Intensidade. Essa palavra, que muitas vezes é confundida com pressa ou raça, é a palavra da moda no futebol moderno. Ser intenso é executar as ações com mais rapidez; saber identificar os espaços antes do adversário; se movimentar muito sem a bola para dar opções de passe ao companheiro; subir o bote nos momentos certos e não deixar o adversário respirar até roubar a bola.
Foi exatamente isso que faltou ao Cruzeiro hoje. É claro, foi apenas o quarto jogo, o segundo oficial, e diante de um adversário que fez uma partida quase perfeita taticamente. Tudo isso conta. Mas mesmo assim, era de se esperar um time um pouco mais intenso com a bola, ou pelo menos um pouco mais do que foi na partida contra o Democrata.
Sistemas iniciais
Marcelo Oliveira teve dois problemas de última hora e teve que modificar o time que treinou durante a semana. Arrascaeta teve problema na documentação, e Bruno Rodrigo foi poupado por dores. Com isso, Fabiano entrou na zaga, pela direita, mudando Léo de lado. Mayke e o estreante Mena completaram a linha defensiva pelas laterais. Willian Farias e Henrique fizeram a dupla volância, atrás do trio formado por Marquinhos à direita, Judivan por dentro e Willian à esquerda, e na referência do ataque, Damião.
Já a Caldense do técnico Léo Condá se postou num 4-1-4-1 muito bem postado e preparado para reagir. O goleiro Rodrigo Viana teve Andrezinho à direita, Rafael Estevam à esquerda e Plínio e Marcelinho no miolo de zaga. Yuri foi o homem entre a defesa e a segunda linha, formada por Tiago Azulão à direita, Nádson e Tiago Ulisses por dentro e Zambi pelo lado esquerdo. Luiz Eduardo era o mais avançado.
Marcação encaixada
No confronto das formações, a marcação ficou muito encaixada. Cada ponteiro da Caldense fechava em um lateral do Cruzeiro; os meias nos volantes; o volante entrelinhas no central Judivan e os laterais marcavam os ponteiros. O time do interior usava a marcação individual por função, isto é, cada jogador pegava o adversário que chegava no seu setor e ia com ele até o fim da jogada.
Assim, não havia espaços no terço final. Era preciso criá-los. Em 2013/14, o Cruzeiro sabia bem fazer isso: quando o time tinha a bola, os jogadores sem ela eram intensos na movimentação, arrastavam os marcadores consigo e abriam linhas de passe. Essa movimentação é coordenada e organizada, o jogador precisa identificar o espaço e ir até ele. E para isso precisa de entrosamento com os companheiros.
Em 2015, os jogadores ainda estão se conhecendo. E não se movimentaram o suficiente para sair da boa estrutura do time da Caldense, ficando muito estáticos em suas posições. Os 3 jogadores atrás de Damião até trocavam de posição, mas sempre antes do Cruzeiro recuperar a posse, e nunca durante as jogadas, facilitando a marcação.
Recomposição e transição
Quando perdia a bola, o Cruzeiro tentava pressionar alto, mas sem coordenação. Para que a marcação no campo de ataque funcione, todos os jogadores tem que avançar de forma a fechar as opções de passe do homem da bola, forçando-o a um erro ou à perda de posse de bola. Mas houve vários momentos em que um dos jogadores do quarteto de frente do Cruzeiro não subia o bote, deixando um jogador da Caldense livre. A bola rodava e chegava nesse jogador, que iniciava o ataque tranquilamente. Assim, o Cruzeiro não conseguia roubar a bola já perto da área adversária, tendo que iniciar os ataques quase sempre de seu próprio campo.
Outro problema apresentado hoje foi a lentidão no contra-ataque. Quando roubava a bola no campo de defesa, o Cruzeiro simplesmente não era veloz o suficiente, e assim a defesa da Caldense conseguia se recompor, fechando os espaços novamente e voltando ao estado anterior: time com mais posse de bola, mas sem conseguir criar espaços para ameaçar Rodrigo Viana.
Em suma: nas quatro fases do jogo (ataque, recomposição, defesa e transição) o Cruzeiro foi mal em três, sendo razoável apenas na parte defensiva. Mena, o estreante, fechou bem a linha de quatro, Léo e Fabiano fizeram um primeiro tempo seguro e os volantes Henrique e Willian Farias protegeram bem a área de Fábio. De resto, faltou movimentação sem a bola no ataque, coordenação na pressão alta na recomposição e velocidade no contra-ataque. Intensidade é o ponto em comum.
A intensidade de Joel
No intervalo, Marcelo trocou Judivan por Júlio Baptista, mais acostumado a jogar como central do 4-2-3-1. Na Caldense, Léo Condé tirou Tiago Ulisses e lançou Diego Souza (não é aquele). Mas nem deu tempo de avaliar: Damião se movimentou, saiu da área para o pivô e levou a marcação, abrindo espaço para Willian, que foi até esse espaço para receber a bola do próprio Damião e vencer Rodrigo Viana. Porém, quase na sequência, uma desatenção na zaga fez a bola sobrar para Luiz Eduardo dentro da área, que fez um gol típico de centroavante à moda antiga: girou em cima de Fabiano e bateu.
Depois dos gols, o jogo assentou e aí sim deu pra ver que nada havia mudado. Júlio tem característica de reter mais a bola, e não se movimenta tanto. O time tinha mais posse de bola, mas continuava muito estático em campo. Aos 15, Willian Farias deu seu lugar a Joel. Marcelo recuou Marquinhos para a linha de Henrique e abriu Joel pela direita. E aí sim, o Cruzeiro pareceu muito mais dinâmico, pois o camaronês se movimentava bastante, com muita intensidade. Ele parece estar num nível físico acima dos demais.
Reequilíbrio na posse
Foi o melhor momento do Cruzeiro no jogo. Joel combinou bem com Mayke pela direita e criou boas jogadas, ainda que não chegassem a ser ameaças reais ao gol adversário. Só durou cinco minutos, porque Léo Condé respondeu com Ewerton Maradona na vaga de Nadson, mudando para um 4-4-1-1 com Maradona na ligação para Luiz Eduardo. O jogador tinha liberdade para se movimentar pelo campo todo, e entrou para segurar a bola nos pés para diminuir a pressão que o Cruzeiro ensaiava. Deu certo.
Para tentar desequilibrar novamente, Marcelo Oliveira ainda tentou uma última cartada, lançando Riascos no lugar de Damião. O colombiano entrou inicialmente como centroavante móvel, mas depois revezou pela direita com Joel. A troca deu mais fôlego ao time, que voltou a ter mais posse de bola (terminaria com 60%), mas novamente sem criatividade como no primeiro tempo. A equipe tinha mais movimentação, mas não conseguiu quebrar as duas linhas de quatro da Caldense, que se contentou em absorver as investidas celestes e tentar estocadas pela esquerda com Maradona e Zambi.
Mantendo o foco no que importa
É claro que é preciso ter paciência, o time ainda está em formação. Mas o próprio Marcelo Oliveira admitiu na coletiva pós-jogo que esperava mais, mesmo considerando que a Caldense fez uma ótima partida em termos táticos. O time veio evoluindo, ainda que desfigurado, nos amistosos e na estreia do Mineiro. Mas de Valadares para hoje, não houve melhora.
Entretanto, nem tudo foi ruim hoje. Mena entrou bem na defesa, mas precisa melhorar o apoio, o que também passa pela questão do entrosamento. Damião fez mais um bom jogo taticamente, saindo da área e abrindo espaços para companheiros, e contribuindo com mais uma assistência. Joel está mostrando muito mais do que o esperado, e se continuar assim deve ser titular em breve.
Até a estreia na Libertadores, no dia 25, ainda serão duas semanas e meia para treinar e entrosar o time. Os jogos no Mineiro devem servir para isso. Porém, até mesmo alguns jogos da 1ª fase da própria Libertadores serão importantes nesse sentido, pois o principal é o time estar competitivo e entrosado até o início de maio, quando começam as oitavas da competição sul-americana e o Brasileirão.
Assim, torçamos para que a pressão por resultados no Mineiro não atrapalhe a formação da equipe. Não é melhor ter o time encaixado e voando nas fases decisivas das competições mais importantes do que vencer o campeonato estadual apenas por vencer.