Cruzeiro 1 x 0 Atlético/PR – Inapelável

Seis vitórias seguidas fazer até mesmo os adversários mais fortes mudarem — não só na estratégia como também no sistema de jogo. O Atlético Paranaense respeitou o Cruzeiro, e mesmo após treze partidas invicto, mudou. Não adiantou muito: as seis vitórias viraram sete num jogo de três estágios bem distintos, e que poderia ter sido bem mais tranquilo se o juiz e a bandeirinha não fossem tão “apressadinhos”.

Plataformas iniciais

Atlético no 4-3-1-2 losango bem compactado e defesa alta encaixou no 4-2-3-1 celeste mas deixou Mayke livre

Atlético no 4-3-1-2 losango bem compactado e defesa alta encaixou no 4-2-3-1 celeste mas deixou Mayke livre

Com Borges de volta, Marcelo Oliveira pode escalá-lo no comando do ataque e escalou ao trio “titular” de meias, com Éverton Ribeiro partindo da direita, Ricardo Goulart centralizado e Willian pela esquerda. Nilton e Lucas Silva foram novamente os parceiros na proteção da área, e a defesa foi formada pelos zagueiros centrais Dedé e Bruno Rodrigo, com Egídio na lateral esquerda e Mayke, na vaga do poupado Ceará, na direita — todos capitaneados pelo goleiro Fábio.

Vágner Mancini não podia contar com o longevo Paulo Baier, e mudou a forma de jogar de sua equipe para encarar o líder no Mineirão. Foi um tradicional 4-3-1-2 losango, mas com compensações defensivas. Debaixo das traves, Weverton teve sua linha defensiva formada por Léo à direita, Manoel e Luiz Alberto no miolo e Maranhão, volante, fechando o lado esquerdo. Bruno Silva ficou plantado à frente da zaga, Deivid à direita e João Paulo à esquerda eram os apoiadores e Everton centralizado na ligação. No ataque, Marcelo fechava o lado esquerdo e Éderson ficava mais por dentro.

Encaixe de marcação

O Atlético começou o jogo muito compacto, com as linhas bem próximas e com perseguições bem definidas. No meio, Deivid colava em Goulart, e os dois apoiadores perseguiam os volantes celestes. Éverton, o meia de ligação, por vezes fechava o espaço no centro sem ter um jogador designado, por vezes fechava o lado direito para bater com Mayke. Marcelo caía pela direita para impedir os avanços de Egídio, e Éderson preferia marcar Dedé à distância.

Assim, ninguém marcava Mayke diretamente. Talvez Mancini esperasse por ali a presença de Ceará, que passa menos que o jovem lateral. Portanto ali era o setor de preferência de saída de bola. Por vezes, Éverton, o meia de ligação, caía por ali para cercar, e por vezes o volante lateral Maranhão subia a marcação no garoto.

Profundidade e velocidade

Mas a defesa do time paranaense jogava alta, um dos requisitos principais para a compactação, dificultando as ações celestes entre as linhas. Também por isso, nos quinze primeiros minutos, o Cruzeiro cadenciou, estudando a melhor forma de sair e atacar, sem dar velocidade. Nesse período, Mayke parecia um tanto nervoso, errando alguns passes bobos e errando domínios de bola, mas depois que o mapa da mina foi descoberto, o Cruzeiro acelerou e intensificou a movimentação. Preferiu a direita e bolas em profundidade, para pegar a defesa atleticana correndo pra trás.

Éverton Ribeiro, Willian, Egídio e o próprio Mayke arremataram contra Weverton nesse período, quase sempre em jogadas de passe vertical nas costas da defesa — assim como o escanteio que originou o gol: bola em profundidade para Mayke finalizar em cima de Weverton que mandou pra fora. Na cobrança, Nílton inverteu os papéis com Dedé e completou sozinho para o gol, de primeira, numa bola difícil — ela ainda resvalou na trave antes de entrar.

A jogada que originou o escanteio do gol foi como muitas outras: profundidade para aproveitar o posicionamento alto da defesa do Atlético/PR

A jogada que originou o escanteio do gol foi como muitas outras: profundidade para aproveitar o posicionamento alto da defesa do Atlético/PR

Mesmo com a vantagem, o Cruzeiro não se deu Logo depois, a arbitragem anularia o segundo gol legítimo e que poderia dar outra cara à partida. No fim do primeiro tempo, Borges também teria oportunidade de ampliar, novamente em jogada de profunidade, mas desta vez sim, ele estava impedido.

Cansaço?

No segundo tempo, a marcação ofensiva do Atlético mudou. Marcelo passou a acompanhar Éderson na semi-pressão aos zagueiros, deixando os laterais livres. A segunda etapa começou como terminou a primeira: antes do relógio ter dado uma volta completa Willian já tinha arriscado para o gol. Depois, Nilton quase fez o segundo num cabeceio, mas Weverton pegou no cantinho e Borges desperdiçou o rebote. Depois Lucas Silva tentaria mais uma vez de fora da área, mas o chute foi bloqueado.

E foi só. Inexplicavelmente — ou, pensando melhor, talvez pela questão física — o Cruzeiro reduziu a velocidade do jogo e deu campo ao Atlético Paranaense. Convidado a atacar, e atrás no placar, o Atlético aceitou a proposta e avançou suas linhas. As três finalizações do primeiro tempo já tinham agora a companhia de mais duas — todas para fora, é verdade, mas agora as estratégias haviam se invertido: o Cruzeiro esperava para contra-atacar e o Atlético tinha mais a bola.

Controle defensivo

Marcelo então promoveu duas trocas de uma só vez. Borges e o amarelado Éverton Ribeiro deram suas vagas e Júlio Baptista e Alisson. Júlio foi ser o central, empurrando Goulart para frente, e Alisson fechou o lado esquerdo, com Willian invertendo. Pernas novas para tentar segurar a bola no ataque e não correr riscos de um injusto empate. Vágner Mancini respondeu tirando Deivid e lançando o meia Felipe, e logo depois mandou Dellatorre na vaga de Marcelo, soltando o time num 4-3-3. A partir daí o Atlético teve mais posse, mas não teve muita eficiência. Foi só aí que Fábio fez sua única defesa no jogo, a única finalização certa do time paranaense durante todo o jogo.

Mancini ainda tentou colocar um homem de área, Roger, na vaga de Éderson, para a famosa tática da bola aérea, mas o Cruzeiro controlava bem o jogo defensivamente e não permitia cruzamentos. A posse de bola atleticana assustava, mas não era produtiva, e era o Cruzeiro quem tinha mais chances de marcar em contra-ataques. No fim, a troca de Willian por Lucca e a sequência interminável de escanteios com Júlio Baptista decretaram o fim da partida.

Chegou a hora

Não só o Atletico finalizou pouco como também concluiu mal e de longe: só 3 foram de dentro da área, e somente 1 foi no gol (Footstats)

Não só o Atletico finalizou pouco como também concluiu mal e de longe: só 3 foram de dentro da área, e somente 1 foi no gol (Footstats)

A vitória do Cruzeiro foi incontestável, diante de um rival direto na ponta da tabela. O jogo só equilibrou no fim porque o Cruzeiro cansou — lembrando que o Atlético não jogou com seu time titular no estadual, e por isso tem um condicionamento físico melhor. Mesmo assim, houve superioridade da defesa celeste sobre o ataque adversário. Não custa lembrar que o Atlético é o segundo time que mais finaliza no campeonato, perdendo apenas para o próprio Cruzeiro. A partida de sábado, no entanto, foi a terceira da equipe paranaense com menos finalizações nas 21 primeiras rodadas — o Atlético só concluiu menos contra Corinthians (na 8ª rodada) e Atlético/MG (10ª).

Encaixar uma sequência de treze jogos sem derrota não é para qualquer equipe. Vágner Mancini chegou ao Atlético Paranaense e conseguiu isso, mas diante de um Cruzeiro que impõe respeito antes mesmo das partidas, mudou sua equipe e conheceu seu primeiro revés — mesmo sendo, na modesta opinião deste blogueiro, a estratégia certa para enfrentar o líder em sua própria casa.

Resta saber se o Botafogo, agora o único rival mais próximo com a derrota do Grêmio, também respeitará o Cruzeiro, modificando ao menos sua estratégia de jogo, ou se irá tentar encarar o time celeste de igual para igual no Mineirão.

Cá pra nós: se Oswaldo de Oliveira preferir a segunda opção, tem muito mais chance de sair derrotado.

Goiás 1 x 2 Cruzeiro – Sem referência

O título acima havia nascido na cabeça deste que vos escreve já na metade do primeiro tempo, pois sintetiza bem o que foi a partida entre Goiás e Cruzeiro no Serra Dourada — atualmente o maior campo do Brasil. Lesionados, os atletas que jogam na referência — jargão do futebol que é sinônimo da posição de centroavante, ou target man no inglês — ficaram de fora. No Cruzeiro, Borges foi vetado pouco antes da partida, e no Goiás já se sabia que Walter dificilmente iria para o jogo — muito mais prejuízo, já que é referência para todo o time e não só para o ataque.

A falta de referência, porém, não estava somente na posição de centroavante, como veremos a seguir.

Formações iniciais

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Goulart não foi bem como centroavante e assim o Cruzeiro ficou ficou sem referência tanto no ataque como no meio

Marcelo Oliveira escolheu o jovem Alisson para a vaga de Borges, avançando Ricardo Goulart para jogar entre os zagueiros. Com isso, o posicionamento de partida dos três meias também foi modificado — Éverton Ribeiro passou a ser o central, Alisson entrou caindo mais pela esquerda e Willian trocou de lado. O resto do time foi o mesmo que iniciou a última partida, com Fábio no gol, Ceará e Egídio nas laterais direita e esquerda, respectivamente, e Dedé e Bruno Rodrigo na zaga central. Nilton e Lucas Silva mais uma vez fizeram uma boa dupla volância, com o primeiro mais preso que o segundo.

Enderson Moreira armou o Goiás num 4-3-3/4-1-4-1 para encaixar a marcação no meio-campo com o Cruzeiro: um apoiador em cada volante e dois homens abertos para bater com os laterais. A linha defensiva que protegia o gol de Renan tinha Vítor à direita, Walmir Lucas e Rodrigo na zaga e William Matheus na lateral esquerda. David foi o volante, tendo Hugo e Thiago Mendes mais à frente, com Ramon pela direita e Renan Oliveira pela esquerda. Na frente, Neto Baiano.

Respeito

Logo no começo da transmissão do jogo, a TV captou a tradicional reunião no túnel de acesso do Goiás ao gramado. Um dos jogadores falava em não pensar em empate, mas sim em vitória. Irõnico, pois o simples fato de ter que se dizer isso já indica que o empate era considerado um bom resultado. É o efeito da liderança inconteste.

E foi por isso que o Goiás se limitou a esperar o Cruzeiro e marcar forte nos minutos iniciais. Marcou em bloco médio/baixo, com Neto Baiano no círculo central olhando Dedé e Bruno Rodrigo tocarem a bola um para o outro. Se a jogada ia para os pés de Ceará, Renan Oliveira pressionava, e se fosse em Egídio, Ramon subia a marcação. O resto do time se postou num marcação individual por setor: laterais batendo com ponteiros, o volante David com o central, e os zagueiros contra Ricardo Goulart.

O central

Para sair dessa forte marcação, era preciso muita mobilidade. Na teoria, a entrada de Ricardo Goulart na vaga de Borges era exatamente pra isso — se o camisa 31 não é centroavante nato, ele se movimenta mais, saindo da área para inverter posições com os ponteiros e o central. Mas Goulart não fez isso, preferindo se limitar a jogar enfiado entre os zagueiros. E com a adição de Alisson, a linha de três não estava tão entrosada, tanto mais com Éverton Ribeiro por dentro. Assim, o time ficou também sem uma referência no meio-campo central, alguém para se movimentar, receber a bola e distribuir de volta: exatamente o papel que Ricardo Goulart faz.

O resultado direto foi que o Cruzeiro não criou pelo chão e tentava a ligação direta. Porém, Goulart dificilmente é o jogador certo para este tipo de jogo, a famosa disputa de 1ª e 2ª bola. Os zagueiros goianos ganhavam quase tudo. Sem ser agredido como esperava, o Goiás foi se soltando aos poucos e foi avançando o time, sem descuidar de seu esquema de marcação. Mesmo assim, não incomodou muito a meta de Fábio, exceção feita ao chute de Hugo pra fora após roubar uma bola na pressão alta.

Mas o Goiás achou seu gol numa falha de marcação de Egídio (veja imagem abaixo), e com a vantagem voltou ao modo inicial da partida — a meta era dificultar ao máximo as ações ofensivas celestes. Se o discurso do túnel de acesso serve de parâmetro, um vitória simples sobre o líder era um excelente resultado. Porém, a defesa goiana não contava com um passe maravilhoso do garoto Alisson. Tentando deixar Goulart em impedimento, se esqueceu de Willian, que desviou de Renan e empatou.

Fim do experimento

No intervalo, Marcelo Oliveira desfez a tentativa. Recuou Goulart e colocou os três meias nas posições “originais” — Ribeiro na direita, Goulart por dentro e Willian na esquerda — tirando Alisson da partida e lançando Anselmo Ramon. Normalmente seria Vinícius Araújo o escolhido, mas o jovem da base não foi relacionado por estar em vias de servir a seleção sub-20. A ideia era conseguir fazer o tal jogo de primeira e segunda bola, com retenção de posse no ataque, e ainda contar com o entrosamento dos três meias para dominar a posse de bola no meio.

Somente o segundo item funcionou. Com Goulart como central, a diferença no fluxo de passes era visível. Anselmo, porém, destoou do time e não venceu nenhum duelo aéreo, servindo apenas para ocupar os zagueiros do Goiás. Foram os quinze minutos de maior domínio do Cruzeiro na partida, até que Marcelo Oliveira tirou Goulart da partida e mandou Dagoberto. No Goiás, Neto Baiano saiu para a entrada de Júnior Viçosa, mais veloz, mas mantendo o sistema tático.

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre as duas primeiras trocas do Cruzeiro

O período de maior produção ofensiva foi justamente quando Ricardo Goulart estava como central, entre a primeira e a segunda troca

Erro ou acerto?

Difícil dizer que a troca foi um erro após o resultado conhecido, mas no momento não me pareceu a melhor escolha. Dagoberto ainda está voltando de lesão, pegando o ritmo, e notadamente não tem a mesma aplicação defensiva que os outros ponteiros celestes. Além disso, o Cruzeiro novamente ficou sem sua referência de passe no meio-campo, com Éverton Ribeiro voltando a ser o central para dar espaço a Dagoberto na direita. Willian continuou pelo lado esquerdo.

O Goiás passou a dominar a posse de bola novamente e chegou com perigo algumas vezes. Enderson Moreira sentiu que podia vencer e colocou Tartá na ponta direita na vaga de Ramon, para pressionar Egídio. No Cruzeiro, Ceará sentiu cansaço ou lesão, e deixou o gramado para a entrada de Mayke — uma troca que é aparentemente seis por meia dúzia, mas quem acompanha o blog sabe que não é bem assim. Mayke é mais ofensivo e veloz, enquanto Ceará dá mais segurança na marcação.

Virada de líder

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

No fim, o Goiás se soltou num 4-2-4/4-2-3-1 mas deu campo para o Cruzeiro contra-atacar com Dagoberto e quase matar a partida

Ter queimado a regra três logo aos 25 do segundo tempo acabou por ser determinante, porque três minutos após a substituição, Lucas Silva virou a bola para Dagoberto na direita. Mayke passou como um raio em direção à linha de fundo e foi acionado. Levantou a cabeça e achou Willian na marca do pênalti, fazendo o famoso “facão” da esquerda pra dentro e virando o placar.

Depois do gol, Enderson Moreira tentou abriu totalmente o time num misto de 4-2-3-1 e 4-2-4 super ofensivo com Araújo na vaga de Hugo, recuando levemente Viçosa para o meio. Incomodou, é verdade, mas correu o risco de dar o contra-ataque para o time celeste, que desperdiçou duas oportunidades. Mas Fábio e a trave nos deram a sexta vitória seguida e a manutenção da vantagem na liderança.

Até quando se erra, se acerta

Ousadamente, manterei a minha opinião: a saída de Goulart foi um erro. A entrada de Dagoberto pode ter sido boa, mas a saída de Ricardo diminuiu consideravelmente o domínio territorial no meio-campo, e correu-se risco demais de sofrer um gol por causa disso.

Entretanto, mesmo com este equívoco, o Cruzeiro venceu. E não foi num erro do adversário, mas sim mérito: jogada construída, com passes conscientes, movimentação e excelência técnica. Além disso, contou com uma pitada de sorte nas duas bolas na trave que levou, e ainda com uma grande defesa de Fábio quando o jogo ainda estava em 1 a 1 — nosso capitão foi praticamente um espectador nas últimas partidas, mas provou que quando acionado é um dos melhores do Brasil. Ou seja, todos os ingredientes de um time campeão: elenco variado, qualidade técnica, time entrosado, confiança e sorte.

É aquela história: quando a fase é boa, tudo dá certo.

Cruzeiro 1 x 0 Flamengo – Força e leveza

Com bons desempenhos nas duas pontas do campo, o Cruzeiro completou a quina e fechou o primeiro turno do Brasileirão com uma bela soma de pontos e boa vantagem para o segundo colocado (e que se não fosse um gol do Botafogo no último minuto do jogo contra o Criciúma, poderia ter sido ainda maior).

Foi um jogo mais difícil do que pareceu. Mesmo tendo muito volume de jogo, os jogadores celestes tomaram algumas decisões erradas no momento do passe decisivo. Mas a atuação defensiva quase perfeita em termos táticos compensou a baixa taxa de conversão de finalizações em gols do ataque: 22 tentativas, 5 no alvo e 1 pra dentro.

Os sistemas

Muitas setas nos três meias: intensidade ofensiva e defensiva para abrir espaços com a bola e ajudar na marcação sem ela

Muitas setas nos três meias: intensidade ofensiva e defensiva para abrir espaços com a bola e ajudar na marcação sem ela

Sem Júlio Baptista, o poupado da vez, Marcelo Oliveira mandou a campo o tradicional 4-2-3-1 que tem usado o ano inteiro, com o trio de meias mais móvel da temporada: Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Willian atrás de Borges. Com a volta de Nilton, Henrique cedeu seu lugar ao lado de Lucas Silva na proteção da linha defensiva, formada por Ceará pela direita, Egídio pela esquerda e Dedé e Bruno Rodrigo por dentro, guardando a meta de Fábio.

Mano Menezes inverteu a orientação do triângulo do meio-campo, abandonando o 4-3-3 em favor do mesmo 4-2-3-1 celeste. Sem Felipe, Paulo Victor ficou na moldura, tendo Léo Moura de volta à lateral direita, Wallace e Samir no miolo de zaga e André Santos na lateral esquerda. Luiz Antônio e Cáceres foram os volantes, com Elias desta vez como meia central, e flanqueado por Gabriel à esquerda e Rafinha à direita. Na frente, Hernane continuou no comando do ataque.

Quinze minutos de pressão

O Cruzeiro começou o jogo tentando sufocar o Flamengo, marcando no alto do campo para roubar a bola o mais rápido possível. Com menos de um minuto, Willian já havia tentando o seu primeiro chute, e logo depois foi Éverton Ribeiro quem fez nova tentativa. O Flamengo, porém, se contentou em jogar defensivamente, com linhas bem próximas, exatamente para tentar evitar o toque de bola envolvente que o Cruzeiro tentava impor. Até os 15 minutos, só o Cruzeiro jogou, e o Flamengo só rebatia a bola e esperava novo ataque. O time celeste chegou a ter 75% de posse de bola nesse período.

Depois disso, no entanto, o Cruzeiro baixou sua marcação e deixou os zagueiros do Flamengo livres, talvez numa tentativa de espaçar as linhas do time adversário para encontrar mais liberdade. Não funcionou bem, em parte porque o Flamengo não quis sair para o jogo — continuou simplesmente tirando a velocidade celeste e atrasando o máximo possível os ataques — e em parte porque o único jogador mais criativo da equipe carioca, Elias, estava mais à frente, marcado, e sem estar em sua melhor forma física, e por isso o Flamengo ficou sem saída de bola.

Defesas

Mas isso também foi ocasionado pela ótima marcação do Cruzeiro. Se com a bola o trio de meias tinha certa dificuldade em vencer a marcação adversária, defensivamente eles mostraram uma aplicação impressionante. Até mesmo Éverton Ribeiro, que em jogos anteriores não era tão exigido na marcação, voltou até a linha de fundo para marcar e cobrir o lateral se estivesse por um dos lados, e marcava os volantes quando estava pelo meio. O mesmo pode ser dito de Ricardo Goulart e Willian, que fizeram o tradicional carrossel na linha de três, e por isso marcavam um adversário diferente a cada momento.

Já o posicionamento defensivo do Flamengo era mais rígido. Hernane se alinhava a Elias no centro e o Flamengo desenhava uma espécie de 4-2-4-0 — Dedé e Bruno Rodrigo tinha todo o tempo do mundo com a bola nos pés. Rafinha vigiava Egídio pela esquerda e Gabriel fazia o mesmo com Ceará pela direita, mas o Cruzeiro usava uma estratégia interessante de atrair o time adversário para um lado do campo, puxando o ponta oposto do Flamengo para o centro do gramado, e girava a bola rapidamente para o lateral do outro lado, que ganhava espaço para avançar e fazia o ponta recuar em diagonal.

Último passe

A partir dessa linha, porém, o Cruzeiro teve dificuldade. O Cruzeiro aplicava movimentação, com a já mencionada troca de posições entre os meias e a participação de Lucas Silva como ponto de apoio mais atrás — coisa que o Cruzeiro não tem tanto quando Nilton e Souza estão em campo — e com isso os espaços eram criados, mas o último passe não encaixava ou não saía. Exemplos foram o lance de Willian pela direita em tabela com Éverton Ribeiro, quando cruzou fraco e fechado demais nas mãos de Paulo Victor; e um passe de Willian para Ribeiro que deveria ter sido devolvido — Éverton preferiu finalizar e errou.

O jogo seguiu nessa toada até o fim, não só do primeiro tempo mas como do jogo. Um bom resumo seria: o ataque cruzeirense e a defesa carioca travando um duelo equilibrado e a defesa do Cruzeiro levando ampla vantagem sobre o inoperante e quase inexistente ataque do Flamengo.

Invertendo o lado

No fim do primeiro tempo, uma falta no meio-campo rendeu um cartão amarelo para Egídio, que fez Marcelo Oliveira agir com cautela e tirar o lateral do jogo. Sem um lateral esquerdo reserva devido à lesão de Éverton, Ceará foi deslocado para lá e Mayke entrou no jogo. Isso acabou dando uma solidez defensiva ainda maior, já que a experiência de Ceará falou bem mais alto que os atacantes do Flamengo, e ele simplesmente venceu todos os duelos. Nenhum cruzamento partiu da lateral de onde Ceará se encontrava, tanto no primeiro quanto no segundo tempo.

Por outro lado, sem Egídio e com Mayke, o Cruzeiro acabou ganhando uma opção ofensiva pelo lado “contrário” ao que está acostumado. Ceará naturalmente se resguarda mais e libera Mayke, e foi numa jogada síntese do Cruzeiro 2013 que saiu o gol da vitória. Drible de Éverton Ribeiro, passe para Willian à frente, que recuou para Ricardo Goulart — todos os meias pelo centro e abrindo os corredores — que imediatamente conectou a Mayke, totalmente livre de marcação por causa dessa movimentação. Ele centrou para Goulart, que já estava dentro da pequena área. O camisa 31 errou o cabeceio, mas a bola beijou a trave e voltou em seus pés com o goleiro vendido. Uma dose de sorte, afinal, a sorte acompanha os competentes.

Com Ceará mais preso na esquerda, Mayke pôde se soltar mais e o Cruzeiro acabou preferindo o lado direito para atacar

Com Ceará mais preso na esquerda, Mayke pôde se soltar mais e o Cruzeiro acabou preferindo o lado direito para atacar

Outras trocas

Mesmo depois do gol, as posturas não se alteraram. O Cruzeiro com a bola, atacando e tentando criar, e a defesa do Flamengo mostrando uma determinação tática impressionante. Mano fez sua primeira mexida mandando Nixon a campo na vaga de Rafinha, sem alterar o desenho tático. Talvez fosse uma tentativa de jogar em velocidade às costas de Ceará, mas nosso camisa 2 inutilizou essa substituição com uma atuação defensiva impecável.

No Cruzeiro, Marcelo Oliveira tentou “bagunçar” a rigidez ofensiva do Flamengo tirando Borges, o centro-avante do time para lançar Dagoberto. A princípio, Dagoberto ficou pela esquerda batendo com Léo Moura, com Éverton Ribeiro pelo meio, Willian pela direita e Goulart à frente. Mas a ideia era ter um quarteto totalmente móvel, e que funcionou exatamente dessa forma. Goulart recuava, Dagoberto invertia de lado, Willian passava ao centro e Éverton Ribeiro caía pela esquerda — um verdadeiro carrossel que melhorou um pouco a produção ofensiva. Porém, o último passe continuou não saindo, ou saindo para o lado errado.

Mano trocou ainda Gabriel e Luiz Antônio por Bruninho e Carlos Eduardo. Elias recuou à faixa dos volantes e Carlos Eduardo foi ser o meia central, mantendo o 4-2-3-1. E no Cruzeiro, Alisson entrou na vaga de Willian e jogou mais pelo centro, com os outros três orbitando, mas houve pouco tempo para que o garoto tivesse uma maior influência na partida.

Liquidez e solidez

Muito se fala do ataque do Cruzeiro neste Brasileirão. Maior número de gols marcados, de finalizações e finalizações certas. Quem acompanha o blog sabe que isto se deve também à maleabilidade e intensidade do sistema ofensivo, com o trio de meias e sua movimentação e aproximação, não guardando posição e sempre abrindo linhas de passe para os companheiros.

A posição média mostra como o Cruzeiro foi maleável e o Flamengo rígido; Éverton Ribeiro (17), Ricardo Goulart (31) e Willian (41) atuam tão próximos quee se confundem. Ceará (2) está no centro porque atuou um tempo em cada lateral

A posição média mostra como o Cruzeiro foi maleável e o Flamengo rígido; Éverton Ribeiro (17), Ricardo Goulart (31) e Willian (41) atuam tão próximos quee se confundem. Ceará (2) está no centro porque atuou um tempo em cada lateral

Mas se voltarmos os olhos para a outra ponta do campo também vamos ver um time sólido, taticamente bem postado e com muita intensidade também na marcação. O Flamengo só chutou 5 vezes, e nenhuma delas no gol — Fábio nem sujou o uniforme. O trabalho sem a bola começa já no ataque, e a aplicação dos meias neste jogo em particular saltou aos olhos. Isto vai de encontro ao que Marcelo Oliveira disse no programa “Bem, Amigos!” do SporTV quando lá foi entrevistado: é mais fácil fazer um jogador técnico marcar do que um jogador mais físico e defensivo jogar. Esta aí a prova.

Agora vem o segundo turno. Mais 19 partidas, porém concentradas em um menor espaço de tempo — o desgaste físico pode influenciar. Além disso, a posição incontestável no topo da tabela faz do Cruzeiro um time mais visado, mais estudado, o que é mais um fator de dificuldade.

Mas, para ser campeão, é preciso vencer isso também — e a possibilidade é grande.

Bahia 1 x 3 Cruzeiro – Tranquilidade agitada

Jogando com certa tranquilidade — por vezes até excessiva — o Cruzeiro venceu o Bahia na Fonte Nova num jogo em que poderia ter tomado menos sustos se não tivesse, por iniciativa própria, tentado se poupar ao máximo. A temporada é desgastante e certamente esta é uma decisão consciente da comissão técnica, mas esta postura perigosa pode dificultar demais alguns jogos aparentemente controlados. Por outro lado, indica a consciência que o time tem sobre si mesmo, o que é importante ao definir a proposta de jogo para cada partida em um campeonato tão longo.

O triunfo garantiu a liderança ao fim do turno com uma rodada de antecedência. Um título simbólico, é verdade, mas que indica a força do elenco celeste e o bom trabalho do treinador: mudam-se as peças, o estilo e até a estratégia, mas a consistência é mantida.

Alinhamentos iniciais

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Cruzeiro no 4-2-3-1 de sempre, mas sem a mesma intensidade diante do 3-1-4-2 baiano quase em marcação individual

Marcelo Oliveira continuou com sua política de fazer rodízio com os jogadores, procurando poupar os que vem tendo sequências grandes. O escolhido da vez foi Ricardo Goulart, e com isso, Júlio Baptista e Borges foram escalados juntos, em suas posições normais do 4-2-3-1: Borges à frente e Júlio centralizado no meio. Fazendo a linha de três junto ao camisa 10 estiveram Éverton Ribeiro à direita e Willian à esquerda. Atrás deles, Henrique e Lucas Silva repetiram a parceria na volância, protegendo a linha defensiva formada por Ceará à direita, Dedé e Bruno Rodrigo no miolo e Egídio à esquerda. Fábio foi o goleiro e capitão.

Já o Bahia de Cristóvão Borges surpreendeu, abandonando o 4-3-3 das últimas partidas e vindo a campo numa espécie de 3-1-4-2. Defendendo a meta de Marcelo Lomba, Titi comandava a defesa, com Demerson à sua direita e Lucas Fonseca pela esquerda. Fahel era o cão de guarda do triângulo no círculo central, com Hélder mais avançado à esquerda e Marquinhos Gabriel um pouco mais centralizado à direita. Lado este que era fechado por Mádson, bem avançado e batendo com Egídio, e Raul na ala esquerda, um pouco mais atrás, mas ainda bem alto em relação a um lateral. Na frente, Wallyson caía mais pela esquerda e Fernandão ficava na referência.

Movimentos iniciais

Desde o apito inicial, o Bahia mostrou o que queria: se defender e jogar no erro do Cruzeiro. Fernandão marcava a partir da linha divisória; Wallyson acompanhava Ceará, deixando Raul mais preocupado com Éverton Ribeiro; do outro lado, Mádson batia com Egídio; os dois meias centrais duelavam com os volantes e Fahel perseguia Júlio Baptista; e na zaga, Willian era marcado por Demerson, Borges por Titi e Lucas Fonseca ficava na sobra da Raul. Praticamente uma marcação mano-a-mano, mas com sobras no meio e na direita, deixando os zagueiros do Cruzeiro completamente livres.

Por já ter a bola nos pés, o Cruzeiro agradeceu ao Bahia por não precisar dar intensidade na marcação, poupando-se do desgaste. Porém, este parecia também ser um dos objetivos com a bola: descansar. Com muita paciência e tocando a bola como em um jogo de handebol, alterando entre os lados até conseguir uma brecha, o time celeste dominou a posse de bola, mas sem a costumeira troca de posições e movimentação que caracterizam o time. O resultado foi o baixo número de finalizações do time se comparado com ele mesmo em outras partidas: foram apenas 5 no primeiro tempo.

Buscando outra rota

Com o meio completamente congestionado, e sem muita vontade de desorganizar o sistema defensivo do Bahia, o Cruzeiro procurou a rota aérea. Primeiro com Egídio achando Júlio Baptista no meio da área, com a bola beijando a trave, e no lance seguinte, Willian centrou a Borges que, entre os zagueiros, mandou de peixinho para abrir o placar.

Nem com o gol sofrido o Bahia mudou a postura — a posse de bola chegou a ficar em 64% a 36%. O que mudou foi que o Cruzeiro também passou a administrar e deixava os zagueiros do Bahia com a bola também. Porém, o time baiano não sabia bem o que fazer com ela, já que a defesa celeste estava bem sólida num 4-4-1-1, com os ponteiros voltando e se alinhando aos volantes. O sistema do Bahia não favorecia, porque causava a sobra dupla redundante na zaga (3 zagueiros contra Borges) e assim o Cruzeiro dobrava a marcação pelos lados.

O intervalo parecia longe já que o jogo estava bem insosso, mas Everton Ribeiro tratou de aumentar a emoção, ao receber cruzamento da direita, driblar dois zagueiros e concluir forte no ângulo direito de Lomba.

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

O Cruzeiro concluiu pouco (11 vezes) devido à postura do Bahia e sua própria estratégia, mas acertou 6 tiros no alvo com 3 gols

Fim da linha de três

Marcelo Oliveira não fez trocas, mas Cristóvão Borges percebeu que a defesa com três zagueiros não funcionou e mandou William Barbio a campo na vaga de Mádson. O atacante foi ser ponteiro direito, puxando Demerson para a lateral direita, deixando os outros dois zagueiros no meio e recuando Raul para a linha defensiva. Fahel continuou mais plantado e Wallyson abriu de vez pela esquerda, configurando o 4-3-3 clássico.

Em teoria, a troca daria mais velocidade de contra-ataque ao time da casa, já que agora os pontas não tinham mais tantas atribuições defensivas. Porém, para existir o contra-ataque, era preciso existir o ataque primeiro — mas o Cruzeiro estava obviamente satisfeito com o resultado, tentando se poupar o máximo possível, já que o Bahia não conseguia chegar perto de Fábio quando tinha a bola nos pés.

Talisca

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Talisca no repaginado 4-3-3 do Bahia deu trabalho, e o Cruzeiro só foi voltar a ter intensidade quando Martinuccio foi a campo

A entrada de Anderson Talisca na vaga do lesionado Marquinhos Gabriel, porém, mudou este panorama. O jovem deu mais criatividade e certa fluência nos passes do time da casa, que chegou algumas vezes em velocidade pelos lados. Wallyson e William Barbio tiveram chances, mas desperdiçaram. Marcelo Oliveira respondeu “aproveitando” a lesão de Borges para lançar Ricardo Goulart, mas desta vez como meia central, mandando Júlio Baptista à frente. A intenção era voltar a acelerar o jogo quando o Cruzeiro tinha a bola, pois o jogo começava a ficar arriscado demais.

E ficou de vez depois do gol de Fahel, em cabeceio sozinho dentro da pequena área, após cruzamento da esquerda. Imediatamente, Cristóvão Borges queimou a regra três mandando Feijão na vaga de Hélder, um volante com mais saída e melhor passe. O Bahia se animou e tentou atacar, dando trabalho principalmente a Egídio pela esquerda. Foi então que Marcelo Oliveira promoveu o inusitado: tirou Egídio de campo e mandou Mayke. Ceará foi ser, talvez pela primeira vez na vida, lateral esquerdo — era clara a intenção de acabar com as investidas de William Barbio por ali.

Lado esquerdo

Apesar do cartão amarelo logo em seu primeiro lance, Ceará aparentemente deu conta do recado e o Bahia parou de ter tantas chances. Só chegou em um chute de Fernandão por cima em passe de Talisca. A última troca teria Éverton Ribeiro dando seu lugar a Martinuccio, jogando Willian para a direita. Em seu primeiro lance, o argentino já tentou o gol — sinal de que, agora sim, o Cruzeiro tinha alguém para acelerar o jogo e definir o confronto de uma vez por todas.

A origem do terceiro gol é o exemplo: Martinuccio recebe o passe e acelera, sofrendo falta. Depois da cobrança, a bola chega em Goulart, que também dá intensidade e sofre nova falta. Na cobrança, Willian achou Dedé na segunda trave, que cabeceou para defesa parcial de Lomba. Júlio Baptista, sumido desde que virou centro-avante, pegou o rebote e — finalmente — matou a partida.

Com “emoção”

O final da partida na Fonte Nova provou que o Cruzeiro poderia sim ter matado a partida em um momento anterior, se optasse por acelerar ao invés de tirar a velocidade do jogo. Mas não se pode culpar totalmente os jogadores, que enxergaram no jogo uma chance de se pouparem do grande desgaste físico que a temporada impõe sem perder pontos. Sem dúvida, é uma postura arriscada, mas que deu certo desta vez.

Outro aspecto tático a ser notado é que, com a entrada de Júlio Baptista, a equipe perde em mobilidade e leveza no meio, mas o camisa 10 compensa isto com experiência e poder de conclusão — já são dois gols em dois jogos e meio. Mais uma opção de formação para o 4-2-3-1, com uma característica diferente.

E essa é a principal virtude desta equipe: ser mutante e adaptável, tendo à sua disposição estratégias, estilos e rotas de ataque diferentes — mas sem alterar a plataforma tática. Essa manutenção é muito importante para os jogadores, pois quem entra já sabe como a equipe joga e de que posição deve partir para exercer sua função em campo, obviamente, adaptada para sua característica.

Isso faz com que o elenco rode e a regularidade se mantenha — aspecto primordial de muitos campeões de pontos corridos…

Cruzeiro 5 x 3 Vasco – Transplante de coração

Cruzeiro e Vasco fizeram um jogo de muitos eventos, dentre eles os vários gols. E parte deles podem ser explicados pela escalação diferente, principalmente no triângulo do meio-campo — o “coração” do time, formado pelos dois volantes e pelo meia central — que modificou o estilo de jogo celeste. Para o bem e para o mal.

Formações

Com um novo trio no círculo central, o 4-2-3-1 celeste teve menos mobilidade na linha de 3 e menos pegada defensiva, mas compensou com o avanço dos volantes e de Júlio

Com um novo trio no círculo central, o 4-2-3-1 celeste teve menos mobilidade na linha de 3 e menos pegada defensiva, mas compensou com o avanço dos volantes e de Júlio

Marcelo Oliveira armou o Cruzeiro no 4-2-3-1 usual, mas com o trio central do meio-campo totalmente diferente. A dupla de volantes titular estava lesionada, e para seus lugares Henrique e Lucas Silva foram os escolhidos. À frente deles, Júlio Baptista herdou a vaga de Borges, com Ricardo Goulart indo para o comando do ataque. O restante do time não foi alterado: Fábio no gol, linha defensiva com Ceará e Egídio pelos lados e Dedé e Bruno Rodrigo no miolo; Lucas Silva e Henrique dando suporte a Everton Ribeiro na direita, Willian na esquerda e Júlio Baptista por dentro, com Ricardo Goulart na frente.

O Vasco de Dorival Júnior veio num 4-3-3/4-1-2-3 que encaixou a marcação no círculo central. Protogendo o gol de Diogo Silva estavam os zagueiros Cris e Rafael Vaz, flanqueados por Fagner na direita e Yotún na esquerda. Abuda era o volante único, com Juninho Pernambucano armando pela direita e Wendel (aquele de 2003) pela esquerda. A linha de ataque era comandada por André, e ainda tinha Willie aberto pela direita e Marlone pela esquerda.

Diferenças de estilo

O jogo começou já com 1 a 0 no placar, pois o gol de Willian em cobrança de lateral de Ceará aconteceu antes de qualquer tipo de análise. Depois, quando o jogo assentou, foi mais fácil entender o que se passava.

Júlio é um jogador diferente de Ricardo Goulart: mais físico e forte, e ao mesmo tempo menos móvel. Isso teve consequências diretas no estilo de jogo celeste, que com Willian, Ribeiro e Goulart no meio, é de movimentação e troca de posições. Com Júlio, o time ficou um pouco mais engessado, com menos inversões. Além disso, Goulart também não é um centro-avante típico, e por isso o jogo de primeira e segunda bola não poderia ser empregado, e nem a estratégia da bola longa pelo chão para a retenção, de costas para o gol, enquanto o time chega de trás.

Porém, o uso de dois volantes mais técnicos, como Lucas e Henrique, ao invés dos dois mais marcadores Nilton e Souza, deu uma certa compensada, já que Júlio se infiltrava mais na área adversária do que se movimentava lateralmente, abrindo espaços para quem chega de trás — Lucas teve mais liberdade para isso do que Henrique, que guardou mais sua posição. Porém, isso também teve seu preço: a marcação menos intensa no meio-campo e nas coberturas aos laterais.

Todos esses fatores podem ser vistos nos gols que se seguiram. No empate do Vasco, Willian sai na marcação de Fagner, que encontra Willie livre por dentro, por onde devia estar Lucas Silva; no replay, é possível ver o jogador atrasado na jogada para tentar barrar o bom chute do jovem vascaíno. Porém, o mesmo Lucas Silva receberia uma bola na frente da área, com muito espaço e sem nenhum tipo de marcação, atraída para outros setores pelos meias, e mandar um balaço no canto para colocar o Cruzeiro novamente na frente.

Os quatro de frente mais os laterais atraem a marcação e abrem espaço para Lucas Silva chutar de longe e marcar o seu primeiro gol na noite

Os quatro de frente mais os laterais atraem a marcação e abrem espaço para Lucas Silva chutar de longe e marcar o seu primeiro gol na noite

Estratégias de marcação

Sem a bola, o Cruzeiro não pressionou os zagueiros com a mesma fome de partidas anteriores. Em parte isso pode ser explicado pelo desgaste físico, provocado pelo apertadíssimo calendário do futebol brasileiro. Mas um outro fator é que essa pressão alta tem que ser coordenada para funcionar, e se somente Goulart fosse pressionar os zagueiros, sem a ajuda de Júlio atrás dele, somente abriria as linhas de passe para que os volantes recebessem a bola. Ou seja, um desgaste desnecessário. Mesmo assim, o Vasco não tentou sair jogando pelo chão, e tentava mais a bola longa.

Já o time carioca tentou se inspirar no seu maior rival e corajosamente avançou seus jogadores para fazer a pressão no campo adversário. Willie, Marlone e André tentavam induzir os zagueiros e laterais a dar o chutão, e frequentemente conseguiam. Isso também pode ser explicado pela diferença de estilo entre os volantes que estavam jogando e os titulares Nilton e Souza. Henrique e Lucas tem mais característica de tentar uma primeira criação, já tentando um passe mais incisivo, enquanto que Nilton e Souza mais recolhem a bola e passam para algum meia.

O resultado foi uma profusão de bolas longas de parte a parte, e nesse quesito Júlio Baptista se destacou: vencia praticamente todos os duelos aéreos, matando a bola e girando para sair jogando. O que me faz pensar que talvez a melhor posição para o jogador, nesse momento em que ele se encontra, sem muito ritmo de jogo, fosse a de centroavante, com Goulart de volta à sua posição “normal”. Talvez ainda vejamos esta experiência.

Egídio

Pelos lados, duelos interessantes. Na direita, Ceará não tinha dificuldades para vigiar Marlone, mas também não apoiava muito; já Éverton Ribeiro dava bastante trabalho para Yotún com a sua movimentação típica da direita para o centro, como pode ser visto na jogada que originou a falta do terceiro gol. Nela, Júlio está pela esquerda e Willian pela direita, com Ribeiro conduzindo em velocidade pela faixa central do campo até sofrer o calço. Cartão de visitas perfeito para Júlio, que mandou por cima da barreira como manda o figurino e aumentou a conta.

Mas pelo lado esquerdo a coisa não ia tão bem. Se Willian foi muito importante e participou tanto das jogdas ofensivas quanto da marcação em Fagner, Egídio teve bastante dificuldade para marcar o garoto Willie. Nem tanto no segundo gol do Vasco, já que o lateral teve que abandonar a composição da linha defensiva para tentar bloquear o cruzamento de Fagner que entrava livre. Mas não conseguiu e André completou para as redes antes de Bruno Rodrigo.

O terceiro, no entanto, poderia ter sido evitado se Egídio não tivesse parado na jogada. Fagner lançou bola longa e Bruno Rodrigo espanou de cabeça, para cima. Willie e Egídio vinham acompanhando, mas o lateral parou confiando que o zagueiro iria tirar. A bola caiu com Willie que driblou com o peito e bateu cruzado para empatar no fim do primeiro tempo.

Uma troca em duas

Os treinadores obviamente estavam satisfeitos com o rendimento de suas equipes, e não promoveram alterações. Mas Marcelo fez um pequenos ajustes: segurou Egídio mais na defesa para vigiar o garoto Willie mais de perto. De fato o garoto pouco fez no segundo tempo.

Assim como o Cruzeiro até as substituições. O resultado de empate era ótimo para o time visitante, especialmente jogando contra o líder do campeonato no Mineirão. E, claro, nada bom para quem almeja o título, caso do Cruzeiro. Então a obrigação de atacar passava cada vez mais a ser do Cruzeiro, e junto com ela crescia a impaciência da torcida, que insistentemente pedia a volta de Dagoberto. Marcelo queria era voltar ao modo “mobilidade” do 4-2-3-1 cruzeirense, e por isso Dagoberto não era o cara certo para entrar, e sim Vinicius Araújo. Inteligentemente, para evitar as vaias, primeiro atendeu ao pedido da torcida, sacando Éverton Ribeiro, e poucos minutos depois fez o que realmente queria, lançando Vinicius Araújo na vaga de Júlio Baptista. Ricardo Goulart voltou ao centro da linha de três. Dagoberto continuava pela direita e Willian pela esquerda — estranhamente, o inverso de seus lados “preferenciais”.

Não demorou muito para que o gol saísse, em uma roubada de bola de Willian, e que se transformou em 40 segundos de posse até sair o gol mais bonito da rodada: Lucas Silva, novamente de fora da área, driblando ninguém menos que Juninho para mandar o sapato e achar o ângulo esquerdo de Diogo Silva.

Um quase déjà vu

Roteiro clássico: após o quarto gol, Dorival arriscou com o atacante Marlone na direita e dois centroavantes, se expondo ao contra-ataque. Pagou o preço

Roteiro clássico: após o quarto gol, Dorival arriscou com o atacante Marlone na direita e dois centroavantes, se expondo ao contra-ataque. Pagou o preço

Pouco depois do gol, Dorival promoveu quase que três substituições de uma vez só. Primeiro, Montoya entrou na vaga de Wendel e Edmílson na de Fagner. O colombiano foi para a mesma posição do ex-cruzeirense, mas tem uma característica mais ofensiva. Já Edmilson foi ocupar a ponta esquerda batendo com Ceará, mandando Marlone para a lateral direita numa tentativa de fazer dois contra um junto com Willie pelo lado de Egídio.

Com isso, o Cruzeiro recuou novamente para proteger o resultado. Mais uma vez, de maneira perigosa. Willian marcava com afinco pela esquerda as investidas de Marlone, frustrando os planos de Dorival, que mandou Tenório a campo na vaga do jovem Willie na sua última cartada: a famosa bola aérea para o cabeceio desesperado.

Felizmente, Dagoberto, Goulart e Vinicius Araújo encaixaram o contra-ataque que aumentou a diferença. Em outros jogos, este gol mataria a partida, mas ainda haveria tempo para Alisson entrar no lugar de Willian e Dagoberto ser expulso em jogada infantil.

A adversidades e os três pontos

A formação com Júlio Baptista e os dois volantes mais técnicos claramente mudou o estilo de jogo do Cruzeiro. Foram “apenas” 15 finalizações, abaixo da média de 17,44 finalizações por jogo até então — mas ainda assim acima da média de 17 das outras 19 equipes. Também teve menos pegada: foi o segundo jogo do Cruzeiro com menos desarmes (19, com 14 certos), perdendo apenas para a partida contra o Fluminense fora de casa (18, sendo 12 certos). Todos os números de acordo com a Footstats.

Não seria exagero dizer que o Cruzeiro praticamente testou uma formação nova, ainda que o 4-2-3-1 estivesse lá, imutável. E mesmo sofrendo com os problemas defensivos na cobertura dos volantes aos laterais, o ataque produziu o suficiente para a vitória. Só há vantagens: rodar o elenco, aumentar a imprevisibilidade do time e o leque de opções, além de manter a confiança.

Vencer o Bahia na Fonte Nova garantirá o título simbólico de campeão do primeiro turno com uma rodada de antecedência. Nos dez nacionais de pontos corridos até aqui, somente por três vezes a equipe com mais pontos no primeiro turno não se sagrou campeã.

Assim, a vitória não nos garantirá o título, mas será “70%” do caminho andado.