curta. Em vários momentos, Thiago fazia esse desmarque, mas não recebia a bola. O time também precisa procurá-lo mais.

Os volantes do Cruzeiro também tem uma parte nisso. Até porque, Lucas Silva é volante passador, fica na base da jogada, não faz jogo entre as linhas do adversário, não pisa na área. Até por isso, Henrique, que é o volante de pegada, tem feito também um trabalho de infiltração que não é lá bem sua característica. Então essa parte do campo fica menos povoada com cruzeirenses, e o Atlético/PR, novamente, tem superioridade numérica no setor.

Henrique pedindo a bola em uma infiltração: tem feito, mas não é bem a a característica dele

Restou, portanto, jogar pelos lados. Mas sem um alvo claro na área, por exemplo, um bom cabeceador, ou mesmo sem ter a área muito povoada, não era muito frutífero ficar cruzando bolas a esmo. O Cruzeiro buscava cruzamentos cirúrgicos, às vezes buscando um jogador mais baixo na segunda trave, às vezes um cruzamento rasteiro pra quem vem de trás. Sem sucesso, é uma jogada muito difícil de entrar.

O gol

Tudo isso resultou num jogo de poucas finalizações, de ambos os times. Não é surpresa, portanto, que o gol do Cruzeiro tenha saído em uma jogada de contragolpe, que é uma das situações em que se busca ter superioridade numérica no campo ofensivo, pegando o adversário desorganizado. Como já eram decorridos 80 minutos, e o Atlético/PR precisava de gols, passou a pressionar alto. E futebol é cobertor curto: se você marca lá na frente, dá o espaço às costas da sua defesa. O Cruzeiro conseguiu bem sair da pressão adversária trocando de lado. Aqui, destacamos o passe Edilson/Raniel, tanto pela boa leitura e execução do lateral quanto pela movimentação inteligente do centroavante para buscar o espaço. Sempre gosto de dizer que um bom passe é obra tanto de quem executa quanto de quem recebe. É uma tarefa de dois jogadores.

O passe Edilson/Raniel que quebrou a segunda linha do CAP: origem

O passe de Edilson venceu de uma só vez toda a segunda linha do Atlético/PR, que estava correndo pra trás pra defender o contragolpe. O quarteto ofensivo do Cruzeiro, de repente, se viu com apenas os dois zagueiros à frente: novamente, superioridade numérica. E quando se tem mais gente que o adversário, é sempre mais fácil fazer a jogada. Robinho passa, recebe e já sabe que Arrascaeta está chegando por trás, e passa a bola sem olhar. Arrascaeta quase perde a chance, mas se recupera e conclui para o gol.

O passe Edilson/Raniel que quebrou a segunda linha do CAP: destino

Mesmo com a vantagem, o Cruzeiro surpreendentemente não se fechou totalmente, e ainda teve mais uma chance com Robinho, novamente em lance de superioridade numérica, 4 contra 3. Mas no fim, com apenas mais alguns minutos por jogar e com a vantagem que já existia no empate ampliada pelo gol, era natural um relaxamento. Bergson conseguiu empatar numa desatenção dos zagueiros, ainda que exista mérito na jogada do atacante paranaense, uma tentativa de chapéu dentro da área que surpreendeu.

Atacar defendendo (por enquanto)

Ao fim, valeu a classificação. Cruzeiro fez um jogo seguro defensivamente, com alguns detalhes aqui e ali como dito no texto. Mas nem sempre será assim, alguma vez um outro time pode conseguir um gol numa bola parada por exemplo, e tudo muda. Não é muito saudável ficar sempre andando no fio da navalha, no limite da classificação ou da vitória, pendurado por um gol. E isso nem é culpa da defesa, mas sim da produção com a bola. Cruzeiro depende um bocado de seu meia central em boa forma técnica para conseguir ter mais jogo ofensivo, como dito acima. E também de um centroavante, esse sistema de jogo do Cruzeiro praticamente pede por um. Sem um atacante central, tem sido bem difícil, neste sistema, criar chances claras.

Otimista que sou, espero sinceramente que Thiago Neves volte à sua melhor forma mais próximo do jogo contra o Flamengo pelas oitavas da Libertadores, que é o sonho do torcedor. Claro que bons desempenhos no Brasileiro serão bem-vindos. E a chegada de Barcos, juntamente com a recuperação de Raniel e, mas tarde, de Fred, nos faça voltar a ter uma produção ofensiva. Oxalá!

Cruzeiro 2 x 0 Atlético/PR – Nada mudou

Começo este texto pedindo desculpas ao leitores por ter deixado passar a análise da partida contra o São Paulo no Morumbi. Como acontece de vez em quando, a vida nos atropela e temos que priorizar umas coisas sobre outras, e o Constelações acaba por ser preterido. Mas se você quiser ler boas análises a respeito daquela partida, acesse o blog Olho Tático, de André Rocha, ou então o blog Painel Tático, de Leonardo Miranda. Não são blogs exclusivos sobre o Cruzeiro e nem tem o estilo prolixo que é a marca do Constelações, mas não é por isso que deixam de ser ótimos textos.

Para recuperar-se da derrota para o perseguidor mais próximo, era imperativo ao Cruzeiro não só vencer o Atlético/PR em casa, como também fazer um bom jogo e mostrar que o revés foi só um pequeno obstáculo e não o início de uma oscilação. E depois de uma primeira etapa um pouco travada, principalmente pela rigidez ofensiva ao invés da fluidez costumeira, o Cruzeiro melhorou no segundo tempo e venceu com certa facilidade. Mesmo porque, quase não teve trabalho defensivamente.

Escalações

Os alas do 3-4-1-2 paranaense eram forçados a recuar, dando espaços para os laterais do 4-2-3-1 celeste, que por sua vez teve pouca intensidade na frente

Os alas do 3-4-1-2 paranaense eram forçados a recuar, dando espaços para os laterais do 4-2-3-1 celeste, que por sua vez teve pouca intensidade na frente

Marcelo Oliveira teve Henrique e Egídio de volta, mas não pôde contar com Goulart, suspenso. Assim, o goleiro Fábio teve sua linha defensiva formada por Mayke à direita, Dedé e Léo no meio e Egídio à esquerda. Henrique e Lucas Silva faziam a proteção e apoiavam o trio formado por Éverton Ribeiro pela direita, Júlio Baptista centralizado e Alisson pela esquerda. Na frente, o flecheiro Marcelo Moreno.

Já o Atlético/PR de Claudinei Oliveira inovou: tentou parar o líder em sua casa usando uma linha de três zagueiros. A meta de Weverton era protegida pelo trio de defensores Gustavo à direita, Cléberson no centro e Willian Rocha à esquerda. Os alas Sueliton e Natanael se alinhavam aos volantes Deivid e João Paulo, com Marcos Guilherme na ligação procurando os avantes Marcelo e Douglas Coutinho. No papel era um 3-4-1-2, mas não foi isso o que aconteceu, como veremos à frente.

O velho problema

Quem acompanha o blog sabe que vira e mexe bato nessa tecla. Um sistema com linha defensiva de três homens não funciona contra uma equipe que jogue com dois ponteiros abertos e um único centroavante, pois a marcação fica indefinida pelos lados. Os alas ficam em um dilema: se voltam para marcar os ponteiros, a linha de três se transforma em linha de cinco, o centroavante fica com dois na sobra: excesso em um setor significa falta em outro setor do campo, significando perda de posse de bola. Caso os alas permaneçam altos para marcar o avanço dos laterais adversários, aí a defesa fica no mano a mano contra o centroavante e os ponteiros, além de abrir vários buracos nos setor devido às distâncias que os zagueiros tem que percorrer.

O time paranaense escolheu voltar com os alas, o que significou muita liberdade para Mayke e Egídio avançarem. Os volantes até tentavam fazer a cobertura com movimentação lateral, mas como o Cruzeiro tinha mais meio-campistas centrais (três contra dois) conseguia tocar a bola com facilidade. Com isso, a estatística de posse de bola do Cruzeiro bateu na casa dos 80% em um dado momento do jogo.

Pouca mobilidade

Mas, se o Cruzeiro chegava fácil até a intermediária, passar dali era bem mais complicado. Éverton Ribeiro até que tentou se mexer e dar intensidade, tentando aparecer em outros setores que não o direito. Mas seus companheiros não o acompanhavam: Júlio Baptista jogava quase como um segundo atacante, ficando muito avançado quase todo o tempo e sempre na faixa central; Alisson, por sua vez, combinou bem com Egídio, foi intenso e veloz, mas não saiu do lado esquerdo. Com os meias estáticos, a marcação do Atlético/PR era facilitada.

Mesmo assim, o time celeste conseguiu abrir o marcador num lance de Alisson. E o gol fez o jogo mudar. O Atlético/PR desfez o sistema e mudou para duas linhas de quatro: os três zagueiros se “moveram” para a esquerda para acomodar o recuo oficial de Sueliton, deixando Natanael pela esquerda na segunda linha, também composta pelos dois volantes e Marcos Guilherme. Um clássico 4-4-2 em linha, que foi suficiente para diminuir o domínio sobre a bola do Cruzeiro, mas não para atacar com qualidade.

Júlio por Willian

Já depois do primeiro gol,  o Atlético/PR voltaria a ter defesa com 4 homens, e assim foi até o final; Cruzeiro só saiu do 4-2-3-1 bem no finzinho com Nilton entre as linhas

Já depois do primeiro gol, o Atlético/PR voltaria a ter defesa com 4 homens, e assim foi até o final; Cruzeiro só saiu do 4-2-3-1 bem no finzinho com Nilton entre as linhas

No intervalo, Júlio Baptista seria substituído por Willian, por lesão sofrida ainda no primeiro tempo. Mas calhou de a substituição ter dado outra cara ao Cruzeiro: Willian foi pra direita, centralizando Éverton. Alisson permaneceu do lado esquerdo. Apesar de ser da opinião de que Éverton rende mais partindo da direita, nesse caso específico foi bom, pois deu ao Cruzeiro o que faltava no setor central: intensidade, tanto ofensiva quanto defensiva. Os três meias se aproximavam e trocavam passes rápidos, lembrando muito os bons momentos do Cruzeiro de 2013.

O aspecto que acabou gerando o segundo gol, no entanto, foi a intensidade aplicada na marcação alta. Em um trabalho conjunto dos quatro homens de frente, o Cruzeiro forçou o erro da defesa do Atlético/PR, a bola sobrou pra Moreno que conduziu, viu Willian passar por um lado e Éverton passar por outro, mas no instinto de centroavante, resolveu mandar o sapato dali mesmo. Décimo primeiro gol do flecheiro, agora artilheiro isolado artilheiro do certame.

Com dois gols de vantagem o Cruzeiro tirou o pé e só controlou. Claudinei trocou Natanael por Sidcley, depois Douglas Coutinho por Mosquito, mas nada foi mudado no sistema tático. Marcelo Oliveira aproveitou e tirou Alisson, amarelado na comemoração do primeiro gol, lançando Marlone na faixa central — e aqui cabe um comentário: o reserva imediato de Goulart na função de central é Júlio Baptista, mas Marcelo tem preparado Marlone para jogar nessa posição também, já pensando à frente quando Goulart, novamente convocado, estará com a Seleção.

No fim, Claudinei ainda mudaria João Paulo por Hernani, numa tentativa de dar criatividade ao meio-campo, ao passo de que Marcelo Oliveira lançou Nilton na vaga de Éverton Ribeiro, posicionando à frente da defesa e atrás e Lucas e Henrique, com Marlone abrindo para configurar um 4-3-3. Mas Fábio nem viu a bola passar perto de seu gol e o dois a zero ficou até o final.

Alisson fez um excelente jogo e só errou um único passe nos 90 minutos: intensidade sem perder qualidade. Só falta se aventurar para longe do lado esquerdo.

Alisson fez um excelente jogo e só errou um único passe nos 90 minutos: intensidade sem perder qualidade. Só falta se aventurar para longe do lado esquerdo.

Mais um muro derrubado

Os adversários vem ao Mineirão e, cada um à sua maneira, tentam parar o Cruzeiro. Duas linhas de quatro, árvore de natal, três zagueiros — todos os sistemas falharam. Se não há um ponto em comum entre eles, então o xis da questão está do outro lado: é a inegável capacidade ofensiva que o time celeste tem em seus domínios. O respeito dos adversários só aumenta, e foi construído com um cartel impressionante de onze vitórias seguidas no Mineirão. E é esse mesmo respeito que faz com que, mesmo em uma noite não tão inspirada ofensivamente, o Cruzeiro saia com uma vitória inconteste.

Com a derrota do São Paulo em Curitiba, a vantagem voltou a ser de sete pontos, com a diferença de que agora são duas rodadas a menos pra o fim do campeonato. Mas o mais importante, contudo, é que o Cruzeiro mostrou não ter entrado na descendente como muita gente apostava. Afinal, a equipe vinha de um empate contra o Fluminense e uma vitória suada contra o Bahia no Mineirão. O futebol apresentado, se não foi brilhante, foi muito mais sólido e consistente que o dos outros times.

No fim das contas, é isso que decide quem será o campeão.

Cruzeiro 1 x 0 Atlético/PR – Inapelável

Seis vitórias seguidas fazer até mesmo os adversários mais fortes mudarem — não só na estratégia como também no sistema de jogo. O Atlético Paranaense respeitou o Cruzeiro, e mesmo após treze partidas invicto, mudou. Não adiantou muito: as seis vitórias viraram sete num jogo de três estágios bem distintos, e que poderia ter sido bem mais tranquilo se o juiz e a bandeirinha não fossem tão “apressadinhos”.

Plataformas iniciais

Atlético no 4-3-1-2 losango bem compactado e defesa alta encaixou no 4-2-3-1 celeste mas deixou Mayke livre

Atlético no 4-3-1-2 losango bem compactado e defesa alta encaixou no 4-2-3-1 celeste mas deixou Mayke livre

Com Borges de volta, Marcelo Oliveira pode escalá-lo no comando do ataque e escalou ao trio “titular” de meias, com Éverton Ribeiro partindo da direita, Ricardo Goulart centralizado e Willian pela esquerda. Nilton e Lucas Silva foram novamente os parceiros na proteção da área, e a defesa foi formada pelos zagueiros centrais Dedé e Bruno Rodrigo, com Egídio na lateral esquerda e Mayke, na vaga do poupado Ceará, na direita — todos capitaneados pelo goleiro Fábio.

Vágner Mancini não podia contar com o longevo Paulo Baier, e mudou a forma de jogar de sua equipe para encarar o líder no Mineirão. Foi um tradicional 4-3-1-2 losango, mas com compensações defensivas. Debaixo das traves, Weverton teve sua linha defensiva formada por Léo à direita, Manoel e Luiz Alberto no miolo e Maranhão, volante, fechando o lado esquerdo. Bruno Silva ficou plantado à frente da zaga, Deivid à direita e João Paulo à esquerda eram os apoiadores e Everton centralizado na ligação. No ataque, Marcelo fechava o lado esquerdo e Éderson ficava mais por dentro.

Encaixe de marcação

O Atlético começou o jogo muito compacto, com as linhas bem próximas e com perseguições bem definidas. No meio, Deivid colava em Goulart, e os dois apoiadores perseguiam os volantes celestes. Éverton, o meia de ligação, por vezes fechava o espaço no centro sem ter um jogador designado, por vezes fechava o lado direito para bater com Mayke. Marcelo caía pela direita para impedir os avanços de Egídio, e Éderson preferia marcar Dedé à distância.

Assim, ninguém marcava Mayke diretamente. Talvez Mancini esperasse por ali a presença de Ceará, que passa menos que o jovem lateral. Portanto ali era o setor de preferência de saída de bola. Por vezes, Éverton, o meia de ligação, caía por ali para cercar, e por vezes o volante lateral Maranhão subia a marcação no garoto.

Profundidade e velocidade

Mas a defesa do time paranaense jogava alta, um dos requisitos principais para a compactação, dificultando as ações celestes entre as linhas. Também por isso, nos quinze primeiros minutos, o Cruzeiro cadenciou, estudando a melhor forma de sair e atacar, sem dar velocidade. Nesse período, Mayke parecia um tanto nervoso, errando alguns passes bobos e errando domínios de bola, mas depois que o mapa da mina foi descoberto, o Cruzeiro acelerou e intensificou a movimentação. Preferiu a direita e bolas em profundidade, para pegar a defesa atleticana correndo pra trás.

Éverton Ribeiro, Willian, Egídio e o próprio Mayke arremataram contra Weverton nesse período, quase sempre em jogadas de passe vertical nas costas da defesa — assim como o escanteio que originou o gol: bola em profundidade para Mayke finalizar em cima de Weverton que mandou pra fora. Na cobrança, Nílton inverteu os papéis com Dedé e completou sozinho para o gol, de primeira, numa bola difícil — ela ainda resvalou na trave antes de entrar.

A jogada que originou o escanteio do gol foi como muitas outras: profundidade para aproveitar o posicionamento alto da defesa do Atlético/PR

A jogada que originou o escanteio do gol foi como muitas outras: profundidade para aproveitar o posicionamento alto da defesa do Atlético/PR

Mesmo com a vantagem, o Cruzeiro não se deu Logo depois, a arbitragem anularia o segundo gol legítimo e que poderia dar outra cara à partida. No fim do primeiro tempo, Borges também teria oportunidade de ampliar, novamente em jogada de profunidade, mas desta vez sim, ele estava impedido.

Cansaço?

No segundo tempo, a marcação ofensiva do Atlético mudou. Marcelo passou a acompanhar Éderson na semi-pressão aos zagueiros, deixando os laterais livres. A segunda etapa começou como terminou a primeira: antes do relógio ter dado uma volta completa Willian já tinha arriscado para o gol. Depois, Nilton quase fez o segundo num cabeceio, mas Weverton pegou no cantinho e Borges desperdiçou o rebote. Depois Lucas Silva tentaria mais uma vez de fora da área, mas o chute foi bloqueado.

E foi só. Inexplicavelmente — ou, pensando melhor, talvez pela questão física — o Cruzeiro reduziu a velocidade do jogo e deu campo ao Atlético Paranaense. Convidado a atacar, e atrás no placar, o Atlético aceitou a proposta e avançou suas linhas. As três finalizações do primeiro tempo já tinham agora a companhia de mais duas — todas para fora, é verdade, mas agora as estratégias haviam se invertido: o Cruzeiro esperava para contra-atacar e o Atlético tinha mais a bola.

Controle defensivo

Marcelo então promoveu duas trocas de uma só vez. Borges e o amarelado Éverton Ribeiro deram suas vagas e Júlio Baptista e Alisson. Júlio foi ser o central, empurrando Goulart para frente, e Alisson fechou o lado esquerdo, com Willian invertendo. Pernas novas para tentar segurar a bola no ataque e não correr riscos de um injusto empate. Vágner Mancini respondeu tirando Deivid e lançando o meia Felipe, e logo depois mandou Dellatorre na vaga de Marcelo, soltando o time num 4-3-3. A partir daí o Atlético teve mais posse, mas não teve muita eficiência. Foi só aí que Fábio fez sua única defesa no jogo, a única finalização certa do time paranaense durante todo o jogo.

Mancini ainda tentou colocar um homem de área, Roger, na vaga de Éderson, para a famosa tática da bola aérea, mas o Cruzeiro controlava bem o jogo defensivamente e não permitia cruzamentos. A posse de bola atleticana assustava, mas não era produtiva, e era o Cruzeiro quem tinha mais chances de marcar em contra-ataques. No fim, a troca de Willian por Lucca e a sequência interminável de escanteios com Júlio Baptista decretaram o fim da partida.

Chegou a hora

Não só o Atletico finalizou pouco como também concluiu mal e de longe: só 3 foram de dentro da área, e somente 1 foi no gol (Footstats)

Não só o Atletico finalizou pouco como também concluiu mal e de longe: só 3 foram de dentro da área, e somente 1 foi no gol (Footstats)

A vitória do Cruzeiro foi incontestável, diante de um rival direto na ponta da tabela. O jogo só equilibrou no fim porque o Cruzeiro cansou — lembrando que o Atlético não jogou com seu time titular no estadual, e por isso tem um condicionamento físico melhor. Mesmo assim, houve superioridade da defesa celeste sobre o ataque adversário. Não custa lembrar que o Atlético é o segundo time que mais finaliza no campeonato, perdendo apenas para o próprio Cruzeiro. A partida de sábado, no entanto, foi a terceira da equipe paranaense com menos finalizações nas 21 primeiras rodadas — o Atlético só concluiu menos contra Corinthians (na 8ª rodada) e Atlético/MG (10ª).

Encaixar uma sequência de treze jogos sem derrota não é para qualquer equipe. Vágner Mancini chegou ao Atlético Paranaense e conseguiu isso, mas diante de um Cruzeiro que impõe respeito antes mesmo das partidas, mudou sua equipe e conheceu seu primeiro revés — mesmo sendo, na modesta opinião deste blogueiro, a estratégia certa para enfrentar o líder em sua própria casa.

Resta saber se o Botafogo, agora o único rival mais próximo com a derrota do Grêmio, também respeitará o Cruzeiro, modificando ao menos sua estratégia de jogo, ou se irá tentar encarar o time celeste de igual para igual no Mineirão.

Cá pra nós: se Oswaldo de Oliveira preferir a segunda opção, tem muito mais chance de sair derrotado.

Atlético/PR 2 x 2 Cruzeiro – Futebol de lama

Abro a análise de hoje com a síntese do jogo que o técnico Marcelo Oliveira deu ao repórter do Premiere FC após a partida.

“Foram tempos distintos. O Atlético nos dominou no primeiro tempo, se adaptou melhor ao gramado — se é que posso chamar de gramado. Então foi chutão pra lá e pra cá, [o Atlético] aproveitou da bola parada e da segunda bola. E nós equilibramos no segundo tempo, fizemos alguns contra-ataques importantes, e desperdiçamos. Mas acho que ficou de bom tamanho, foi justo o empate.”

Marcelo fala de três fatores determinantes para o resultado de hoje: (1) o arremedo de gramado prejudica a execução de qualquer estratégia que não seja (2) a bola longa e a bola parada. E foi usando exatamente desse expediente que o Cruzeiro mudou a forma de jogar no segundo tempo e conseguiu (3) contra-ataques que poderiam resultar em mais três pontos.

Porém, há outros aspectos que também devem ser levados em conta.

Escalações

A grande distância entre os volantes e os meias e a sobrecarga pelo lado esquerdo dificultaram o jogo cruzeirense na primeira etapa

A grande distância entre os volantes e os meias e a sobrecarga pelo lado esquerdo dificultaram o jogo cruzeirense na primeira etapa

Marcelo mandou a campo o 4-2-3-1 de sempre, o que hoje pode ser considerado o time titular. A linha defensiva que protegia o gol de Fábio era formada por Dedé e Bruno Rodrigo na zaga, ladeados por Ceará à direita e Egídio do outro lado. Leandro Guerreiro e Nilton, este último ligeiramente mais avançado, faziam a proteção à área. Everton Ribeiro era o ponteiro direito, com a famosa tendência a centralizar e se juntar a Diego Souza, o meia central. Na ponta esquerda, Dagoberto ficava um pouco mais espetado e procurava se juntar a Borges, na frente.

O Atlético Paranaense do técnico Ricardo Drubscky entrou num 4-3-3 clássico, com um volante e dois meias (4-1-2-3). O gol de Weverton foi defendido por Léo na lateral direita, Manoel e Cleberson no miolo e Pedro Botelho à esquerda. Deivid foi o volante mais preso, liberando João Paulo e Everton para se juntarem ao ataque, formado por Ederson na ponta direita, Marcão centralizado e Felipe pela esquerda.

Terrestre x aéreo

O Cruzeiro tinha confiança que ia superar o péssimo estado do gramado tentando jogar da mesma forma de sempre: trocando passes, cadenciando e girando a bola. Mas o gramado venceu essa batalha prejudicando muito a estratégia celeste, simbolizada num lance em que Everton Ribeiro pega uma sobra de bola e passa a Borges. A devolução do camisa 9 foi boa, e Everton Ribeiro se posicionou de forma a esperar a bola que certamente chegaria em seus pés se o gramado fosse minimamente razoável, mas que ficou presa em uma poça de lama que freou sua trajetória, atrasando o que seria um excelente contra-ataque.

Já o Atlético não quis saber de transições pelo chão e jogava a bola longa pelo alto. Foi assim que o Atlético Paranaense chegava com facilidade à frente da área cruzeirense. Pra essa estratégia funcionar, entretanto, é preciso que o time atacante pegue a segunda bola. Chama-se de” segunda bola” a sobra da disputa de cabeça pelo alto, que é a “primeira bola” Quando treinadores falam que o jogo foi de primeira e segunda bola, eles querem dizer “disputas pelo alto e vamos ver quem pega a sobra”.

Descompactação

No Atlético, a ligação direta quase sempre procurava Marcão, que disputava na maioria das vezes com Dedé. Ele não ganhou muitas, mas a segunda bola era sempre do time da casa, isso porque os setores do Cruzeiro estavam muito espaçados. Marcelo queria a marcação no alto do campo, e quarteto ofensivo tentava fazer isso, mas a zaga e os volantes era pressionados pra trás pela bola longa, abrindo um clarão de Guerreiro e Nilton aos três meias. A segunda bola quase sempre caía por ali, e com isso os jogadores de meio do Atlético avançavam com a bola dominada quase sempre com pouca marcação.

Dois contra um

Mas a parte mais vulnerável do time era o lado esquerdo da defesa. Ricardo Drubscky certamente estudou o Cruzeiro e notou que o trabalho defensivo de Dagoberto por aquele setor não é tão intenso. Ele escalou Léo, um jovem lateral com muito ímpeto ofensivo e grande velocidade, e Ederson, também muito veloz e driblador. Sem Dagoberto para auxiliar na marcação, Egídio se viu sobrecarregado e precisou da ajuda constante dos volantes Nilton e Guerreiro. Em uma jogada específica é possível ver os dois volantes celestes jogando por aquele lado, deixando a direita e o meio totalmente desprotegidos.

Com essa dificuldade, o Cruzeiro cometia sucessivas faltas, deixando a oportunidade da bola aérea em sua própria defesa. Todos os fatores combinados originaram os gols da equipe da casa. Falta cometida por Guerreiro pela esquerda, bola na área, a defesa afasta mal e a bola volta. Sem marcação, do outro lado, o lateral esquerdo Pedro Botelho completou no canto de Fábio. Depois, mais uma falta pela esquerda, e desta vez Manoel completou a bola aérea em falha dos dois zagueiros do Cruzeiro, que subiram errado na bola e deixaram o zagueiro atleticano livre.

O feitiço contra o feiticeiro

Ainda no fim do primeiro tempo, o jovem Léo sentiu uma lesão e foi substituído pelo volante Derley na lateral direita. Isso representou um alívio imediato para Egídio, e também para Dagoberto, que agora não precisava voltar tanto já que Derley era muito mais marcador que Léo. Com menos pressão, Egídio começou a se aventurar mais na frente, e foi numa falta sofrida pelo lateral cruzeirense em tabela com Diego Souza — naquele momento pela esquerda, com Dagoberto pela direita e Everton Ribeiro no meio — que o empate começou a ser construído. Cobrança de Dagoberto, a zaga afasta mal e Dedé, de pé esquerdo, jogou mansinho para o gol.

No intervalo, Marcelo Oliveira percebeu que o jogo tinha que ser feio: muito mais físico do que técnico. Aproveitou a indisposição de Dagoberto para lançar Luan, muito menos driblador mas bem mais forte, pelo lado esquerdo do campo. O empate veio no primeiro toque do camisa 88 na bola, numa jogada que ilustra como o Cruzeiro teve que mudar sua estratégia de jogo. Logo na saída, bola longa para Luan disputar pelo alto. A bola sobrou pra Borges, que foi desarmado, mas depois também sobrou limpa para Luan completar de fora da área.

Taticamente mais preso àquele setor, Luan não só segurou Derley por ali como também voltava muito mais para marcar do que Dagoberto, praticamente anulando as investidas de Ederson pela direita do ataque atleticano. Com Egídio mais livre, era Ederson quem tinha que voltar, e com isso a situação se invertia: o lado esquerdo do Cruzeiro, direito do Atlético Paranaense, antes o caminho do gol para o time da casa, era agora vantajoso para o time celeste.

Contra-ataques

A entrada de Luan e o recuo da linha ofensiva ajudaram a resolver os problemas da primeira etapa e o Cruzeiro por pouco não conseguiu a virada

A entrada de Luan e o recuo da linha ofensiva ajudaram a resolver os problemas da primeira etapa, e o Cruzeiro por pouco não conseguiu a virada

O jogo de fato ficou bem mais feio, mais pegado e disputado, e com muito menos técnica. Celso Roth diria que era um jogo não para se jogar, mas para se “competir”. E o Cruzeiro entendeu bem isso, disputando cada bola e equilibrando a partida na base da força. O Atlético sentiu o empate e procurava ficar mais com a bola. Mas Marcelo Oliveira certamente pediu para seus homens de frente marcarem atrás da linha do meio-campo, e a aproximação dos setores compactou o time fechando todas as brechas. A segunda bola já não era sempre do time da casa, e não havia brechas por onde entrar.

Com o time mais recuado, o Cruzeiro chamava o Atlético a seu campo e partia em contra-ataques, quase sempre usando a bola longa para Luan ou Borges. Numa jogada, Egídio pegou uma segunda bola e achou Diego Souza pela esquerda, que fez o pivô e mandou a Borges sozinho na área. O cabeceio veio fraco, mas o lance ilustra como o Cruzeiro teve chances em jogadas de velocidade e pelo alto. Luan ainda teria mais duas oportunidades, e também Everton Ribeiro para decretar a virada, mas o placar insistiu no empate.

As outras trocas feitas pelos treinadores não alteraram as plataformas táticas nem as estratégias de jogo. Borges por Anselmo na referência, Everton Ribeiro por Ricardo Goulart na meia, mandando Diego Souza para a direita. No Atlético, as trocas foram diretas e simples, e o 4-3-3 se manteve até o fim.

Números e o “gramado”

Ao invés de fazer uma conclusão, darei aqui alguns números que provam como o Cruzeiro poderia ter saído com os três pontos se não tivesse errado tanto. Ambos os times acertaram 50% de suas finalizações, mas o Cruzeiro finalizou 18 vezes, contra 14 do Atlético. Considerando que o Atlético teve mais posse de bola (60% x 40%), o Cruzeiro foi mais eficiente e chegou mais ao gol adversário — fruto da estratégia do segundo tempo.

O site da ESPN Brasil também disponibiliza os números da Footstats de tempo de posse de bola por setor do campo. O Atlético passou 42,47% do tempo com a bola em seu lado direito, e o Cruzeiro 43,09%, mostrando como o jogo se concentrou naquele lado do campo. Também, o Cruzeiro foi a equipe que passou menos tempo em seu meio-campo do que nos setores de ataque e defesa nesta rodada, ilustrando bem o jogo de bola longa que o gramado permitia.

O jogo de hoje mostrou que o Cruzeiro tem capacidade de adaptação e elenco variado e heterogêneo, aspectos quase indispensáveis para se almejar o título. Por outro lado, também mostrou algumas falhas, como erros em bolas aéreas e algumas decisões estratégicas equivocadas, mas estes fatores foram causados mais pelo péssimo estado do campo do que propriamente pelo adversário.

Como acho difícil jogarmos novamente em um gramado tão ruim, o Cruzeiro ainda está muito credenciado ao título.

Atlético/PR 1 x 0 Cruzeiro – Hipertensão

Um pouco de pressão alta do Atlético Paranaense no início do jogo mais uma certa incompetência nas finalizações foi a receita amarga da terceira derrota seguida do Cruzeiro. Se Vágner Mancini já tinha de colocar as orelhas em pé, agora então precisa vencer e convencer para ter sobrevida no cargo. Não que eu concorde, pois a má fase não é culpa inteiramente do treinador, mas sabemos que no futebol, principalmente aqui em terras tupiniquins, o resultado importa muito mais do que o planejamento e o trabalho.

O 4-3-1-2 losango inicial do Cruzeiro, com Roger e Amaral invertendo e sem força pelo lado esquerdo

O Cruzeiro foi a campo no 4-3-1-2 losango, mas com Roger recuando pela direita e invertendo com Amaral. Na zaga, Alex Silva estreou no lugar de Victorino, vetado. Já o Atlético-PR veio no 4-3-3 com triângulo alto (4-1-2-3) armado pelo técnico uruguaio Juan Carrasco, com o veterano Paulo Baier num posicionamento interessante: o camisa 10 recuava para ser o primeiro volante, liberando seus companheiros de meio-campo Deivid e Liguera para atacar.

Logo de cara, o Atlético partiu para a marcação no alto do campo quando perdia a bola, sufocando os defensores cruzeirenses. Foram 20 minutos de uma excelente execução de pressing. Os três atacantes pressionavam os quatro defensores e os volantes eram perseguidos pelos dois meias. Paulo Baier regia de trás.

Nas raras vezes em que o Cruzeiro conseguia passar pelo meio-campo, o Atlético imprimia velocidade no contra-ataque, com intensa movimentação do trio ofensivo. Foi justamente num destes contra-ataques que saiu o gol da partida. Roger e Amaral estavam na ponta direita disputando a posse, mas perderam a bola, que chegou para o ex-cruzeirense Guerrón, desta vez aparecendo pelo lado esquerdo. O veloz equatoriano tinha a marcação de Diego Renan, mas sem cobertura. Leandro Guerreiro tenta chegar para fazer a sobra, mas Diego Renan já havia sido driblado e Guerrón já partia em velocidade. Antes do camisa 5 alcançá-lo, ele cruzou rasteiro para dentro da área azul. Alex Silva, o homem da sobra, não conseguiu cortar e Edigar Junio conseguiu aparecer entre Léo e Everton para completar. Méritos de Guerrón, mas houve falha na cobertura a Diego Renan e na hora de cortar a bola no cruzamento.

Do outro lado do campo, Anselmo Ramon ainda nem tinha visto a cor da bola. O centro-avante azul ficou esperando a bola chegar, mas o Atlético continuava a pressão. Do lado esquerdo, Marcelo Oliveira se preocupava em marcar Deivid, e Everton segurava o atacante que caísse por ali, na maioria das vezes Guerrón. O lado esquerdo ofensivo do Cruzeiro ficou novamente deserto. Roger recuava para buscar o jogo e tentar dar qualidade à saída, numa tentativa de cadenciar o jogo, para frear a velocidade que o time mandante queria impor. Mas foi dele o lance mais bizarro do jogo: num passe muito displicente para Léo, acabou entregando para o centro-avante Patrick avançar sozinho. Fábio cresceu, o camisa 11 se assustou e desperdiçou.

A partir dos 20 minutos, a pressão atleticana foi arrefecendo. Aos poucos o Cruzeiro foi ganhando espaço, mas os atacantes estavam muito bem marcados. O Cruzeiro tentava bolas longas para os atacantes, principalmente partindo de Roger. O repórter da TV até conseguiu pegar uma conversa do camisa 7 com Vágner Mancini, reclamando que não tinha alvos para fazer lançamentos. De fato, os dois atacantes azuis estavam encaixotados na defesa paranaense: Wellington Paulista até tentava se esquivar, mas foi bem vigiado pelo lateral esquerdo Héracles. Anselmo Ramon não caía pelo lado esquerdo e ficava tentando brigar com o zagueiro Manoel, com Bruno Costa na sobra.

Aos poucos o Cruzeiro foi equilibrando as ações, mas muito mais porque o Atlético já não conseguia pressionar no campo adversário (nenhum time no mundo consegue fazer isso durante os 90 minutos com tal intensidade). Quando a bola passava pelos meias atleticanos, o Cruzeiro levava mais perigo. Isso porque  Paulo Baier já não tem mais energia para ser o único volante à frente de sua zaga, e com o avanço de Amaral pela direita, as jogadas começaram a sair. As melhores chances foram com Roger, aos 29, quando WP tirou um zagueiro da área e o meia recebeu um lançamento longo de Diego Renan mas mandou para fora, e aos 47, em cobrança de falta cujo rebote WP não conseguiu aproveitar.

No intervalo, Vágner Mancini tirou Amaral, pouco produtivo no primeiro tempo, e estreou o veterano Souza. A equipe passou a um híbrido de 4-2-2-2 e 4-3-1-2 pelo posicionamento variável de Roger. Juan Carrasco tirou Liguera e lançou o volante Zezinho, mudando para um 4-2-1-3, talvez tentando liberar Paulo Baier para se aproximar mais da área adversária. Também trocou seu centro-avante: Bruno Mineiro na vaga de Edigar Junio.

A combinação das três alterações do intervalo resultou em um Cruzeiro com mais espaço para tocar a bola no meio campo e um Atlético-PR “divorciado”, com uma enorme distância entre os três atacantes e os três jogadores de meio. Um filme que já vimos antes no nosso próprio time. O Atlético parou de pressionar alto e deixou o Cruzeiro jogar. Os laterais azuis começaram a aparecer mais à frente, e aos poucos o Cruzeiro foi desequilibrando a balança da posse a seu favor. A explicação era simples: com Souza e Roger, o time conseguia reter mais a posse de bola, e os volantes do time da casa tinham de se preocupar com os dois. Paulo Baier ficava sozinho e ainda tinha a companhia de LG e MO: 4 contra 3 no meio. Uma situação pela qual o Cruzeiro passou várias vezes no ano, dessa vez estava do lado contrário.

Até os 15 minutos, só o Cruzeiro havia criado chances. Juan Carrasco viu que seu time não ia sair do lugar, mas não tentou corrigir o erro: queimou a regra 3 lançando mais um volante marcador, Renan Teixeira, no lugar de Paulo Baier, efetivamente fazendo um bizarro 4-3-0-3. Sim, o time da casa ficou sem nenhum homem de ligação. É claro, essa função foi designada para os atacantes mais abertos, mas eles não conseguiram executá-la. O Atlético se defendia com 7 homens atrás da linha da bola, tentando partir em contra-ataques com bolas longas para a velocidade de seus pontas.

Era em vão. Marcelo Oliveira e Everton estavam combinando bem pelo lado esquerdo. Do lado direito, Wallyson foi a campo no lugar de WP para dar mais velocidade à saída. O esquema se manteve, mas o Cruzeiro agora tinha muito mais largura de ataque. Foi de Marcelo Oliveira a melhor chance do Cruzeiro para o empate. Everton mandou a Anselmo Ramon, que protegeu, fez o pivô e lançou ao camisa 8, entrando nas costas do lateral atleticano. Ele avançou até dentro da pequena área mas conseguiu mandar por cima do goleiro.

Após as alterações, a volta ao losango inicial, com muita posse de bola mas sem eficácia na criação e na conclusão

O lateral direito Gabriel Marques, que havia caído e deslocado o ombro, voltou para jogar no sacrifício, já que o Atlético já havia feito suas três alterações. Vágner Mancini, então, tentou aproveitar-se da situação lançando Gilson no lugar de Roger, empurrando Everton para o meio e mudando Marcelo Oliveira de lado, voltando ao losango no meio. Mas o tiro saiu pela culatra, pois Marcelo Oliveira não se aventurou tanto pela direita, e Gilson e Everton não conseguiram combinar tão bem e explorar a condição física debilitada de Gabriel Marques. O lateral do Atlético fez um fim de partida heróico, segurando seu próprio braço e não saindo de nenhuma dividida.

O Atlético viu que não conseguiria mais se impor e postou seus 11 homens atrás da linha da bola, dificultando de vez as ações do time celeste. Mesmo com mais posse de bola (cerca de 60% aos 30 do segundo tempo), o Cruzeiro não conseguiu mais criar boas chances e ainda tomou uma bola na trave num rápido contra-ataque rubro-negro. Mas uma coisa boa pode ser tirada desse final: o Cruzeiro não se desesperou e lançou chuveirinho na área (como é costumeiro com times que estão tentando o gol de qualquer jeito). A organização tática se manteve até o fim.

Talvez o empate fosse o resultado mais justo, pelo volume de jogo das duas equipes nas pontas do tempo da partida. No início, um Atlético elétrico, e no fim um Cruzeiro mais calmo, com mais posse, mas não tão elétrico. Porém, o Cruzeiro só jogou quando o adversário deixou. Mais uma vez. Souza deu qualidade ao meio-campo, pode ser titular. Alex Silva, apesar da falha no gol, também deu mais segurança em bolas aéreas. WP e Anselmo Ramon não jogaram bem. Talvez seja a hora de usar um ataque mais móvel. Os dois são centro-avantes, homens de referência: não podem mais jogar juntos.

Portanto, talvez o resultado mais “justo” fosse mesmo a derrota, mas com o Cruzeiro marcando gols. E, na Copa do Brasil, isso faria muita diferença para o jogo da volta.