Quatro jogos e perspectivas

Antes de mais nada, este blogueiro pede desculpas aos leitores por ter ficado tanto tempo ser dar satisfações. Entrei em um momento de mudança na vida — literalmente — e por isso fiquei sem infra-estrutura necessária para escrever os posts (leia-se: internet e computador).

Então, para não deixar de falar sobre nenhum dos jogos passados, aqui vão notas rápidas sobre os quatro últimos jogos.

Villa Nova 2 x 4 Cruzeiro

Em alguns jogos, o equilíbrio entre as equipes é simplesmente uma questão de número no centro do meio-campo. Que o Cruzeiro tem um elenco superior ao do Villa Nova todos sabemos, mas neste jogo o Villa tinha um quarteto no centro do campo, com o seu 4-3-1-2 losango frente ao 4-2-3-1 do Cruzeiro. Os dois volantes e Tchô, o meia central, se deram melhor em relação a Leandro Guerreiro e Nilton, que não conseguiam marcar os três. A partida tendeu para o domínio do time da casa no primeiro tempo simplesmente por isso.

Já no segundo, Marcelo Oliveira lançou Tinga para fazer um 4-1-2-3 que acertou a marcação: Guerreiro ficou responsável apenas por Tchô, e mesmo perdendo o duelo algumas vezes, como no gol de empate do Villa Nova, conseguiu tirar a liberdade que o camisa 10 adversário tinha na primeira etapa.

Mas com a mudança, Diego Souza foi jogar aberto do lado direito, deixando o time sem um meia central. Com isso, o time equilibrou o centro do meio-campo, mas criou pouco. A entrada de Ricardo Goulart aconteceu justamente para resolver este problema. Com ambos os times com meio-campo em losango, a qualidade técnica fez diferença e o Cruzeiro marcou mais dois gols.

Em suma: quando tinha apenas 2 meio-campistas (já que Diego Souza marca pouco) contra 4 do adversário, o Cruzeiro foi dominado. Com Tinga, o 3 x 4 equilibrou, e com Goulart, o número de meio-campistas se igualou, e aí o Cruzeiro se sobressaiu.

América 1 x 4 Cruzeiro

O América do técnico Paulo Comelli quis jogar de igual para igual contra o Cruzeiro no Mineirão. E foi amplamente dominado, principalmente porque, diferente dos outros times do campeonato, foi um time que tentou sair para o jogo e deu espaço para os jogadores de frente do Cruzeiro.

Também num 4-2-3-1, o time de Paulo Comelli foi facilmente repelido pela linha defensiva celeste. Com Rodriguinho, o meia central, encaixotado entre os volantes, Fábio Júnior tinha que sair muito da área, e Fábio quase não viu a cor da bola.

Já o Cruzeiro, desta vez com Ricardo Goulart na vaga do suspenso Dagoberto, imprimiu movimentação e confundiu a marcação americana. Já aos 16 minutos o Cruzeiro vencia por dois a zero, em jogadas de bola áerea. Depois disso apenas controlou as ações, repelindo as investidas do América com propriedade. Ainda sofreria um gol em falha de Leandro Guerreiro na cobrança de escanteio, mas matou o jogo logo em seguida com excelente trama pela direita com Everton Ribeiro e Ceará e a conclusão de Borges.

O 4-2-3-1 foi mantido do início ao fim. Apesar do placar e do domínio, os volantes ainda tiveram pouca participação ofensiva e uma certa dificuldade na marcação. Acredito ser o setor mais frágil da equipe no momento, ao contrário da maioria dos comentaristas e torcedores que dizem ser a defesa.

CSA 0 x 3 Cruzeiro

Eliminar o segundo jogo era esperado. Mas o futebol apresentado, preguiçoso, não. Era quase como se o Cruzeiro soubesse que tinha que fazer pouca força para avançar de fase, e assim foi. Já o CSA jogava a vida, provavelmente o jogo de maior visibilidade que o time terá no ano, e por isso foram pra cima, com muita velocidade.

A defesa do Cruzeiro jogava bem alta, longe de sua própria área, para compactar o time. Mas isso só funciona se os jogadores de frente também fizerem marcação avançada, o que não acontecia. Assim, o CSA tocava a bola e o Cruzeiro esperava, deixando espaços atrás de sua própria defesa. E time da casa, num moderno 4-1-2-3, jogava bolas longas para jogadores rápidos que tinha abertos, nas costas dos nossos laterais. Para nossa sorte, a pontaria deles não estava boa e pelo menos três chances reais foram mandadas pra fora.

Ofensivamente, o Cruzeiro parecia, de fato, bem preguiçoso. Os gols aconteceram mais por bobeira da defesa do time alagoano do que por mérito celeste. O primeiro numa bola longa de Dagoberto, na direita, para Diego Souza. A defesa estava mal posicionada e deixou o camisa 10 entrar livre. O segundo em um pênalti cometido atabalhoadamente pelo zagueiro. Somente o terceiro pode ser considerado superioridade técnica: Ricardo Goulart recebeu o passe final de uma trama rápida de passes, driblou um marcador, ganhou na força do segundo e concluiu sem chances para o goleiro.

O jogo provou a força do elenco cruzeirense, que mesmo jogando com pouca vontade, mostrou ser forte o suficiente para construir o placar. Entretanto, a mesma preguiça causou dificuldades desnecessárias. Portanto, não foi um jogo bom para se tirar alguma conclusão.

Cruzeiro 5 x 0 Nacional

Ah, goleadas. Como elas têm o poder de enganar o torcedor. Basta fazer uma grande soma de gols num mesmo jogo e automaticamente tudo fica bem, a torcida se empolga e tal. Felizmente, não era esse o caso.

É claro que se deve levar em conta a fragilidade do Nacional, que está brigando para sobreviver no Módulo I do Campeonato Mineiro. Mas é justamente contra estes é que o poderio do time mais capacitado tem que aparecer. E assim foi feito: o Cruzeiro jogou como se fosse um jogo decisivo (não, confirmar a liderança na primeira fase do estadual não dá esse caráter à partida). Ricardo Goulart entrou na vaga do suspenso Diego Souza e promoveu a mesma intensa movimentação de jogos anteriores, e foi o senhor da partida.

O Nacional se entrincheirou numa espécie de 4-3-3 defensivo, contra o 4-2-3-1 costumeiro de Marcelo Oliveira. Os três da frente estreitavam e bloqueavam a saída pelo meio, mas deixavam as laterais livres. Além disso, os volantes cruzeirenses não eram pressionados e buscavam a bola no pé dos zagueiros para iniciar o jogo, quase sempre jogando para um dos laterais. E dali, a bola circulava tranquilamente para os três armadores, trocando de posição a todo momento.

Sem a bola, o Cruzeiro pressionava no alto do campo, com muita sede de roubar a bola. Foi a pressão alta mais intensa até aqui no ano. Quando o Nacional tinha a bola, não tinha muito tempo pra pensar, pois o quarteto ofensivo do Cruzeiro encurtava os espaços dos zagueiros, obrigando ao chutão ou passe errado. Os gols saíram naturalmente, em erros do Nacional provocados pela marcação intensa do Cruzeiro e ataques velocíssimos.

Todos os quatro jogadores de frente participaram dos dois primeiros gols: no primeiro, o tiro de meta ruim veio parar nos pés de Goulart, que de letra achou Everton Ribeiro, que finalizou de fora da área. No segundo, Borges se desloca e tabela com Dagoberto, deixando o companheiro na cara do gol. Já o terceiro foi uma jogada dos defensores: Nilton a Bruno Rodrigo, que de peito passou a Leo dentro da área. O zagueiro cruzeirense ainda marcaria mais um de cabeça em bola parada, ainda no primeiro tempo.

No segundo, o time desacelerou, naturalmente. Mesmo assim, Élber completaria a goleada “roubando” a bola na jogada individual de Ricardo Goulart, tamanha a facilidade que o Cruzeiro criou na partida, muito devido à sua própria atuação.

Outro ponto a se destacar é que, nas raras vezes em que era marcado em seu próprio campo, o Cruzeiro evitava ao máximo a bola longa para o ataque. O objetivo era manter a bola nos pés e construir a jogada de trás. É uma mudança sutil de postura, mas que revela como Marcelo Oliveira quer sua equipe.

Perspectivas

Notadamente, existe uma preocupação da torcida e da crítica em geral com o setor defensivo do Cruzeiro. Quase todos localizam a instabilidade nos zagueiros, mas este blogueiro pensa que o problema está na volância. Leandro Guerreiro e Nilton são bons marcadores, mas não estão com funções definidas. Não sabemos quem sai mais e quem fica mais (pense em Paulinho e Ralf, por exemplo).

Mas, Dedé chegou. E com ele a segurança na zaga que a torcida precisava. Porém, estou esperando muito mais os testes de Henrique ou Lucas Silva no meio para ver como se encaixam neste time. Aparentemente, Lucas Silva jogará neste domingo contra o Tupi, mas não será um 4-2-3-1 e sim num 4-3-1-2 losango ao lado de Tinga, com Nilton no suporte e Diego Souza na ligação. Terá liberdade para atacar. Sorte para o garoto.

Ademais, o time está se encaixando mais rápido do que esperávamos, e não só o time titular. O Cruzeiro hoje tem mais do que 11 titulares, e isso é um luxo que poucos times no Brasil podem ter. O esquema base está definido, variações estão sendo treinadas e têm dado certo em determinadas situações de jogo. Podemos esperar, sim, um bom ano em 2013.

Cruzeiro 2 x 1 Caldense – Velhos problemas, novas soluções

O Cruzeiro sofreu com alguns problemas recorrentes, mas conseguiu manter o aproveitamento máximo de pontos jogando no Mineirão, ao virar o jogo contra a Caldense hoje pela sétima rodada do Campeonato Mineiro. A vitória praticamente sela a classificação e pode dar mais tranquilidade para — quem sabe — fazer testes mais ousados.

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

O 4-2-3-1 inicial do Cruzeiro, encaixotado na marcação e volância passiva no ataque e na defesa

Com Borges lesionado, Marcelo Oliveira optou pelo garoto Vinicius Araújo para comandar o ataque do 4-2-3-1 cruzeirense, à frente dos três meias “titulares”: Everton Ribeiro à direita, Diego Souza mais por dentro e Dagoberto pela esquerda. atrás destes, a imutável dupla de volantes Nilton e Leandro Guerreiro, e a linha defensiva composta por Everton, de volta à lateral esquerda, Ceará do outro lado, e Paulão e Léo, a surpresa, no miolo de zaga. Todos sob a capitania do goleiro Fábio.

A Caldense treinada por Tarcísio Pugliese veio também num surpreendente 4-2-3-1, mais defensivo. Glaysson no gol teve Jeffeson Feijão à direita, Júlio César e Paulão na zaga e Cris na lateral esquerda. Edmilson e Maxsuel eram os volantes, com Chimba pela direita, Rossini centralizado e Everton Maradona pela esquerda. Na frente, Nena era o atacante solitário.

O time visitante mostrou porque é uma das melhores defesas do Campeonato Mineiro até aqui, e conseguiu encaixotar o ataque celeste no primeiro tempo. O Cruzeiro segue com problemas ofensivos e defensivos, mas a mexida na formação de Marcelo Oliveira conseguiu reverter a situação, mostrando que já tem planos táticos alternativos na manga.

Marcação central

Apesar de ser um 4-2-3-1, a Caldense tinha proposta defensiva. Comandados por Rossini, o meia central, o quarteto de frente da Caldense aplicava uma marcação mista: Nena ia atrás do zagueiro que tivesse a bola, forçando o passe para o outro zagueiro e dali para um lateral. E assim que a bola chegava em Everton ou Ceará, o time compactava horizontalmente, ou seja, apertava o campo, tornando-o estreito, fechando qualquer possibilidade de passe curto à frente para os volantes ou meias pelo centro. O preço de deixar o lateral do lado oposto livre, provocando muitos gritos exaltados de “vira o jogo” nas arquibancadas do Mineirão.

A virada de jogo era sim uma opção, mas quando é feita pelo alto, a bola demora a chegar a seu destino e a Caldense “rodava” e compactava novamente do outro lado, mantendo as linhas de passe fechadas. O mais eficiente era fazer isso pelo chão, voltando no zagueiro do lado próximo e dele direto para o outro lateral, fazendo o ponteiro adversário (Chimba se o passe fosse para Everton, e Everton Maradona se o destino fosse Ceará) correrem como loucos para retomarem suas posições. O Cruzeiro se aproveitou disso, principalmente com Everton, que avançava pelo centro do campo e tentava procurar um dos quatro homens de frente.

Volantes passivos

Mas o avanço territorial era quase sempre infrutífero. É claro que enfrentar a segunda melhor defesa do campeonato era um motivo, com os quatro homens de frente bem marcados — laterais marcando os ponteiros, os dois volantes cuidando do meia central e os dois zagueiros encaixotando Vinicius Araújo. Mas o principal fator era a falta de mais gente no centro do meio campo com a posse de bola. Leandro Guerreiro e Nilton, hoje, ficaram passivos demais, não se juntavam à ação ofensiva. E assim a marcação da Caldense foi muito facilitada, e o time visitante executou sua proposta sem muitos sobressaltos. O Cruzeiro só levava perigo em bolas aéreas, cujo excesso demonstrou a falta de criatividade do ataque.

Como se não bastasse, a passividade da dupla volância não foi só quando o Cruzeiro tinha a posse. A marcação em cima dos meias adversários, principalmente em Rossini, foi muito frouxa. O meia tinha liberdade para recuperar a bola e pensar o jogo, sem que Leandro Guerreiro ou Nilton se aproximassem muito. Assim a Caldense criou algumas dificuldades e incomodou Fábio. A falta de pressão sobre o homem da bola, como se diz, fazia os jogadores da Caldense terem bastante tempo de posse de bola sem ser incomodados. Em um desses momentos, a bola foi cruzada na área, Léo rebateu na direção de Paulão, mas o zagueiro dominou mal e perdeu na corrida para Chimba, derrubando-o dentro da área e cometendo o pênalti que abriu o placar.

A alternativa

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

A surpresa foi o 4-1-4-1 com Tinga de volante preso e Everton Ribeiro vindo buscar atrás, abrindo espaços para Ricardo Goulart e para a velocidade dos ponteiros

Vendo que mesmo após a conversa no intervalo o time não dava sinais de conseguir sair da excelente marcação adversária, Marcelo Oliveira usou as três substituições para tentar desmontar o esquema defensivo de Pugliese. Primeiro fez uma dupla mudança, com Tinga e Élber nas vagas de Nilton e Diego Souza. Logo depois, Ricardo Goulart entrou na vaga de Paulão. Élber entrou aberto pela direita, Ricardo Goulart fez companhia à Everton Ribeiro como dupla de meias centrais e Dagoberto ficou na esquerda, com Tinga sendo um volante único do novo 4-1-4-1 — Guerreiro foi ser zagueiro.

Porém, o camisa 55 mal teve trabalho, pois depois das substituições o time melhorou muito. Isso porque Everton Ribeiro ficou um pouco mais recuado que Ricardo Goulart, pegando bolas nos pés de Tinga e dos zagueiros para começar as jogadas ofensivas. Isso tirava um dos volantes da sólida linha defensiva da Caldense, abrindo espaços para Goulart e os ponteiros. Estes últimos fizeram a festa, pois agora só tinham os laterais à frente, sem auxílio dos volantes. E foi numa jogada de Dagoberto pela esquerda, driblando em direção ao gol que o juizão apitou um pênalti no mínimo estranho, na modestíssima opinião deste blogueiro.

Duas linhas de quatro

A Caldense já havia trocado Chimba por Tinga (o deles), por lesão, e também Everton Maradona por Rodrigo Paulista. As substituições mantiveram o 4-2-3-1 defensivo, mas não evitaram o empate. Então, Pugliese lançou Luizinho na vaga do cansado Rossini, colocando-o como ponteiro esquerdo e avançando Rodrigo Paulista para o ataque, configurando um típico 4-4-2 britânico — ou seja, com o meio-campo em linha, as famigeradas “duas linhas de quatro”. De certa forma, funcionou, pois os ponteiros já não tinham tanta liberdade com a marcação dobrada.

Mas a Caldense já não tinha mais o mesmo fôlego, e não encurtava tanto. Foi assim que Ceará e Élber trocaram vários passes do lado direito da área, procurando uma brecha, até que Élber centrou aparentemente sem muita esperança de achar alguém ali. Mas Ricardo Goulart, como um bom meia central, saiu da marcação na hora certa, cabeceando no cantinho, tirando de Glaysson para virar e partida, selando a vitória e a manutenção dos 100% no Mineirão.

É preciso testar todos os setores

O Cruzeiro ainda oscila. Faz um jogo excelente e logo na rodada seguinte cai de produção. É normal para um time que só fez sete partidas oficiais no ano — alguns paulistas já fizeram 18 — mas o tempo passa, e a fase inicial do Campeonato Mineiro, que é o ambiente ideal para testes, já está acabando. É claro que ainda há tempo para fazer testes, pois o Cruzeiro, com 19 pontos, já está praticamente garantido na fase final. Entretanto, o treinador me parece querer testar apenas o parceiro para Paulão, que vem mudando a cada jogo. O quarteto ofensivo, os laterais e os volantes já me parecem estar definidos, e é justamente estes últimos que mais me intrigam.

A volância me parece ser o problema mais crônico do time, e Guerreiro e Nilton parecem ter lugar cativo. Não vejo outros volantes serem testados, sequer em treinamentos. Lucas Silva, Henrique e Uelliton parecem não agradar ao treinador. Ok, Henrique ainda não tinha condições de jogo, mas os outros dois sim. Porque não testá-los? Porque não levá-los pelo menos para o banco e usá-los durante a partida? Perguntas que só quem está no dia-a-dia dos treinamentos pode responder.

Alô, Marcelo Oliveira, você lê este blog? É, não, acho que não.

Araxá 2 x 3 Cruzeiro – Depois do vermelho

Num jogo em que o Araxá executou muito bem sua proposta tática, Borges marcou duas vezes e o Cruzeiro manteve a liderança do Campeonato Mineiro — tarefa que foi facilitada pela expulsão de Carlão no início da etapa final.

O 4-2-3-1 inicial: Diego Souza se movimentando, laterais bloqueados pelos alas adversários e volantes pouco participativos

O 4-2-3-1 inicial: Diego Souza se movimentando, laterais bloqueados pelos alas adversários e volantes pouco participativos

O 4-2-3-1 habitual de Marcelo Oliveira desta vez teve duas novidades no quarteto ofensivo em relação ao jogo passado: atrás do garoto Vinicius Araújo no comando do ataque, Dagoberto voltou ao time titular como ponteiro esquerdo. Diego Souza centralizado e Everton Ribeiro completavam a linha de três meias, suportada por Leandro Guerreiro e Nilton na dupla volância e a linha defensiva formada por Ceará na lateral direita, Everton na lateral esquerda e Nirley estreando ao lado de Paulão no miolo de zaga, protegendo o gol de Fábio.

O Araxá do técnico Flávio Lopes teve três zagueiros “ão” à frente do gol de Marcelo Cruz: dois “Rodrigões”, o Mineiro pela direita e o Paulista por dentro, e Carlão pela esquerda. No meio campo do 3-4-1-2, os alas Osvaldir na direita e Fabiano na esquerda flanqueavam os volantes Bruno Moreno e Balduíno e Braitner era o encarregado da ligação para Evandro e Fabrício Carvalho.

Encaixe

Em seu livro sobre a história da tática no futebol, “Invertendo a Pirâmide” (infelizmente ainda não publicado no Brasil), Jonathan Wilson discorre sobre a ascensão do 4-2-3-1 e, por consequência, o declínio do 3-5-2 (e sistemas derivados). Em resumo, ele diz, citando Nelsinho Batista, que os alas do 3-5-2 têm que recuar para marcar os ponteiros do 4-2-3-1, criando uma sobra redundante de cinco homens contra três. Isso libera os laterais adversários para ser o homem da sobra na defesa, ajudar no meio-campo ou apoiar o ataque sem ser incomodados. Assim, o time do 4-2-3-1 domina a posse de bola e ao mesmo tempo tem mais amplitude.

No entanto, corajosamente, Flávio Lopes pediu justamente o oposto para seus alas: Fabiano e, principalmente, Osvaldir jogavam muito avançados, alinhando-se com os meias, formando uma espécie de 3-2-4-1. O objetivo era justamente bloquear a saída pelas laterais do Cruzeiro, que foi a única alternativa no primeiro tempo do jogo anterior. Era só a bola chegar em Ceará ou Everton que eles já eram pressionados, à frente da linha do meio-campo, pelos alas. Quase não vimos o camisa 2 e o 23 apoiarem o ataque. Isso, somado à pouca participação ofensiva dos volantes, e a forte marcação imposta ao quarteto ofensivo, deixava o Cruzeiro com mais posse de bola — chegou a mais de 60% em um determinado momento do primeiro tempo — mas sem produzir muito.

Sobra no meio

A marcação araxaense na última linha, inclusive, tinha uma particularidade. Os zagueiros não permaneciam centralizados, como é o costume de um sistema com um trio defensivo. Os zagueiros de lado saíam à caça dos ponteiros cruzeirenses, enquanto Rodrigão Paulista ficava a cargo de Vinicius Araújo. Não havia cobertura na zaga, pois ela estava no meio-campo: Diego Souza era perseguido de perto por Balduíno, com Bruno Moreno ajudando. Com todos os jogadores ocupados, sobrava para os zagueiros Paulão e Nirley — nenhum particularmente criativo ou bom passador — iniciarem o trabalho de ataque.

Todos estes fatores fizeram o Araxá ser melhor no primeiro tempo. A cada passe errado do Cruzeiro, a bola chegava rapidamente em Fabrício Carvalho, que fez uma excelente partida na função do centro-avante de referência. Ele abusou dos passes de primeira para o velocíssimo Evandro, sempre levando a melhor sobre Nirley e pegando a defesa do Cruzeiro desprevenida, sem o suporte dos volantes. As chances criadas pelo time da casa não foram em vão.

A jogada do gol não teve particularmente um aspecto tático, tirando o fato do Araxá estar com a marcação bem adiantada na posse de bola azul (a alternância de pressão do Araxá também foi um fator que chamou a atenção). A lambança de Nirley e Fábio gerou o escanteio que expôs novamente o que já podemos dizer ser um problema crônico do Cruzeiro: a bola parada, cada vez mais uma arma no futebol moderno — para a tristeza deste blogueiro, que gosta de gols com bola rolando.

10 contra 11

A movimentação de Diego Souza, tentando cair pelos lados para fugir da perseguição de Balduíno, aumentou um pouco a paciência de Marcelo Oliveira, que não mexeu no intervalo. Ele provavelmente quis testar o comportamento do time atrás no placar. Dez minutos foram suficientes para ver que nada tinha mudado: mesmo vencendo, o time da casa não abdicou do ataque e manteve a proposta, tendo a primeira chance logo a um minuto em contra-ataque velocíssimo, finalizado por Bruno Moreno em cima de Fábio.

Após as substiuições, Luan e Everton Ribeiro se revezavam pela esquerda, mas foi a velocidade de Élber do outro lado que provocou a expulsão

Após as substituições, Luan e Everton Ribeiro se revezavam pela esquerda, mas foi a velocidade de Élber do outro lado que provocou a expulsão

O time precisava de velocidade e movimentação. Élber entrou na vaga de Dagoberto, invertendo Everton Ribeiro de lado, e Borges entrou na vaga de Vinicius Araújo: o 4-2-3-1 estava mantido. Logo no primeiro lance, Élber sofreu falta dura de Carlão, que já tinha amarelo. A expulsão por acúmulo desmontou o sólido sistema defensivo de Flávio Lopes, mesmo após a recomposição do trio de zagueiros com a entrada de Bruno na vaga de Braitner. Isso porque a cobertura no meio-campo deixou de existir, já que um dos volantes agora tinha que cuidar de Nilton ou Leandro Guerreiro, agora livres para apoiar. E com isso um pouco do futebol de Diego Souza apareceu.

Logo após o empate de Paulão, fuzilando de primeira após cabeceio ofensivo de escanteio, o camisa 10 fez uma jogada na sua característica, arrancando na força física. Rodrigão teve de sair da marcação a Borges para tentar parar o avanço do meia, mas o passe de Diego Souza nesse exato momento matou a cobertura e deixou o camisa 9 na cara do gol, que venceu Marcelo Cruz para a virada.

Quando tudo parecia mais tranquilo, o Araxá empatou em pênalti cometido por Nirley em Fabrício Carvalho. Logo após o gol, Marcelo Oliveira lançou Luan de ponteiro esquerdo na vaga de Everton, passando Everton Ribeiro para a lateral esquerda. Na verdade era muito mais um revezamento, mas a intenção era dar mais verticalidade àquele lado do campo. Mas o gol da vitória veio pela direita. Ceará achou Diego Souza fugindo da marcação no meio, indo para a direita da área. Com apenas um marcador à frente, Diego arriscou pro gol, e no rebote de Marcelo Cruz, Borges fez seu segundo gol na partida.

Flávio Lopes ainda tentou mandar o time à frente para tentar novo empate, com as entradas de Roberto Jacaré e Michel Cury no meio-campo nas vagas de Bruno Moreno e Evandro, deixando apenas Fabrício Carvalho à frente. A intenção era repovoar o meio-campo, mas com um homem a menos havia muito chão para cobrir, e o Cruzeiro manteve a tranquilidade com a posse de bola até o fim.

Paciência e elenco

O jogo de ontem mostrou que o Cruzeiro ainda tem deficiências a serem corrigidas — o que é normal, pois ainda considero o time em formação. A bola parada, uma das cinco fases do jogo, ainda não deve ser a prioridade de Marcelo Oliveira nos treinamentos, mas sim as outras quatro: a fase ofensiva (posse de bola no ataque), transição ofensiva (também conhecido como contra-ataque), transição defensiva (contra-ataque do adversário, ou seja, a recomposição) e fase defensiva (posse de bola do adversário). Este blogueiro-torcedor aprova: marcar gols e evitar os do adversário com a bola rolando faz com que eventuais deslizes na bola parada sejam menores.

Um outro possível problema está na volância: o Cruzeiro precisa, nestes jogos, de um volante passador, que apóie mais. Nilton e Leandro Guerreiro são excelentes na marcação, mas contra esquemas como o de ontem não conseguem jogar. A variação tática proporcionada por um jogador como Henrique ou Lucas Silva, por exemplo, seria muito importante para anular estes sistemas defensivos, já que o avanço do volante configuraria um 4-1-4-1 temporário e cancelaria a sobra dupla no meio, dando mais liberdade a Diego Souza.

O camisa 10, aliás, foi uma das notas boa do jogo: movimentou-se mais, recebeu mais bolas e deu mais assistências. Aos poucos vai ganhando “ritmo de futebol brasileiro” e tem tudo para despontar nas fases agudas do Mineiro e nas primeiras rodadas do Brasileirão, no qual os adversários certamente jogarão de maneira menos reativa que os últimos adversários celestes.

É claro que, exigente como é, a torcida cruzeirense já quer que o time esteja voando. Mas é preciso paciência. A boa notícia que é o banco está resolvendo. É como aquela frase famosa diz: “bons times ganham jogos, bons elencos ganham campeonatos”.

E são campeonatos que nós queremos.

Cruzeiro 3 x 1 Tombense – Foi na técnica

Para abrir este post, recorro novamente a Jonathan Wilson, autor do livro “Inverting the Pyramid” sobre a história da tática no futebol, em uma frase que utilizou em seu blog no jornal inglês The Guardian: “Simetria não é essencial, mas o equilíbrio é”.

Este equilíbrio é o sonho de todo treinador de futebol: defender e atacar com a mesma eficiência, em todos os setores do campo. Mas o que se viu ontem do Cruzeiro, na vitória por 3 a 1 sobre o Tombense no Mineirão, foi uma equipe sem simetria mas também sem equilíbrio. Ataque e defesa tiveram momentos diferentes durante a partida, e a vitória só veio pela diferença técnica existente entre os dois elencos.

Formações

O 4-2-3-1 da primeira etapa tinha a tendência de cair para a esquerda, com E. Ribeiro mais por dentro e Everton apoiando mais que Ceará

O 4-2-3-1 da primeira etapa tinha a tendência de cair para a esquerda, com E. Ribeiro mais por dentro e Everton apoiando mais que Ceará

Marcelo Oliveira escalou o Cruzeiro no seu já habitual 4-2-3-1, com Fábio no gol e sua linha defensiva composta por Ceará à direita, Thiago Carvalho (substituindo Bruno Rodrigo, contundido) e Paulão no miolo de zaga e Éverton na lateral esquerda. Nilton e Leandro Guerreiro mais uma vez fizeram dupla na volância, suportando Everton Ribeiro à direita, Diego Souza centralizado e a novidade Luan de ponteiro esquerdo, todos procurando Anselmo Ramon na frente.

Já o Tombense veio, como esperado, em um sistema super-defensivo para segurar o ataque azul. O técnico Marcelo Cabo mandou a campo um 4-3-2-1. O gol de Glaycon foi defendido pelos zagueiros Andrezinho e Alexandre, flanqueados por Ari na direita e Guilherme Lazaroni na esquerda. O trio de volantes era formado por Mateus Silva pela direita, Serginho por dentro e João Guilherme na esquerda. À frente, Joílson na ligação tinha a companhia do atacante Éder Luiz. Só Adeílson ficava mais à frente.

A árvore de natal e a assimetria

Dois fatores chamaram a atenção no primeiro tempo. O primeiro era que a marcação do Tombense, que lembrava uma árvore de natal, foi desenhada para forçar a posse de bola do Cruzeiro para lados do campo. Os três jogadores da frente fechavam as linhas de passe no meio, forçando os zagueiros do Cruzeiro a procurarem as laterais. Os volantes Nilton e Leandro Guerreiro, que normalmente se revezam para tentar achar o primeiro passe, quase não viam a bola em seus pés.

O outro fator que o time do Cruzeiro “pendia” para o lado esquerdo, uma vez que Everton Ribeiro, um “ponteiro de pé invertido” (canhoto na direita), tinha a tendência de centralizar mais, ao invés de ficar aberto, perto da linha lateral. Do outro lado, Luan fazia exatamente o contrário: ficava o mais aberto possível, tentando achar uma corrida em diagonal ou buscar a linha de fundo para o cruzamento.

Com isso, o time perdia amplitude no ataque (ou seja, não “alargava” o campo, tentando abrir a defesa adversária) e facilitava a marcação do Tombense. Este problema seria facilmente resolvido se Diego Souza revezasse com Everton Ribeiro na ponta direita, arrastando a marcação consigo e abrindo espaço para ele e ao mesmo tempo dando mais uma opção de passe. Mas o camisa 10 se movimentou pouco e quase não participou do jogo ofensivo.

Ceará bem que tentou ser a opção pelo lado direito, mas o lateral apoiou pouco, não só por ser estar “sozinho” naquele lado como também pelas opções de passe dos companheiros, que sempre buscavam o lado canhoto do campo.

O resultado pode ser visto nos números: de acordo com os dados coletados pela Footstats e publicados no site da ESPN Brasil, o Cruzeiro passou 43,09% de sua posse no lado esquerdo do campo, contra apenas 30,75% do lado direito. Uma discrepância grande.

Curiosamente, o gol saiu num momento em que Luan e Everton Ribeiro estavam invertidos. E numa tabela entre os dois Evertons é que saiu a conclusão do lateral que provocou o rebote para o garoto Vinicius Araújo — que havia entrado no lugar do lesionado Anselmo Ramon sem alterar o sistema — abrir o marcador.

Segundo tempo

Marcelo Cabo tirou um de seus volantes, Mateus Silva, e lançou o atacante Tiago Azulão, que foi jogar de ponteiro esquerdo. Joílson foi para a direita e Eder Luiz ficou centralizado, configurando um 4-2-3-1 que variava para um 4-4-1-1 sem a posse de bola. Talvez o treinador do Tombense queria dobrar a marcação nos dois lados do campo e ao mesmo tempo ter uma saída de contra-ataque para buscar o empate.

Porém, assim como na primeira etapa, o Cruzeiro continuava dominando a posse de bola, mas desta vez com ainda mais dificuldade para penetrar na bem postada defesa adversária. O Cruzeiro só chegava quando tocava rápido a bola, virando o jogo pelo chão mas com velocidade, o que acontecia só esporadicamente.

Somente aos 12 minutos Marcelo Oliveira mexeu: sacou Luan e lançou Dagoberto, que foi jogar espetado pelo lado esquerdo, quase como um segundo atacante. Era um 4-2-3-1 com uma variação interessantíssima para o 4-2-2-2 (com Everton Ribeiro centralizando e Dagoberto avançando). Mas a mudança mais importante com a alteração foi no estilo: Dagoberto prefere a velocidade, enquanto Luan tentava mais na força física. O time ficou mais leve e mais vertical.

Domínio visitante

Porém, com o ataque melhorando, a defesa começou a piorar. Com menos jogadores marcando nos flancos ofensivos, já que Dagoberto não acompanhava o lateral e Everton Ribeiro frequentemente estava na parte central do campo, o Tombense começou a achar uma saída de bola sem pressão. A marcação celeste, que no início do jogo era no campo adversário, agora era em bloco médio, fazendo pressão somente quando a bola já havia ultrapassado a linha divisória. O time de Tombos começou a “gostar” do jogo e saiu um pouco mais. A defesa do Cruzeiro respondia passivamente, deixando os jogadores adversários pensarem.

No fim, o Cruzeiro se postou num 4-2-2-2 com muito mais movimentação ofensiva, mas desorganização na defesa

No fim, o Cruzeiro se postou num 4-2-2-2 com muito mais movimentação ofensiva, mas desorganização na defesa

Quando o Tombense já era melhor no jogo, o Cruzeiro ampliou, justamente num contra-ataque. Bola rebatida, passe para Vinicius Araújo, que estava bem aberto pela esquerda, sem marcação. Ele avançou e cruzou rasteiro para o outro lado da área. Everton Ribeiro, que já tinha passado da linha da bola, recuou e concluiu com muita tranquilidade, sem chances para Glaycon.

Logo após o gol, Éder Luiz cedeu seu lugar a Alex, em mais uma tentativa de Marcelo Cabo em pressionar o Cruzeiro. O jogador foi jogar de meia central, mantendo o 4-2-3-1. Marcelo Oliveira queria garantir a vitória e sacou Diego Souza, apagado no jogo, lançando o garoto Élber. Dagoberto virou atacante de vez e o 4-2-2-2 estava oficializado, com quatro jogadores leves se movimentando à frente.

Mas o domínio do time de Tombos continuou. O Cruzeiro sofreu um gol em lance de bola parada, com Adeílson, e quase sofreu o empate minutos depois. Fábio, que já havia feito um milagre antes, impediu um lance e Tiago Azulão mandou pra fora em outro. A tranquilidade só veio quando, em um lance — ironicamente — de contra-ataque, Élber encontrou Dagoberto aberto pela direita do ataque. O camisa 11, dominou e esperou a chegada de Élber para devolver a bola num passe milimétrico que furou o sistema defensivo. O jovem meia bateu no canto alto esquerdo e deu números finais à partida.

Vencer sem convencer?

A vitória veio, a liderança foi mantida, mas não sem um certo sufoco. O Tombense esteve muito bem armado em campo pelo técnico Marcelo Cabo, e o resultado veio muito mais na habilidade técnica dos jogadores cruzeirenses do que na disposição tática. Nesse aspecto, arrisco dizer até que o Tombense foi superior — cumpriu muito bem o papel de travar o ataque cruzeirense.

É claro alguns fatores, como ficar duas semanas sem jogar, a atuação discreta de Diego Souza — muito marcado e sem inspiração para se movimentar e sair dela — e a pouca participação dos volantes nas ações ofensivas fizeram o Cruzeiro ficar mais previsível, facilitando o trabalho defensivo adversário. O time melhorou no segundo tempo ofensivamente com as substituições promovidas, mas caiu muito defensivamente. Fosse o Tombense um time mais técnico, certamente sairia com um resultado melhor do Mineirão.

Um time ofensivo e envolvente, como quer Marcelo Oliveira, pode ser equilibrado. Mas isso requer entrosamento (foi apenas o quarto jogo oficial do Cruzeiro na temporada) e que os jogadores executem funções para além das que estão designados: atacantes têm que marcar e defensores têm que jogar. Coisas que faltaram ao Cruzeiro ontem e que só o tempo poderá trazer.

De fato, ainda há muito trabalho a fazer.

Guarani/MG 0 x 0 Cruzeiro – O anti-futebol

Diz-se na física que quando matéria e antimatéria colidem, o resultado é o aniquilamento de ambos. Traduzindo para o futebol, seria mais ou menos assim: quando o futebol e o “anti-futebol” se encontram, o resultado é um zero a zero.

Assim foi na Arena do Calçado, em Nova Serrana, onde o Guarani mandará seus jogos. Que o time de Divinópolis entraria para se defender era certo; o que foi surpresa foi abdicar também do contra-ataque. Ao Cruzeiro faltou velocidade no início e paciência no fim.

Foi um jogo razoável do Cruzeiro, que ainda podemos dar um desconto por ser início de temporada. Mas também temos que dar créditos ao esquema defensivo do Guarani, que cumpriu melhor sua proposta de jogo.

Estreias

Dagoberto mais espetado pela esquerda e a movimentação do trio de meias no 4-2-3-1 cruzeirense do primeiro tempo

Dagoberto mais espetado pela esquerda e a movimentação do trio de meias no 4-2-3-1 cruzeirense do primeiro tempo

Regularizado, Diego Souza pôde enfim ser escalado por Marcelo Oliveira no centro da linha de três meias do 4-2-3-1, atrás de Anselmo Ramon. Dagoberto, que começou jogando, estava à esquerda do camisa 10, e Everton Ribeiro era o ponteiro direito. Nilton e Leandro Guerreiro protegiam a linha defensiva composta por Ceará e Everton, de volta à lateral esquerda, e Bruno Rodrigo e Paulão no miolo de zaga, todos capitaneados por Fábio debaixo das traves.

O Guarani do técnico Leston Jr. veio num teórico 4-3-1-2, mas os inúmeros ajustes defensivos descaracterizaram o esquema. O goleiro Leandro, destaque do jogo, teve Adalberto e Asprilla à sua frente, com os laterais Choco à direita e Rafael Estevam à esquerda. O meio-campo começavam com André Silva centralizado, mas os volantes de lado, Rafael Pulga pela direita e Eder pela esquerda, se alinhavam a ele e abriam, para fazer dois contra um nos ponteiros do Cruzeiro. À frente, Joubert, o armador, era flanqueado pelos atacantes Lucas Newiton e Carlos Júnior, fazendo a primeira linha de marcação. Na prática, uma espécie de 4-3-3-0 super defensivo.

Bloco baixo

Como se não bastasse, a marcação só começava mesmo a partir da linha do meio-campo, o que é comumente chamado de bloco baixo (com o bloco médio sendo a marcação a partir da intermediária adversária, e o bloco alto a pressão nos zagueiros, o famoso pressing). O time vermelho deixava os zagueiros do Cruzeiro tocarem a bola livremente entre si e até para os volantes Leandro Guerreiro e Nilton, que conseguiam ficar com a bola no pé sem ser incomodados. O trio avançado, comandado por Joubert, ficava bem agrupado para forçar a saída celeste com os laterais. Porém, quando a bola chegava neles, os três giravam e pressionavam o lado da bola, congestionando o setor e fechando as linhas de passe, obrigando o Cruzeiro a voltar ou virar o jogo.

Obviamente, a segunda opção era a melhor, mas não pelo alto, direto para o ponteiro, como queria o comentarista da TV. O certo era girar pelo chão, voltando no zagueiro e, este sim, direto para o outro lateral, com velocidade para pegar a defesa aberta. Mas o Cruzeiro fazia isso com uma certa preguiça, dando tempo para o Guarani se recompor.

O trio de meias não guardava posição e tentava se movimentar. Everton Ribeiro partia da direita mas circulava por todo o campo; Dagoberto ficava mais espetado pelo lado esquerdo mas por vezes invertia de lado; e Diego Souza ora vinha buscar a bola no pé dos volantes, ora caía pela esquerda para tentar desarmar a setorização defensiva do Guarani. Diego, no entanto, parecia um pouco fora de sintonia, com a bola meio “queimando” no pé e ainda faltando ritmo de jogo. Acredito que vá melhorar.

Mesmo assim, o Cruzeiro conseguiu criar algumas chances. Um delas, ironicamente, foi num contra-ataque de bola parada. Anselmo Ramon, que estava na área ajudando na bola aérea, recebeu passe e lançou rapidamente a Everton Ribeiro, que avançou pela direita e mandou preciso e rasteiro para Dagoberto no meio da área, que infelizmente não esperava que a bola passasse do zagueiro e não conseguiu concluir. Em outro lance, Everton tabelou com Dagoberto em passes de primeira e concluiu no canto alto de Luciano, que praticou bela defesa.

E foi só isso no primeiro tempo: oito contra onze em uma metade do campo só.

Segundo tempo

No intervalo, Marcelo Oliveira lançou Egídio na lateral esquerda, avançando Everton e tirando Dagoberto do jogo, aparentemente ainda sem muitas condições físicas. O Cruzeiro aumentou a velocidade com a dupla Egídio e Everton, mas ainda continuava sem muitas opções para passar a bola, na mesma toada do primeiro tempo. Foi só quando Luan entrou como ponteiro esquerdo substituindo Leandro Guerreiro, com Everton para ser volante pela esquerda, é que o Cruzeiro ameaçou mais, sempre buscando o lado do campo para a conclusão do centro-avante.

No fim, Cruzeiro se lançou à frente no mesmo 4-2-3-1, embora mais na vontade do que na organização tática

No fim, Cruzeiro se lançou à frente no mesmo 4-2-3-1, embora mais na vontade do que na organização tática

Percebendo que a ameaça era por aquele setor, Leston Jr. sacou um de seus “atacantes defensivos”, Lucas Newiton para colocar mais um volante, Nando, para dar suporte naquele lado, aberto pela esquerda, com Pulga na centro-esquerda. O repaginado 4-4-2 (ou seja, meio-campo em linha) travou as ações pelos flancos do Cruzeiro e ainda proporcionou o melhor (e único) momento ofensivo do Guarani na partida, já que Everton estava de volante mas com uma incumbência clara de sair para o jogo, deixando apenas Nilton na proteção à zaga.

O Guarani então começou a rebater bolas em velocidade para Carlos Júnior, que agora tinha mais liberdade para circular. Leston Jr. então dobrou sua capacidade de contra-ataque colocando o veloz Eric na vaga de seu único criador, Joubert, oficializando o jogo de ligação direta: quatro volantes e dois atacantes.

Funcionou por um tempo até que o Cruzeiro começou a perder a paciência, e tentar sair com velocidade mas sem organização. Os jogadores se afobavam e tentavam levantar a bola na área de qualquer jeito para Borges, que a essa altura havia entrado na vaga de Anselmo Ramon. Só quem parecia mais lúcido era Everton Ribeiro, que por vezes conseguia se desvencilhar da marcação e cruzar com mais perigo. Mesmo na afobação, algumas finalizações de cabeça ainda aconteceram, muito mais na vontade do que na técnica ou na paciência. Mas não teve jeito: o zero insistiu em permanecer no placar.

Sem afobação

Se os jogadores não podem se afobar no fim do jogo, tendo que ter paciência, o mesmo vale para nós torcedores. Ainda é cedo para tirar uma conclusão definitiva, foi só o primeiro jogo deste que provavelmente será o trio de meias titular da temporada. Então, devagar com o andor.

Mas o aspecto mais importante é que este jogo não pode servir de parâmetro. Os grandes jogos, que todos nós esperamos que o Cruzeiro irá disputar na temporada, não serão de ataque contra defesa desta forma. Os outros times, no Campeonato Brasileiro e fases finais da Copa do Brasil, tentarão sair mais para o jogo, abrindo espaço para nós também, e aí que acredito que faremos a diferença. Enfrentar retrancas como essa não será, nem de longe, a tônica da nossa temporada.

Que sirva de lição, entretanto. Afinal, quando estivermos atrás no placar contra grandes times brasileiros, certamente se fecharão em muralhas tão bem postadas como a do Guarani de hoje.

Mas nós havemos de derrubá-las.