Muito já se falou sobre o jogo de quarta-feira (leia as análises de André Rocha, do blog Olho Tático do ESPN.com.br, e de Léo Miranda, no blog Painel Tático na Globo.com). Obviamente, por ser inegavelmente o jogo mais esperado da rodada, do líder contra o vice-líder, ambos com sequências de vitórias incomuns em Campeonatos Brasileiros (7 celestes contra 4). E os textos contém muitos pontos importantes e descrevem bem a partida, mas o Constelações não poderia ficar de fora, já que é o único blog de tática exclusivo sobre o Cruzeiro Esporte Clube, o líder incontestável do Brasileirão 2013.
O jogo foi de domínio cruzeirense na primeira etapa e de equilíbrio na segunda — em que pese as propostas das equipes terem se alterado no intervalo.
Esquemas táticos iniciais
O Cruzeiro foi para o jogo no tradicional 4-2-3-1 de Marcelo Oliveira, apenas com a volta de Ceará à lateral direita no lugar de Mayke, que jogou contra o Atlético-PR. O resto da linha defensiva foi igual à daquele jogo, com Egídio na lateral esquerda, Dedé de zagueiro direito e Bruno Rodrigo na zaga esquerda, protegendo o gol de Fábio. Nilton e Lucas Silva fizeram mais uma vez a dupla volância para dar suporte à linha de três meias, com Ribeiro partindo da direita, Goulart se movimentando do centro para as pontas e Willian fazendo a diagonal da esquerda para a área, se aproximando do centroavante Borges.
Oswaldo de Oliveira também armou seu Botafogo no 4-2-3-1 que vem utilizando na temporada toda. De volta da Seleção, o goleiro Jefferson teve sua meta defendida pelos zagueiros Bolívar e André Bahia — este último na vaga do suspenso Dória. Nas laterais, Edilson ficou pela direita e Júlio César foi o esquerdo. Marcelo Mattos fez a marcação principal e Renato tinha um pouco mais de liberdade no meio-campo defensivo, tentando se juntar ao trio formado por Lodeiro, Seedorf e Rafael Marques. Na referência do ataque, Elias.
Pressão na saída
Como vem se tornando comum em jogos no Mineirão, no início do jogo, o Cruzeiro procurou dar o máximo de intensidade, tanto na ofensiva quanto na marcação. Pressionava os zagueiros do Botafogo, forçando-os ou a passes longos — que ficavam quase sempre com a defesa celeste — ou a erros que entregavam a posse da bola perto da sua própria área, ou mesmo dentro dela, como no passe errado de André Bahia que Borges recebeu de presente dentro da área, logo a 3 minutos. Bolívar se recuperou e travou a conclusão.
Já quando tinha a bola, a “novidade” foi o posicionamento de Borges, um pouco mais recuado junto aos três meias, que naturalmente já jogam mais próximos uns dos outros. O camisa 9 ficou mais longe da área e não teve tantas chances de conclusão, mas ofereceu uma linha de passe rápida para dar seguimento e velocidade às jogadas. Destaque para um lance de condução de Goulart, que tabelou com Borges e passou a Willian já dentro da área, com Bolívar travando o chute no último instante.
Verticalidade x cadência
O Botafogo demorou uns dez minutos para passar da linha divisória, tamanho o controle do jogo que o Cruzeiro exercia. Porém, depois dos quinze minutos iniciais, o Cruzeiro arrefeceu um pouco e passou a variar mais a altura da pressão: ora buscava encurtar em cima dos zagueiros e laterais botafoguenses para forçar o chutão, ora fechava o meio-campo e deixava o time carioca com a bola. Com isso o Botafogo cadenciou, pois lhe era vantajoso tirar a intensidade do Cruzeiro naquele momento.
A estatística de posse de bola foi virando lentamente, muito devido aos estilos contrastantes. O Cruzeiro recuperava a bola e aplicava velocidade, tentando resolver rápido a jogada para pegar os defensores cariocas fora de posição e recuando para a sua própria área, e o Botafogo tentando abrir um espaço no excelente sistema defensivo do Cruzeiro. A estratégia cruzeirense acabou funcionando melhor, com Jefferson trabalhando em conclusões de Ribeiro e Willian, além de dois lances de cruzamento rasteiro que por pouco não foram empurrados para o gol, um de cada lado.
Já o Botafogo pouco ameaçou a meta de Fábio. O bom jogo defensivo dos laterais foi um fator, mas Lucas Silva fez uma partida excelente, conseguindo ganhar a maioria dos embates com Seedorf. Isso acabou por fazer o holandês procurar espaços longe da área, para ter tempo com a bola e armar o time de trás, tentando fugir da marcação de Lucas. Fábio só trabalhou em chute de Elias na entrada da área, mas trabalhou muito bem.
O gol e a mudança
É difícil falar em justiça no futebol, porque este blogueiro sempre acredita que o placar do jogo é o mais justo. Mas merecimento é diferente, e se tinha de haver um vencedor no primeiro tempo, este tinha de ser o Cruzeiro. E no último lance do primeiro tempo isso se comprovou, num repeteco do lance do gol contra o Atlético/PR: escanteio da direita, Dedé segurando o marcador e Nilton sozinho completando de pé para o gol. Desta vez, porém, o volante pegou mais bonito na bola para fazer um golaço.
Apesar de não terem modificações, os times voltaram diferentes. Talvez pela vantagem que conseguiu, o Cruzeiro voltou mais calmo e assistindo o Botafogo trocar passes em sua defesa, provavelmente mais cansado pela intensidade do primeiro tempo. E por isso mesmo o Botafogo, que também tem jogadores de qualidade, imprimiu mais velocidade e foi acuando o Cruzeiro, aos poucos, até que Seedorf, naquele que talvez tenha sido seu único bom lance na partida, deu um belo passe e achou Rafael Marques livre de marcação na área. Bruno Rodrigo tentou tirar, e o zagueiro acabou chutando a perna do atacante botafoguense, que já havia sido dominada por ele. A bola de Seedorf no pênalti passou rente à trave direita, e isso foi o mais perto que o Botafogo chegaria do gol de Fábio.
Trocas
O Botafogo sentiu a perda do pênalti por sua maior referência em campo, e deixou de atacar tanto o Cruzeiro. Mas àquela altura o time celeste já estava no modo “contra-ataque para matar o jogo”, e novamente o Botafogo teve mais a bola nos pés, apesar de não levar tanto perigo como antes do pênalti.
Marcelo Oliveira se viu obrigado a trocar Nilton por Henrique devido a uma lesão do volante-artilheiro, mas aproveitou para lançar Júlio Baptista na vaga de Borges. Júlio foi ser o central e Goulart passou para a referência, mas depois sairia para a entrada de Dagoberto, que foi ser ponteiro direito, com Ribeiro passando a ser o central e Júlio o centroavante. No Botafogo, Oswaldo de Oliveira mandou Hyuri na vaga de Renato, fazendo um 4-3-3 com Marcelo Mattos de único volante e Seedorf tendo a companhia de Rafael Marques no meio-campo ofensivo, e depois lançou Alex na vaga de Elias na referência.
As trocas fizeram a intensidade cruzeirense ser retomada, principalmente nos contra-ataques. E foi numa transição rápida, em bola roubada por Bruno Rodrigo, que Everton Ribeiro entrou driblando na área, caiu e o juiz marcou pênalti duvidoso. Júlio converteu e praticamente matou o jogo. Oswaldo ainda tentaria uma última cartada, com Henrique no lugar de Rafael Marques, lotando o setor ofensivo com dois centroavantes e dois jogadores abertos. Henrique chegou a fazer Fábio defender uma bola, mas um contra-ataque mortal puxado por Júlio Baptista e muito bem concluído pelo próprio em um drible de corpo deu a oitava vitória seguida ao Cruzeiro.
Cara de campeão
A proposta de jogo cruzeirense já é bem conhecida: marcação a partir dos atacantes sem a bola, e aproximação e troca de posição dos meias e ultrapassagem dos laterais com a bola nos pés, tudo isso feito com muita intensidade. É claro que nenhuma proposta é perfeita — às vezes o Cruzeiro dá muito espaço, deixando os adversários com tempo demais com a bola nos pés. Porém, seja quando os adversários mudam sua forma de jogar, seja quando não o fazem e exploram os pontos menos fortes do Cruzeiro, como o Botafogo fez, a vitória vem.
Além disso, o comprometimento dos jogadores com o objetivo de campeonar ficou claro na saída para o intervalo, quando o repórter do PFC tentou entrevistar Nilton. O jogador não conseguiu falar devido à emoção de ver a torcida enlouquecida com o seu gol. Indício de comprometimento e motivação.
Se o Cruzeiro vencerá o torneio, ainda é cedo para dizer. Mas que estes ingredientes dão à equipe uma cara de campeão, ah, isso dão.