Cruzeiro 3 x 0 Santos, Cruzeiro 1 x 0 Grêmio – Desmantelando muros

O calendário corre. Se o Cruzeiro, como todos queremos, chegar à final da Copa do Brasil, será quarta e domingo até dezembro — a próxima semana livre seria apenas entre a penúltima e a última rodada do Brasileirão. Com isso, o blogueiro também fica sem tempo. Por isso, abaixo seguem textos mais curtos sobre as partidas em casa contra Santos e Grêmio, antes de começar a rodada 17.

Com espaço

Cruzeiro 3 x 0 Santos

Para compensar a falta de trabalho defensivo de Robinho, volantes ficavam recuados para a cobertura e abriam espaço no meio, que o trio de meias celestes aproveitou

Na partida contra o Santos, ambos os times entraram num 4-2-3-1. Marcelo Oliveira manteve Mayke na lateral direita, e por isso todos esperavam o duelo com Robinho. Isso porque o santista joga normalmente pelo lado esquerdo do ataque, mas nessa partida, Oswaldo de Oliveira optou por escalá-lo do outro lado, provavelmente para explorar os espaços que Egídio deixa ao subir para o ataque.

Teria funcionado se esse movimento não ocasionasse um efeito cascata. Mesmo com Robinho, Egídio não deixou de apoiar, e Robinho não voltava com ele. Pra evitar o dois contra um em cima de Cicinho, os volantes do Santos iam para a cobertura, principalmente Alan Santos. Isso abriu uma cratera no meio campo, por onde os meias celestes tinham espaço para jogar. O Cruzeiro dominou todo o primeiro tempo, dando chances apenas quando errava os passes e as coberturas nos contra-ataques. Destaque para a atuação de Henrique, senhor do meio-campo, com 5 desarmes.

Na etapa final, Osvaldo entrou com Rildo na vaga de Damião, centralizando Robinho no ataque. A ideia era dar mais movimento e velocidade pelos lados, já que os contra-ataques entraram no primeiro tempo, mas o gol logo no início da segunda etapa acabou com os planos do time paulista. Este gol é fruto da total inteligência tática de Ricardo Goulart e merece destaque.

Depois de troca rápida de passes pela esquerda, Egídio acionou Willian. O bigode já estava longe do alcance de Cicinho, obrigando Edu Dracena a sair na cobertura. Assim que Edu abandona a área para dar o combate, Ricardo Goulart percebe o espaço nas costas do zagueiro e o ocupa, recebendo o passe e finalizando bem. É importante ressaltar que Goulart só faz isso porque Edu Dracena saiu do seu posicionamento. Se o zagueiro continuasse mantendo a linha, é bem provável que Goulart continuasse na frente da área esperando o passe lateral. Isso é inteligência tática: perceber os espaços, ir até eles e saber o que fazer quando chegar lá.

Com 2 x 0, o jogo assentou. O Cruzeiro apenas controlava o ritmo e o Santos tentou dar velocidade. Rildo, que havia entrado como ponteiro esquerdo, começou a levar perigo em cima de Mayke, que já havia levado o amarelo. Marcelo aproveitou a troca por Ceará para lançar também Júlio Baptista na vaga de Moreno, para segurar a posse no meio e dar cadência, tirar a velocidade do jogo que naquele momento favoreceria ao Santos. Goulart foi fazer a função na frente, mas logo depois sentiria um incômodo e seria trocado por Dagoberto, fazendo Éverton Ribeiro ser o central, com Dagoberto na direita e Júlio na referência.

Oswaldo até tentou colocar Leandrinho na vaga de Alan Santos, abrindo o time num 4-3-3 com um volante só para tentar diminuir. Mas o Cruzeiro ensaiou duas vezes o contra-ataque, errando sempre o último passe. No terceiro, Éverton passou a Júlio Baptista, que com um drible mágico tirou do carrinho de Dracena antes de completar pro gol e matar o jogo.

Sem espaço

Cruzeiro 1 x 0 Grêmio

Já na partida contra o Grêmio, o 4-3-2-1/4-5-1- de Felipão fechou o meio, e o único espaço disponível era o setor de Lucas Silva e Henrique

Na partida contra o Grêmio, porém, a postura do adversário foi diferente. Contra um Cruzeiro sem Moreno por força de contrato e com Júlio Baptista em seu lugar, Felipão fez o que devia ter feito no jogo contra a Alemanha e escalou três volantes, fechando todos os espaços no meio-campo. Além disso, Dudu e Luan, os meias, jogavam abertos em cima dos laterais e voltavam com eles. Apenas o jovem Ronan ficava à frente da linha do meio-campo, fazendo uma espécie de 4-5-1 com o meio em linha sem a bola. A consequência era que os meias celestes não tinham o mesmo espaço que tiveram na partida contra o Santos, dificultando muito as ações ofensivas.

Com 9 homens atrás da bola, o espaço para jogar se encontrava entre a linha divisória e a intermediária ofensiva. Assim, o Cruzeiro chegou mais quando os meias recuavam até este espaço para iniciar a construção, ou quando Henrique e Lucas Silva, que naturalmente jogavam por ali, faziam este primeiro passe. Lucas, no entanto, não estava em um bom dia e errou muitos passes, gerando os contra-ataques perigosíssimos do Grêmio que paravam nas mãos de Fábio. O primeiro tempo terminou com o placar em branco muito por conta da atuação do capitão celeste.

Na volta, Marcelo mandou Alisson a campo na vaga de Willian, que não fez bom primeiro tempo, errando muitos passes e interrompendo a construção do ataque. Alisson tinha a missão de não só manter a intensidade e dar profundidade do lado esquerdo. Do lado oposto, Felipão trocou Riveros por Edinho, por lesão. Agora o sistema parecia bem mais um 4-1-4-1, com Edinho bem próximo da defesa e fixo entre as linhas.

Com 3 minutos, Edinho foi amarelado, mas Lucas Silva e Henrique também foram — um sinal de um jogo brigado no meio. Temendo o vermelho, Marcelo mandou Nilton na vaga de Lucas, e depois queimou a regra três aos 17 minutos, com Dagoberto na vaga de Júlio Baptista. Goulart avançou para a referência, Éverton Ribeiro foi ser o central e Dagoberto entrou pela direita. O jogo continuou encardido, e só aí Felipão sentiu segurança para tentar algo mais. Tirou Ronan e lançou Fernandinho, ex-rival, como ponteiro. Com isso, Luan foi ser o centro-avante. A tentativa era a clássica: dar velocidade nos contras.

Mas as alterações não mudaram a partida. O Cruzeiro continuou tendo a posse da bola, e o Grêmio continuou fechadinho. A equipe gaúcha parecia feliz por empatar sem gols com o melhor time do Brasil fora de casa — de fato, teria sido um grande resultado. Teria, se Dedé não fizesse jogada de lateral e acertasse um dos dois cruzamentos certos do Cruzeiro em toda a partida. Dagoberto, que naquele momento era o ponteiro esquerdo, cabeceou fora do alcance de Grohe e fez o gol que valeu 5 pontos de folga na liderança. Felipão ainda tentou lançar Alan Ruiz, meia, na vaga de Riveros, mas a área de Fábio não foi mais ameaçada.

Demolição de muros

Tanto Santos como Grêmio mostraram formas de se tentar jogar contra o Cruzeiro no Mineirão. Oswaldo confiou em Robinho para decidir, pois abriu o meio-campo para deixá-lo sem responsabiliade defensiva. Arriscou e perdeu, pois Robinho não fez boa partida e o espaço fornecido foi fundamental na vitória por 3 a 0. Portanto, o Santos foi um bom exemplo de como não se portar.

Já Felipão não quis arriscar. Usou a política do “erro zero” na defesa, para pelo menos deixar o placar em branco e quem sabe conseguiu um gol na frente. Quase um anti-futebol, onde o importante é não perder. Considerando que o Cruzeiro impõe respeito, é compreensível. E apesar do resultado não ter sido favorável, a postura gaúcha na partida de quinta à noite abre um precedente perigoso para que outros treinadores tentem fazer o mesmo.

Existe uma máxima no futebol que diz: por mais que uma equipe seja inferior técnica e taticamente a outra, pelo menos uma ou duas chances de gol ela terá. E no livro “Os Números do Jogo” é mostrado, por análises estatísticas, que a chance de vitória aumenta mais quando se evita sofrer o primeiro gol do que quando se marca o primeiro gol. Esses dois fatos corroboram com a teoria do “erro zero”: defender-se bem e marcar nas poucas chances que aparecerem é uma estratégia válida.

É claro que nem todos os adversários terão a qualidade defensiva que o Grêmio teve, nem jogadores técnicos e rápidos o suficiente para ameaçar em contra-ataques. Mas esse futebol negativo, de reação, é o que podemos esperar de quase todos os adversários do Cruzeiro no Mineirão, e até de alguns outros times na sua própria casa.

E o Cruzeiro, como melhor time do Brasil, tem a obrigação de desmantelar esses muros — para o bem do futebol brasileiro.

2014: o ano da Copa… Libertadores

O Constelações está de volta. O único blog de análise tática assumidamente sem compromisso com a análise neutra — aqui é só o Cruzeiro que interessa — abre seus trabalhos em 2014 com uma opinião sobre os novos contratados e um resumo sobre as duas primeiras partidas do ano.

Mas antes, cabe uma rápida explicação: as últimas rodadas do Brasileirão 2013 foram atenciosamente vistas por este que vos escreve. Porém, como sabem, este não é o meu trabalho principal (adoraria que fosse) e portanto não posso me dedicar a ele como gostaria. Some-se a isso as viagens e festas de fim de ano, nas quais fiquei sem meu equipamento para escrever os textos (um computador), passou-se o tempo, as análises não foram escritas e deixaram de ser relevantes.

Entretanto, não acredito ter perdido muita coisa. Afinal o Cruzeiro foi totalmente outro após a conquista do título, jogando mais para festejar com a torcida do que para vencer. O mesmo 4-2-3-1 permaneceu até o final, mas com equipes do outro lado jogando a vida para não caírem para a segunda divisão — uns conseguiram, outros não.

Reforços

Os inscritos para a Libertadores 2014.

Os inscritos para a Libertadores 2014

Mas 2014, o ano da Copa (Libertadores), chegou. E com ele, novos contratados apareceram na Toca II: Rodrigo Souza, Samudio, Marlone e Marcelo Moreno.

O primeiro é volante, mais de contenção, e portanto jogaria na posição que é atualmente do Nilton. Confesso que não sei se o jogador tem a mesma qualidade de passe e chegada na área em bolas paradas, a conferir.

O lateral esquerdo Samudio foi uma excelente contratação. Vem para ser a sombra que Egídio precisava, já que Éverton chegou a ser titular no Campeonato Mineiro mas perdeu a posição novamente e não jogou mais. O gringo traz a experiência de Libertadores que possui e será muito importante quando Egídio, ainda dono da posição, não puder jogar. Não conheço a característica do jogador, se é lateral mais defensivo (como Ceará) ou tem mais ímpeto (como Mayke e Egídio). Se eu tivesse que apostar, apostaria no primeiro caso.

Marlone é uma jovem promessa que apareceu muito bem no Vasco no ano passado. É ponteiro, podendo jogar pelos dois lados mas preferencialmente o esquerdo. Está na disputa com Willian, Dagoberto e Luan por esta vaga — sim, porque do lado direito, Éverton Ribeiro é o dono indiscutível da posição. E pode ter sido uma contratação já pensando numa provável saída de Éverton Ribeiro para o futebol europeu.

Já Moreno é velho conhecido da torcida celeste. Foi o artilheiro da Libertadores de 2008, a primeira da era Adílson Batista. Volta quatro anos mais experiente, depois de uma temporada razoável no Grêmio e no Flamengo, onde amargou a reserva de Hernane. Centroavante, possui bola aérea forte, mas tem características bem diferentes dos outros centroavantes Borges e Anselmo Ramon (e de Vinícius Araújo, que já se foi). Confesso que estou com um pé atrás com esta contratação, pois precisávamos de centroavantes móveis e não de mais uma referência na área (Borges e Anselmo já servem a esse propósito), mas pode também ser um indicativo de que Marcelo Oliveira está disposto a mudar o estilo de jogo se for preciso.

Cruzeiro 1 x 0 URT

O 4-2-3-1 de sempre, diante de uma URT recuada e defensiva tentando bloquear os laterais celestes

O 4-2-3-1 de sempre, diante de uma URT recuada e defensiva tentando bloquear os laterais celestes

O ano começou como terminou ano passado: o mesmo 4-2-3-1, porém com Souza na vaga de Nilton. Os outros dez eram os de sempre: Fábio no gol, Ceará e Egídio nas laterais, Dedé e Bruno Rodrigo na zaga, Lucas Silva de volante avançado e Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Dagoberto na linha de três meias atrás de Borges. Nada de novo.

Como também não foi novidade o número de finalizações celestes: 35, sendo 14 na direção do gol, contra apenas 6 da URT. Isso porque o time de Patos de postou com uma trinca de volantes, dois meias mais abertos para barrar as subidas dos laterais e um atacante apenas, que não fazia pressão em Dedé e Bruno Rodrigo. Assim, o Cruzeiro avançava até quase na intermediária ofensiva sem ser incomodado, e só sofria marcação mais pesada a partir daí.

A movimentação da trinca de meias do ano passado estava lá, ainda um pouco enferrujada, mas era intensa o suficiente para por vezes afundar um ou dois volantes patenses na linha defensiva e abrindo espaço logo à frente da área. Esse espaço gerou uma profusão de chances, que só não foram melhor aproveitadas porque o goleiro Guilliano estava em tarde inspirada, e também o pé ainda não me pareceu bem calibrado. Era o primeiro jogo da temporada, afinal.

Marcelo fez trocas simples, apesar de não serem diretas. Dagoberto por Willian, Júlio Baptista por Borges (com Goulart temporariamente na referência) e Goulart por Moreno. Manteve-se o 4-2-3-1 e o placar de 1 a 0 construído no fim do primeiro tempo.

Caldense 0 x 0 Cruzeiro

No mesmo 4-2-3-1 do Cruzeiro, a Caldense teve mais físico e por isso mais intensidade: muita marcação e velocidade com a bola

No mesmo 4-2-3-1 do Cruzeiro, a Caldense teve mais físico e por isso mais intensidade: muita marcação e velocidade com a bola

Já no sul de Minas foi diferente. A Caldense, com um bom time armado pelo técnico Leonardo Condé, não teve a mesma postura da URT e avançou suas linhas de marcação. Jogando no mesmo 4-2-3-1 do Cruzeiro, tinha o veloz Diney na esquerda, e Éverton Maradona comandando o meio-campo central. Em teoria, não havia superioridade numérica em nenhum setor do campo, mas o time de Poços tinha mais energia e preparo físico, jogando com muita velocidade tanto no ataque como na defesa. O Cruzeiro, sem o mesmo condicionamento, tentava tirar a velocidade do jogo, e por isso ficava com a bola mais tempo mas sem produzir nada.

Nesta feita, Marcelo Oliveira teve que trocar Borges por Moreno diretamente, devido a lesão do camisa 9 ainda no primeiro tempo. Depois, Júlio Baptista entrou na vaga de Willian (que havia começado o jogo pela esquerda na vaga do poupado Dagoberto), fazendo Ricardo Goulart jogar pela esquerda na linha de três, mas “a la Éverton Ribeiro”: puxando para o centro, devido sua tendência de estar por dentro do campo, e ao mesmo tempo explorando o espaço que Júlio Baptista tentava criar com incursões à grande área.

E por fim, Éverton Ribeiro, que errou muitos passes neste jogo, saiu para a entrada de Élber. A tentativa era a da velocidade, ultrapassagens pelos lados para levantar a bola para Moreno na área, mas não houve sucesso.
E, em suma, foi assim o jogo: a Caldense jogando a vida, pois qualquer ponto nos confrontos com os time da capital pode valer uma vaga na semifinal, e o Cruzeiro ainda tentando encontrar um ritmo e recuperando a questão física. O zero a zero acabou sendo um resultado condizente, em que pese o time da casa ter tido mais chances.

Ainda é pré-temporada

Lembremos que o Cruzeiro jogou sua última partida em 2013 no dia 8 de dezembro. Somemos o mês de férias e o mês de pré-temporada e chegamos à data de 8 de fevereiro: o dia em que aí sim podemos passar a cobrar um pouco mais do Cruzeiro, ainda que seja o início da temporada. Portanto, estes primeiros jogos só servem como pré-temporada de fato, mesmo que sejam jogos oficiais. A estreia na Libertadores é no dia 12 contra o Real Garcilaso, e até lá o Cruzeiro ainda vai evoluir física e tecnicamente.

Taticamente, a evolução continua, mas já é um time bastante amadurecido com o sucesso na temporada passada.

Exaltando a escola cruzeirense de futebol

Depois de um jogo em que poderia ter vencido não fosse o goleiro adversário ter gasto suas últimas fichas para fechar a meta, o Cruzeiro não deu chances ao azar e venceu outros dois adversários. Internacional e Portuguesa usaram estratégias e estilos de jogo diferentes para tentar surpreender Marcelo Oliveira, mas o estilo leve e rápido do ataque cruzeirense sobressaiu sobre ambas as equipes.

Como não sou pago para escrever e não posso tirar meu sustento do blog, não posso me dedicar a ele como gostaria. Por isso não foi possível postar uma análise separada para os dois jogos. Assim, o blogueiro vai tentar ser menos prolixo e condensar as duas partidas em apenas uma postagem.

Internacional 1 x 2 Cruzeiro

O 4-2-3-1 do Internacional tentou explorar a velocidade com um quarteto leve, principalmente com Otávio às costas de Egídio; já o Cruzeiro sentiu um pouco a falta de Goulart e não teve tanta presença no meio-campo central

O 4-2-3-1 do Internacional tentou explorar a velocidade com um quarteto leve, principalmente com Otávio às costas de Egídio; já o Cruzeiro sentiu um pouco a falta de Goulart e não teve tanta presença no meio-campo central

Para o jogo contra o Internacional, Ricardo Goulart e Lucas Silva estavam suspensos, e por isso Marcelo optou por lançar Henrique de volante mais solto e Dagoberto de ponteiro direito no 4-2-3-1 habitual. Com isso, Éverton Ribeiro foi deslocado para a posição de central — mas essa é só uma referência inicial neste Cruzeiro de 2013, onde os três meias circulam por todos os setores. Porém, mais do que o ponto de partida de Ribeiro, o estilo do quarteto ofensivo também mudou. Com Goulart, o time tem mais presença próximo ao círculo central e por isso as jogadas saem de trás com mais fluência. Já Dagoberto tem tendência de ser mais agudo, como Willian do outro lado. Com isso o Cruzeiro fica mais vertical e incisivo, mas perde em volume no meio-campo.

A jogada do primeiro gol merece destaque. Nas partidas contra o Atlético/PR e Botafogo, Nilton “inverteu” de papéis com Dedé — ou seja, o volante fechava na segunda trave enquanto Dedé puxava a marcação. Normalmente é o volante que segura os marcadores do zagueiro, numa jogada inspirada no pick-and-roll do basquete. Porém, depois de dar certo duas vezes, a dupla voltou ao modo “normal”, e o cruzamento de Egídio na primeira trave achou a cabeça de Nilton.

No lance seguinte o Inter empataria, tirando a vantagem psicológica que o Cruzeiro acabara de construir. Com a igualdade de volta ao placar, o estado inicial do jogo foi recolocado. Sem D’Alessandro, Dunga — agora ex-técnico do Inter — armou um 4-2-3-1 com Jorge Henrique pela esquerda, Otávio na direita e Alan Patrick de central, com Caio na frente — quatro jogadores leves, tentando surpreender a defesa celeste na base da velocidade. Otávio foi quem melhor aproveitou a estratégia, aproveitando espaços às costas de Egídio. Foi dele o gol de empate, recuando para sair da marcação do lateral esquerdo e ainda contando com um desvio no meio do caminho, mas não parou por aí. O Inter arrematou 7 vezes no primeiro tempo, com um gol e duas defesas de Fábio, bem acima do que o Cruzeiro permite a seus adversários.

Com as trocas, o Intermacional tentou pressionar com Damião e Alex, mas o Cruzeiro mudou o sistema e se defendeu com Tinga entre os volantes, controlando o jogo sem sustos até o fim

Com as trocas, o Intermacional tentou pressionar com Damião e Alex, mas o Cruzeiro mudou o sistema e se defendeu com Tinga entre os volantes, controlando o jogo sem sustos até o fim

Ofensivamente, Goulart fez falta. Ribeiro foi muito bem marcado por Willians, mais plantado para liberar Josimar, e Dagoberto ficou escondido do lado do campo. Só Willian tentava algo. Depois do gol, o Cruzeiro finalizou mais 3 vezes até os 15 minutos, e não mais até o intervalo. Marcelo percebeu o problema defensivo e tirou Egídio, amarelado, lançando Mayke e deslocando Ceará para a direita. A substituição funcionou e a defesa celeste equilibrou o jogo, que ficou mais lento e truncado. Quando o Cruzeiro acelerou pela primeira vez na segunda etapa, conseguiu o gol da vitória em jogada de Dagoberto, disputando bola aérea e acionando Willian no bico esquerdo da área. O bigodinho cortou pra dentro e colocou a bola quase com a mão no canto de Muriel, sem chance para o goleiro. Golaço.

Desta vez o Internacional não conseguiu empatar logo em seguida e o lado psicológico falou mais alto. Dunga tentou soltar o time, lançando Damião na vaga de Josimar e recuando Jorge Henrique para a volância, na tentativa de qualificar a saída e ter presença de área — Caio foi ser o ponteiro esquerdo. Depois trocou de central, Alan Patrick por Alex. Marcelo respondeu com Alisson na vaga do cansado Dagoberto para fazer as funções defensivas de ponteiro e depois Tinga no lugar de Éverton Ribeiro — uma espécie de 4-3-2-1 com dois jogadores abertos, quase um 4-5-1 com meio em linha. Assim o Cruzeiro controlou o jogo até o fim e garantiu mais três pontos.

Cruzeiro 4 x 0 Portuguesa

O 4-1-4-1 da Portuguesa até tentou explorar o lado esquerdo da defesa celeste com Luís Ricardo e Corrêa, mas Ferdinando e os laterais não conseguiram conter a intensidade do quarteto ofensivo celeste

O 4-1-4-1 da Portuguesa até tentou explorar o lado esquerdo da defesa celeste com Luís Ricardo e Corrêa, mas Ferdinando e os laterais não conseguiram conter a intensidade do quarteto ofensivo celeste

Já no jogo seguinte, o adversário tentou usar o mesmo espaço de campo, mas usou de outra estratégia. A ideia de Guto Ferreira era encaixar a marcação no meio-campo e soltar a bola rapidamente para Luís Ricardo — lateral de origem improvisado como ponteiro direito num 4-1-4-1 com Ferdinando entre as linhas e dois volantes — Bruno Henrique e Moisés — como meias centrais. Souza abriu na esquerda e Gilberto ficava centralizado. Corrêa, volante de ofício, foi quem deu o suporte defensivo a Luís Ricardo, jogando como lateral direito.

A tentativa era boa, pois é sabido que a marcação de Egídio é o ponto menos forte do time celeste. A primeira chance da partida foi exatamente com Luís Ricardo, mas não deu tempo de haver mais chances, porque a goleada foi construída em apenas 30 minutos. Nos outros 60 o Cruzeiro nitidamente se poupou e a Portuguesa recuou para não negativar o saldo de gols construído na partida anterior contra o Corinthians.

Os gols não foram parecidos na construção, mas tiveram sempre o mesmo elemento: Borges. No primeiro, a disputa aérea de Willian com Corrêa foi suficiente para fazer o volante-lateral errar e mandar a bola pra trás, que Borges aproveitou e mandou na trave. No rebote, Éverton Ribeiro, que acompanhou todo o lance, mandou para as redes sem marcação. Detalhe: quando a bola cruza a linha, Willian já estava dentro da área.

Depois, uma troca de passes pela esquerda e Goulart arrisca uma bomba que explode no travessão. No rebote, Borges está sozinho à frente de Lauro para aumentar. Já no terceiro, Borges, o camisa 9, homem de área, está à direita para receber o passe de Éverton Ribeiro e cruzar rasteiro para Willian ampliar. E no quarto, Borges é lançado após erro de saída da Portuguesa — na verdade forçado pela pressão alta dos atacantes celestes — e serve Ribeiro dentro da área sem olhar, saindo da área depois disso. Ribeiro perde o ângulo e acha Goulart, que finaliza em cima da zaga, e após disputa de Willian com o zagueiro, a bola sobra caprichosamente nos pés de Borges, que voltou lentamente para dentro da área. Fim de papo ainda com quinze minutos por jogar na primeira etapa.

Tudo por causa da estratégia de Marcelo nos jogos em casa: intensidade no início da partida para resolver logo a parada e chamar a torcida para junto do time. Com apenas dois pontos perdidos no Mineirão comprovam que a postura tem dado muito certo. Borges, que no fim do jogo contra o Inter saiu extenuado de campo, dizendo que todos estavam no limite, foi quem mais se aplicou enquanto houve jogo e por isso foi o nome da partida, com dois gols, duas traves e uma assistência.

Na etapa final, Marcelo Oliveira tentou reacender o jogo trocando todo o ataque; já Guto Ferreira repaginou o lado direito com Wanderson para poder deslocar Corrêa de volta para a proteção e melhorar a marcação no setor

Na etapa final, Marcelo Oliveira tentou reacender o jogo trocando todo o ataque; já Guto Ferreira repaginou o lado direito com Wanderson para poder deslocar Corrêa de volta para a proteção e melhorar a marcação no setor

Porém, depois dos gols, o jogo morreu. Difícil motivar um time no intervalo com tamanha vantagem, mas Marcelo Oliveira disse na coletiva pós-jogo que criou o desafio para o time de não sofrer gols, mesmo se poupando. A Portuguesa mudou para não sofrer mais gols, com o meia Wanderson de ponteiro direito na vaga de Ferdinando, que sofreu com os três mais celestes no primeiro tempo. Com isso, Corrêa e Luís Ricardo voltaram para suas posições “de origem” — volante e lateral direito, respectivamente, reforçando a marcação no meio e na direita.

Já o Cruzeiro claramente descansava com a bola nos pés, preservando a parte física para enfrentar a última maratona de jogos até o fim de outubro (em novembro os jogos serão apenas aos domingos, com exceção de uma rodada). Borges saiu ovacionado para dar lugar a Dagoberto, mandando Goulart temporariamente à frente. Era uma tentativa de Marcelo Oliveira de reacender o jogo, sem muito sucesso. Na Portuguesa, Cañete entrou na vaga de um inoperante Souza, mantendo a função de ponteiro esquerdo, e depois Gilberto cedeu seu lugar a Bérgson, mais móvel. Mas não houve sucesso em incomodar a defesa do Cruzeiro, que ainda teve Vinícius Araújo e Lucca nos lugares de Willian e Éverton Ribeiro, em novas tentativas de continuar com a intensidade, mas os jogadores preferiram descansar e repelir as poucas ações do time visitante.

Contra tudo e contra todos

Talvez eu não tenha conseguido resumir tanto quanto gostaria. Mas a ideia é que o Cruzeiro consegue jogar sempre da mesma forma, contra qualquer adversário, estilo ou estratégia adotada, seja onde for.

O Cruzeiro enfrentou dois adversários em momentos diferentes — a Portuguesa em recuperação e o Internacional em queda — com estratégias diferentes, mas tendo o mesmo resultado: o revés. O estilo cruzeirense — intensidade em todos os setores, solidez e estrutura defensiva, e velocidade, leveza e maleabilidade no ataque — se impõe sobre os planos táticos dos adversários, que já não sabem muito o que fazer para parar o time celeste. Um time que respeita o estilo histórico de jogar futebol do Cruzeiro: ofensivo e envolvente.

Esta equipe já foi testada de todas as formas, seja saindo atrás do placar e sendo paciente para buscar a virada; seja resolvendo o jogo em trinta minutos e garantindo os três pontos, e saiu vitoriosa na grande maioria das vezes. Ainda falta muito, mas a consistência tática é que permite aos estatísticos afirmar que o Cruzeiro tem mais de 90% de chances de levantar a taça no fim do ano.

Porém, se continuar neste ritmo, talvez até mesmo antes do fim do ano.

Cruzeiro 2 x 1 Flamengo – Golaço tático

Imposição, intensidade, movimentação e paciência foram alguns dos predicados que o Cruzeiro apresentou ontem na partida contra o Flamengo pela Copa do Brasil. Talvez tenha sido o jogo mais impressionante da temporada do ponto de vista tático até aqui, e não seria nenhum exagero dizer que o Flamengo escapou de levar uma goleada histórica no Mineirão. Talvez o placar elástico até tivesse saído se Júlio Baptista estivesse em um ritmo melhor.

Mas, como o futebol não é matemática, às vezes — ou melhor, frequentemente — o placar é mentiroso. O gol sofrido numa falha técnica ainda mantém o confronto aberto, mas não há como negar o favoritismo do Cruzeiro, não só pela vantagem em gols, mas pela superioridade tática, técnica e física.

Escalações

Um execução primorosa dos três meias no 4-2-3-1 do Cruzeiro, ante o recuadíssimo 4-1-4-1/4-3-3 do Flamengo

Um execução primorosa dos três meias no 4-2-3-1 do Cruzeiro, ante o recuadíssimo 4-1-4-1/4-3-3 do Flamengo

Com a lesão de última hora de Mayke, o retorno de Souza e a manutenção de Willian entre os onze iniciais, Marcelo Oliveira enviou a campo o seu famigerado 4-2-3-1, capitaneado pelo goleiro Fábio e com a linha defensiva formada por Ceará à direita, Egídio à esquerda e Dedé e Bruno Rodrigo — jogando com efeito suspensivo. Na proteção, Nilton e Souza não só marcavam como também ajudavam o setor de destaque do time, o trio de meias. Éverton Ribeiro, Ricardo Goulart e Willian foram sensacionais na execução da linha de três, bagunçando o desenho com muita movimentação e inversões. Sorte de Borges, que teve bastante munição, apesar de ter desperdiçado.

Mano Menezes, que há menos de um ano era técnico da Seleção, deve ter visto alguns jogos do Cruzeiro. Por isso mudou algumas peças, mas sem abrir mão do 4-3-3 que vem adotando, que neste blog gosto de chamar de 4-1-2-3. Neste caso, porém, o Flamengo parecia muito mais um 4-1-4-1, e às vezes até um 4-5-1 mesmo, com os cinco do meio campo em linha, tal o recuo dos jogadores para proteger-se do volume ofensivo imposto pelo Cruzeiro. O gol de Felipe foi protegido pelos zagueiros Chicão e Marcos González, com Luiz Antônio na lateral direita e o zagueiro Samir na esquerda. Victor Cáceres era o volante entre as linhas, com Elias e André Santos mais avançados e flanqueados por Gabriel e Fernando. Na frente, Marcelo Moreno era o centroavante solitário.

Saída de bola

Depois de um início que parecia equilibrado, com o Flamengo inclusive tendo uma posse de bola longa demais, aos poucos o Cruzeiro foi tomando as rédeas do jogo, e o time carioca foi inconscientemente recuando cada vez mais, até que Marcelo Moreno, o homem mais avançado, estava atrás da linha do meio-campo, à frente de Nilton e Souza. O fama da equipe celeste certamente contribuiu, e assim o Flamengo tinha seus onze jogadores em um espaço de trinta metros, a famosa compactação que muitos técnicos atuais pedem.

Mas isso não foi um problema para o Cruzeiro, que saía com qualidade pelas laterais. Pois Gabriel e Fernando, os jogadores abertos do Flamengo, esperavam os avanços dos laterais para marcar ao invés de fazer pressão no alto do campo. E quando Ceará e Egídio avançavam até a intermediária, os flamenguistas não os acompanhavam, e assim os laterais do Flamengo ficavam sobrecarregados e a bola chegava com facilidade à frente.

Intensidade com a bola

Some-se a isso o fato de Willian, Ricardo Goulart e Everton Ribeiro se movimentavam bastante, invertendo de lado, e estavam sempre muito próximos uns dos outros, oferencendo linhas de passe quando preciso e abrindo espaços para os companheiros, principalmente os volantes e laterais. Além disso, Goulart — ou o meia que estivesse centralizado no momento, tal a movimentação — flutuava sua posição para fugir da marcação de Cáceres, que ficou perdido sem saber a quem acompanhar.

Flagrante de um dos momentos do jogo onde os três meias estavam fora de suas posições “oficiais”

Assim foi a maior parte do primeiro tempo, com posse de bola celeste, mas o Cruzeiro também jogou bem em outra fase da partida: a transição ofensiva. Se o Flamengo ameaçasse subir um pouco suas linhas para iniciar um ataque, logo que a bola era roubada o Cruzeiro já partia em velocidade, tentando pegar a defesa desprevenida, mas sem conseguir concatenar bons passes.

E também sem a bola

E, nos pequenos períodos em que não tinha a bola nos seus pés, o Cruzeiro marcava o Flamengo impiedosamente. Impressionou a participação de todos os jogadores no trabalho defensivo: seja na disposição de Borges correndo para pressionar os zagueiros flamenguistas, seja Willian roubando não uma, mas sim DUAS bolas praticamente dentro da área do Flamengo. Até Everton Ribeiro, que normalmente não faz parte do trabalho de marcação, foi visto dentro da própria área interceptando passes e roubando bolas do lateral-zagueiro Samir, nas raras vezes em que este se aventurou ao ataque. Um indicativo excelente de que o time soube “mudar a chavinha” da competição, sabendo que este jogo era bem mais decisivo que os jogos de temporada normal do Brasileirão. Ou seja, amadurecimento de equipe.

E assim, como um organismo vivo de metabolismo muito alto, o Cruzeiro jogou praticamente sozinho na primeira etapa, finalizando de todas as formas: cabeceios em bola parada, chutes longos e curtos, e com vários jogadores. De acordo com a Footstats, Dedé (2), Everton Ribeiro (3), Nilton, Ceará, Borges, Willian (2), Egídio e Ricardo Goulart arremataram. Por isso tudo, o gol de Willian aos 26 — fazendo o esperado de um ponteiro que está do lado oposto da jogada: entrando na área para concluir — em jogada de Ceará foi o tento solitário de 45 minutos de um massacre tático.

As conclusões do Cruzeiro (Footstats): bolinhas = gols, azul escuro = finalizações certas, azul claro = finalizações erradas

As conclusões do Cruzeiro (Footstats): bolinhas = gols, azul escuro = finalizações certas, azul claro = finalizações erradas

O golaço

Supreendentemente, Mano Menezes não quis trocar peças nem o sistema, preferindo pedir outra atitude ao seu time. E em certa medida, isso aconteceu, mas também porque o Cruzeiro já não aplicava tanta intensidade quanto antes — o que é esperado depois de um primeiro tempo em tão alta rotação. Algumas finalizações, mas nada que assustasse muito Fábio. Além disso, o Cruzeiro não diminuiu a produção ofensiva, finalizando com Borges em passe magistral de Goulart e com Bruno Rodrigo cabeceando na trave um centro de Willian.

E se os contra-golpes não haviam encaixado no primeiro tempo, no segundo só precisou de um para fazer valer a anuidade do Sócio do Futebol. Bola aérea de escanteio contra repelida, Everton Ribeiro passa a Ricardo Goulart. É possível reparar no lance que Goulart olha para o ataque antes de correr atrás da bola. Ele não precisava ver se Ribeiro estaria naquele espaço vazio, ele sabia que sim — entrosamento. Quando a bola chega, Ribeiro chapela o pobre Luis Antônio, fazendo cobertura do lado contrário, e sem deixar a bola cair, solta um petardo praticamente dentro da pequena área que deixou Felipe pregado no chão, sem reação.

Trocas e Júlio

Este lance antológico foi logo aos 10 minutos, e o jogo já estava controlado. Tanto o Flamengo se retraiu novamente tentando evitar uma possível goleada, quanto o Cruzeiro arrefeceu e começou a cadenciar. Mesmo assim, tinha muito mais a bola. Mano Menezes, então, tentou mudar esse panorama lançando Carlos Eduardo na vaga de Gabriel, na mesma ponta direita. Logo depois, Marcelo promoveu a estreia de Júlio Baptista, colocando o novo 10 na vaga de Willian. Com isso, Goulart foi ser o ponteiro esquerdo “oficial”, com Júlio indo para o centro.

Mas o recém-contratado estava com pouco ritmo e “congelou” a movimentação do meio-campo celeste. E quando Nilton se viu sem opção de passe, perdeu a bola que originou o gol carioca. Acho que todos os analistas que vi comentarem sobre a partida atribuíram ao gol sofrido a queda de produção do Cruzeiro, mas eu discordo. Foi a entrada de Júlio a principal causa. Não dá pra trabalhar com hipóteses, mas talvez se a entrada de Júlio fosse um pouco depois, esse lance nem teria acontecido, ou mesmo se acontecesse, o Cruzeiro teria mais volume para tentar aumentar a conta.

Mano mandou João Paulo na vaga de Fernando logo após o gol, mantendo-o como ponteiro esquerdo, mas logo tirou Samir e lançou Paulinho, recuando João Paulo para a lateral esquerda. No Cruzeiro, Goulart e Borges deram seus lugares a Luan e Vinicius Araújo. Mas Marcelo não deu muita sorte, e Luan acabou se lesionando logo após entrar, praticamente apenas fazendo número. Não só isso matou uma possível chance de aumentar o placar para o Cruzeiro como fez o Flamengo ter mais a bola, mesmo sem levar muito perigo a Fábio.

O Brasil descobriu o Cruzeiro

Aparentemente Marcelo encontrou a formação titular com estes três meias. Apesar de estar apagado contra o Vitória, Willian foi muito bem ontem. Goulart e Ribeiro estão demonstrando um entrosamento espetacular. E os três juntos fizeram um fuzuê na defesa carioca: willian esteve pela direita e pela esquerda, Goulart saía do centro para as pontas, e Ribeiro circulava nas três.

Mas só isso não seria suficiente para que o Cruzeiro jogasse em tão alto nível. O time celeste foi superior em todas as fases do jogo, não só na posse de bola. Recompunha-se com intensidade, com todos os jogadores trabalhando defensivamente; contra-atacava com velocidade, apenas precisando acertar mais passes nesse momento; e na posse de bola adversária, destaque para Nilton e Souza — que partida fizeram os dois volantes. Não seria exagerado dizer que, nestes cinco jogadores, o Cruzeiro talvez conte com um dos melhores meio-campos do Brasil.

A partida de ontem, certamente uma das mais assistidas, certamente mostrou o potencial do Cruzeiro para todo o Brasil. Quando até os velhos analistas começam a dizer que tem gosto de ver o Cruzeiro jogar, quando Mayke é especulado na seleção ao invés de Maicon para a reserva de Dani Alves, e quando Everton Ribeiro é assunto mundial, é sinal de que algo grande está acontecendo aqui. Agora o Cruzeiro é o time a ser batido, mesmo não sendo o atual líder do Brasileirão.

Mas nós cruzeirenses já sabíamos disso tudo.

Atlético/GO 0 x 1 Cruzeiro – Sonolento mas interessante

Eu havia cogitado não escrever a respeito desta partida, pois já se sabia que o time que iria jogar não era o titular, e portanto seria uma análise isolada das outras e sem parâmetro de comparação. Porém, como o confronto já tinha sido decidido no jogo de ida, as experiências dos treinadores foram tantas que a partida mereceu um post mais curto.

Partidas que valem-mas-não-valem, como esta, são excelentes para fazer experimentos no time, pois o resultado é o que menos importa. O Cruzeiro querendo rodar o seu elenco, se preparando para a maratona de quarta e domingo que está por vir, enquanto que o Atlético Goianiense quis dar ritmo ao seu novo time, reformulado após a chacoalhada sofrida na semana passada e a derrota no jogo da Série B.

Formações

O mistão celeste no 4-2-3-1: Tinga mais contido que Lucca e espaço à frente dos dois "primeiros" volantes

O mistão celeste no 4-2-3-1: Tinga mais contido que Lucca e espaço à frente dos dois “primeiros” volantes

Marcelo Oliveira só mandou três titulares a campo, mas manteve o 4-2-3-1. O gol de Fábio foi protegido pelos zagueiros Paulão e Léo, ladeados por Egídio na esquerda e Lucas Silva — isso mesmo — na lateral direita. Uelliton e Leandro Guerreiro ficaram na dupla volância atrás da linha de três, com Tinga fazendo o lado direito mais contido, o recém-promovido à titularidade Ricardo Goulart partindo do centro e circulando, e Lucca pela esquerda com mais liberdade para atacar. Na frente, Anselmo Ramon duelava com os zagueiros.

O esquema de Renê Simões tinha muitas particularidades interessantes. Era um 4-5-1 com meio-campo em linha sem a bola e que virava um 4-3-2-1 na fase ofensiva, com os “ponteiros” Diogo Campos pela direita e João Paulo pela esquerda centralizando e se aproximando de Ricardo Jesus. Renan Foguinho era o volante mais plantado, o que dava mais liberdade para Dodó e Marino avançarem. E, por fim, a linha defensiva do goleiro Márcio tinha Jorginho — com a camisa 10 — na lateral direita, Artur e Diego Giaretta no miolo de zaga e Ernandes na lateral esquerda.

Lentidão e espaços

Esse posicionamento do time goiano sem a bola lotava a entrada da área com os três volantes. Com os meias acompanhando os laterais, só Ricardo Jesus raramente tentava pressionar Léo e Paulão, que trocavam bolas sem muita dificuldade, o que fazia a partida ser bem sonolenta. Já o Cruzeiro, quando perdia a bola, tentava retomar, mas sem a mesma intensidade característica — naturalmente, pois é difícil dar motivação para jogadores em um jogo que pouco interessa.

Outro aspecto é o espaço entre os volantes e os meias. Leandro Guerreiro e Uelliton são primeiros volantes, e não tem característica de sair pro jogo. Ricardo Goulart participava pouco do trabalho defensivo, e Tinga e Lucca voltavam só até a intermediária, abrindo um grande espaço na frente da área celeste. Não foram poucas as vezes em que um jogador goiano teve liberdade naquele setor.

O jogo era tão lento que, quando as equipes arriscavam acelerar um pouco, conseguiam criar. Foi assim o gol: bola roubada, Ricardo Goulart teve toda a liberdade do mundo para pensar no melhor passe ao mesmo tempo em que Lucca saía da esquerda e ia para o centro, abrindo o flanco para Anselmo Ramon receber o passe em profundidade, cruzar de três dedos de primeira para Lucca completar e marcar o gol solitário da partida.

As trocas

No final, zagueiro Leo e atacante Luan improvisados como laterais, mas sem tomar sustos

No final, zagueiro Leo e atacante Luan improvisados como laterais, mas sem tomar sustos

Entretanto, a parte mais interessante — taticamente falando — foram as trocas. No Atlético, Renê Simões foi aos poucos fazendo o time ficar num esquema mais “normal”, mas mesmo assim com jogadores improvisados. A primeira substituição foi tirar o meia-esquerda João Paulo e colocar o ponteiro-esquerdo Caio. A diferença é que o jogador permanecia aberto ao invés de centralizar. Depois, Dodó deu seu lugar a Mahatma Ghandi — nome mais do que apropriado para uma partida nessa intensidade — que foi ser lateral esquerdo, empurrando Ernandes para o meio-campo. E por fim, Diogo Campos — que apesar de estar com a camisa 2 e a repórter da TV insistir que ele estava jogando na lateral direita, é atacante de ofício e estava na meia-direita — deu seu lugar a Juninho, que espelhou a movimentação de Caio do outro lado. No fim, o time goiano estava num 4-3-3 clássico, com dois meias, dois atacantes abertos centro-avante.

Já no Cruzeiro, as substituições de Marcelo Oliveira foram muito mais “estranhas”. A entrada de Martinuccio na vaga de Ricardo Goulart no intervalo não chega a ser classificada assim — o gringo indo fazer o lado esquerdo que lhe é característico e Lucca invertendo para a direita e Tinga passando para o meio — mas depois Egídio deu lugar a Luan, que foi fazer a bizarra função de ser lateral esquerdo. E mais pro fim da partida, o zagueiro Wallace entrou na vaga de Lucas Silva, e quem foi fazer a lateral direita foi Léo, que até arriscou um apoio ao ataque ao fim da partida. Assim, no fim do jogo, a linha defensiva celeste era Leo, Wallace, Paulão e Luan.

Pra que serviu, então?

Rodar o elenco é fundamental em um time grande de futebol. Não só pra poupar os titulares, mas pra dar ritmo aos reservas, que certamente serão acionados mais pra frente devido a inevitáveis lesões e suspensões. Marcelo aproveitou também para tentar ampliar o seu leque de opções, vendo a resposta que os jogadores dariam em posições que não lhe são naturais. Mas valeu pela manutenção dos 100%, e pra aumentar o aproveitamento em 2013 para impressionantes 81,3% (19 vitórias, 4 empates e apenas 2 derrotas no ano).

A fala de Tinga após o jogo reflete como o Cruzeiro encarou a partida: “Eu venho jogando quase todas as partidas, mas maioria [dos jogadores] estava há muito tempo sem jogar, sem entrosamento. Deu pra ver que o Cruzeiro está com um plantel bom. A vitória foi importante para mostrar a força do grupo. Pra conquistar algo importante nesta temporada tem que ter um grupo forte.”

De fato faltou entrosamento, mas também faltou intensidade, porque faltou motivação, o que é natural, causando o baixo nível técnico da partida. Na parte tática, entretanto, foi muito mais interessante.